Cinco




O dia era funesto, cinza, escuro, não que ela pudesse ver a luz do sol, porque de fato não podia, mas desde o tempo gélido a terra molhada e árvores sem vida tudo tinha um ar melancólico e sombrio digno do mais profundo funeral.


A mulher se revirou no chão duro em suas cobertas ralas.


Fazia quanto tempo desde que fugira? Que horas eram? Será que voltaria a sair novamente?


Tantas perguntas passavam pela mente dela, mas não a preocupava o fato de estar presa, atada a grilhões mágicos, sem sua varinha e sem nenhum plano ou chance de fuga. Só esperava que o seu raptor não encontrasse a garotinha.


A morena tinha longos cabelos, que encontravam-se sujos graças ao seu estado, mas que costumavam ser sedosos e ondulados, caindo em  ondas suaves até sua cintura. Tinha uma pele branca e corpo voluptuoso, mesmo após meses de torturas e falta de comida. Seus olhos ainda tinham um brilho questionador de quem pensa em mil coisas ao mesmo tempo, havia sido uma das melhores alunas de seu tempo, só tinha tido um problema: se envolver com as pessoas erradas.


Os cortes e escoriações não a deixavam menos bonita. Davam até um toque selvagem à mulher, como uma amazona que, mesmo acorrentada, ainda poderia matar qualquer um que cruzasse seu caminho.


A porta do quarto escuro abriu-se com um rangido surdo e ela sentiu a água gelada perfurar-lhe a pele em finas agulhadas, mas já se acostumara aquele tipo de dor.


Ela não movera-se.


Esperava o pior.


- Esta é a sua última chance, querida Giovanna – a voz que antes havia sido tão familiar e doce para ela, era agora tão fria, cruel e seca – Diga-me: onde está o bebê?


Ainda de costas para seu raptor ela instintivamente moveu o braço para o ventre e uma solitária lágrima escapou-lhe o olho.


- O gato comeu a sua língua? Vamos Gio, pelos velhos tempos, diga-me onde está a criança – exigiu novamente o homem que havia entrado no quarto, seu tom era persuasivo, doce, quase amável.


Giovanna não se moveu novamente não iria dar aquele homem o prazer de vê-la derramar outra lágrima. Iria morrer, sabia disso, mas não iria entregar a ele o bem mais precioso de sua vida inteira.


- Não irás me dizer, não é? – o homem andava em círculos, como um falcão que habilmente cerca a sua presa, vendo que a morena não dirigia a palavra a ele. Deixou a porta aberta e continuou com seu monologo – Está bem. Então vamos. Saia. Não tenho mais o que fazer contigo. És uma causa perdida. Corra logo e fuja, antes que eu mude de idéia.


Ela sentiu a corrente em seus pés desprender-se. E, por um breve momento, tão breve quanto um piscar de olhos, deixou-se iludir, acreditando que, finalmente, estava livre.


Contudo, assim que se levantou, percebeu que deixá-la livre não era o plano de seu seqüestrador, ele ia castigá-la da pior forma, mas no momento a deixaria crer que podia ir.


 


Ela sabia em seu íntimo que não tinha a menor chance de sucesso, mesmo assim pôs-se a correr, o mais rápido que seu estado debilitado permitia, inundada por uma esperança vã e torpe de que tudo não passasse de seu mais temido pesadelo.


Seus pés encontraram a neve, mas isso não a fez fraquejar, continuou correndo por entre a floresta morta que habitava os arredores de seu cativeiro.


Mal havia cruzado a quarta fileira de pinheiros quando ouviu o uivar de lobos, uma alcatéia de pelo menos cinco animais a perseguiam.


Ela correu, tentando ir o mais rápido que podia, mas suas pernas a traíram, ela tropeçou em uma raiz grossa e tentou engatinhar para algum ponto onde pudesse estar a salvo, os cortes e os ossos quebrados já não doíam mais, tudo que importava era a sua chance de sobrevivência, ainda que fosse mínima.


Seu braços já não obedeciam, ela olhou para o céu, olhou para as árvores, tentou subir em uma delas, seu pé escorregou no lodo e ela tombou no chão gelado.


Quando despertou percebeu que era tarde demais.


Sua ultima visão foi a lua cheia saindo detrás de uma nuvem carregada.


Ela fechou os olhos e sorriu sombriamente com um último pensamento.


“Nunca irá achá-la”


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