Conversas da meia-noite



Ainda não era tarde o suficiente para Hermione cessar sua leitura. Ela sempre tivera prazer em ficar em casa lendo até altas horas. Embora estivesse rodeada pelo silêncio, a poucos quarteirões dali estava acontecendo uma festa para qual ela havia sido convidada. Suas amigas trouxas estavam todas lá, dançando, bebendo e provavelmente ficando com algum garoto. Hermione não era do tipo que mentia para si mesma: aquele ambiente simplesmente não a atraía. Ela já estava habituada a tomar cerveja amanteigada, a frequentar encontros no salão comunal da Grifinória e também já estava conformada a respeito de suas pequenas paixões não correspondidas. Cerveja gelada, música eletrônica alta e garotos fúteis não lhe despertavam mais interesse algum. Agora a garota fazia parte de algo maior do que ela própria. Ela era uma bruxa. Nenhuma das pessoas naquela festa nunca se quer sonharia com Hogwarts e todo O Mundo da Magia ao qual ela pertencia.
- Filha? - Hugo Granger colocou a cabeça na porta entreaberta e abriu um sorriso. – Eu e sua mãe já vamos dormir. Não demore muito lendo, amanhã terá que acordar cedo. Os feitiços, chapéus falantes, professores que viram gato e todo o resto esperam por você.
Hermione retribuiu o sorriso. Ela sabia que seu pai tinha uma noção superficial sobre o que de fato era  Hogwarts, caso contrário haveria brilho em seus olhos e entusiasmo em sua voz.
- Assim até parece que você tem ciúmes! – retrucou.
- Sou o seu pai velho e apaixonado de sempre, lembra? – Ele caminhou até ela e sentou ao seu lado. – É claro que tenho ciúmes. Afinal, eu sou só mais um trouxa.
- Não fale desse jeito pai, você sabe que eu não penso assim! Eu amo o senhor e amo a mamãe.
- Nós sabemos disso, não se preocupe querida. – respondeu o Sr. Granger carinhosamente – No entanto, também sabemos que estamos te perdendo. Você achou o seu lugar e nós compreendemos isso. Hoje por exemplo: por que não quis ir a festa com as suas amigas?
- Não tinha nada para mim lá, eu simplesmente...
- Está tudo bem, - interrompeu - se a minha filha adolescente diz que não há nada de legal em uma festa, quem sou eu para discordar?
Hermione não sabia o que responder. Seu pai tinha toda razão. Ela tentou esboçar um sorriso a respeito de seu comentário e lhe deu um beijo na testa.
- Já estou indo dormir, prometo. – disse enfim.
- Certo então, boa noite querida.
Hugo Granger se retirou e fechou a porta. Suas palavras ficaram ecoando soltas pela cabeça de Hermione. Ela realmente não sabia o que fazer com elas, então resolveu ler mais um pouco e guardar o seu livro para ir dormir. Amanhã seria a sua volta a Hogwarts e embora as férias de Natal tivessem sido ótimas, já estava na hora de retornar. Após ler mais um capítulo, ela saiu do quarto e foi caminhando silenciosamente até o banheiro, quando ouviu alguns murmúrios vindos do quarto de seus pais.
- Você sabe que está na hora de contar para ela, agora mais do que nunca Marta. – disse Hugo.
- A única coisa que eu sei é que quero ter minha Hermione comigo para sempre, – respondeu a Sra. Granger temerosa – você sabe muito bem o que pode acontecer, não sabe?
- Sei.
- Então por que insiste nisso?
- Eu só... Bem, acho que você deve ter razão. – concordou – Ela parece feliz. 
- Já fazem doze anos, - sussurrou Marta – quem dirá se a tal mulher ainda quer conhecê-la.
Hermione sabia que o que estava fazendo não era certo, mas não conseguia se mover. Seus pais estavam conversando sobre algo importante e que decididamente dizia respeito a ela. Movida por sua curiosidade, ela deu um passo a frente. Vendo que não havia feito nenhum barulho, começou a ouvir mais atentamente a conversa. O que Hermione não havia notado era que, ao se mexer, fizera com que sua sombra ficasse a vista. O único problema era que Marta Granger havia notado.
- A data que o bilhete indicava está chegando. - disse Hugo Granger - Parece que mesmo depois de ter se passado 14 anos eu vou continuar sentindo como se...
- Hugo, - interrompeu Marta - Hermione já está dormindo, não está?
- Deve estar, sim.
- Eu pensei ter visto uma sombra no corredor... - sussurrou.
Hugo Granger foi verificar o corredor, mas não havia mais nada. Hermione voltara silenciosamente para o seu quarto assim que ouvira seu nome ser pronunciado, o que fora um ato muito sábio. Ao deitar na cama, ela simplesmente não conseguia pegar no sono. Estava muito confusa e preocupada. Seus pais nunca haviam escondido nada dela e agora estavam se preocupando com uma sombra na parede. Ela teria que conversar com os dois sobre o que estava acontecendo e teria que ser amanhã.

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