Tristes Recordações



Nunca pensei que revê-lo iria mexer comigo, como mexeu. Que sentir o seu perfume iria trazer, de novo, aquela inquietação no coração. Aquela inquietação que sentia quando namorávamos.

Voltar a Hogwarts, já em si, trazia grandes recordações, mas aceitei o pedido de Dumbledore. Precisava de um professor para dar a aula de Defesa Contra as Artes Negras. Aquele lugar parecia estava amaldiçoado, era raro um professor ficar mais do que um ano. Começava a concordar com o que os alunos diziam: Tanta era a vontade de Snape ocupar o lugar que a sua inveja acabava por afastar todos os professores. Mas, até hoje, só se comprovou uma única vez a sua culpa. Quando, de modo como quem não quer nada, deixou escapar que Lupin era lobisomem.

Há quase vinte anos que eu não falava com ele. Ainda, parece que foi ontem que Black pregou aquela estúpida partida a Snape, que quase lhe tirou a vida. Parece que foi ontem que Black me acusou de traição. Snape só podia desconfiar porque eu comentei alguma coisa sobre a saídas deles nas noites de lua cheia. Mas eu nunca contei nada a ninguém como tinha prometido, a Black, na noite em que me encontrou atrás daquele arbusto.

Estava arreliada por causa das insinuações de Snape. Queria ficar sozinha. Por isso, naquela noite estava fora do castelo. Era noite de lua cheia; e como o brilho da lua acalmava a vida atribulada do meu ser. Depois daquela noite permaneci calada, nem mesmo Lupin soube da verdade. A verdade, era que o amava demais para o prejudicar. Era que eu o amava de mais para me importar com o simples facto de ele se transformar em lobisomem, uma vez por mês.


Muitas vezes, ainda sonho com aquela noite. Soube o que se tinha passado e foi ter com Lupin para ver se estava tudo bem. Mas não, não estava nada bem. O Salão Principal já estava vazio, apenas estávamos lá nós. Quando me aproximei, Black levantou-se e barrou o meu caminho.

Lupin nunca intendeu o que se passava. Não acreditava na minha inocência. E, até era fácil intendê-lo, era mais fácil acreditar num amigo do que em mim. Afinal, de um Slytherin não se pode esperar nada de bom.

— Ela quis vingar a morte do pai! — era o argumento usado por Black contra mim.

Vingança... Por acaso, havia motivos para vingança. E não vou negar que muitas vezes pensei nisso, mas Romulus Lupin apenas defendeu a família do ataque de um Devorador da Morte. Sim, meu pai foi um Devorador da Morte.

— Ela, uma noite, seguiu-nos e viu tudo. Já há muito tempo que ela sabia o que nós fazíamos nas noites de lua cheia e quem éramos de verdade!

Eu permanecia calada. Era acusada injustamente. Sentia as lágrimas a caírem pelo rosto. Olhava para Lupin em busca de um refúgio, de uma palavra amiga... Ele permanecia de cabeça baixa, pousada nos braços, sobre a mesa dos Gryffindor. Lily estava sentada a seu lado, tinha o braço sobre as costas e acariciava-lhe a cabeça como que a transmitir-lhe confiança. Peter, esse, encontrava-se encostado a outra mesa, por detrás de Lily e Lupin, com as mãos nos bolsos e de olhos fixos no chão. Mas o que mais me preocupava era James que se encontrava na enfermaria com um grande e profundo corte nas costas, provocado pelo Salgueiro Zurzidor ao salvar Snape.

— Remus... — arrisquei. Mas ele não olhou para mim, ignorou o meu chamamento. — Remus... eu... eu estou inocente...

— Inocente! — gritou, de novo, Black — Como ousas dizer que estás inocente, se o próprio Snape te acusa!

Fiquei assustada. Como é que ele foi capaz de me acusar. Nunca lhe tinha feito nada de mal. Ultimamente, até me tinha afastado dele. Uma coisa era certa, ele nunca aceitou o meu namoro com Lupin. Não podia ver que duas pessoas, totalmente diferentes, podiam ser tão felizes; que poderia haver amor entre um Gryffindor e uma Slytherin. No meu peito começou a crescer uma raiva, uma raiva forte contra Snape. Afinal, ele estava a conseguir o que sempre tentou fazer, separar-nos.

— Remus... — tentei de novo. — Remus, deixa-me explicar...

— Explicar! — rosnou Black. — Que explicações podes dar? Como é que Snape iria desconfiar? Nunca ninguém descobriu, nem mesmo Dumbledore que só o soube agora, o que fazíamos nas noites de lua cheia. Pára de querer dar explicações, não há explicação para o que fizes-te.

— Chega! — Lupin levantou-se. Continuava com as mãos apoiadas e olhos fixos sobre a mesa. — Não quero ouvir mais nada.

— Mas Remus... — argumentou Black.

— Chega Sirius. Já estou a ficar cansado de te ouvir. Deixa-me falar — pode ver uma lágrima a cair na mesa. — Aqui, o único culpado sou eu que vos deixei envolver no meu problema. E se ela e Snape descobriram o que se passava é porque deixamos pistas. Desculpa Mary, mas não posso continuar com isto.

O meu amor afastava-se. Nem sequer me olhou. Não quis ouvir os meus argumentos. Não me deixou defender de algo que não teve culpa. Os outros seguiram-no, Lily ainda o abraçava. A partir daquele dia nunca mais nos falamos. Snape conseguiu o que desejava e eu comecei a demonstrar que era uma verdadeira Slytherin. Tornei-me rancorosa, escrupulosa, descarregava a minha raiva naqueles que não tinham culpa de nada. Tinha perdido o meu amor. O primeiro homem da minha vida. Aquele que me fez cometer a maior loucura da minha inocência. Tinha perdido o homem a quem me entreguei pela primeira vez...

A partir daquele momento, nunca mais amei ninguém como amei a ele. Nunca mais tive coragem de ser feliz. Vivia infeliz e afastada do mundo. E, até corriam vários rumores de que me tinha tornado uma serva das trevas, uma Devoradora da Morte, como o meu pai. Mas era tudo mentira, não suportava aqueles maníacos que procuravam o poder junto de Voldemort. Voldemort... Aqui está uma coisa que aprendi com Lupin, a não temer o nome Voldemort.

Os anos, depois da escola, passaram com lentidão. Fiquei triste quando soube que Lily e James tinham morrido. Mas quanto à prisão de Sirius Black, nem sequer me manifestei. Lembro-me apenas de ter pensado que agora ele tinha o que merecia, só por julgar as pessoas sem as escutar.


Passados vários anos, encontrava-me de novo, deitada numa cama de Hogwarts. A luz da lua entrava na escuridão do quarto, pela janela aberta. Dei voltas na cama. Não conseguia dormir. Voltar a encontrá-lo fez despertar aquele desejo selvagem que sentia sempre que estava perto dele. Levantei-me. Estava farta de estar deitada. Aproximei-me da janela, a lua estava completamente cheia.

Ao longe oiço um uivo... É ele...! O meu coração palpitou. Apoiei as mãos no parapeito da janela e tentei saber de onde vinha o som. Era um uivo fraco, devia estar sobe o efeito da poção de Snape. Estava sozinho, não tinha os amigos para o acompanhar. Black andava foragido. Peter e James estavam mortos.

Senti o vento da noite a bater no meu corpo sobe a camisa de noite, de seda preta, que tinha vestido. Sempre apreciei os produtos dos Muggles — foi adoptada por um casal Muggle aos dois anos —, afastei-me da janela e dirigi-me para a cama. Enquanto caminhava, deslizei as mãos pelo corpo, sentia-o quente, cheio de desejo... Só tinha uma coisa a fazer, ir para onde me refugiava quando era aluna. Ir para o único sitio que me trazia lindas recordações. O único sitio que procurava para acalmar. Peguei no robe, vesti-o e sai do quarto em direcção à torre de astronomia, a torre mais alta de Hogwarts, como fiz tantas vezes, depois de Remus me deixar. Onde sentia mais perto, de mim, a lua...

No cimo da torre, com a varinha, fez aparecer um divã e sento-me a apreciar a lua. Ao longe oiço outro uivo. Esse foi mais perto do castelo. Deslizei, novamente, as mãos pelo corpo e senti um arrepio. Um arrepio de desejo. Um arrepio que já não sentia há muito tempo. Fechei os olhos e continuei a percorrer o corpo com as mãos. E, então, recordei, recordei a primeira noite de amor. Foi naquele lugar há muitos, muitos anos...

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