A Nova Vizinha




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“Primeiro aprenda a ser um artesão. Isso não impedirá você de ser um gênio.”
Eugene Delacroix



Os raios solares que adentravam pela janela a acordaram. Conseguiu descansar tudo que tinha direito naquela noite, estava revigorada. Ligou para sua casa logo após o meio-dia, mas ninguém atendeu.

Oi! É a Haylla. Só estou deixando essa mensagem na secretária para dizer que cheguei bem ontem e que já arrumei tudo por aqui. Está tudo bem. O lugar é ótimo. E tanto ele como a dona já estão esperando visitas suas.”, ela riu. “Amo vocês. Falamo-nos logo.”

Ela realmente queria falar com os pais. Desculpar-se com eles pela maneira como os tratou nos últimos dias que ficara em casa. Tratara-os mal e não fora muito carinhosa. E, de certa forma, já sentia saudade deles.

Mas ela não queria ficar deprimida e muito menos em casa num dia maravilhoso como aquele. Tinha que aproveitar os últimos dias de férias e do verão também. Vestiu uma roupa confortável, pegou sua bolsa e saiu do apartamento.

Parou em frente ao elevador e apertou o botão que indicava descida, representado por uma flecha com a ponta voltada para baixo. As portas abriram-se mais rápido do que ela esperava, revelando uma senhora.

- Boa tarde. – ela cumprimentou, sorrindo e entrando no elevador.

- Boa tarde, moça. – a senhora respondeu.

Era realmente muito idosa, aparentava ter por volta de noventa anos de idade. Seus cabelos eram totalmente brancos e longos, caíam numa trança sobre seu peito. Ela trajava roupas florais de um tecido fino, e saia que ia até os tornozelos, usava chinelo de dedos e estava acompanhada do que seria uma bengala extremamente retorcida. Carregava em baixo do braço um chapéu pequeno de palha.

- É nova por aqui? –indagou a senhora com voz fina.

- Sim, me mudei ontem – ela informou.

A mulher balançou a cabeça levemente e olhou a garota de cima a baixo, procurando detalhes com seus apertados olhos negros.

- Qual é seu nome?

- Haylla Hellarien – falou ela, sorridente. – E o seu?

- Sou a Sra. Murder.

Haylla sorriu e olhou para o visor, que indicava que eles ainda estavam no décimo terceiro andar.

- Gostou do lugar?

- Ah, sim. Adorei, apesar de só estar aqui há um dia. – falou Haylla. – É muito legal mesmo, as pessoas são simpáticas.

- Simpáticas? – a velha espantou-se. – Não, não, não. Só com os recém-chegados. A mim, por exemplo, tratam muito mal.

- Mas e sua família?

- Não tenho família. Moro aqui sozinha. – ela baixou a cabeça. – Meus pais morreram há muito tempo, minhas irmãs também e nunca me casei.

Haylla segurou um riso.

- E seus sobrinhos?

- Não se importam com essa velha aqui. – ela resmungou. – Nem eles, nem ninguém.

A garota não soube o que dizer. Apenas fitou o visor mais uma vez, constatando já estarem no sétimo andar. Olhou sua imagem refletida no espelho que cercava as paredes do elevador e tentou ajeitar alguns fios mais rebeldes de cabelo.

- Para ajudar não tem ninguém. – resmungou a senhora. – Agora para atrapalhar, esse prédio está cheio.

- Deve ter alguém que goste da senhora.

- Não tem, não. Todos me odeiam. Sabe - ela arregalou os olhos –, dizem que estou caducando. Imagine só, que mentira.

A voz da mulher era fina e rouca, o que deixava os ouvidos de Haylla tontos.

- Caduca é a mulher do 17B! Sabe o que ela está fazendo?

- Não.

- Traindo o marido. Vê se pode uma coisa dessas! Se eu tivesse um marido, não o trairia. Não é?

- É. – Haylla respondeu relutante.

- Ela sai de casa às três da tarde. – cochichou a senhora. – E por acaso você sabe que horas ela volta?

- Não faço nem idéia.

- Às duas da manhã! Passa metade do dia fora. E ela tem um bebê de sete anos. Não, de seis. Ou seria oito?

- E o marido? – Haylla tentava fazer-se de interessada.

- Nem aí. Ele também tem amante, eu acho. No sábado ele só chega de manhã em casa!

- Incrível. – balbuciou Haylla.

- Outra que não está passando bem é a maluca do 12A. Ela acorda às cinco e meia da manhã para escutar sabe o quê?

- Não.

- Aqueles programas de rádio. Depois eu sou a velha ultrapassada. Só assisto televisão!

Haylla colocou a mão na boca para não rir.

- E tem a adolescente do 7D. Já disse para você o que ela faz?

- Não e eu não...

- É algo horrível. – a expressão dela tornou-se fúnebre. – Ela tem quatorze anos e acorda às cinco horas só para se arrumar. E sabe por que ela faz isso?

- Não, eu...

- Para ir se encontrar com o vizinho do 7B. E ele tem vinte e dois anos. Não quero nem imaginar o que eles fazem lá dentro.

O elevador parou e as duas saíram. O porteiro cumprimentou-a com um sorriso.

- Não ande muito com essa aí. – ele sugeriu. – Cuida da vida de todo mundo. Não é nem um pouco confiável.

- Estou percebendo. – Haylla sorriu para o homem.

Haylla abriu o portão e as duas saíram para a rua; a velha senhora colocou na cabeça o chapéu de palha que segurava.

- E olha que ela deveria ir para a escola nesse horário. Pega mochila e tudo para enganar a mãe. Quando eu puder, quero avisar aquela senhora.

- Olha minha senhora...

- E sabe do que mais?

- Não. – respondeu Haylla, mal humorada.

- Tem ainda as crianças da cobertura. Eles são podres de ricos e se acham no direito de pularem o tempo inteiro fazendo muito barulho.

- Oh, mas que incrível.– ironizou.

- É, não é?

Elas ficaram alguns segundos em silêncio, mas aquilo parecia ser como tortura para a Sra. Murder, que logo voltou a falar.

- São um bando de malucos. Como eu disse, depois eu sou a caduca, a louca, a fofoqueira, a que não tem nada para fazer. Eles vivem cuidando da minha vida, sabia?

- Nossa.

- Cuidam o que eu faço o dia inteiro. Tenho certeza de que tem umas dez cabeças para fora desse prédio vendo que estou conversando com você agora. – ela falou.

- Não acredito!

- É inacreditável mesmo. Por isso que não gosto de morar aqui, é muita gente. – ela hesitou. – Mas o prédio ao lado é pior ainda.

- Pior? Mas por quê?

- Tem uns malucos que são piores que os nossos malucos. – ela afirmou, como se fosse a notícia do século.

- E eles podem ser piores?

- Podem e são! – Ela sacudiu a bengala, olhando para o prédio em que passavam em frente com rancor. – Tem um monte de músicos aí.

- Eu gosto de músicos. – Haylla comentou.

- A jovem Hellarien não iria gostar destes. – falou a mulher.

- Por que não?

- Eles tocam à noite. Sempre à noite. Nunca os ouvi tocarem ou cantarem durante o dia. Parece que fazem de propósito.

- Devem ser solitários.

- Solitário deve se sentir o neurônio de cada um deles! É impossível que tenham mais de um. – resmungou a velha senhora.

Haylla não conseguiu conter um sorriso.

- Mas tem um que é especial. – a velhota sorriu. – Mas é muito triste. É difícil o vermos sair de casa. Muito difícil mesmo. Dizem que morreu alguém que ele muito amava e por isso encarcerou-se nesse apartamento afastado de tudo. Não conversa com ninguém, nem nada.

- Oh, que pena. – ela disse, sinceramente. - Será que essa história é realmente verídica?

- Acho que é. Ele é novo, tem ótimo porte físico e é bonito. Mas muito triste. Triste demais. Só canta as tristezas da vida, por causa da morte da tal mulher. Eu o faria ter um infarto em meus braços...

Haylla soltou uma gostosa gargalhada e a velhota a acompanhou.

- Acontecem coisas estranhas no apartamento dele. Tem luzes bem fortes que saem de lá. É esquisito. Mas, bem, ele é totalmente esquisito.

- Sra. Murder, eu vou pegar uma circular para ir ao cinema. Soube que há um ótimo pelas proximidades. – ela disse. – Até mais!

- Até, moça. Espero que possamos conversar mais, qualquer dia desses.

No ponto de ônibus ela certificou-se de que o transporte a levaria mesmo ao lugar certo e embarcou, rindo da senhora que acabara de conhecer.



O filme estivera ótimo. Era baseado em um ótimo livro, o qual ela lera há pouco tempo e gostara muito. Imaginar o que estava escrito era muito bom, mas realmente ver as imagens tornava-se melhor ainda.

Ela desceu do ônibus e colocou a jaqueta fina que levara com ela, a noite tinha um vento gélido que cortava seu rosto. Ela sorriu levemente, sentindo-se muito bem. Gostara daquela liberdade, de poder fazer o que queria, ir aonde desejava... Acordar numa manhã, sentir vontade de ir ao cinema e... ir. Sem precisar pedir permissão, comunicar alguém ou pedir para alguém acompanhá-la.

Quando já estava próxima do seu edifício, avistou um homem e uma mulher saindo do condomínio ao lado, parecendo nervosos. Ele gritou alguma coisa e esta retrucou.

- Volte aqui! – berrou ele. – Nossa conversa ainda não terminou!

- Saia de minha vida! Não quero vê-lo nunca mais! Afaste-se de mim!

Do bolso da calça social que usava, o homem tirou um graveto e adiantou-se para a mulher. Esta o olhava preocupada, como se segurar aquele pequeno pedaço de madeira desse a ele algum poder ou simplesmente o fizesse merecer mais respeito.

O homem abriu a boca e murmurou o que seria metade de uma palavra estranha, a qual Haylla não entendeu no momento. Porém, antes de concluir o que iria fazer, foi atingido por uma luz vermelha extremamente forte, que no momento que cortou o ar quase cegou os olhos da moça.

A luz provavelmente o fez desmaiar, e um outro homem aproximou-se da mulher. Acolheu-a num abraço e afirmou que ficaria tudo bem. Ela o olhou enternecida e depois saiu correndo do local.

O homem que a abraçou observou-a sumir pelas largas ruas e depois fitou o homem caído ao chão. Haylla não conseguiu ver sua expressão, mas achou todo o ocorrido muito estranho. Parecia ser a única capaz de ver tudo aquilo, as outras pessoas pareciam alheias ao acontecimento.
Resolveu sair dali antes que alguém percebesse que ela estava observando curiosamente a cena. Chegou o mais rápido que pôde ao seu apartamento e lá ficou, não conseguindo tirar aquela luz vermelha de sua mente. Às vezes a achava conhecida.

- Como Londres é animada. – falou para si mesma, achando bom acrescentar – E estranha.



Logo a semana de descanso e reconhecimento daquela parte da cidade passou, e Haylla viu-se novamente em uma carteira de faculdade. Até nessas coisas Londres era diferente, parecia mais adiantada em relação à sua ex-universidade, no interior. E era muito mais puxada, também. Mas Haylla sentiu-se feliz com tudo aquilo, sabia que seria melhor. Assim ela aprenderia mais e mais rápido, tornando-se mais capacitada para o mercado de trabalho que a aguardava.

O professor falou com ela em particular no final de sua primeira aula e pediu-lhe que lhe escrevesse num papel seus dados principais: telefone, endereço, e-mail se tivesse, etc. para o controle da universidade. Porém, ela e o professor acabaram se distraindo e ela deixou para entregar o papel na próxima aula que haveria, logo no dia seguinte.

Quando novamente voltava para casa, notou a presença de passos leves atrás dos seus. Apressou-se pelas ruas que a conduziriam para seu novo lar, tentando fazer isso de forma sutil para quem quer que fosse que estivesse atrás dela não percebesse a mudança.

Quando aumentou a velocidade, sentiu que quem estava atrás dela também a aumentou. Ficou preocupada, não sabendo o que fazer. Àquela hora havia poucas pessoas na rua e também havia poucas luzes acesas nas casas. Gritar? Talvez, se ela tivesse certeza de que adiantaria alguma coisa.

À medida que o tempo ia passando, Haylla ia se convencendo de que estava sendo perseguida. Aumentou o ritmo dos passos e, qualquer um que a visse naquele momento diria que estava correndo na rua. Avistou seu edifício e, quando virou lentamente o rosto para trás, bateu em alguém.

- Desculpe-me, eu não...

- Não tem problema.

- Mas eu preciso...

Todas suas coisas caíram no chão, e o homem que se encontrou com ela ajudava-a a recolhê-las. Nem olhou para o rosto dele, nem deixou que ele falasse nada. Apenas pegou suas coisas e foi embora, não vendo mais a pessoa que a perseguia.



Alô.

- Mel, é você?

Sim. Haylla?”

- Sou eu. – ela sorriu ao saber que era a irmã quem falava.

Estamos morrendo de saudades! Como andam as coisas por aí?”

- Também estou morrendo de saudades de todos. Bem, as coisas estão indo...

Indo? Conheço essa sua voz. O que aconteceu?”

- Posso confessar? Eu queria voltar para aí.

Haylla escutou a irmã gargalhar de felicidade no outro lado da linha.

Sabia que você gostaria de voltar.”

- É? E como?

Cidade grande não faz seu tipo.”

- Quem disse que não? É só de umas coisas que não estou gostando.

E do que é?”

- Primeiro é vocês não estarem aqui comigo. A faculdade recomeçou. Moro num edifício onde, segundo uma vizinha maluca que eu arranjei, só tem doidos. A cidade é grande demais. Logo na primeira noite tomei um susto, pois estava cantando baixo na janela e quando parei alguém continuou a música. Sei lá...

Alguém continuou cantando? Ah, que emocionante! E era quem?”

- Não sei, Mel. Era um cara. Um maluco provavelmente. Mas acho que isso foi fruto da minha imaginação.

Ah, já estou acostumada a ver você fechando os olhos pro mundo e só os abrindo para os estudos.”

- Não é isso. E esse cara também não interessa. Está tudo bem com você, mamãe e papai?

Mais ou menos.”

- Mais ou menos? Aconteceu alguma coisa?

Não passei no vestibular. Mamãe não consegue mais cozinhar, diz que é porque você não está aqui. Papai está desanimado, sentindo sua falta.”

- Que droga. – resmungou Haylla. – Bem, eu liguei para te convidar para vir aqui alguns dias.

O que? Está falando sério?”

- Sim, estou. Como disse, estou me sentindo sozinha. Você poderia vir aqui para esfriar a cabeça.

Essa seria a desculpa?”

- Sim, esta seria. – a moça riu. – Mas eu quero mesmo que venha.

Duvido que mamãe deixe.”

- Prometo a ela que cuido de você.

Ela não vai confiar minha segurança a você.”

- Melissa. – repreendeu a irmã.

Haylla”, a garota riu. “Mas eu vou convencê-la. Estou mesmo deprimida por não ter conseguido passar. Poderia dizer também que você vai me ajudar a estudar para um próximo vestibular.”

- Boa idéia.

É isso aí. Quer falar com eles?”

- Eles estão bem humorados?

Nem um pouquinho. Parece que a nossa tia Sara virá passar alguns dias aqui em casa. Então, imagine o mau humor deles.”

- Sendo assim, não quero falar com eles. Se disser que estou com saudades é capaz de me repreenderem.

É, é bem capaz sim.”

- Ligo amanhã. Convence a mamãe aí, está bem? Já estou até abrindo um lugar na minha agenda super lotada para ir recebê-la na rodoviária.

Ela não irá resistir a minha carinha de anjo, claro que irá conceder permissão.”

- Tudo bem. – Haylla revirou os olhos. – Estou falando sério, quero que venha mesmo.

Sim, eu vou.”

- Então beleza. Até amanhã, Mel.

Até. E se cuida na sua cidade grande.”

- Tchau, beijos.

Beijos.”



Ela havia confirmado que viria. Prometera que ligaria quando chegasse, já que um problema na linha dos ônibus iria atrasar a viagem em pelo menos duas horas. Já faziam três que esperava pela ligação. Quando começou a desanimar-se, o telefone tocou.

Já estou aqui.”

- Ótimo. Espere quietinha, não saia daí que logo estou chegando.

Por que eu sairia daqui?”

- Por que é maluca?

Eu não sou maluca.”

- Estou indo te buscar, até logo.

Por que disse que sou maluca?”

- Até logo, Melissa.

O abraço recebido da irmã no instante em que se encontraram e o sentimento de alívio que predominou no peito de Haylla ao vê-la, compensaram os minutos a mais de ônibus.


No próximo capítulo: Alguém muito misterioso, chamado apenas “Mestre dos Desejos” envia um bilhete à Haylla. Com a ajuda de Melissa, e sua insistência para que o respondesse, ela também escreve um pouco sobre si. Algo muito estranho acontece quando ela segue o conselho do novo amigo.


N/A.: Olá! Tudo bem? Viram, quando há colaboração com os comentários, o capítulo vem bem cedo. Adoraria se vocês continuassem assim ^^’ Ah, quanto ao capítulo de hoje: eu tentei deixar a Sra. Murder o mais chata possível. Espero ter conseguido. E, como vocês viram, já apareceu um indício de magia na fic. Mas esse acontecimento nem será mais citado, pois eu não consegui pensar em uma explicação para ele. A nova vizinha de Haylla também só será citada mais uma vez, num momento crucial, portanto, tentem lembrar dela. E, com a Mel no pedaço, a fic ficará bem divertida...

Alguns leitores me perguntaram e, sim, sou eu quem faço as capas para os capítulos. Por isso é que elas estão assim tão simples. Torço para que estejam gostando delas e das frases! E também, espero postar o próximo capítulo bem rápido. E isso depende de vocês! Obrigada a todos que comentaram e continuem assim, por favor! Beijos!

Manu Riddle

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