Temores



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Capítulo X - Temores

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Um castelo não é tão grande quanto parece. Aliás, para as notícias, nem mesmo o
mundo é tão grande! Obviamente que todos ficaram sabendo do que aconteceu
naquele sábado em Hogsmeade, embora muitas coisas ainda estavam obscuras e sem
explicação, como o fato do gato da Hermione ser, na verdade, um bruxo animago e
nunca ninguém ter descoberto isso. Havia muita especulação. Havia também muitos
comentários maldosos, principalmente vindos da Sonserina. Parvati e Lilá também
andaram falando algumas bobagens, mas Rony, Harry, Gina, Neville e Dean Thomas
andavam policiando todos os colegas, para que não ficassem falando besteiras e
espalhando boatos infundados e mentirosos. De certa forma, as fofocas e boatos
não estavam tão intensos como se esperaria que estivessem, afinal, todos estavam
compadecidos com o que aconteceu à Hermione Granger, que, por pouco, não foi
morta por estrangulamento por um comensal da morte.





Hermione estava sentada a beira do lago, oculta por uma frondosa árvore de
tronco muito grosso e grandes raízes proeminentes. Estava sentada recostada no
tronco, entre duas raízes. Desde que recebera alta de Madame Pomfrey, tentava o
máximo possível se manter incógnita. A notícia do ocorrido no sábado em
Hogsmeade alastrou-se como fogo em relva seca. Até mesmo no jornal Profeta
Diário a notícia saíra em primeira capa, embora Hogwarts não tenha permitido a
veiculação de nomes... o que era de todo o péssimo, menos mau.





Apoiado sobre suas pernas estava um livro que havia emprestado da biblioteca e
estava lendo-o pela terceira vez. Mas com enfado, fechou o livro rudemente,
soltando um longo suspiro e fechando os olhos, que estavam marejados. Na capa,
em letras prateadas e estilizadas, o título ‘Animago Mortis’ reluzia com a
claridade daquele fim de tarde, onde o sol de fim de verão banhava as plácidas
águas do lago, onde descansava serenamente uma lula gigante.





Recostou sua testa no livro, encolhendo-se ainda mais, abraçando as próprias
pernas. Suas lembranças iam a três dias atrás, assim que teve alta da
enfermaria. Teve algumas horas de uma difícil conversa com seus professores, que
lhe falavam com muita cautela e preocupação. Queriam passar-lhe uma
tranqüilidade que sabia que seria muito difícil de tê-la depois daquele ocorrido
tão estranho e tão absurdo. Teve vontade de chorar novamente ao se lembrar
disso.





Três dias atrás...





Hermione recebera alta de Madame Pomfrey. Era por volta das 4 horas da tarde.
Enquanto a medibruxa saia da enfermaria para chamar a Profª Minerva para
acompanhar a menina até o escritório de Dumbledore, Hermione ficara sentada no
leito onde jazeu por dois dias inteiros, recuperando-se da violência que
sofrera. Olhando para o lado oposto da enfermaria, quase no final da grande
sala, havia um leito oculto por leves cortinas brancas que tremulavam pela brisa
que ali corria. Subitamente, criou coragem e dirigiu-se até o leito, tomando a
devida precaução de não ser flagrada por ninguém, embora estivesse a sós na
enfermaria. Sabia que ele estava ali. Por algumas vezes, ouviu seus murmúrios de
dor e por duas vezes ouviu-o gritar. Madame Pomfrey estava sempre por perto e
por diversas vezes viu o Prof Snape junto, auxiliando-a. Sentia seu coração
levar apunhaladas ao ouvir aqueles gemidos. Sentia-se, de alguma forma, culpada
e responsável por ele... afinal, ele era o Crookshanks, não era? O seu gatinho
de estimação tão companheiro, que esteve consigo por quatro anos.





Ainda há muitos passos do leito onde jazia o animago, Madame Pomfrey entrou
rapidamente na enfermaria acompanhada pela Profª Minerva. Hermione assustou-se
com a aparição súbita e as duas alcançaram-na preocupadas.





_O que houve, querida? Aconteceu algo ao rapaz?





_N-não, não Madame Pomfrey... - Hermione tentava disfarçar. _Acho que ouvi gemer
e então.. como a senhora não estava...





_Está tudo bem, Hermione. Deixe que Madame Pomfrey cuide do rapaz. Agora venha
comigo até a sala do Diretor, ele quer muito falar contigo.





No escritório de Dumbledore permaneceu por quase três horas, ouvindo muitas
coisas sobre o animago, cujo nome era Pavel Nicolai Donskoi...









“_Nome bonito... ele reclamará muito por ter sido chamado de ‘Pernas Tortas’ por
tanto tempo...” - divagava entre uma lágrima e outra, a Hermione que estava
sentada a beira do lago naquela agradável tarde de quinta-feira.









Dumbledore estava com um semblante muito preocupado, que não era muito diferente
de Minerva e Snape, que também ali estavam. Os três professores estavam, sim,
muito preocupados com o futuro daquele rapaz. Obviamente que o Ministério soube
do ocorrido e estava pressionando Dumbledore. Logo que Donskoi despertasse,
seria levado a um inquérito, pois bem, ele havia cometido mais de um crime e
todos eles eram gravíssimos. Sabendo o quanto o Ministério era irredutível,
temiam seriamente a pena que seria imposta ao pobre garoto. Sim, o rapaz era
digno de compaixão, afinal, passara duas décadas preso a uma maldição e agora,
quando finalmente consegue libertar-se, poderia ser enviado à Azkaban!





_...sabemos que não será fácil, Hermione, mas tente não transformar isso num
drama ainda maior do que já é. - dizia Dumbledore, com seus longos e finos dedos
cruzados sobre a escrivaninha e que enviava um olhar penetrante a menina sentada
a sua frente. _Querendo ou não, isso lhe afeta diretamente e não queremos que
você sofra com isso, filha.





Hermione desviava do olhar do diretor, abaixando sua cabeça. Estava realmente
muito confusa com tudo, não sabia sequer o que sentir, como agir, o que dizer.
Sabia também que Dumbledore via através de seus olhos a sua alma e talvez fosse
mais fácil do que responder perguntas.





_É, eu sei, professor... mas é tão estranho, tão absurdo, ainda mais quando
descobrimos toda aquela história sobre Sirius e Pettigrew, há quatro anos...





Voltava seu olhar aflito para o Prof Dumbledore, quase em lágrimas.





_O Senhor acha que ele será mesmo levado à Azkaban?





_Isso é muito provável, minha querida, afinal, há três crimes muito graves
contra o Sr Donskoi: ser um animago ilegalmente, ser um comensal da morte e ter
matado um homem...





_Mas.. mas.. se ele não tivesse o matado, nós é que teríamos morrido!





_Sim, legítima defesa motivada por perigo iminente e fortes emoções... e o
sujeito era um comensal... bem, francamente, não sei o que ocorrerá, Hermione e,
dependendo muito do que encontrarmos quando o Sr Donskoi acordar, Hogwarts
preparará uma forte defesa a seu favor.





_Como assim ‘dependendo do que encontrarmos’?





_Não conhecemos muito bem esse rapaz, não sabemos o que se passa em sua mente,
não sabemos que atitude ele poderá tomar agora que está de volta. Se a pior das
hipóteses se confirmar, será melhor mesmo que ele seja levado para Azkaban.





Hermione sentiu como se uma lança atravessasse seu peito com aquelas palavras
tão duras de Dumbledore. E estava muito confusa, como jamais estivera. Não era
de seu gato de estimação que falavam... ele não existia mais, aliás, jamais
existiu de fato! Por que se importava tanto com aquele desconhecido? Se
importava tanto como se fosse um velho amigo, alguém muito importante para si?





_Alvo... talvez eu esteja me precipitando, mas... - Snape tomava a palavra e sua
expressão tão incomum era de uma certa tristeza. _...Nicolai sempre foi um bom
garoto, apesar de tudo. Era muito honrado, muito sério. Talvez eu esteja falando
bobagens, mas tenho quase certeza de que ele não se aliou a Voldemort para
auxiliá-lo, muito pelo contrário.





_É, também tenho esse pressentimento, Severus... com todos esses fatos vindo a
tona, relembro de algumas coisas estranhas, por assim dizer, que aconteciam
naquela época em que vocês ainda estudavam. Creio que o rapaz agia como um
agente duplo, como você o faz hoje Severus, mas ele, ingenuinamente, agia por
conta própria. Essa nossa tese pode até ser confirmada pelo fato de ele ter
sofrido uma maldição das trevas muito antiga e possivelmente fora Voldemort que
o amaldiçoara. Se for mesmo isso e o porquê de tudo o mais, somente o Sr Donskoi
poderá nos responder. Por ora, portanto, o melhor é pararmos de especulações.







*







Hermione era desperta de suas lembranças por uma aflita Virgínia Weasley, que a
chamava e a chacoalhava, com o coração nas mãos.





_Mione! Mione! Acorda! Você está bem?!





_Gina? Desculpe... estava um pouco.. distante.





_É, eu percebi. - Gina sentava-se sobre as pernas de frente para Hermione,
aliviada. _Mas está tudo bem, né?





_Heheh, isso é engraçado... - Hermione ria tristemente. _Nunca ouvi tanto essa
pergunta quanto agora. E, sinceramente... não, não está tudo bem, mesmo!





_É, eu entendo.. a cabeça é sempre mais difícil de curar. Mas, se você, ao
menos, confiasse alguma coisa a mim.. algo que esteja realmente lhe
incomodando...





Hermione olhava para a menina ruiva a sua frente, avaliando se deveria ou não
contar o que tanto tinha medo. Sim, o que sentia, acima de tudo, era medo. Medo
de estar nas mãos de um desconhecido.





Esticou as pernas, alongando os músculos. Sobre as pernas, o livro com o romance
bruxo, onde falava de um homem que fora condenado a viver preso na sua forma
animago. Porém, o protagonista daquela história era perverso e desumano, e fora
condenado por um deus a permanecer na forma de um cão vira-latas sem dono e
sentir na pele e na alma toda a humilhação, crueldade e tristeza que fazia
passar todos aqueles que julgava lhe ser inferiores. Mas, o final apesar de
belo, foi trágico.





“_Por Deus! Não quero isso pro Shanks! Espero que não haja muitas semelhanças
com esse livro...”





_Sabe, Gin... eu tenho medo. Estou com muito medo daquilo que o Crookshanks se
tornou...





_Medo, Mione? Por que? Duvido muito que esse tal de Donskoi venha a lhe fazer
mal. Lembra-se um vez quando a Profª Minerva falou que um animago tem plena
consciência de seus atos? O Shanks te adorava, Mione!





_É... e pelo que lembro, a você também!





A duas coraram, desviando-se uma do olhar da outra. Era mesmo uma situação muito
complicada.





_Aaiii! Será que ele vai se lembrar daquele chamego que eu tinha com ele? Eu
adoro gatos! Não podia vê-lo que logo ia pegá-lo no colo! E o Shanks sempre foi
tão fofo!





Hermione não conseguiu conter a risada, pois a Gina estava mesmo muito
encabulada e não parava de esfregar os dedos no rosto, deixando sua face ainda
mais vermelha.





_Não fique assim, Gin - Hermione tentava consolar a amiga, segurando a mão da
menina antes que ela ferisse o rosto. _Tenho certeza de que se ele lembrar,
ficará muito grato por você ter sempre o tratado bem, ao contrário de muitos por
aí.





_Feh! Afinal, quem veio consolar quem? Bom, aceito isso como consolo. Também
aceito a idéia de como ele poderá se portar ao ver as nojentinhas da Patil e da
Brown!





_Isso é complicado... espero que ele não seja vingativo... espero que ele seja
mesmo uma boa pessoa, como Snape havia me dito...





_E você ainda não nos contou o que os professores lhe falaram sobre esse Donskoi...





_Contei sim, em parte... você sabe que Dumbledore me fez promoter a não falar
nada o que me disseram sobre esse cara, me desculpe.





_Tudo bem, Mione! A última coisa que quero é te pressionar... mas e aí, não vai
me falar qual é esse medo que você tanto sente?





_Bem... o que você faria.. como se sentiria se, de repente, seu diário caísse na
mão de qualquer um? E que seus segredos mais íntimos fossem espalhados aos
quatro ventos?







*







_É bom vê-lo desperto, meu jovem! Como se sente, Sr Donskoi?





Nicolai, que enxugava as mãos e o rosto com uma toalha branca que estava sobre a
mesa de canto, vira-se admirado para Dumbledore, que se aproximou sem que ele
percebesse.





“_Esse bruxo é incrível, nem como gato eu conseguia antevê sua chegada!”





O rapaz nada falou, apenas sorriu para o onipotente bruxo a sua frente. Seus
olhos transmitiam muita confiança e otimismo, que era contagioso. Fez uma
reverência, curvando-se para frente, sem desprender seu olhar dos de Dumbledore.





_Papoula me falou que você ainda não conseguiu firmar sua voz, mas não creio que
isso seja impedimento para uma boa conversa, não é mesmo? Afinal, precisa
exercitar sua fala. Me acompanharia num passeio pelos jardins, Sr Donskoi?





Nicolai apenas sorriu e assentiu positivamente com a cabeça. Uma das coisas que
sempre quis fazer era conversar com esse bruxo soberbo, mas nunca tivera a
oportunidade e seu maior erro, sem duvida alguma, fora jamais contar seu planos
sobre Voldemort à Dumbledore. Se tivesse feito isso, não teria perdido vinte
anos de sua vida...





_Por favor... me chame.. Nicolai.. só...





_Muito bem, Nicolai... mas creio que precisará de sapatos, não? É difícil crer
que Severus tenha esquecido desse detalhe.





Enquanto Nicolai olhava para os próprios pés, pois nem havia percebido que
estava descalço apesar do chão frio, certamente por estar acostumado a andar sem
sapatos, Dumbledore agitava a sua varinha na direção dos pés do rapaz,
conjurando os calçados.





_Oh, belas sandálias de couro! Espero que não se importe, é que sempre gostei
desse tipo de calçado trouxa, são muito frescas e confortáveis!





Dumbledore levantava a veste o suficiente para o garoto poder ver que ele
calçava os mesmos tipos de sapatos. Nicolai apenas sorriu gentilmente, o que,
para Alvo, era um ótimo sinal. Afinal, logo a primeira vista o rapaz demonstrara
ser de fácil convívio... ao menos, assim esperava.







*







_Aah, nem me fale em diário, Mione! A última vez que tive um foi a maior
tragédia da minha vida!





_É, eu sei e é algo que jamais esqueceremos... Mas o que estou dizendo é a mesma
coisa. Obviamente que não tem a mesma proporção e nem seria uma tragédia que
envolveria outras vidas além da minha, mas...



_Mas? Não entendi ainda o que você quis dizer... por acaso o Crookshanks leu seu
diário, é isso?



Hermione não conseguiu conter a risadinha, afinal, apesar de ser muito boa
menina, Gina Weasley era mesmo muito bobinha.





_Não, Gin. Acho que é ainda pior... digamos que Crookshanks era o próprio
diário. Posso dizer que ele era como um confidente meu...





_Ah! Bem, sim, e... o que você contava a ele? Eram coisas muito íntimas? Alguma
coisa muito grave?





_Jogando verde para colher maduro, Gin? Bem, digamos apenas que eram sim, coisas
muito íntimas e que seria péssimo se outras pessoas ficassem sabendo. Nada que
chegasse perto de uma catástrofe, mas não estou na minha fase psicológica mais
segura.





_Isso é verdade! Todos estão notando o quanto você anda estressada, se magoando
muito fácil. Acha que esse Donskoi pode querer chantageá-la com isso? Sei lá,
talvez espalhar seus segredos para todo mundo? Ouvi dizer que ele é um sonserino...





_O que é um agravante! É, ele é mesmo um sonserino e estudou aqui na mesma época
de Snape e dos pais de Harry. Na hora em que aconteceu aquelas coisas em
Hogsmeade eu estava tão chocada que não lembro de nenhum detalhe, mas os meninos
falaram que ele vestia o uniforme de inverno da Sonserina.





_Ânimo, Mione! Não fique triste! Pense o lado positivo. Talvez ele reconheça o
quanto o tratou bem e lhe seja até grato por isso.





_Talvez... vamos ver... “se fosse apenas isso, mas estou com um péssimo
pressentimento!”





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Fim do Capítulo X - continua...

By Snake Eyes - 2004

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N/A: Crookshanks vem
do inglês medieval que quer dizer, literalmente, “entorte canelas” ou, melhor
adaptando, “pernas tortas”.

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