O Bandido



Thomas Bowers - nascido Harry Potter - sentou-se junto à janela do avião e
ficou olhando para fora, enquanto o aparelho decolava. Levantou um lenço para os
olhos, enquanto seus ombros subiam e desciam.


Dennis Trevor - também conhecido como Brandon Higgins - sentado ao seu lado,
fitou-o espantado.


- Ei, era apenas dinheiro! - disse ele. - Não há motivo para chorar.


Harry Potter virou-se para ele, as lágrimas escorrendo pelas faces.
Espantado, Higgins, descobriu que Harry se encontrava convulsionado pelo riso.


- Que diabo deu em você? - indagou Higgins. - Também não é motivo para rir.


Para Harry era sim. Aquela era sua Hermione. Esperta até o último fio de
cabelo! Um golpe por cima de um golpe. Fudge lhe dissera que ela era amadora.
Por Deus, pensou Harry, como seria se ela fosse uma profissional?


Hermione estava mais linda do que Harry se lembrava. E sua memória, para ela,
era excelente!


E estava esperta também. Harry orgulhava-se de ser o melhor vigarista em ação
e ela conseguira passá-lo para trás. Sirius mal acreditará quando eu contar
pensou Harry.


Fora Sirius que educara Harry, nessa escola que era a vida. Mas isso fora
somente depois que Tio Valter e Tia Petúnia morreram.


A história de vida do famoso Harry Potter - pensou ele - daria um livro para
ninguém botar defeito.


Com um ano de idade os pais de Harry haviam sido assassinados por um bruxo
chamado Voldemort. E desde então ele morara com seus parentes trouxas, que
compreendia seus tios e primo.


Harry pensara até os onze anos de idade que era uma pessoa comum que fazia
coisas incomuns, isso até seu passado ser revelado e ele começar a freqüentar
Hogwarts. Lá, Harry soubera de toda a verdade, bem como arrumara dois amigos e
um padrinho. Eles eram Hermione Granger, Rony Weasley e Sirius Black,
respectivamente.


Mas aos dezesseis anos de idade, os tios de Harry sofreram um acidente fatal
de carro. E ele foi morar com Sirius (então inocentado das acusações), e Duda,
que ele nunca mais vira, fora morar com sua tia Guida.


Quando Hogwarts acabara, Harry teve que enfrentar a dura realidade da guerra,
matar Voldemort e ver o mundo o aclamar herói, aos dezoito anos, por ter
cometido um assassinato.


Mas, o que o fizera decidir-se rodar o mundo nos anos subseqüentes, fora a
revelação de que Hermione, sua amada, amava Rony. Ainda se lembrava daquela
noite.


"Chovia intensamente em San Francisco, naquele momento. O mar tão estava
revolto e tumultuoso, quanto os pensamentos do homem, deitado no sofá.


A campainha tocou uma, duas, três vezes. Harry pedia em pensamento para a
pessoa ir embora, não queria conversar naquele momento.


De repente as luzes da sala escura se acenderam, e aquela luminosidade o
cegou um momento. Depois ele reconheceu Hermione parada no meio da sala,
completamente encharcada!


- Harry, seu mal-educado - ralhou ela - quando a campainha toca é um costume
trouxa se atender a porta. E não esperar que a pessoa aparate dentro de sua
casa!


Harry riu. Ela era uma figura engraçada. Toda molhada e com raiva. Ficava
linda com raiva.


- Desculpe-me Mione, mas não queria conversar com ninguém. Mas se enxugue,
senão vai ficar doente.


Com um suspiro, Hermione se jogou no sofá e começou a secar a roupa com
magia.


- O que está fazendo aqui, Mione?


- Você acreditaria, se dissesse que estava fazendo compras, e que vim aqui me
esconder da chuva?


- Poderia até ser. - retrucou Harry zombeteiro - se você não morasse em Nova
Orleans e eu em San Francisco.


- Ok... Ok... Vim aqui pedir sua ajuda meu amigo. Estou com um medo tremendo
e sinto que só você pode me ajudar.


Harry, Rony e Hermione sempre que juntos evitavam falar dos horrores da
guerra. Tudo ainda era traumático demais.


- Fale Mione.


- Uma amiga minha, da faculdade trouxa que faço, falou que tem uma vaga em um
banco da Filadélfia. E você sabe, Harry, que Rony estará lá. Dei-me um conselho,
Harry. Porque não sei ser mais natural ao lado do Rony. Meu amor por ele afeta
até meu modo de falar.


Ali estava pensou Harry, Hermione o amor de sua vida, amava seu melhor
amigo."


E aquilo mais que tudo fizera Harry tomar a solução de virar um anônimo.


Passou a percorrer o mundo no Gran Circo Bruxo que Sirius e Lupin tinham, era
o sonho dos quatro amigos em Hogwarts. E fora viver sua vida e esquecer
Hermione. Nunca mais falara com Rony também.


O Circo era um mundo em si mesmo. Dividido em circo bruxo e parque de
diversões trouxas. Do circo, que tinha espetáculos mágicos quem cuidava era
Lupin, e do parque era Sirius que cuidava.


- Não promovemos um show de escola de catecismo - explicou Sirius a Harry. -
Somos artistas da vigarice. Mas nunca se esqueça, filho, que não se pode enganar
pessoas que não sejam gananciosas para começar. W.C. Fieids estava certo. Não se
pode passar para trás um homem honesto.


Todos no parque se tornaram amigos de Harry. Havia os homens da "fachada",
que tinham as concessões, e a turma dos "bastidores", que comandava os
espetáculos, como a mulher gorda e a dama tatuada, sem falar nos operadores das
barracas em que se promoviam os jogos. O parque tinha a sua cota de moças núbeis
e todas se sentiram atraídas pelo rapaz. Aos dezoito anos Harry não era um
garoto magricela de cabelos revoltos, mas sim um homem bonito e sensível, com um
corpo ma-ra-vi-lho-so. As moças disputaram quem aliviaria Harry de sua
virgindade. Sua primeira experiência sexual foi com uma linda contorcionista e
durante anos ela foi a nota alta a que todas as outras mulheres tinham de
corresponder.


Sirius providenciou para que Harry trabalhasse em diversas funções no parque,
do circo Harry não gostava muito.


- Algum dia tudo isto lhe pertencerá - disse Sirius ao rapaz. - A única
maneira de você conservar é conhecer mais do parque que qualquer outra pessoa.


A primeira coisa que Harry perguntou, era porque não se usava magia no
parque.


- Não se usa a magia garoto, por um motivo. O parque é para trouxas e se o
Ministério souber que um grande numero de mágicas foi feita na presença de
trouxas, é o nosso fim.


Harry começou com o golpe dos seis gatos. Os fregueses pagavam para jogar
bolas, tentando derrubar numa rede seis gatos feitos de lona, com uma base de
madeira. O operador dirigindo a barraca mostrava como era fácil derrubar os
gatos. Mas quando o freguês tentava, um "artilheiro" escondido por trás da lona
da barraca levantava uma vareta para firmar as bases de madeira. Nem mesmo um
atirador de elite do exército podia afogar aqueles gatos.


- Ei, você acertou muito baixo! - dizia o operador. - Tudo o que precisa
fazer é jogar firme e forte.


Firme e forte era a senha. No momento em que o operador a dizia, o artilheiro
retirava a vareta. Assim, o operador não tinha a menor dificuldade para derrubar
o gato. Ele acrescentava então:


- Vê como é fácil?


Esse era o sinal para que o artilheiro tornasse a levantar a vareta. Havia
sempre um caipira que queria mostrar à namorada risonha como tinha o braço forte
e certeiro.


Harry trabalhou também com a barraca dos pinos. Os fregueses tinham de jogar
argolas de borracha sobre pinos numerados, dispostos em filas; se o total fosse
de 29, ele ganharia um brinquedo caro. Mas o que o otário não sabia era que os
pinos tinham números diferentes nas duas extremidades e que o operador podia
esconder o número que daria a soma de 29, providenciando assim para que ele
jamais ganhasse. E Sirius disse um dia a Harry:


- Você está indo muito bem, garoto. Sinto-me orgulhoso de você. Está pronto
para ser promovido a skillo.


Os operadores do skillo eram o máximo, convidados por todos os parques.
Ganhavam mais dinheiro que qualquer outro, hospedavam-se nos melhores hotéis e
guiavam carros vistosos. O jogo de skillo consistia de uma roda horizontal, com
uma flecha equilibrada cuidadosamente em vidro e um pedaço de papel fino no
centro. Cada seção era numerada; o freguês girava a roda, a agulha apontava para
um número ao parar, esse número era tapado. O freguês pagava para girar outra
vez a roda, outro número ficava tapado. O operador do skillo explicava que o
freguês ganharia uma quantia fabulosa quando todos os números estivessem
tapados. À medida que o freguês se aproximava da cobertura de todos os números,
o operador encorajava-o a aumentar suas apostas. Ele olhava nervosamente ao
redor e sussurrava:


- Não sou o dono deste jogo e gostaria que você vencesse. Se isso acontecer,
talvez me dê uma pequena comissão.


O operador chegava mesmo a entregar sub-repticiamente ao freguês uma nota de
cinco ou dez dólares, murmurando:


- Aposte isso por mim, está bem? Você não pode perder agora.


O otário sentia que conquistara um cúmplice. Harry tornou-se um perito em
ordenhar os fregueses. À medida que diminuíram os espaços abertos no tabuleiro e
aumentavam as chances de ganhar, o excitamento se intensificava.


- Você não pode perder agora! - exclamava.


Ansiosamente, o jogador empenhava mais dinheiro. Por fim, quando só restava
um espaço a preencher, o excitamento chegava ao clímax. O otário jogava todo o
dinheiro que tinha, muitas vezes ia apressadamente em casa para buscar mais. O
freguês nunca vencia, no entanto, porque o operador ou seu preposto dava um
empurrão imperceptível na mesa e a flecha passava e parava invariavelmente no
lugar errado.


Harry aprendeu rapidamente os termos do parque. "Fisgar" significava arrumar
os jogos para que os otários nunca pudessem ganhar. Os homens que se postavam na
frente de uma barraca, anunciando seu espetáculo, eram conhecidos como
"faladores". O falador ganhava dez por cento por aumentar a ponta... A "ponta"
sendo uma multidão. "Cortiço" era um prêmio dado. O "carteiro" era um
funcionário do ministério que precisava ser subornado.


Harry tomou-se um perito na "explosão". Quando os fregueses pagavam para
assistir a um espetáculo, Harry jogava a sua conversa:


- Senhoras e senhores, verão no interior desta barraca tudo por que pagaram e
está anunciado no lado de fora. Mas... imediatamente depois que a moça na
cadeira elétrica terminar de ser torturada, temos uma atração extra que não tem
absolutamente nada a ver com o espetáculo e não está anunciada no lado de fora.
Lá dentro vocês verão algo realmente extraordinário, tão assustador e arrepiante
que não nos atrevemos a mostrar do lado de fora, porque não deve ser visto por
crianças inocentes ou mulheres impressionáveis.


E depois que os otários pagavam um dólar extra, Harry os introduzia para
verem uma mulher sem a parte do meio do corpo ou um bebê com duas cabeças...
Tudo, claro, um jogo de espelhos.


Um dos jogos mais lucrativos do parque era a "corrida de camundongo". Um
camundongo vivo era posto no centro de uma mesa, com uma tigela por cima. Havia
dez buracos em torno do perímetro da mesa e o camundongo podia correr para
qualquer um, quando a tigela fosse levantada. Cada freguês apostava num buraco
numerado. O prêmio ficava para quem acertasse o buraco para o qual o camundongo
corria.


- Como fisga uma coisa assim? - perguntou Harry a Sirius - Enfeitiça
camundongos?


Sirius chorou de tanto rir.


- Quem tem tempo para enfeitiçar todos os camundongos? Nada disso. A coisa é
muito simples. O operador vê qual é o número em que ninguém apostou, põe um
pouco de vinagre na ponta do dedo e toca na beira do buraco em que quer que o
camundongo corra. E o camundongo seguirá invariavelmente para esse buraco.


Karen, uma jovem e atraente dançarina do ventre, introduziu Harry no golpe da
"chave".


- Depois de jogar a sua conversa na noite de sábado - disse-lhe Karen - chame
alguns fregueses para um lado, um de cada vez, venda-lhes uma chave do meu
trailer.


As chaves custavam cinco dólares. Por volta da meia-noite, uma dúzia ou mais
de homens circulavam em torno do trailer. A esta altura, Karen já se achava num
hotel na cidade, passando a noite com Harry. Quando os otários voltavam ao
parque na manhã seguinte, a fim de se vingarem, as barracas já tinham sido
desmontadas e há muito que o pessoal caíra na estrada.


Harry aprendeu muita coisa sobre a natureza humana durante os três anos
seguintes. Descobriu como era fácil atiçar a ganância, ou como as pessoas podiam
ser crédulas. Acreditavam em histórias inacreditáveis porque a ganância as
levava a quererem acreditar. Aos 21 anos, Harry era excepcionalmente bonito. Até
mesmo a observadora feminina mais casual notava instantaneamente os seus olhos
verdes, bem espaçados, o corpo alto e forte, os cabelos pretos em rebelde
desalinho. Os homens gostavam de sua inteligência e de seu bom humor. Até as
crianças, como se falassem a uma criança receptiva nele, concediam-lhe a sua
confiança imediata. As freguesas flertavam abertamente com Harry, mas Sirius não
perdia a oportunidade de advertir:


- Fique longe das garotas trouxas, rapaz. Os pais delas são sempre os
xerifes.


Foi a mulher do lançador de facas que levou Harry a deixar o parque. Haviam
acabado de chegar a Milledgeville, Geórgia, as barracas estavam sendo armadas
(claro por meios mágicos). Um novo ator fora contratado, um atirador de facas
siciliano conhecido como Grande Zorbini e sua atraente esposa loura. Enquanto o
Grande Zorbini se encontrava no parque, preparando seu equipamento, a mulher
convidou Harry para uma visita a seu quarto no hotel na cidade.


- Zorbini estará ocupado durante o dia inteiro - ela disse a Harry. - Vamos
nos divertir um pouco.


Parecia bastante promissor.


- Dê-me uma hora e depois suba para o quarto - disse ela.


- Por que esperar uma hora? - indagou Harry.


Ela sorriu e respondeu:


- É o tempo que precisarei para aprontar tudo.


Harry esperou, a curiosidade aumentando. Quando finalmente chegou ao quarto
do hotel, ela recebeu-o na porta inteiramente nua. Harry agarrou-a, mas ela
tirou sua mão e disse:


- Entre aqui.


Ele foi para o banheiro e ficou espantado com o que viu. Ela enchera a
banheira com seis sabores de gelatina, misturada com água quente.


- O que é isso? - perguntou.


- É a sobremesa. Dispa-se, meu bem.


Harry despiu-se.


- E agora entre na banheira.


Ele entrou na banheira e sentou. Foi a sensação mais incrível que já
experimentara. A gelatina macia e escorregadia parecia preencher todas as fendas
de seu corpo, massageando-o por completo. A loura também entrou na banheira.


- Agora - disse ela - o almoço.


A loura começou pelo peito de Harry e foi descendo para a virilha, lambendo a
gelatina pelo caminho.


- Hum... Você tem um gosto delicioso. Gosto mais do morango...


Entre a língua veloz da loura e a fricção da gelatina quente e viscosa,
aquilo era a experiência erótica mais incrível que já tivera. No meio da coisa,
porém, a porta do banheiro abriu-se bruscamente e o Grande Zorbini entrou. O
siciliano lançou um olhar para a esposa e a um aturdido Harry, depois berrou:


- Tu sei una puttana! Vi ammazzo e duel Dove sono i miei coltelli?


Harry não reconheceu qualquer das palavras, mas o tom era familiar.


Enquanto o Grande Zorbini saia correndo do banheiro para buscar suas facas,
Harry pulou da banheira, o corpo parecendo um arco-íris com a gelatina
multicolorida grudada, pegou suas roupas. Pulou pela janela, nu, desatou a
correr pelo beco. Ouviu um grito atrás dele e sentiu uma faca passar zunindo
perto de sua cabeça. Zing! Outra faca e depois ele desaparatou.


Vestiu-se num beco, pondo a camisa e a calça por cima da gelatina viscosa.
Foi para a estação rodoviária, onde pegou o primeiro ônibus que saía da cidade.


Foi para a Europa.


O ano subseqüente foi repleto de aventuras. Para Harry, o mundo inteiro era
um parque de diversões e as pessoas eram os seus otários. Ele criava os seus
próprios golpes. Colocava anúncios nos jornais oferecendo uma fotografia a cores
do Presidente do país onde se encontrava por um dólar. Quando recebia o dólar,
mandava para a vítima um selo postal com um retrato do presidente.


Pôs anúncios em revistas avisando ao público que restavam apenas 60 dias para
o envio de cinco dólares; depois disso, seria tarde demais. O anúncio não
especificava o que os cinco dólares comprariam, mas o dinheiro se despejou.


Por três meses Harry trabalhou numa sala de caldeira, vendendo falsas ações
de companhias petrolíferas pelo telefone. Ganhou muito dinheiro. Adorava barcos,
e, quando um amigo ofereceu-lhe emprego numa escuna de partida para Madeiras,
Harry assinou um contrato como marujo.


A escuna era uma beleza, branca, com 165 pés, rebrilhando ao sol, todas as
velas enfunadas. Tinha o deque de teça, pinheiro suíço no casco, um salão de
jantar que acomodava 12 pessoas, uma cozinha moderna, com fogões elétricos.


Os alojamentos da tripulação eram no porão de vante. Além do comandante, do
camareiro e do cozinheiro, havia cinco marujos.


O trabalho de Harry consistia em ajudar a içar as velas, polir as vigias de
latão, subir pelo enfrechate para mastrear a vela principal. A escuna estava
transportando oito passageiros.


- A pessoa que possui a escuna se chama Hollander - informou o amigo de
Harry.


Hollander. Era Louise Hollander, uma beldade loura de 25 anos, cujo pai
possuía metade da América Central. Os outros passageiros eram seus amigos, aos
quais os amigos de circo de Harry se refeririam desdenhosamente como "jest set",
usando o jest (pilhéria) para alterar a expressão "jet set".


Em seu primeiro dia no mar, Harry trabalhava ao sol, polindo os metais no
deque, quando Louise Hollander se aproximou e parou ao seu lado.


- Você é novo a bordo.


Ele levantou os olhos.


- Isso mesmo.


- Tem um nome?


- Harry Potter.


- Um nome bonito. - Ele não fez qualquer comentário. - Sabe quem eu sou?


- Não.


- Louise Hollander. Dona deste barco.


- Ou seja, estou trabalhando para você.


Ela presenteou-o com um sorriso lento.


- Isso mesmo.


- Pois então, se quer que eu mereça o dinheiro que me paga, é melhor deixar-
me continuar a trabalhar.


E Harry passara para o esquepe seguinte.


Em seus alojamentos, à noite, os tripulantes depreciavam os passageiros e
contavam piadas a seu respeito. Mas Harry admitia para si mesmo que os invejava
- por sua criação e vida fácil. Tinham famílias ricas e tinham o que de melhor
se comprava. Tinham tido pais, não tiveram de matar ninguém, e nem foram criados
por tios insuportáveis. Harry nem mesmo tinha dinheiro bruxo!


Porque havia perdido tudo na maldita guerra contra Voldemort!


Na última noite, antes da escuna atracar em Madeiras, Harry foi chamado ao
camarote de Louise Hollander. Ela usava um chambre de seda.


- Queria me falar, madame?


- Você é homossexual, Harry?


- Não creio que isso seja da sua conta, Senhorita Hollander, mas a resposta é
não. Apenas sou exigente.


A boca de Louise Hollander se contraiu.


- Que tipo de mulheres você aprecia? Suponho que prostitutas.


- Às vezes - disse Harry, amavelmente. - Deseja mais alguma coisa, Senhorita
Hollander?


- Desejo, sim. Oferecerei um jantar amanhã de noite. Gostaria de comparecer?


Harry fitou-a em silêncio por um longo tempo antes de responder:


- Por que não?


E foi assim que começou.


Louise Hollander já tivera dois maridos antes de completar 21 anos. Seu
advogado fez um acordo com o terceiro marido quando ela conheceu Harry. Na
segunda noite em que estavam ancorados na enseada, enquanto passageiros e
tripulantes iam para a terra, Harry recebeu outro chamado ao camarote de Louise
Hollander.


Quando Harry ali chegou, ela vestia um páreo de seda colorido, aberto no lado
até a coxa.


- Estou tentando tirar isto, mas estou tendo dificuldade com o zíper - disse
ela.


Harry adiantou-se e examinou o páreo.


- Não tem nenhum zíper.


Ela virou-se para fitá-lo e sorriu.


- Sei disso. É justamente o meu problema.


Eles fizeram amor no tombadilho, onde o suave ar tropical lhes acariciava os
corpos como um bálsamo. Depois, ficaram de lado, fitando-se. Harry soergueu-se,
apoiado no cotovelo, contemplou Louise de alto a baixo.


- Seu pai não é o xerife, não é mesmo?


Ela sentou, surpresa.


- Como?


- Deixe para lá, você não entenderia mesmo. Era apenas uma expressão de meu
padrinho Sirius.


Depois disso, eles passavam todas as noites juntos. A princípio, os amigos de
Louise acharam divertido. Ele é outro dos caprichos de Louise, pensaram. Mas
ficaram frenéticos quando ela informou-os que tencionava casar com Harry.


- Pelo amor de Deus, Louise, ele é um nada! Ele trabalhou num parque de
diversões. Por Deus, é a mesma coisa que casar com um cavalariça. Ele é
bonito... Não se pode deixar de admitir. E tem um corpo fabuloso. Mas, fora do
sexo, vocês não têm absolutamente nada em comum, querida.


- Louise, Harry é para o café da manhã, não para um jantar.


- Você tem uma posição social a resguardar.


- Francamente, meu anjo, ele não vai se adaptar, não é mesmo?


Mas nada do que disseram os amigos pôde dissuadir Louise. Harry era o homem
mais fascinante que ela já conhecera.


Descobrira que os homens extraordinariamente bonitos eram monumentalmente
estúpidos ou insuportavelmente insípidos. Harry era inteligente e divertido, o
que fazia uma combinação irresistível.


Quando Louise falou em casamento, Harry ficou tão surpreso quanto os amigos
dela.


- Para quê casamento? Você já tem meu corpo. Não posso lhe dar qualquer coisa
que já não possua.


- É muito simples, Harry. Eu o amo. Quero partilhar o resto da minha vida com
você.


O casamento fora uma idéia estranha, mas subitamente deixou de ser. Sob o
verniz mundano e sofisticado de Louise Hollander havia uma garotinha vulnerável
e perdida. Ela precisa de mim, pensou Harry. A perspectiva de uma vida doméstica
estável e filhos tornou-se subitamente atraente. Harry tinha a impressão de que
vivia correndo desde que podia se lembrar. Chegara o momento de parar. E
esquecer Hermione.


Eles casaram na prefeitura da cidade, três dias depois.


Quando voltaram à Nova York (era lá que Louise morava), Harry foi convocado
ao escritório de Scott Fogarty, o advogado de Louise Hollander, um homem pequeno
e frio, de lábios comprimidos.


- Tenho um documento aqui para você assinar - anunciou o advogado


- Que documento?


- É uma declaração. Diz simplesmente que no caso de dissolução de seu
casamento com Louise Hollander...


- Louise Potter


-... Louise Potter, você não participará financeiramente de qualquer...


Harry sentiu os músculos das mandíbulas se contraindo.


- Onde eu assino?


- Não quer que eu termine de ler?


- Não. Acho que você não entendeu. Não casei com ela pela porra do dinheiro.


- Por favor, senhor Potter! Eu apenas...


- Quer que eu assine ou não?


O advogado estendeu o documento para Harry. Ele assinou e saiu furioso do
escritório. A limusine e o motorista de Louise estavam à sua espera lá embaixo.
Ao embarcar, Harry teve de rir para si mesmo. Por que diabo estou tão furioso?
Fui um vigarista durante oito anos; quando me torno honesto pela primeira vez e
alguém pensa que estou dando um golpe, eu me comporto como a porra de um
professor de catecismo.


Louise levou Harry ao melhor alfaiate de Manhattan, comentando:


- Você ficará fantástico num smoking.


E foi exatamente o que aconteceu. Antes do segundo mês de casamento, cinco
das melhores amigas de Louise já haviam tentado seduzir o atraente recém-
chegado a seu círculo. Mas Harry ignorou-as. Estava determinado a fazer com que
seu casamento desse certo. Não contara a Louise que era bruxo.


Simplesmente cortou qualquer vinculo ou fonte de informação com essas coisas.
Não sabia o porque, mas tinha certeza que Louise não gostaria disso, nem mesmo
queria que ela soubesse.


Budge Hollander, o irmão de Louise, apresentou a proposta de Harry para sócio
do exclusivo Pilgrim Club, de Nova York. Harry foi aceito. Budge era corpulento,
de meia-idade, ganhara esse apelido, que significava mover, na equipe de futebol
americano de Harvard, pela reputação de ser um jogador que os oponentes não
podiam deslocar.


Possuía uma empresa de navegação, uma plantação de banana, ranchos de gado,
um frigorífico e inúmeras outras empresas, mais do que Harry podia contar. Budge
Hollander não era sutil em esconder seu desdém por Harry Potter.


- Você é realmente abaixo de nossa classe, não é mesmo, meu velho? Mas não
tem problema enquanto divertir Louise na cama. Gosto muito de minha irmã.


Harry teve de recorrer a toda a sua força de vontade para se controlar. Para
não transformar nenhuma vez a cara dele em uma lesma que ninguém jamais
reconheceria. Mas não. Não estou casado com este idiota. Casei com Louise.


Os outros sócios do Pilgrim Club se mostravam igualmente ofensivos. Mas
achavam Harry muito engraçado. Almoçavam no clube todos os dias e pediam a Harry
que lhes contasse histórias sobre os seus dias no parque de diversões. E Harry
fazia questão de contar histórias cada vez mais chocantes.


Harry e Louise viviam numa casa de vinte cômodos, cheia de criados, no East
Side de Manhattan. Louise tinha propriedades em Long Island e nas Bahamas, uma
vila na Sardenha e um enorme apartamento na Avenue Foch, em Paris.


Além do iate, ela possuía uma Maserati, um Rols Corniche, um Lamborgbini e um
Daimler.


É fantástico, pensou Harry.


É sensacional, pensou Harry.


É tedioso, pensou Harry. E degradante.


Ele levantou-se uma manhã da cama de dossel do séc. XVIII, pôs um chambre
Sulka e foi procurar Louise. Encontrou-a na sala do café da manhã.


- Tenho de arrumar um emprego - declarou Harry.


- Pelo amor de Deus, querido, por quê? Não precisamos do dinheiro.


- Não tem nada a ver com dinheiro. Você não pode esperar que eu passe a vida
toda refestelado, com alguém a me dar comida na boca. Preciso trabalhar.


Louise pensou por um momento.


- Está bem, meu anjo. Falarei com Budge. Ele possui uma firma de corretagem
de valores. Você gostaria de ser um corretor, querido?


- Quero apenas começar a trabalhar - murmurou Harry.


Ele foi trabalhar para Budge. Nunca antes tivera um emprego de horário
regular. Vou adorar, pensou Harry.


Ele detestou. Só continuou porque queria levar seu pagamento para a esposa.


- Quando vamos ter um filho? - ele perguntou a Louise numa tarde de domingo,
depois de um almoço prolongado.


- Em breve, querido. Estou tentando.


- Pois então vamos para a cama. Tentemos de novo.


Harry estava sentado à mesa reservada para seu cunhado e meia dúzia de outros
lideres industriais da América, no Pilgrim Club. Budge anunciou:


- Acabamos de divulgar nosso relatório anual do frigorífico. - Os lucros
aumentaram em 40 por cento.


- Por que não haveriam de aumentar? - disse um dos homens à mesa, rindo. -
Você subornou os inspetores.


Ele virou-se para os outros à mesa e explicou:


- O velho Budge, sempre esperto, compra carne de terceira, obtém a
classificação de carne de primeira e depois vende por uma fortuna.


Harry ficou chocado.


- Mas as pessoas comem essa carne, pelo amor de Deus! E dão para seus filhos!
Ele está brincando, não é mesmo, Budge?


Budge sorriu e gritou:


- Olhem só quem está querendo bancar o moralista!


Durante os três meses seguintes Harry passou a conhecer muito bem os seus
companheiros de mesa. Ed Zeller pagara um milhão de dólares em subornos pra
construir uma fábrica na Líbia.


Mike Quincy, o líder de um conglomerado, era um trapaceiro que adquiria
empresas e ilegalmente avisava aos amigos quando comprar e vender as ações.


Alan Thompson, o homem mais rico à mesa, gabava-se da política de sua
companhia:


- Antes de mudarem a maldita lei, costumávamos despedir os velhos um ano
antes de terem direito a suas pensões. E com isso poupávamos uma fortuna.


Todos os homens sonegavam impostos, cometiam fraudes de seguros,
falsificações nas contas de representação e punham as amantes correntes na folha
de pagamento, como secretárias ou assistentes.


Por Deus, pensou Harry, eles são simplesmente vigaristas bem vestidos. Todos
dão os seus golpes sujos.


As esposas não eram melhores. Agarravam tudo o que podiam com suas mãos
gananciosas e enganavam os maridos abertamente. Elas estão no jogo da chave,
pensava Harry. Quando tentou explicar a Louise como se sentia, ela riu.


- Não seja ingênuo, Harry. Você está gozando a vida, não é mesmo?


A verdade é que ele não sentia assim. Casara com Louise porque acreditava que
ela precisava dele. Achava que os filhos mudariam tudo.


- Vamos ter um casal. Está na hora. Afinal, já estamos casados há um ano.


- Seja paciente, meu anjo. Fui ao médico e ele me disse que estou bem. Talvez
você devesse fazer um check-up para descobrir se também está certinho.


Foi o que Harry fez.


- Você não deve ter qualquer problema para gerar filhos saudáveis - garantiu
o médico.


E nada acontecia.


O mundo de Harry desmoronou na Segunda-Feira Negra, duas semanas depois da
consulta ao médico. Começou pela manhã, quando foi ao armarinho de remédios de
Louise para pegar uma aspirina.


Encontrou uma prateleira cheia de vidros de pílulas anticoncepcionais. Um dos
vidros estava quase vazio. Ao lado, inocentemente, havia um frasco com um pó
branco e uma colherinha de ouro. E isso foi apenas o começo do dia.


Ao meio-dia, Harry se encontrava sentado numa poltrona em profunda reflexão,
no Pilgrim Club, esperando por Budge, quando ouviu dois homens por trás dele
conversando.


- Ela jura que o pau do seu italiano tem mais de vinte e cinco centímetros de
comprimento.


Houve uma risadinha.


- Louise, sempre gostou de pau grande.


Eles estão falando sobre outra Louise, disse Harry a si mesmo.


- Provavelmente foi por isso que ela casou com aquele sujeito do parque de
diversões. Mas Louise conta as histórias mais engraçadas a respeito dele. Não
vai acreditar no que ele fez outro dia...


Harry levantou e saiu do clube às cegas.


Estava dominado por uma raiva descomunal. Tinha vontade de usar uma maldição
imperdoável. Queria torturar o italiano desconhecido. Queria torturar Louise.
Com quantos outros homens ela se teria deitado durante o último ano? Riam dele
sem parar. Budge, Ed Zeller, Mike Quiney e Alan Thompson. E suas esposas
vinham-se divertindo enormemente à sua custa. E Louise, a mulher que ele quisera
proteger.


A reação imediata de Harry era pegar suas coisas e ir embora. Mas isso não
era suficiente. Não tinha a menor intenção de permitir que os filhos da puta
rissem por último.


Louise não estava quando Harry chegou em casa naquela tarde. Pickens, o
mordomo, informou:


- Madame saiu de manhã. Creio que tinha diversos compromissos.


Aposto que tinha mesmo, pensou Harry. Deve estar fodendo com a porra do
italiano com um pau de vinte e cinco centímetros. Oh, Deus!


Quando Louise chegou, Harry já conseguira recuperar um controle firme e
perguntou-lhe:


- Teve um bom dia?


- As coisas tediosas de sempre, querido. Uma hora no salão de beleza,
compras... E como foi o seu dia, meu anjo?


- Foi interessante - respondeu Harry, com toda a sinceridade. - Aprendi uma
porção de coisas.


- Budge me disse que você está indo muito bem.


- Estou, sim. E muito em breve, estarei ainda melhor.


Louise afagou-lhe a mão.


- Meu marido brilhante. Por que não vamos cedo para a cama?


- Não esta noite - disse. - Estou com dor de cabeça.


Ele passou a semana seguinte fazendo seus planos. E começou pelo almoço no
clube.


- Algum de vocês sabe qualquer coisa sobre as fraudes de computador?


- Por quê? - perguntou Ed Zeller. - Está planejando cometer alguma?


Houve uma explosão de risos.


- Estou falando sério - insistiu Harry. - É um grande problema. Muitas
pessoas estão interferindo nos computadores e roubando bilhões de dólares dos
bancos, seguradoras e outras empresas. E a coisa se torna pior a cada dia.


- Parece matéria que você conhece muito bem - murmurou Budge.


- Conheci um homem que afirma ter inventado uma maquina que é à prova de
interferência.


- E você quer mandar liquidá-lo por causa disso - gracejou Mike Quincy.


- Para dizer a verdade, estou interessado em levantar um dinheiro para
financiá-lo. E pensei que algum de vocês poderia conhecer um pouco de
computadores.


- Não, não sabemos. - Budge sorriu. - Mas conhecemos tudo sobre o
financiamento a inventores. Não é mesmo, pessoal?


Houve outra explosão de risos.


Dois dias depois, no clube, Harry passou por sua mesa habitual e explicou a
Budge:


- Desculpe, mas não poderei me juntar a vocês hoje. Tenho um convidado para o
almoço.


Depois que Harry se afastou para outra mesa, Alan Thompson comentou,
sorrindo:


- Provavelmente ele vai almoçar com a mulher barbada do circo.


Um homem grisalho e meio encurvado entrou no restaurante e foi conduzido à
mesa de Harry.


- Ei, aquele não é o Professor Ackerman? - indagou Mike Quiney.


- E quem é o Professor Ackerman?


- Nunca lê qualquer coisa além dos relatórios financeiros, Budge? Vernon
Ackerman saiu na capa do Times no mês passado.É o presidente do Conselho
Cientifico Nacional que assessora o nosso presidente. O cientista mais brilhante
do país.


- Que diabo ele está fazendo com o meu caro cunhado?


Harry e o professor se mantiveram absorvidos em profunda conversa durante
todo o almoço. Budge e seus amigos foram ficando cada vez mais curiosos. Depois
que o professor foi embora, Budge fez sinal para que Harry viesse até sua mesa.


- Quem era aquele, Harry?


Harry assumiu uma expressão culpada.


- Oh... está se referindo a Vernon?


- Isso mesmo. Sobre o que estavam conversando?


- Nós... ahn... - Os outros quase que podiam observar o processo de
pensamento de Harry, enquanto tentava se esquivar à pergunta. - Eu... ahn...
posso escrever um livro sobre ele. É uma personalidade muito interessante.


- Eu não sabia que você era escritor.


- Ora, acho que todos temos de começar algum dia.


Três dias depois Harry teve outro convidado para o almoço. Desta vez foi
Budge quem o reconheceu:


- Ei, aquele é Seymour Jarrett, presidente do Conselho de Administração da
Jarrett Internacional Computer. Que diabo ele está fazendo aqui com Harry?


Harry e seu convidado tiveram uma conversa longa e animada. Depois que o
almoço terminou, Budge foi sondar.


- Harry, meu rapaz, o que estava fazendo com Seymour Jarrett?


- Nada - disse Harry rapidamente. - Apenas conversando.


Ele começou a se afastar, mas Budge deteve-o.


- Não tão depressa, meu velho. Seymour Jarrett é um homem muito ocupado. Ele
não se senta com os outros só para ter uma conversa fiada.


Harry disse, ansiosamente:


- Está bem, Budge. A verdade é que Seymour coleciona selos e eu lhe falei
sobre um selo raro que posso lhe arrumar.


A verdade coisa nenhuma, pensou Budge.


Na semana seguinte, Harry almoçou no clube com Charlie Bartlett, presidente
da Bartlett & Bartlett, um dos maiores grupos de capital de risco do mundo.


Budge, Ed Zeller, Alan Thompson e Mike Quincy observaram fascinados, enquanto
os dois homens conversavam, muito absortos.


- Seu cunhado tem voado alto ultimamente - comentou Zeller. - Que tipo de
negócio ele está preparando, Budge?


Budge respondeu, irritado:


- Não sei, mas pode ter certeza de que vou descobrir. Se Jarrett e Bartlett
estão interessados, deve haver muito dinheiro envolvido.


Eles observavam quando Bartlett se levantou, apertou efusivamente a mão de
Harry e depois foi embora. Quando Harry passava por sua mesa, Budge agarrou- o
pelo braço.


- Preciso voltar ao escritório - protestou Harry. - Eu...


- Você trabalha para mim, está lembrado? Sente-se. - Harry obedeceu. - Com
quem você almoçou hoje?


Harry hesitou por um instante.


- Ninguém especial. Um velho amigo.


- Charlie Bartlett é um velho amigo?


- De certa forma


- Sobre o que você e seu velho amigo Charlie conversaram, Harry?


- Ahn... principalmente sobre carros. O velho Charlie gosta de carros antigos
e eu soube de um Packard 37, quatro portas, conversível...


- Pare com essa merda! - disse Budge bruscamente. - Você não coleciona selos,
não vende carros antigos e não escreve livro nenhum. O que está realmente
fazendo?


- Nada. Eu...


- Está levantando dinheiro para alguma coisa, não é mesmo, Harry? - indagou
Ed Zeller.


- Não!


Mas Harry foi precipitado demais na negativa. Budge passou o braço enorme em
torno dele.


- Ei, companheiro, sou o seu cunhado. Da mesma família, lembra? - Ele deu um
aperto efusivo em Harry. - É alguma coisa sobre aquele computador à prova de
interferência que você mencionou na semana passada, não é mesmo?


Todos puderam perceber, pela expressão no rosto de Harry, que ele estava
acuado.


- Ahn... é, sim...


Era como arrancar dentes para tirar alguma coisa do filho da puta.


- Por que não nos disse que o Professor Ackerman estava envolvido?


- Achei que vocês não estavam interessados.


- Pois se enganou. Quando precisa de capital, deve procurar primeiro os
amigos.


- O professor e eu não precisamos de capital - disse Harry. - Jarrett e
Bartlett...


- Jarrett e Bartlett são autênticos tubarões e vão devorá-lo vivo! -
interveio Alan Thompson.


Ed Zeller aproveitou a deixa:


- Mas quando lida com amigos, Harry, não há qualquer risco de sair machucado.


- Já está tudo acertado - confessou Harry. - Charlie Bartlett...


- Assinou alguma coisa?


- Ainda não. Mas dei minha palavra...


- Então nada está acertado. Mas que diabo, Harry, nos negócios as pessoas
mudam de idéia a cada hora.


- Eu nem deveria estar discutindo o assunto com vocês - protestou - O nome do
Professor Ackerman não pode ser mencionado. Ele tem contrato com uma agência do
governo.


- Sabemos disso - interveio Thompson, suavemente. - O professor acha que a
coisa funcionará?


- Ele sabe disso com certeza.


- Se é bom o bastante para Ackerman, então é também para nós... não é mesmo,
pessoal?


Houve um coro de assentimento.


- Ei, não sou um cientista! - disse Harry. - Não posso garantir qualquer
coisa. Pelo que sei, a coisa pode não ter o menor valor.


- Claro, claro... Compreendemos perfeitamente. Mas suponhamos que tenha um
valor, Harry. Quais poderiam ser as dimensões?


- O mercado para isso é mundial, Budge. Não dá nem para começar a fixar um
valor. Todo mundo poderá usar.


- Qual é o financiamento inicial que você está procurando?


- Dois milhões de dólares. Mas tudo o que precisamos é de 250 mil dólares de
entrada. Bartlett prometeu...


- Esqueça Bartlett. Isso é uma ninharia, companheiro. Entraremos com essa
quantia pessoalmente. E manteremos tudo em família. Certo, pessoal?


- Certo!


Budge levantou os olhos e estalou os dedos. Um garçom aproximou-se
apressadamente.


- Dominick, traga papel e uma caneta para o sr. Potter.


O pedido foi atendido prontamente.


- Podemos fechar o negócio agora mesmo - disse Budge a Harry. - Basta
escrever uma cessão dos direitos para nós. Todos assinaremos e pela manhã você
terá um cheque visado no valor de 250 mil dólares. Está bom assim para você?


Harry mordia o lábio inferior.


- Budge, prometi ao Sr. Bartlett...


- Foda-se Bartlett! - rosnou Budge. - Casou-se com a irmã dele ou com a
minha? E agora escreva.


- Não temos uma patente e...


- Escreva logo!


Budge empurrou a caneta para a mão de Harry. Relutantemente, Harry começou a
escrever:


"Por este documento transfiro todos os meus direitos, título e interesse num
computador matemático chamado SUCABA, aos compradores Donald 'Budge' Hollander,
Edward Zeller, Alan Thompson e Mike Quincy, em troca de um pagamento de 250 mil
dólares na assinatura. O SUCABA foi amplamente testado, é barato, não apresenta
problemas e consome menos energia do que qualquer outro computador atualmente no
mercado. O SUCABA não precisará de manutenção ou peças por um período mínimo de
dez anos".


Todos olhavam por cima do ombro de Harry, enquanto ele escrevia.


- Santo Deus! - exclamou Ed Zeller. - Dez anos! Não há um só computador no
mercado que ofereça essa vantagem!


Harry continuou a escrever: "Os compradores sabem que nem o Professor
Ackerman, nem eu temos uma patente sobre o SUCABA "...


- Nós cuidaremos disso - interveio Alan Thompson, impaciente. - Tenho o
melhor advogado de patentes.


Harry continuou a escrever: "Expliquei aos compradores que o SUCABA pode não
ter qualquer valor e que nem o Professor Vernon Ackerman nem eu assumimos
quaisquer responsabilidades ou garantias sobre o SUCABA, a não ser as que estão
relacionadas acima".


Ele assinou e estendeu o documento, indagando:


- Está bom assim?


- Tem certeza sobre os dez anos? - perguntou Budge.


- Garantia absoluta. Vou escrever uma cópia.


Eles ficaram observando enquanto Harry escrevia uma cópia do documento. Ao
final, Budge pegou as duas cópias e assinou, seguido por Zeller, Quincy e
Thompson. Budge estava radiante.


- Uma cópia para nós e uma cópia para você. O velho Seymour Jarrett e Charlie
Bartlett ficarão furiosos, hem? Mal posso esperar para ver a cara dos dois
quando souberem que os passamos para trás neste negócio.


Na manhã seguinte, Budge entregou a Harry um cheque visado no valor de 250
mil dólares.


- Onde está o computador? - perguntou Budge.


- Providenciei para que seja entregue no clube ao meio-dia. Achei que seria
apropriado que todos estivéssemos juntos quando o receberem.


Budge bateu afetuosamente no ombro do cunhado.


- Sabe, Harry, você é um cara esperto. Até à hora do almoço.


Pontualmente ao meio-dia um mensageiro entrou no restaurante do Pilgrim Club
e foi conduzido à mesa de Budge, que ali estava com Zeller, Thompson e Quincy. O
mensageiro entregou um pacote.


- Aqui está! - exclamou Budge.- Santo Deus! A coisa é até portátil!


- Devemos esperar por Harry? - indagou Thompson.


- Ele que se dane. A coisa agora nos pertence.


Ele rasgou o papel e abriu a caixa. Havia palha lá dentro. Cuidadosamente,
quase com reverência, Budge tirou o objeto que repousava sobre a palha. Os
homens ficaram olhando fixamente.


Era uma estrutura quadrada, com cerca de 30 centímetros de diâmetro, contendo
uma série de fios com contas. Houve um silêncio prolongado.


- O que é isso? - perguntou Quincy finalmente.


Foi Alan Thompson quem respondeu:


- É um ábaco. Uma dessas coisas que os orientais usavam para fazer contas...
- Sua expressão mudou abruptamente. - Ei, SUCABA é abacus, a palavra em inglês,
soletrada ao contrário!


Ele virou-se para Budge, acrescentando:


- Essa é a sua idéia de brincadeira?


Zeller falou atabalhoadamente:


- Pouca energia, sem problemas, usa menos força do que qualquer computador
atualmente no mercado... Cancelem o maldito cheque!


Houve uma corrida coletiva para o telefone.


- O cheque visado? - disse o gerente. - Não precisa se preocupar. O Sr.
Potter descontou-o esta manhã.


Pickens, o mordomo, lamentava muito, mas o Sr. Potter fizera as malas e
partira.


- Ele falou alguma coisa sobre uma longa viagem.


Naquela tarde, um frenético Budge conseguiu finalmente entrar em contato com
o Professor Vernon Ackerman.


- Claro que lembro de Harry Potter. Um homem muito simpático. Ele é seu
cunhado?


- Professor, sobre o que conversou com Harry?


- Acho que não é segredo. Harry está querendo escrever um livro a meu
respeito. Ele me convenceu de que, o mundo está interessado no homem por trás do
cientista...


Seymour Jarrett mostrou-se reticente:


- Por que quer saber o que conversei com o Sr. Potter? É um colecionador de
selos rival?


- Não. Eu...


- Pois não vai adiantar bisbilhotar. Só existe um selo desse tipo e o Sr.
Potter concordou em vendê-lo a mim assim que o obtiver.


E ele bateu o telefone.


Budge sabia o que Charlie Bartlett ia dizer antes mesmo de ouvir as palavras:


- Harry Potter? Ah, sim... Coleciono carros antigos. Harry sabe onde existe
um Packard 37, quatro portas, conversível, em excelente estado...


Desta vez foi Budge quem desligou.


- Não se preocupem - disse ele a seus companheiros. - Recuperaremos o nosso
dinheiro e ainda meteremos o filho da puta na cadeia pelo resto da vida. Há leis
contra a fraude.


O grupo foi ao escritório de Scott Fogarty.


- Ele nos tomou duzentos e cinquenta mil dólares - explicou Budge ao
advogado. - Quero metê-lo atrás das grades pelo resto da vida. Providencie um
mandato para...


- Está com o contrato, Budge?


- Estou, sim.


Ele entregou a Fogarty o documento que Harry escrevera. O advogado examinou-
o rapidamente, depois leu mais devagar.


- Ele falsificou as assinaturas de vocês neste documento?


- Claro que não - respondeu Mike Quincy. - Fomos nós mesmos que assinamos.


- E leram antes?


Ed Zeller disse, irritado:


- Claro que lemos. Acha que somos estúpidos?


- Deixarei que vocês mesmos julguem isso, senhores. Assinaram um contrato em
que foram informados que estavam comprando, com uma entrada de 250 mil dólares,
uma coisa que não tinha patente e podia ser completamente sem valor. Nos termos
legais de um velho professor meu: "Vocês se foderam".


Harry obteve o divórcio em Reno. Foi quando estava lá, fixando residência
como era necessário para a concessão do divórcio automático, que se encontrou
com Cornélio Fudge. Fudge trabalhara outrora para Sirius. (como as coisas
mudavam com a guerra!!! - pensou Harry)


- Poderia me fazer um pequeno favor, Harry? - perguntou Fudge - Há uma jovem
viajando num trem de Nova York para St. Louis com algumas jóias...


Harry só aceitara porque era Hermione. Depois de separado, descobriu que
Lupin morrera, Sirius vendera tudo e se mudara para Londres, Rony estava casado
com Padma Patil e que Hermione fora presa e solta.


Agora, Harry olhou pela janela do avião e pensou em Hermione.


Havia um sorriso em seu rosto.


Quando voltou a Nova York, o primeiro lugar a que Hermione compareceu foi
Jewelry Store Fudge. Cornélio Fudge levou-a para sua sala e fechou a porta. Ele
esfregou as mãos e disse:


- Eu estava começando a ficar preocupado, minha cara. Esperei por você em St.
Louis e...


- Você não estava em St. Louis.


- Como? O que disse?


Os olhos azuis de Fudge pareciam faiscar.


- Disse que não foi a St. Louis. Nunca teve a intenção de se encontrar
comigo.


- Mas claro que tinha! Você está com as jóias e eu...


- Mandou dois homens me tirarem as jóias.


Uma expressão de perplexidade se insinuou no rosto do velho.


- Não compreendo...


- A princípio, pensei que houvesse um vazamento em sua organização. Mas não
havia, não é mesmo? Foi você. Disse-me que comprou pessoalmente a minha passagem
de trem. Portanto, era a única pessoa que sabia o número da cabina. Usei um nome
diferente e um disfarce, mas seus homens sabiam exatamente onde me encontrar.


A surpresa no rosto enrugado de Fudge era agora total.


- Está tentando me dizer que alguns homens lhe roubaram as jóias?


Hermione sorriu.


- Estou tentando dizer que eles não roubaram.


E desta vez o espanto no rosto de Fudge era genuíno.


- Você está com as jóias?


- Isso mesmo. Seus amigos ficaram com tanta pressa de pegar um avião que as
deixaram para trás.


Fudge estudou Hermione em silêncio por um momento.


- Com licença.


Ele passou por uma porta particular e Hermione continuou sentada no sofá,
esperando, perfeitamente relaxada.


Cornélio Fudge se ausentou por quase 15 minutos. Quando voltou, havia uma
expressão de consternação em seu rosto.


- Receio que um erro tenha sido cometido. Um grande erro. É uma jovem muito
esperta, senhorita Granger. Mereceu os seus 25 mil dólares. - Ele sorriu em
admiração. - Dê-me as jóias e...


- Agora são cinqüenta mil.


- Como?


- Tive de roubar as jóias duas vezes. E por isso o preço agora é de cinqüenta
mil, senhor Fudge.


- Não. - Os olhos dele perderam o brilho. - Não posso lhe dar tanto.


Hermione levantou-se.


- Não tem problema. Tentarei encontrar alguém em Las Vegas que ache que as
jóias valem isso.


Ela se encaminhou para a porta.


- Cinqüenta mil dólares? - murmurou Fudge.


- hum - hum.


- Onde estão as jóias?


- Num armário que aluguei na Estação de Pensilvânia. Assim que me der o
dinheiro e me puser num táxi, eu lhe entregarei a chave.


Cornélio Fudge deixou escapar um suspiro de derrota.


- Negócio fechado.


- Obrigada - disse Hermione jovialmente. - Foi um prazer fazer negócios com
você.



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