O Primeiro Roubo a Gente Nunca

O Primeiro Roubo a Gente Nunca



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Com os mil dólares que Cornélio Fudge lhe adiantara, Hermione comprou uma
calça comprida azul-marinho, um macacão preto e uma valise, imitação de Gucci,
em um ambulante que estava na Lexington Avenue. Até agora, tudo corria
perfeitamente, conforme Fudge prometera


Hermione recebeu um envelope contendo uma carteira de motorista, em nome de
Ellen Branch, um diagrama do sistema de segurança da casa da Sra. Bellamy, a
combinação do cofre no quarto e uma passagem da Amtrack para St. Louis, numa
cabina particular.


Hermione recolheu seus poucos pertences e partiu. Nunca mais tornarei a viver
num lugar como este, ela prometeu a si mesma. Alugou um carro, disfarçada com um
cabelo preto rasta, e a pele mais morena do que seria normal, e seguiu para Long
Island. Hermione achou melhor não aparatar, além de não saber ao certo a
localização da casa, estava indo cometer um roubo,o que a deixava muito nervosa.


O que fazia tinha a irrealidade de um sonho e ela sentia-se apavorada. E se
fosse apanhada? O que estava preste a fazer valia o risco?


É ridiculamente simples, dissera Cornélio Fudge. Ele não estaria envolvido em
qualquer coisa assim se não tivesse certeza absoluta. Ele tinha sua reputação a
zelar. Eu também tenho uma reputação, pensou Hermione amargurada, só que é a
pior possível. A qualquer momento que uma jóia esteja desaparecida, eu serei
culpada até que se prove a minha inocência.


Hermione sabia o que estava fazendo. Tentava se pôr num estado de raiva.
Tentava se preparar psicologicamente para cometer um crime. Mas não deu certo.
Ao chegar a Sra Cliff, era um destroço nervoso. Por duas vezes quase saiu com o
carro da estrada. Talvez a polícia me detenha por condução perigosa, pensou ela
esperançosa, poderei então dizer ao senhor Fudge que tudo saiu errado antes
mesmo de começar.


Mas não havia qualquer carro da polícia à vista. Claro, pensou Hermione
furiosa, eles nunca estão por perto quando se precisa.


Ela foi para o estreito de Long Island, seguindo a orientação de Cornélio
Fudge: a casa fica à beira do mar. Tem o nome de Embers. É uma antiga mansão
vitoriana. Não pode errar.


Por favor, Deus, faça-me errar, rezou Hermione.


Mas lá estava a casa, assomando da escuridão, como algum castelo gótico num
pesadelo. Parecia deserta. Como os criados se atrevem a tirar folga no sábado?!
- Pensou Hermione indignada.


Todos deveriam ser despedidos.


Ela levou o carro para trás de um grupo de enormes salgueiros, onde ficaria
escondido. Desligou o motor. Ficou escutando os ruídos noturnos dos insetos.
Nada mais perturbava o silêncio. A casa ficava longe da estrada principal e não
havia qualquer tráfego àquela hora.


A propriedade é protegida por árvores, minha cara, o vizinho mais próximo
está a acres de distância. Portanto, não precisa se preocupar com a
possibilidade de ser vista. A patrulha de segurança efetua a sua inspeção às dez
horas da noite e novamente às duas da madrugada. Hora que você já estará bem
longe. Hermione olhou para o seu relógio, eram 11 horas. A primeira inspeção já
fora feita. Ela tinha três horas antes que a patrulha voltasse para a segunda
inspeção. Ou três segundos para fazer a manobra com o carro e voltar à Nova
York, esquecer toda aquela loucura. Mas voltar para o quê? As imagens afloraram
espontâneas em sua mente. O gerente-assistente no Saks:


"Lamento profundamente, Senhorita Granger, mas devemos fazer a vontade de
nossos fregueses".


"Pode esquecer a idéia de trabalhar com um computador. Eles não contratarão
alguém que tenha uma ficha criminal... "São 25 mil dólares, livres de impostos,
por uma ou duas horas. Se tiver escrúpulos, saiba que ela é realmente uma mulher
horrível."


- O que estou fazendo?-Pensou Hermione.-Não sou realmente uma ladra. Não uma
ladra genuína. Sou uma estúpida amadora, que está preste a sofrer um colapso
nervoso.


Se eu tivesse metade de um cérebro, escaparia daqui enquanto ainda há tempo.
Antes que os homens da SWAT me encontrem, haja um tiroteio e levem meu corpo
crivado de balas para o necrotério. Posso ver a manchete: PERIGOSA CRIMINOSA
MORTA DURANTE TENTATIVA DE ROUBO FRUSTRADA.


Quem haveria de chorar em seu enterro? Ernestine e Amy. Hermione olhou para o
relógio.


- Oh, Deus!


Estava sentada ali, pensando, há 20 minutos.


-Se vou fazer, é melhor começar logo.


Ela não podia se mexer. Estava paralisada pelo medo. Não posso ficar sentada
aqui eternamente, disse a si mesma. Por que não dou uma olhada na casa? Apenas
isso, nada mais.


Hermione respirou fundo e saiu do carro. Usava o macacão preto. Podia sentir
os joelhos tremendo. Aproximou-se da casa lentamente e constatou que se achava
completamente às escuras. Não se esqueça de usar luvas, alertara Cornélio horas
antes.


Hermione meteu a mão no bolso, tirou um par de luvas, vestiu-as. Oh, Deus, eu
vou fazer!-Pensou ela.- Vou realmente seguir em frente e cometer um roubo. Seu
coração batia tão alto que não podia mais ouvir quaisquer outros sons.


O alarme fica à esquerda da porta da frente. Há cinco botões. A luz vermelha
estará acesa, o que significa que o alarme se acha ativado. O código para
desligá-lo é três-dois-quatro-um-um. Quando a luz vermelha se apagar, você
saberá que o alarme está desativado. Aqui está a chave da porta da frente.
Depois de entrar, não se esqueça de fechar a porta. Use esta lanterna. Não
acenda nenhuma das luzes da casa, pois sempre é possível que alguém passe de
carro. O quarto principal fica no segundo andar, à esquerda, de frente para o
mar. Encontrará o cofre por trás de um retrato de Lois Bellamy. É um cofre muito
simples. Tudo o que tem a fazer é seguir esta combinação.


Hermione ficou imóvel,tremendo,pronta para fugir ao menor ruído. Silêncio.
Lentamente, ela tirou a varinha do bolso da roupa. ''Se farei mesmo essa porra,
usarei magia!'' Ela se inclinou e apertou a seqüência dos botões do alarme,
rezando para que não desse sinal. A luz vermelha se apagou. O passo seguinte a
comprometeria irremediavelmente. Ela lembrou-se de que os pilotos de avião
tinham uma frase para isso: o ponto do qual não se podia mais voltar.


Hermione olhou para fechadura e se concentrando terrivelmente murmurou:


- Alorromora.


A porta se abriu. Ela esperou um minuto inteiro antes de entrar. Todos os
nervos de seu corpo vibravam num ritmo frenético quando parou no vestíbulo,
escutando, com medo de se mexer. Um silêncio de deserto povoava a casa.


- Lumos - e a ponta da varinha se acendeu. A sua direita, Hermione viu a
escada. Adiantou-se e começou a subir. Tudo o que queria agora era acabar com
aquilo o mais depressa possível e fugir.


O vestíbulo superior parecia fantasmagórico à pouca luz da varinha, o facho
bruxuleante fazia com que as paredes tremessem. Hermione espiou em cada cômodo
por que passou. Estavam todos vazios.


O quarto principal ficava no final do corredor, dando para o mar, exatamente
como Morgan o descrevera. Era aconchegante, numa tonalidade rosa suave, uma cama
de dossel e uma cômoda adornada com rosas. Havia duas poltronas, uma lareira e
uma mesa pequena de refeição na frente. Eu quase vivi numa casa assim, com Rony
e nosso filho, pensou Hermione.


Ela foi até a janela panorâmica e contemplou os barcos distantes, ancorados
na baía. Diga-me, Deus, o que o levou a decidir que Lois Bellamy deveria viver
nesta linda casa e que eu deveria estar aqui para roubá-la? Vamos, menina, ela
disse a si mesma, não se torne filosófica. Será uma vez só. Tudo irá acabar em
poucos minutos, mas não se ficar parada aqui sem fazer nada.


Hermione virou-se e foi até o retrato que Fudge descrevera. Lois Bellamy
tinha uma expressão dura e arrogante. É verdade, ela parece mesmo uma mulher
horrível. O quadro virava para fora, afastando-se da parede, havia um pequeno
cofre por trás.


Hermione memorizara a combinação. Três voltas para a direita, pare em
quarenta e dois. Duas voltas para a esquerda, pare em dez. Uma volta para a
direita, pare em trinta. Suas mãos tremiam tanto que ela teve de começar duas
vezes. Ouviu um clique. A porta do cofre estava aberta.


Em seu interior havia diversos envelopes grossos e documentos, mas Hermione
ignorou-os. Lá no fundo, sobre uma pequena prateleira, ela viu um saco de jóias
de camurça. Hermione estendeu a mão e levantou-o da prateleira, e foi nesse
instante que o alarme começou a soar, o barulho mais alto que já ouvira em toda
a sua vida. Parecia reverberar de todos os cantos da casa, gritando o seu
alerta. Ela ficou imóvel, paralisada pelo choque.


O que saíra errado? Cornélio Fudge não sabia do alarme dentro do cofre, que
era acionado quando se removiam as jóias da prateleira? - Perguntou-se Hermione.


Ela tinha de sair dali rapidamente. Meteu a bolsa de camurça no bolso e
começou a correr para a escada. E de repente, acima do som do alarme, ouviu
outro ruído, o barulho de sirenes se aproximando. Hermione parou no alto da
escada, apavorada, o coração disparado, a boca seca. Correu em direção a uma
janela, entreabriu uma cortina e espiou. Uma radiopatrulha preta e branca estava
parando diante da casa.


-Não posso mais fugir! Se desaparatar, acharão o carro e se for para lá, me
perseguirão, Meu Deus estou perdida!


Enquanto Hermione observava, um policial uniformizado correu para os fundos
da casa, enquanto um segundo se encaminhava para a porta da frente. Não havia
escapatória. O alarme ainda ressoava e subitamente parecia a terrível campainha
nos corredores da Penitenciária Meridional da Louisiana Para Mulheres.


Não! - Pensou Hermione. - Não permitirei que me mandem de volta para lá.


A campainha da porta da frente soou estridentemente.


---


O Tenente Melvin Durkin integrava a força policial de Sea Cliff há dez anos.
Sea Cliff era uma cidadezinha tranqüila e a principal atividade da polícia era
reprimir o vandalismo, uns poucos roubos de carros e ocasionais brigas de
bêbados nas noites de sábado. A ativação do alarme Bellamy se enquadrava numa
categoria diferente, era o tipo de atividade criminosa pelo qual o Tenente
Durkin ingressara na polícia. Ele conhecia Lois Bellamy e tinha conhecimento da
valiosa coleção de quadros e jóias que ela possuía. E com a Sra Bellamy
viajando, ele fizera questão de inspecionar a casa periodicamente, pois
constituía um alvo tentador para qualquer ladrão. E agora, pensou o Tenente
Durkin, parece que peguei um. Ele se encontrava apenas a dois quarteirões de
distância quando recebera a chamada pelo rádio da companhia de segurança. Isto
ficará sensacional na minha folha!


O Tenente Durkin apertou a campainha da porta da frente. Queria poder
registrar em seu relatório que tocara a campainha três vezes, antes de forçar a
entrada. Seu companheiro cobria os fundos e assim não havia qualquer
possibilidade de o ladrão escapar. Ele tentaria provavelmente se esconder no
interior da casa, mas teria uma surpresa. Ninguém podia se esconder de Melvin
Durkin.


Quando o tenente estendia a mão para tocar a campainha pela terceira vez, a
porta da frente se abriu subitamente. Ele ficou aturdido. Parada à sua frente se
achava uma mulher, numa camisola fina, que deixava muito pouco à imaginação. O
rosto se apresentava coberto por um creme escuro, os cabelos metidos numa touca.
Ela perguntou:


- Que diabo está acontecendo?


Tenente Durkin engoliu em seco.


- Eu... quem é você?


- Sou Ellen Branch. Uma hóspede de Lois Bellamy. Ela está na Europa.


- Sei disso. - O tenente ficou confuso. - Ela não nos disse que teria uma
hóspede.


A mulher na porta balançou a cabeça ironicamente.


- Isso não é típico de Lois? Com licença, mas não posso suportar este
barulho.


Enquanto o Tenente Durkin observava, a hóspede de Lois Bellamy estendeu a mão
para os botões do alarme, apertou uma seqüência de números. O som cessou.


- Assim está melhor. - Ela suspirou. - Não posso lhe dizer o quanto estou
contente em vê-lo.


A mulher fez uma pausa, rindo, trêmula.


- Eu estava me aprontando para deitar quando o alarme começou a tocar. Tinha
certeza de que havia ladrões na casa e me encontro sozinha aqui. Todos os
criados saíram de folga ao meio-dia.


- Não se importa se dermos uma olhada?


- Por favor, eu insisto!


O tenente e seu companheiro levaram apenas poucos minutos para se
certificarem de que não havia ninguém à espreita no interior da residência.


- Tudo certo - anunciou o Tenente Durkin. - Alarme falso. Algum defeito deve
tê-lo ativado. Nem sempre se pode confiar nesses inventos eletrônicos. Eu
ligaria para a companhia de segurança e pediria que verificassem o sistema.


- É exatamente o que vou fazer.


- Acho melhor eu ir. . .


- Obrigada por ter vindo. Eu me sinto muito mais segura agora.


Ela tem mesmo um corpo sensacional, pensou o Tenente Durkin. Ele se perguntou
como a mulher pareceria sem o creme no rosto e sem a touca.


- Ficará aqui muito tempo, Senhorita Branch?


- Mais uma ou duas semanas até Lois voltar.


- Se houver algo que eu possa fazer, basta me avisar.


- Obrigada. Não esquecerei.


Hermione ficou observando enquanto o carro da polícia se afastava pela noite.
Sentiu que podia desmaiar de alívio.


Depois que o carro sumira, ela subiu correndo a escada. Tirou do rosto o
creme que encontrara no banheiro, arrancou a touca e a camisola de Lois Bellamy,
tornou a vestir o seu macacão preto e saiu pela porta da frente, tornando
cuidadosamente a ligar o alarme.


Foi somente quando já atingira a metade do caminho de volta a Manhattan que
Hermione absorveu completamente a audácia do que fizera. Ela soltou uma
risadinha, que acabou se transformando em gargalhadas trêmulas e incontroláveis,
até que finalmente parou o carro à beira da estrada. E continuou a rir, as
lágrimas escorrendo pelas faces. Era a primeira vez que ria em um ano inteiro. E
a sensação era maravilhosa.


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