O Acidente - PoV Scorpius



Então Rose bateu a porta na minha cara. Não era justo, eu estava tentando conciliar tudo e não havia outra solução. A culpa não era inteiramente minha e ela sabia disso...


            Ouvi o motor do carro ligar. As crianças não estavam em casa, por tanto se ela fosse sair, provavelmente iria para  a casa dos pais. Ela acelerou, e foi embora. Nós morávamos em um condomínio, portanto ela só pararia no final da rua para esperar o portão se abrir... Ou não, pois como era feriado, os portões deveriam estar abertos.


– Magnólia?! – Berrei, tentando constatar que ainda havia alguém em casa.


Um silêncio ensurdecedor foi o que obtive como resposta. Acho que Rose havia dispensado nossa empregada por causa do feriado de Natal. Aliás, deveríamos ter ido para a casa da família dela - A Toca – se ela não tivesse brigado comigo e dirigido por aí sem rumo. Sim, eu sabia que minha rosinha estava fazendo exatamente isso agora.


Rose de certa forma era previsível e ao mesmo tempo imprevisível, e isso era tão atraente para mim... Ela não imaginava o quanto. Eu detestava saber que ela havia pego o carro e agora dirigia por aí completamente nervosa, sabe-se lá o que poderia acontecer.


Nessa manhã, antes das crianças irem para a casa dos bisavós maternos,  havia acordado com uma sensação ruim. Estava inquieto e Rose tinha notado isso logo no café, até me perguntara se era algo da empresa ou o que, mas nem eu mesmo sabia dizer.


Meia hora depois da briga, estava sentado no sofá quando me ligaram. Rose havia sofrido um acidente de carro. Aquilo fazia minha cabeça girar... A mãe dos meus filhos e mulher da minha vida, estava agora em um hospital, correndo o risco de entrar em coma. E se acordasse, será que estaria tudo bem com ela??


Fui visita-la enquanto ainda estava dormindo. Seu rosto parecia o de um anjinho, e havia alguns arranhões perto do supercílio mas não era nada grave. Rose não havia quebrado nada, embora, segundo Dr. Jeremy – que fora colega do Louis na faculdade trouxa, primo da minha ruiva – ela corria o risco de ficar em coma, ou ter amnésia. Nem sei o que é pior...


Voltei no dia seguinte. 


Agora ela estava melhor embora estivesse pálida ainda. Fiquei até o horário de visitas do hospital trouxa acabar e fui embora pois precisava passar na casa dos meus sogros para ficar um pouco com as crianças.


 Eles haviam dito aos meus filhos que iriam ficar por um tempinho alí, ou pelo menos até que a mãe deles saísse do hospital. Tive que explicar aos dois o que havia acontecido com Rose (amenizei a situação, inclusive) e que ela deveria ficar lá por um tempo até ser liberada e poder voltar para cada.


Foi deprimente vê-los triste, mas pedi para que fizessem desenhos a ela para que entregássemos quando saísse do hospital.


Então voltei no terceiro dia.


Entrei no hospital e a enfermeira chefe estava encostada no balcão conversando com a recepcionista. Ela novamente deu em cima de mim e tive que rir e fingir que não havia percebido a indireta. Amava Rose e não queria que isso acontecesse...  Me dirigi ao elevador e esperei por ele. Trazia flores para a minha ruiva, aliás, as preferidas dela: rosas vermelhas.


Então quando o elevador chegou, subi dois andares e ao sair dei de cara com Hugo. Não sogros haviam deixado-o entrar pois acreditavam que poderia ser demais para a ruiva receber tantas visitas em um dia só. Segundo Hugo, que segundo Ron, Rose havia acordado.


Então entrei sem nem bater a porta.


Lá estava ela, deitada, com uma carinha melhor e ao mesmo tempo com uma expressão de quem estava confusa. Encarei Rony e Hermione e percebi que eles estavam do mesmo jeito, e Jeremy me encarou preocupado. Alguma coisa estava errada...


Rose me encarou com seus olhos esverdeados e sua pergunta foi como uma facada no meu peito.


– Ahn?? O que ele está fazendo aqui??


Ela parecia mais confusa ainda por me ver. Agora eu sentia até nos meus ossos que algo errado se passava.


– Ele? – Perguntei, usando o mesmo tom de insignificância que ela tentara esconder quando falara de mim.


 Rony e Hermione me encararam como quem quer conversar, e entendemos pelo olhar de Jeremy que ele pretendia fazer isso.


Saímos do quarto – sem graça, aliás – em que Rose estava e no corredor conversamos nos quatro, pois resolveram informar ao Hugo o que se passava.


– Tenho que ser franco... Tem algumas coisas acontecendo e não sei até onde vocês sabem. – Jeremy desabafou, enquanto andávamos até a sala dele.


Mal entramos e meu sogro o bombardeou com perguntas.


– Rose está com amnésia, mesmo?? Quando ela vai voltar ao normal?? O que vamos fazer agora? – Seu rosto estava vermelho de preocupação, literalmente


– Ron, acalme-se. – Ordenou uma Hermione irritada.


– Senhor Weasley, ela pode ficar assim por um tempo indeterminado. Pode ser semanas, meses ou até mesmo anos. – Jeremy nos informou.


– Anos? – Perguntei furioso enquanto me levantava da cadeira e quase a derrubava.


 Ele me encarou como quem diz  “é melhor você sentar” e foi o que acabei fazendo.


– Sim. E não para por aí, ela pode não se lembrar de você e nem de outras pessoas, mas pelo menos se lembra de algumas coisas recentes pelo que entendi.


 Eu o encarei furioso.


– Pois é, mas de mim ela não se lembra... Imagina então dos próprios filhos! – Agora estava praticamente berrando de raiva.


– Acalme-se senhor Malfoy, ou vou ser obrigado a lhe dar um calmante...


– Eu não quero me acalmar, quero falar com a minha esposa! Ela TEM QUE se lembrar de mim.... – O final da frase soou mais como um choramingo, e meus olhos se encheram de lágrimas.


            Hermione se levantou, serviu um copo com água e me entregou. Relutante eu o peguei, e beberiquei um pouco do conteúdo. Hugo me puxou e fez com que eu me sentasse novamente.


– Tudo o que vocês precisam fazer é estimular a memória dela, Scorpius. Depois que sair daqui, ela precisa de atenção muita paciência... – Eu o interrompi.


– E você acha que eu não tenho tudo isso com a minha própria esposa? – Perguntei, sarcástico, enquanto ele me olhava torto.


– Não. Não ponha palavras na minha boca...


– Será que dá pra manter o foco?? Estamos nos desviando do assunto. – Protestou Hugo.


– Certo. Bem, eu descobri mais uma coisa com a bateria de exames que fizemos quando ela chegou no hospital... – Jeremy informou cauteloso enquanto me encarava.


– O que?


– Ela está grávida. Você sabia disso? – Ele observou.


 Então eu praticamente paralisei...


 Minha ruiva está grávida e eu não tinha nem ideia disso... Será que ela iria contar pra mim antes desse maldito acidente e não deixei??


Como sempre,  eu só pensava em mim... Contei à ela o que não devia e nem sei o que ela ia me dizer antes daquela maldita briga que ferrou com tudo. Será que era isso?? Bem, a culpa não era totalmente minha, afinal, aquele maldito motorista bêbado bateu de frente do carroda Rose...


– Não. – Foi a única coisa que consegui responder. Rony também estava atônito, talvez tanto quanto eu.


            Sim, agora além de não se lembrar de mim, e provavelmente dos nossos filhos, ela esperava um filho que nem sabia que existia... E que era nosso.


            Hermione me encarou e eu senti que alguém finalmente ia dizer alguma coisa sensata.


          – Scorpius, você não pode deixar Rose saber de nada disso por enquanto... Nem de vocês, nem dos meninos e nem dessa criança, por que eu não tenho a mínima ideia do que isso pode acarretar pra ela. Você me entendeu? – Ela perguntou lenta e claramente, enquanto encarava meus olhos.


– Sim.


– Concordo com a Sra. Weasley. No momento isso é o mais correto a se fazer, ou pelo menos até ela se lembrar de tudo.


– E se ela não se lembrar??


– A gente faz ela lembrar. – Rony saiu do transe e cortou o médico.


            Conversamos por mais quarenta minutos e Jeremy achou melhor voltarmos para o quarto de Rose – menos Hugo - assim que terminássemos, não era bom para ela ficar sozinha agora.


            Fui o último a entrar e ela parecia mais calma agora. Resolvi perguntar qualquer coisa para ver do que minha ruiva se lembrava.


– Oi Rose, você se lembra mesmo de mim?? – Perguntei, sentindo a expectativa irradiar pelos meus poros.


Fitei seus olhos verdes e sua voz doce me atingiu fatalmente.


– Sim, fomos colegas na escola... Eu acho. 


Me senti um completo inútil ao detectar que minha própria esposa não lembrava que era casa comigo... Resolvi insistir um pouco então.


– Você acha? – Perguntei, irônico, e ela me olhou torto.


– Se for começar com as suas ironias, é melhor ir embora. Não é minha culpa se, segundo o Dr. Jeremy, estou com amnésia. Ao menos eu me lembro que nunca fui com a sua cara de doninha albina...


            Sim, lá estávamos nós, exatamente como nos velhos tempos: brigando como cão e gato. Eu não ia desistir de fazer ela se lembrar de tudo o que passamos juntos... Não ia mesmo.


– Céus... – Rony finalmente se manifestou de novo. Sua expressão era de preocupação ao mesmo tempo em que ele me encarava como quem pede desculpas. O encarei como quem diz “não é culpa nossa”.


– O que o Malfoy está fazendo aqui afinal?? – Consegui notar através do tom de sua voz e de sua expressão que Rose estava extremamente irritada agora.


Então para quebrar a tensão, resolvi implicar um pouquinho com ela e ver se isso a fazia lembrar de alguma coisa... Ou de como costumávamos ser.


– Eu soube do acidente e vim te visitar, Daisy.


– É Rose. – Ela revirou os olhos e tive que rir.


– Eu sei que é Rose, mas gosto de te irritar. E é tudo nome de flor, de qualquer maneira... – Observei, enquanto me rendia e mostrava para ela quem realmente eu era. Queria que Rose sentisse que sou uma pessoa confiável apesar de tudo, apesar do que ela pode vir a se lembrar de mim.


– Você tem senso de humor... – Ela tentou quebrar o clima e sorri sem mostrar os dentes, pois sabia isso era típico dela quanto as coisas tomavam um rumo preocupante.


Resolvi então me aproximar e me sentar na cadeira que estava ao lado dela, bem perto da cama. Não sei o que ela enxergou em mim, mas eu pude ver nos seus olhos que ela tentava facilitar as coisas para mim.


– O que você se lembra em relação a mim? -  Senti minha voz falhar no final, mas tentei não demonstrar isso. Ela não precisava de motivos para desconfianças agora.


– Muito pouca coisa... –Ela  admitiu  sem graça ao perceber o quanto queria que ela se lembrasse de mim.


            Admito que estava forçando a barra, mas eu precisava que ela se lembrasse. Amava aquela mulher mais do que tudo e não seria uma porcaria de uma amnésia que me faria desistir dela... Nem mesmo Ron nos separou quando tentou, imagina se uma coisa passageira como essa conseguiria.


– Tipo o que exatamente?? – Insisti.


– Por que faz tanta questão de que me lembre de você, Malfoy?? Me lembro só de que devo manter distância e nunca olhar pra sua cara arrogante. Aliás, creio que não nos vemos há algum tempo, não?? – Rose perguntou, agora sendo ela a arrogante na conversa.


            Não posso negar, aquilo doeu. Aquele tom de voz que ela raramente usou comigo antes, era como se ela pisoteasse em mim agora. Não deixei minhas emoções transparecerem, afinal, eu era um Malfoy e isso era intolerável na minha família. Ainda mais por que Rose estava com Amnésia e podia usar qualquer maldita coisa contra mim agora, mas se eu a fizesse lembrar de algo....


É. Faz algum tempinho mesmo... – Havia um duplo sentido tanto na minha voz quanto na minha frase, e eu esperava que ela continuasse sendo esperta a ponto de perceber e ficar intrigada.


Jeremy interrompeu e ainda por cima me olhou com cara de pena. Não precisava que ele sentisse pena de mim... Mas apesar disso, não demonstrei nem mesmo raiva ou antipatia por ele.


– Senhor Malfoy, creio que seja melhor deixar Rose descansar. Pode voltar outra hora se quiser...


– Por que vocês fazem questão de deixa-lo me ver?? O que isso importa pra ele?? – Rose se manifestou, furiosa, e eu tive medo que ela resolvesse me encher de coisas.


            Me rendi. Ou pelo menos por hora sim....


– Ok, volto outra hora. Posso deixar isso aqui?? – Levantei uma das mãos e ela finalmente notou que havia um buquê de rosas vermelhas nela. Havia trazido comigo durante todo o caminho, aliás. E eram as preferidas dela, por isso tinha pensado que seria uma boa ideia trazer.


Seria. Se ela lembrasse, teria sido.

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