Capítulo 2: Entrega Grátis



- Drª Granger? - a voz da secretária de Hermione cortou o ar.


-Sim, Stella? - ela respondeu para parede.


- O Sr. Finch-Fletchley está aqui para vê-la.


-Mande-o entrar.


Alguns segundos depois, seu companheiro de casa entrou. Uma pequena sacola de papel marrom em suas mãos e um sorriso no rosto. -Entrega grátis. - ele disse, sentando na mesa dela. Ele começou a tirar comida da sacola e a colocar sobre a mesa. Uma garrafa de chá gelado. Um cacho de uvas. Um grande prato com fatias de queijo meticulosamente arrumadas. Um molheiro prateado do qual saía o aroma do molho de tomate de Jorge, o favorito dela.


Hermione sorriu satisfeita enquanto ele tirava os pratos e talheres da sacola. -O que é isso tudo?


Justino amassou a sacola. - Você vive reclamando que nunca tem tempo pra comer. Problema resolvido!


Ela pegou uma tigela e a concha. - Ah, eu podia te beijar agora!


-Não obrigado. Não jogo pra esse time - ele colocou algumas uvas na boca. -Você estava bastante quieta durante o café.


Hermione deus de ombros. O aroma de sopa temperada com alho invadindo suas narinas. -Quem consegue falar alguma coisa quando Cho está em casa?


Justino riu. - Bem que tive a impressão de te ver olhando feio pra ela. Qual é o problema?


-Problema nenhum.


-Ah, qual é. Como mediador oficial da casa, é minha responsabilidade ouvir e ajudar a resolver qualquer dificuldade entre os habitantes de lá.


Hermione pensou por um momento, colocou seu prato de sopa sobre a mesa e olhou para Justino. -Você sabe o que Harry faz pra viver?


Ele pareceu surpreso, com a aparente repentina mudança de assunto. - Parei de me perguntar anos atrás. Quer dizer, nossa... ele é o bruxo com mais opções de emprego do hemisfério e tudo o que ele diz é que "trabalha". Meio vago, não é mesmo?


-Cho parece saber todos os detalhes.


Ele franziu a testa. -Sério?


-E mal podia esperar pra me contar ontem.


-E o que ela disse?


Hermione considerou por um momento se deveria dizer ou não... mas só por um momento. Ou a notícia era verdadeira, e no caso o segredo dele já fora revelado, ou era mentira e não importava. -Ela disse que ele é um espião.


Justino não ficou surpreso. -Bem, naturalmente. O que mais ele poderia fazer? Tinha que ser isso, não é? Que outra carreira seria suficiente para o famoso Potter? Professor? Escritor de feitiços? Algum posto chato no Ministério? - uma ponta de amargura apareceu em sua voz por alguns segundos. - E isso com certeza explicaria algumas coisas.


-Foi exatamente o que eu pensei! - ela disse. -As horas malucas, os ferimentos, todo o segredo...


-Então você acredita nela?


-Bem... Acho que sim. Não tenho nada que prove o contrário.


-Não é isso que está te incomodando.


-Não. Se era um segredo tão grande, que ele escondeu de nós por anos, por que contar a *ela*?


Justino deu de ombros. -Acho muito estranho ele ter contado a ela e não a você.


-Acha que ela está inventando?


-Não disse isso. É só que... - ele limpou a garganta, desconfortável. - Acho que Cho tem certos objetivos em relação a Harry, e acho que seria bom pro lado dela se você pensasse que ele confia nela. - terminou escolhendo suas palavras com o máximo de diplomacia.


Ela franziu a testa. -Isso soa tão... maquiavélico. Não posso acreditar que ela seria tão baixa.


- Claro que pode acreditar. Você a conhece há... quanto tempo? Doze anos? Cho tem muitas qualidades a seu favor, mas ser justa em relacionamentos não é uma delas. Não lembra a armação que ela fez para aquele monitor da Lula-lufa... Qual era o nome dele?


Hermione sorriu. -Kirby Storping-Goyter.


-É esse mesmo. Bem, ele tinha acabado de começar a namorar Syren Sagyramius e parecia que Cho tinha perdido


-Ela colocou uma Poção da Chatice de Syren – Hermione lembrou, sorrindo. -A coitada não conseguia falar de nada além de engenharia mecânica e da história da metalurgia de caldeirões durante dias. Quando estava perto de acabar, parecia que ela acabaria se matando de tédio.


-Depois desse encontro, que provavelmente foi o mais longo de sua vida, Kirby largou Syren e Cho teve sua chance. Eu poderia continuar ainda.


-Não é a mesma coisa.


-Não estou dizendo que é. Só estou dizendo que não descarto a possibilidade de ela estar inventando. Mesmo se o que disse for verdade, ela poderia ter descoberto de milhões de formas que não envolvem ele contando a ela. Harry guarda seus segredos com muito zelo. Se ele quisesse que alguém soubesse, teria dito a *você*. É a melhor amiga dele, Hermione. Não deixe que ninguém, como Cho no caso, te convença do contrário.


*****


Enquanto dois de seus companheiros de casa discutiam sua carreira durante o almoço, a vários quilômetros de distância Harry Potter estava em seu escritório lendo o pergaminho de um elfo que trabalhava na vigilância pra ele. Seus lábios se contorceram enquanto lia... Parecia que só recebia notícia ruim esses dias. Um rosto apareceu em sua porta. - Recebeu o bilhete de Sabian?


Harry levantou os olhos para o visitante, olhando por cima de seus óculos. - Que bilhete?


Remo Lupin entrou e vasculhou os papéis em cima da mesa de Harry até que encontrou um pequeno pergaminho enrolado bem apertado. - Esse bilhete. Leia.


Ele desenrolou e leu, franzindo as sobrancelhas. Olhou para Remo, com os olhos arregalados. -Isso está certo? Não pode estar.


Harry jogou os óculos na mesa e apertou a ponta do nariz como se tivesse com princípio de uma dor de cabeça... O que era verdade. -Achei que a enxurrada estivesse contida.


-Todos pensávamos isso, Harry.


-Bem, não posso me preocupar com isso agora. Se piorar, mando uma equipe. - olhou para Lupin, que parecia estar segurando um sorriso. - Que foi? Você parece um homem com um segredo.


-Ah, estou apenas me divertindo com esse momento.


Harry, completamente confuso, suspirou. - Não vou cair nessa.


-Adivinhe o que tenho atrás das costas.


-Umm.... é maior do que uma caixa de pão? É conhecido pelo seu trabalho no cinema?


-Não é não.


-Vai me fazer querer te matar?


-Provavelmente. - puxou uma revista e mostrou, o sorriso aparecendo. Harry viu que era o "Semanário das Bruxas..." E seus olhos se arregalaram em horror ao ver que na capa estava seu próprio rosto.


-Não - ele disse chocado -Por favor, diga que é uma brincadeira. - O Harry da fotografia olhava furtivamente a seu redor, como se tentasse escapar.


-É o resultado do concurso do Sorriso mais Charmoso! Te dou três tentativas pra adivinhar quem ganhou, e as duas primeiras não contam.


Harry levantou num pulo e tirou a revista das mãos de Lupin, corando até a raiz dos cabelos quando percebeu que o amigo não estava brincando. - Não acredito - resmungou.


-Lockhart vai ficar furioso - Lupin disse, seu sorriso aumentando. -Você tirou sua seqüência.


-Eu *nunca mais* vou ter paz por isso - Harry disse, jogando a revista na mesa e esfregando os olhos. -O pessoal lá de casa vai ter um ótimo dia.


-Só estou surpreso que tenha demorando tanto. - Lupin disse. -Sendo o herói famoso mundo afora que você é...


-Você gosta do seu *emprego*, Remo? - Harry retrucou, mas seus olhos sorriam. Lupin levantou as mãos em súplica.


-Certo, certo.. não precisa lembrar a hierarquia. Só estava comentando... - foi interrompido por Edwiges, que passou com pressa por sua cabeça e pousou no ombro de Harry, empurrando o bilhete que carregava na mão dele. Harry o pegou, seu bom humor evaporando... sabia que a mensagem devia ser importante pelo jeito que Edwiges estava agindo. Leu o bilhete, ficando pálido durante o processo.


-O que foi? - Lupin perguntou, se aproximando.


-Leland. Eles o encontraram.


O queixo de Lupin caiu em choque. - Ele está bem? O que...


Harry o interrompeu, balançando a cabeça. -Só diz aqui que estão com ele no Confinamento. - Isso não era um bom sinal. O Confinamento era o lugar onde te colocavam se tivesse a infelicidade de ser vítima de um ataque mágico que não pudesse ser revertido. Era um lugar horrível. Bruxos que puxavam os próprios olhos apenas para que crescessem novamente. Bruxas que não conseguiam fazer nada além de sentar em um canto e gritar até que suas gargantas partissem. Tristes e horripilantes cacos de pessoas cujas defesas contra as artes das trevas não foram compatíveis aos ataques que enfrentaram, e que não podem fazer nada além de esperar e ter a esperança que pesquisadores bruxos acharão um novo feitiço ou poção para ajudá-los. Pensar que Leland estava naquele lugar era no mínimo sinistro... Especialmente para Harry e Lupin, que sabiam muito bem que poderia ser um deles. Bastaria encontrar um bruxo das trevas que fosse um pouco mais esperto num dia em que estivesse de folga e você passaria o resto de sua vida no Confinamento, certo de que besouros lhe comiam por dentro.


O queixo de Lupin finalmente voltou a trabalhar. -Vamos lá. - Harry concordou triste, jogando o bilhete sobre a mesa. Segurou o braço de Lupin e estreitou os olhos em concentração, até que sentiu um puxão familiar no umbigo e o escritório começou a se dissolver. Desapareceram do escritório de Harry e reapareceram num corredor branco e estéril. Lupin deu um passo pra o lado, tremendo. Como um ser metamórfico, com as estruturas instáveis, aparatar era muito difícil pra ele. Na verdade, ele não conseguia sozinho e por isso Harry teve que ajudá-lo. Uma bruxa muito séria com curtíssimos cabelos loiros-platinados os esperava.


-Boa tarde, Chefe - disse para Harry, seus olhos pousando um segundo sobre Lupin.


-Vim assim que recebi sua coruja. Como ele está?


-Não muito bem - olhou mais demoradamente para Lupin.


-Ah, desculpe - Harry disse, lembrando que tinha educação. -Esse é Remo Lupin, um de meus agentes. Remo, essa é Elektra Stillwagon, a chefe do setor. - os dois apertaram as mãos. -Ele estava trabalhando com Leland na época do desaparecimento.


Elektra começou a guiá-los pelo corredor. -Ele está lá. Tivemos que aplicar um feitiço sedativo. Receamos que ele possa se ferir.


Harry balançou a cabeça, pressionando os lábios com fortemente juntos -Onde o encontraram?


-Um bruxo americano de férias no Canadá recebeu uma coruja anônima, seguiu as instruções que lhe passaram e o achou no meio de uma floresta amarrado a uma rocha.


Harry parou no meio do corredor. -O quê?


-Eu sei - Elektra disse, reconhecendo a estranheza da situação toda. Continuaram andando.


-Ele foi visto pela última vez no Nepal. - Lupin disse, frustrado, passando a mão pelos cabelos desgrenhados. -Como ele foi parar no Canadá? - chegaram a uma sólida porta branca com uma pequena janela na parte de cima.


Elektra levantou a mão. - Agora, devo avisá-los. Ele está quase irreconhecível. A mente dele está quase toda... Bem, onde quer que ele estivesse, e por quer tenha passado, quase o destruiu. Ele pode não reconhecê-los. Preparem-se. - Harry e Lupin trocaram olhares preocupados enquanto ela abria a porta.


Entraram no pequeno quarto, com cadeiras confortáveis e almofadas. Deitado encolhido no canto estava Leland Stormare, um bruxo da inteligência assim como Harry e Lupin... Só que Leland ficou desaparecido por dois meses. Apesar de todas as buscas e dezenas de Feitiços Buscadores, não conseguiram achá-lo. E agora ali estava ele, misteriosamente de volta.


Harry se aproximou devagar e se agachou até ficar na altura dele. -Leland? Pode me ouvir? - sentiu seu coração doer ao vê-lo. Leland era um bruxo alto, forte e robusto com uma pele áspera e um vasto cabelo acaju que sempre falava com voz alta e confiante e tinha uma risada parecida com grandes sinos tocando. Sempre parecia conseguir preencher todos numa sala em que entrava. Mas aquele bruxo alegre tinha muito pouca semelhança com a pilha que tremia no chão à sua frente. Seu corpo musculoso fora reduzido a um monte de galhos frágeis e esqueléticos, seu cabelo estava ralo, caindo e manchados de cinza. Ao ouvir a voz de Harry, Leland virou a cabeça devagar para encará-lo... Harry teve que se esforçar para não recuar. Os olhos azuis brilhantes de Leland agora eram cinzas e sem vida e pareciam olhar através dele para um lugar infernal que somente ele podia ver.


-Harry? - sua voz falhou. Seus olhos focalizaram Harry e ele levantou uma de suas mãos, tremendo, para segurar o antebraço de Harry.


-Sou eu, Leland. Remo também está aqui. Sabe onde você está?


-Sorry, Harry. Sorry! - Leland soluçou.


-Shhh, não tem que se desculpar. Estamos felizes que esteja de volta... lembra o que aconteceu?


-Eu vi... Eu vi uma floresta de espinhos... O rio corria vermelho com sangue... - Harry e Lupin trocaram outro olhar preocupado. -Tam Htab... sorry, sorry...


-Ele fica repetindo isso - Elektra sussurrou. -Fica dizendo que lamenta, e falando "tam htab". Isso significa alguma coisa pra você?


Harry balançou a cabeça. -Não, não entendo nada. - Leland segurou o outro braço de Harry e ficou de joelhos, olhando fixamente para Harry com um olhar penetrante e assustado como se reunisse toda sua concentração.


-Sorry - ele disse enfático. Harry fez que sim com a cabeça, tentando encorajá-lo. Leland começou a tremer todo. -É sempre inverno... tam htab - conseguiu dizer. De repente, seus olhos reviraram pra dentro das órbitas e ele apertou os braços de Harry. Elektra correu até eles, a varinha em punho, e colocou Leland no chão recoberto. Harry recuou, ainda sentindo o aperto fantasmagórico dos dedos esqueléticos de Leland em seus braços. Lupin estava de costas, sem conseguir olhar.


-Deus do céu, Harry - ele disse rouco. -O que fizeram com ele? E quem?


Harry ficou olhando enquanto Elektra acalmava Leland com um feitiço. -Não sei, mas algo me diz que vamos descobrir logo.


**********


Quando Hermione chegou em casa naquela noite, Cho já tinha ido embora. Outra viagem com os Minotauros a manteriam longe nas próximas quatro semanas, e Hermione tinha que admitir, não lamentava.


Laura cortava vegetais na cozinha quando ela entrou. -Jorge vai passar a noite em Kent; viagem de negócios. - ela disse sem pestanejar. -Então achei melhor ajeitar algo pra você, pra mim e Justino.


Hermione olhou para as panelas ferventes atrás dela e tentou ignorar o aroma de alguma coisa queimando. -Não podemos mandar uma coruja pra pedir uma pizza ou algo assim?


Laura apontou a faca para Hermione. -Sou perfeitamente capaz de lidar com atividades básicas de cozinha.


-E o que seria básico? Ferver a água?


Antes que Laura pudesse replicar, uma panela fechada explodiu com uma gosma do que parecia molho de tomate, a tampa voando pela cozinha como se fosse um pequeno frisbee de metal. Laura e Hermione pularam e depois se abaixaram pra evitar que fossem decapitadas. Levantaram-se devagar, olhando os montes de molho vermelho espalhados nas paredes e no teto. Laura tirou o avental, decidida e o jogou no balcão. -Pizza, então. - disse, desligando o fogo com movimentos firmes do pulso, como se tentasse desligar também suas aventuras na cozinha.


Passaram pelo corredor até a alcova onde Fausto vivia. Quando se mudaram, somente Harry tinha coruja própria então eles compraram juntos uma coruja para casa... Só que no momento ele não estava lá. Hermione e Laura se entreolharam e deram de ombros. -Deve ter ido levar correspondência. - Laura disse.


Como se tivesse sido chamado, a porta de coruja se abriu sobre a entrada principal e Fausto entrou voando, derrubando um monte de cartas na caixa de correio e pousando sobre seu poleiro dando um pio de alegria. Hermione deu a ele um pouco de água e um bilhete para a pizzaria. -Pode esperar uns minutos pra recuperar o fôlego se quiser. - ela disse a ele. Fausto pareceu dar um suspiro e balançou as penas, depois partiu novamente. Laura olhava o correio.


-Uma pra você - ela disse, entregando um grosso envelope creme com o selo de Hogwarts. Reconheceu a letra de Minerva imediatamente. -Droga, nenhuma carta do meu docinho. Ah, bem... É melhor limpar aquele molho marinara antes que ele endureça - voltou pra cozinha, deixando Hermione que sentou no parapeito da janela e leu sua carta.


Querida Hermione - dizia - Não precisa mais pesquisar sobre as derivações do Feitiço de Mogrificação, já achei a referência que precisava. Mas aprecio os esforços que tenha feito por mim.


Mas esse não é o único motivo pelo qual escrevo. Há varias semanas me pergunto se devo discutir um assunto com você e decidi que não posso mais guardar isso pra mim mesma. A verdade é que estou muito preocupada com Harry. Não sei o quanto ele te conta sobre a vida dele e sobre o que ele faz... Eu mesma não tenho certeza de qual é a ocupação dele. Isso, entretanto, não diminui a preocupação que me ocupou ao ouvir certas informações que chegaram até mim.


Hermione franziu as sobrancelhas enquanto continuava a ler.


O fato é que recebi informações de uma natureza alarmante envolvendo as atividades dele. Por exemplo, semana passada um amigo muito próximo, um ex-colega de Hogwarts, me disse que encontrou com Harry em Hong Kong, numa parte muito perigosa da cidade dominada por bruxos das trevas e por magia negra. Meu amigo trabalha para o Departamento de Defesa e estava lá numa missão, mas disse que Harry foi muito evasivo em suas explicações sobre as razões pra estar naquela parte da cidade. Outro relato me diz que Harry esteve em uma reunião social com dois conhecidos bruxos das trevas em algum lugar de Nova Iorque alguns meses atrás. Hermione, eu poderia preencher várias páginas com relatos semelhantes. Também posso ressaltar que aqueles que o viram nessas circunstancias notaram que sua cicatriz não estava visível. Você e eu sabemos que Harry é poderoso o suficiente para camuflar a própria aparecia se assim quiser... O fato dele estar fazendo isso para contatar forças das trevas é no mínimo preocupante.


Não estou sugerindo que Harry tenha mudado para o lado das trevas ou que tenha inclinações para fazer isso... apesar de outros não estarem tão seguros da integridade dele quanto eu e você. O que me preocupa é que ele pode estar prolongando uma luta que terminou há anos e estendendo-a a qualquer um que pratique artes das trevas. Os livros de história estão lotados de com contos sobre pessoas cuja busca por vingança consumiram suas vidas, mesmo depois que as pessoas que lhes fizeram mal eram destruídas. Não seria a primeira vez. Voldemort pode ter ido, mas temo que Harry tenha continuado a batalha sozinho.


Não tenho que lhe dizer o que isso significa para comunidade mágica, nem tenho que descrever o que poderia nos acontecer se o perdêssemos agora. Você é a pessoa mais próxima a ele no mundo, Hermione. Se alguém pode dar uma luz sobre essa situação, essa pessoa é você... se há alguém que pode dissuadi-lo de tomar um rumo perigoso que ele pode escolher, é você. Não peço que traia qualquer confiança que ele tem em você, nem peço um relatório sobre as idas e vindas dele. Somente desejo te alertar do que ouvi. Você sabe tão bem quanto eu, como os rumores se espalham rápido no mundo mágico. Não acredito que ninguém realmente acredite que ele está indo para o lado das trevas, mas com relatórios tão intrigantes rodando por aí, quem pode saber o que vai acontecer. Ele ainda é um herói, até mesmo uma lenda, mas isso só significa que as pessoas darão mais atenção ao que ele faz, do que se ele fosse um bruxo normal.


Sei que a vida de Harry é solitária. E fico feliz que ele tenha você. Estou ansiosa para te ver semana que vem na conferência.


Atenciosamente,


Minerva


Hermione recolocou a carta no envelope, pensando. Ela não compartilhava as preocupações de Minerva. Se Harry realmente era um espião (e ela estava mais convencida a cada minuto que ele realmente era) então suas associações com as artes das trevas eram facilmente explicadas. Era o trabalho dele, afinal, e também era um motivo muito bom para estar se disfarçando. O que a preocupava é que as atividades dele não pareciam ser tão secretas quanto ele pensava. Se não tomasse cuidado, poderia começar a sentir as conseqüências.


Laura voltou da cozinha, limpando as mãos numa toalha. - Estou faminta, espero que a pizza não demore muito - ela parou, examinando o rosto de Hermione. -O que foi?


Hermione sorriu. -Nada. Só que... - ela pausou, incerta de como continuar.


-Só que o que?


-Só um pouco mais de drama do gênero Potter.


-Ah. Não há curta-metragem pra isso, não é? - Laura disse, sentando no parapeito junto dela. -Não consigo entendê-lo.


-O que há para entender?


-Ele é tão misterioso.


Hermione piscou. -Misterioso? Se você diz...


-Eu digo sim... Mas suponho que não tenha sobrado muito mistério pra você depois de quinze anos.


-Ele está mais reservado do que era, mas sempre foi meio tímido. Rony era quem mais falava antigamente. - ela virou para olhar através da janela. A antiga tristeza começava a cobrir sua pele. -queria que o tivesse conhecido. - disse baixinho. Laura se inclinou para frente, muito interessada... nem Hermione nem Harry nem ninguém mais na casa falava muito sobre o famoso Rony. -Você me lembra ele de várias formas.


-Mesmo?


Hermione afirmou com a cabeça, sorrindo. - Éramos como três pêras num pacote, mas tão diferentes. Eu era séria e estudiosa, Harry era concentrado e corajoso e Rony era extrovertido e sarcástico... - ela parou, percebendo que realmente estava prestes a falar sobre Rony, uma coisa que evitava, mesmo que às vezes a consumisse por dentro até que não soubesse se poderia continuar guardando essas palavras. Laura pareceu sentir isso.


-Me fale sobre ele. Está tudo bem.


Hermione suspirou e puxou as pernas para cima, apertando os joelhos contra o peito. -Rony e Harry se conheceram no trem no caminho de Hogwarts no primeiro ano... uma coisa boa pra Harry. Os Weasley são uma família antiga e Rony era o sexto filho da casa a ir para Hogwarts então ele era um expert. Harry, coitado, nem sabia o que estava acontecendo.


-Ele cresceu como trouxa, certo?


-Certo. Com a tia e o tio. Pessoas horríveis, os dois. Como eu, ele não sabia que era um bruxo até que recebeu a carta de Hogwarts convidando-o a freqüentar. De qualquer maneira, quando conheci Rony, achei que ele era um chato irritante. Passei grande parte do nosso primeiro ano desaprovando as situações em que ele e Harry se metiam, e *me* levavam junto. A idéia de quebrar as regras era antiética pra mim, mas para eles, era completamente natural. - ela sorriu, perdida em suas memórias. -Muitas pessoas só conheciam Rony como o amigo de Harry, mas não acho que ele se importava com isso. Estava acostumado a ser coadjuvante dos irmãos e não se sentiria confortável sendo o líder, sem falar no fato dele adorar Harry, todos adorávamos.


-Mas você namorou o *Rony* não o Harry.


-Não poderia ter namorado o Harry nem se quisesse. Ele já estava com Cho no final do nosso quarto ano. Rony e eu passamos cada vez mais tempo juntos quando ele estava com ela, acho que uma coisa levou a outra. - ela virou o rosto e passou a mão nos olhos. -depois que ele morreu, eu e Harry ficamos próximos por um lado e mais distantes por outro. Ficamos juntos, porque não podíamos evitar isso, mas também nos afastamos, porque sabíamos que um dos dois podia ser o próximo. E eu sabia que *eu* não podia passar por aquela dor novamente. Depois que nos formamos e a história de Voldemort acabou, eu melhorei. O espectro da morte se afastou um pouco, e sair de Hogwarts ajudou. Amávamos aquele lugar, mas era difícil estar lá quando todos os cantos traziam uma memória de Rony.


-Você o amava? - Laura perguntou, fascinada com esse raro acesso ao coração de Hermione.


A pausa se prolongou cada vez mais, até que Hermione olhou fixamente através da janela. -Não sei - finalmente disse. -Nunca consegui descobrir isso.


**********


Harry e Lupin aparataram de volta para o escritório sem falar muito. Ver Leland tão mal não fez nada por seus otimismos, apenas colocou uma capa de tristeza em seus humores. Não ajudou que assim que apareceram na entrada do quartel general subterrâneo da Divisão de Inteligência, encontraram Argo Pfaffenroth esperando por eles. Argo era chefe de Harry; era a chefe da Divisão de Inteligência, subordinada apenas ao Chanceler da Federação Internacional de Bruxos... E a presença dela não era um bom sinal. Ela geralmente não tinha muito contato com o dia-a-dia das atividades que chefiava, e se ela se interessava por algo que você estava fazendo com certeza era um sinal que você deveria prestar muita atenção.


-Confinamento? - perguntou. Pfaffenroth não era uma pessoa de muitas trivialidades.


-Sim, nós o vimos. - não era necessário mais comentários. Harry sabia que Elektra já tinha entregado um relatório completo a Pfaffenroth. Eles andaram pelo corredor até o escritório de Harry. -Posso te ajudar em alguma coisa? - Harry disse, tentando manter o tom normal.


-Já que perguntou, sim. Quero saber de você se o desaparecimento de Leland Stormare e seu recente retorno se encaixam num padrão. - seu sotaque americano deixava as perguntas diretas ainda mais abruptas.


Harry parou, franzindo as sobrancelhas em alarme. -Argo! Isso é confidencial! - ele exclamou, olhando para Lupin. Pfaffenroth não pareceu preocupada. Lupin parecia querer pedir licença, mas estava interessado demais no que estava acontecendo para fazer isso.


-Responda minha pergunta, por favor.


Ele suspirou. -Não tenho certeza.


-Não quebre minha corrente, Chefe. Você tem certeza, só não quer dizer em voz alta.


-Adicionou leitura de mentes a seus truques, foi?


-Pelo amor de Cristo, se encaixam?


Harry hesitou. -Sim.


Argo balançou a cabeça que sim. -Como eu suspeitava.


-Como todos *temíamos*


-Algum progresso com as possíveis interpretações?


-Não desde a última vez que chequei. Não pensam em outra coisa lá nas Pesquisas.


-Nesse caso não temos escolha a não ser... - ela continuaria, mas Harry não ouvia mais nada. Tão repentino quanto um raio de luz num céu azul, uma dor aguda e quente tomou conta de sua testa. Ele colocou as duas mãos sobre a cicatriz e se dobrou, gritando de agonia.


-Harry! - Lupin disse, se curvando sobre ele. Argo fez o mesmo.


-Vá para enfermaria buscar ajuda! - ela gritou para um bruxo que passava, que saiu correndo o mais rápido que suas pernas podiam carregá-lo.


As pernas de Harry dobraram e ele caiu de joelhos, as mãos ainda sobre a cabeça. Seu queixo estava firmemente fechado para calar os gritos, mas gritos abafados de dor ainda escapavam de sua garganta. Ele olhou para o rosto chocado de Lupin... depois seus olhos reviraram para dentro das órbitas e ele caiu mole sobre o chão.

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