SACIS E SOBRENATURAL



A única coisa concreta que Harry Potter sabia sobre o Brasil era que lá havia cobras. Quando ainda nem estudava em Hogwarts, e nem sabia ser ofidiglota, Harry havia conversado com uma cobra que era originária do Brasil. Não tinha a mínima idéia de porque Sheeba inventara de trazê-los para o Brasil.
    ‒ Que língua falam no Brasil? ‒ perguntou Rony a Hermione.
    ‒ Português. Será que Sheeba ou Sirius falam português, Harry?
    ‒ Não sei, nada do que Sheeba faz me surpreende mais.
    ‒ Harry, Sheeba e Sirius são ricos? ‒ Willy perguntou, curiosa.
    ‒ Não sei, Willy. O que eu sei é que aparentemente eles não tem problemas de dinheiro, mesmo que a moto de Sirius seja mágica e não precise de gasolina, passar dias viajando pelo mundo não é barato... Eu não sei nada sobre a vida de Sirius antes de Hogwarts, e acho que ele não tem família... mas achei muito estranho ele ter tido dinheiro para me dar uma Firebolt, quando eu estava no terceiro ano... naquela época ele ainda era um renegado.
    ‒ Talvez ele tivesse economias...
    Quando chegaram ao Brasil, quem abriu a porta do trailer foi Sirius, e com uma cara muito melhor do que a de quando saíram de Nova Iorque. Ele estava de óculos escuros e bermudas, apontou a varinha para eles, mudando suas roupas e disse:
    ‒ Vestes de Bruxo e Brasil não combinam. Aqui é muito quente! Estamos no Rio de Janeiro ‒ num segundo, Harry e Rony estavam de bermuda e camiseta e as meninas em vestidos curtos e floridos ‒ e tomem isso! ‒ disse entregando a cada um uma pílula cor de laranja.
    ‒ O que é isso? ‒ perguntou Harry
    ‒ Pílulas de português. Assim vocês vão entender e falar português perfeitamente por doze horas. ‒ eles tomaram as pílulas e saíram. Para sua surpresa, não estavam em nenhum lugar escondido, nem a moto estava invisível. Estavam estacionados em frente à uma praia.
    ‒ Aqui ‒ disse Sirius ‒ Não precisamos esconder que somos bruxos! Os trouxas daqui são ótimos, adoram bruxaria, mas não levam muito a sério. A única coisa é que não podemos chegar voando, porque com isso eles não estão acostumados.
    Os jovens estavam quietos, maravilhados com a beleza da praia que tomava a paisagem à sua frente, havia um caos em volta, muitos carros e muita gente. Rony ficou impressionado ao ver a maior quantidade de garotas de biquíni que jamais vira. Um menino magro aproximou-se de Sirius e perguntou:
    ‒ E aí tio, quer que eu tome conta da sua moto?
    ‒ Tudo bem ‒ ele disse tirando uma nota  do bolso, o garoto ficou feliz e saiu correndo, gritando
    ‒ Cem Real, galera, cem real! O tio ali é gringo.
    ‒ O que ele quis dizer com isso? ‒ perguntou Rony, espantado.
    ‒ Aqui existem muitos trouxas pobres ‒ disse Sirius ‒ o que é uma pena, pois este é um país e tanto, pena que o ministério da magia daqui seja uma tremenda bagunça... Esse menino mesmo que veio tomar conta da moto, eu sei que ele tem um grande potencial mágico, mas duvido que o ministério daqui o descubra.
    ‒ Sirius, onde está Sheeba?
    ‒ Conseguindo um carro de trouxa alugado. Ela dirige, eu odeio dirigir carros que não sabem se virar sozinhos.
    Minutos depois, Sheeba apareceu num carro amarelo, e todos entraram nele.
    ‒ Vamos conhecer um lugar incrível!
    ‒ Mais que aquela praia? ‒ perguntou Rony olhando as garotas de biquíni que passavam para todo lado. Hermione pareceu não gostar.
    Foram andando e Harry estava maravilhado com a beleza da cidade e da gente, ele nunca vira tanta gente morena, umas caras diferentes das que ele estava acostumado. Willy disse:
    ‒ Que cidade bonita! Aqui existem escolas de bruxaria?
    ‒ Só uma ‒ disse Sheeba ‒ e fica bem longe daqui, perto da capital, Brasília. O ministério da magia daqui é muito desorganizado! Mas os bruxos daqui, em compensação são os de cabeça mais aberta que eu conheço.
    Pouco tempo depois, subiam uma estrada, e Sheeba explicou:
‒ Vamos entrar na floresta da Tijuca, que fica bem no meio da cidade, quando atingirmos o coração dela, vamos entrar no parque mágico. ‒ entraram por uma estradinha secundária, que acabava numa cachoeira, Sheeba saltou e disse:
    ‒ A cachoeira é um portal, não tenham medo, atravessem direto e vocês não vão se molhar, pisem nas mesmas pedras e na mesma ordem que eu pisar ‒ ela disse e entrou na cachoeira. Todos foram atrás dela, Sirius foi o último.
    Harry não esperava o que encontrou do lado de dentro. A montanha era oca! E o teto, como de uma caverna, era coberto de pequenos cristais alaranjados, que brilhavam iluminando tudo. Um bruxo moreno, de cabelo crespo e estatura mediana aproximou-se deles:
    ‒ Sirius? Sirius Black! Eu não acredito cara! ‒ o bruxo veio na direção de Sirius, e abraçaram-se com um sorriso ‒ Qual é, cara! Eu soube que você saiu! Mas não pensei que fosse fazer família tão depressa! Adotou um bando de bruxinhos?
    ‒ Não é nada disso, Souza! Essa você já conhece, é Sheeba.
    ‒ E aí, Sheeba! O Black aqui parou de te enrolar, né, tô sabendo!
    ‒ Esse é meu afilhado, Harry e seus amigos, Rony, Hermione e Willy.
    ‒ Harry? AQUELE  Harry?  Que barato, cara, que maneiro! Harry Potter veio aqui! Vou tirar uma foto! ‒ o Bruxo sacou uma varinha e fez aparecer uma câmera, tirou foto de Harry e todos ‒ Essa vai pra parede da fama! E ninguém paga ingresso, falou? Vão conhecer o zoológico de graça, por conta do Souza aqui. Aliás, eu não me apresentei! Alcebíades Souza, mas podem me chamar de Souza. Cara, eu não te via... há uns dezessete anos, hein, Sirius! Tá meio branco, mas tá legal... não mudou muito não... E você Sheeba, não mudou nada...  saudades de Hogwarts! Como vai o velho, vai bem?
    Harry não podia acreditar que o bruxo os tratasse como se fossem da família, depois Sheeba disse que esse era o jeito dos brasileiros, bruxos ou trouxas. Souza havia feito um intercâmbio de dois anos em Hogwarts na época de Sirius e Sheeba , e agora, mesmo muito jovem para isso, era diretor do parque zoológico de criaturas mágicas do Brasil. Foram entrando no parque guiados por ele.
    Havia nichos imensos nas paredes, onde ficavam jaulas sem grades, mas isoladas por feitiços poderosíssimos.  Dentro de cada nicho havia criaturas mágicas que Harry nunca imaginara, e que não estavam no livro monstruoso dos monstros. Souza explicou que estava esperando verba do ministério da magia do Brasil há quinze anos para editar um livro sobre as criaturas, mas até agora, não conseguira.O zoológico era uma iniciativa de bruxos para preservar criaturas mágicas com as quais os homens estavam acabando Ele apresentou a primeira criatura:
    ‒ Esse aí é um boitatá filhote ‒ dentro do nicho havia uma cobra negra com pontos luminosos, enorme, quase tão grande quanto um basilisco, dormindo. ‒ ele vive 500 anos, mas só acorda de vinte em vinte para comer, e come tudo que vê pela frente, até cansar. Aí dorme de novo por mais vinte anos... existem muito poucos na natureza agora... esse aí está dormindo há dez anos, nem sei o que eu vou dar para ele comer quando acordar... mas ainda faltam dez anos, tá tranqüilo, ainda...
    ‒ Agora, o curupira... ‒ havia um ser verde que parecia um ser humano, mas do tamanho de um menino de uns treze anos, com os pés virados para trás e cabelos verdes até os ombros, tinha um belo rosto de índio ‒ foi um custo conseguir convencer esse aí a largar a floresta e vir pra cá... eu tive que prometer que ia proteger a mata da Tijuca... ele era daqui mesmo. Também está em extinção ‒ o curupira piscou um olho para Hermione ‒ acho que ele gostou de você, gatinha!
    Hermione olhou assustada para a criatura, que piscou-lhe novamente um olho. Rony arrastou-a para o próximo nicho, e Souza começou:
    ‒ Isso aí é uma caapora, a mulher do mato ‒ havia um ser arrepiado e ruivo, com o corpo todo pintado ‒ ela odeia fogo, estão acabando com as terras dela lá no sul... o chato dos trouxas é esse: não sabem preservar nada!
    A criatura seguinte estava sobre uma pedra dentro de um lago com cachoeira. Era uma sereia muito bonita, de cabelos negros e olhos verdes, com uma grande cauda de peixe prateada . Nem bem os viu começou a cantar, uma música suave, hipnótica.  Ninguém percebeu que Souza punha protetores de ouvidos. Repentinamente, a sereia pulou no lago e Sirius, Harry e Rony bateram de cara no feitiço de impedimento.
    ‒ Há! Há! ‒ Souza gargalhou ‒ até hoje não vi um que não batesse nesse feitiço quando a Uiara pula na água! O que ela tem de bonita tem de traiçoeira, a sem vergonha... Ela canta desse jeito e quando vê que não, o cara já morreu afogado... Pior que ela só a mãe d’água, que até enchente provoca, ainda bem que não tenho nenhuma aqui. Vamos indo que a próxima é perigosa, não mostrem as unhas nem os dentes... ela é temperamental.
    Havia uma criatura esquisita e disforme dentro do nicho seguinte, parecia um cavalo, galopando descontrolada, mas não tinha cabeça, e sim um feixe de chamas que se moviam, dava saltos e piparotes, às vezes rolava no chão como cachorro, emitindo grunhidos horríveis, as chamas que soltava batiam no feitiço, espalhando-se em imensas labaredas, não havia nada no nicho além dela, nenhuma vegetação.
    ‒ Essa estressada aí é a mula sem cabeça... Ela é um porre, dá um trabalhão pra gente. Acredita que a gente teve que forrar o nicho dela com terra de cemitério? ‒ Harry detestou a idéia‒ e esse fogaréu dela mata tudo que pára na sua frente, mas ela não come nada, porque é uma alma penada. A isolamos melhor que qualquer outro. Eu adoraria vê-la longe daqui.
    ‒ Esse aí ‒ Souza indicou o nicho seguinte onde havia uma caverna dentro da qual se enxergavam dois olhos amarelados brilhando no escuro ‒ é outro chato. Até hoje a gente não conseguiu descobrir como é a cara do tal do chupa cabra, Sirius! Minha equipe pegou ele lá em Minas Gerais numa armadilha (botamos um guaxinim no lugar dele para enganar os trouxas) e ninguém conseguiu abrir a caixa. Quando colocamos ele aí dentro, voou feito uma bala para a caverna e fica lá desde então.  Acho que eu vou trazer o Hagrid aqui para ver se esse bicho se entende com ele... A única coisa horrível mesmo é o grito dele.
    Depois de caminharem algum tempo, vendo dezenas de outras criaturas estranhas, chegaram ao maior nicho, onde umas três dezenas das criaturinhas que Harry mais gostou no zoológico brincavam na maior algazarra. Pareciam meninos, eram negros e pequenos, do tamanho de crianças de quatro anos ou menos, tinham apenas um perna e usavam um gorro vermelho e um cachimbo, ao verem os visitantes vieram saltitando,  gritando “Pito! Pito! Pito!”
    ‒ Eles estão pedindo fumo na língua deles ‒ disse Souza ‒ Ainda está muito cedo, seus viciados! Estes são Sacis, alguns gostam de chamar de duende brasileiro, gnomo brasileiro, mas eu que os conheço bem, chamo só de saci mesmo... eles são terríveis! Fazem bagunça com tudo, e adoram enganar os trouxas... é uma das poucas criaturas que não está em extinção por aqui, até porque eles se reproduzem com uma facilidade imensa... cada vez que você diz “acredito em saci” você faz nascer algum em algum lugar... eu vivo dizendo isso. Porque os adoro... não canso de tentar estudá-los, mas eles não colaboram muito.
    ‒ Eles são domesticáveis? ‒ perguntou  uma esperançosa Willy.
    ‒ Não gatinha. Se você leva um pra casa, até consegue prendê-lo numa garrafa, mas cada vez que alguém que não é você olha para ele, ele vira pedra... depois, se não tem ninguém olhando, vira saci de novo e fica te mostrando a língua... eles são muito mais divertidos assim.
    Depois de almoçarem com Souza, que se despediu como se fossem parentes e disse que à noite sairiam por conta dele. Passearam até a noite, quando foram encontrar Souza num lugar chamado “Escola de Samba” . Na verdade, nada tinha de escola,  era uma espécie de festa, onde havia muitas pessoas dançando ao som de uma música diferente de qualquer outra que Harry já tinha ouvido. Muitos homens batucavam juntos em tambores, pareceria uma orquestra, não fosse a música completamente diferente. Algumas moças de shorts minúsculos dançavam de um jeito que fez Rony, Harry e Sirius ficarem de queixo caído, levando um safanão cada um.
    Ninguém se animou a tentar copiar a dança, que Souza executava com perfeição, rindo e chamando-os de “gringos no samba”. Quando chegaram ao carro, Sheeba lembrou-se que não armara a casa em lugar nenhum, e para espanto de todos, Souza os convidou para armá-la no parque. Eles dormiram ouvindo o barulho dos Sacis e o grito arrepiante do Chupa Cabra.
    Todos os dias foram de festa, até o último, em que foram conhecer a casa de Sobrenatural de Almeida, que não era uma casa, e sim um cemitério! Sheeba os levou por um portão, onde Harry leu: “Cemitério São João Batista”, passaram por alguns túmulos, até que chegaram num, sem inscrição nenhuma. Sheeba bateu e uma voz triste respondeu, quando ela se anunciou, o túmulo se abriu, entraram no que parecia ser uma casa, debaixo da terra. Um fantasma esquisitíssimo, com cara chupada e uma camisa verde, branca e grená veio recebê-los. A casa não tinha cômodos, só um poleiro onde uma coruja amarelada e caolha descansava. Sobrenatural era um fantasma muito culto e bem falante, perguntou pela Murta, “uma simpática alminha!”, e pelos outros fantasmas de Hogwarts, então desatou a reclamar de como punham nele a culpa das coisas no Brasil.
    ‒ Veja bem, a seleção de futebol perde, a culpa é minha, chove, a culpa é minha, há seca, a culpa é minha... dizem que tudo é culpa minha... Esses trouxas brasileiros são místicos demais! Eu gostaria que eles fossem um pouco mais trouxas, sabe? Assim me sentiria menos culpado... já não basta o Fluminense perder toda vez que eu vou ver o jogo dele?
    Depois que saíram do cemitério, Harry perguntou a Sheeba o que era Fluminense, e ela disse:
    ‒ Um time de futebol... o Sobrenatural adora futebol, mas parece que não dá sorte... toda vez que vai ver algum time jogar, o time perde inexplicavelmente.
    ‒ E porque eles o culpam?
    ‒ Acho que eles acreditam demais nele...


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