O acidente



               — “Me ajude, Sir Nicholas” falou a garota assim que eu tive a intenção de falar. “Eu lhe imploro!”. Eu não sabia o que fazer, Harry. Ela pediu minha ajuda mais uma vez. Quando falei que a ajudaria, seu rosto de contorceu naquele sorriso medonho e sujo, aliviada.


               “Perguntei a ela o que houve. Um grande soluço sacudiu-lhe o corpo, e então ela falou (e eu nunca esqueçerei as palavras que disse!), sua voz quase tão baixa como um sussurro: ‘Estou presa nesse navio há anos, Sir Nicholas. Trabalhei aqui como criada desde a primeira vez que este navio navegou pela primeira vez. A viajem foi tranquila, o único problema que tinha era para me acostumar com o sacolejo do navio, mas com o tempo me acostumei.’”


               “‘O navio ancorou em uma ilha aparentemente deserta. Eu estava louca para esticar as pernas e respirar um pouco de ar e sentar em terra firme, mas não tinha permissão de sair. Ficamos parados ali por dias. Alguns homens saiam do navio em busca de alimentos e, aos poucos, o navio foi reabastecido de frutas e água potável.


               “‘E havia um homem... Paul. Era esse o nome dele. Desde que nós entramos no navio ele ficava me olhando, um olhar apaixonado. Eu pensava que ele me amava. Que me amava de verdade. E eu desejava muito um homem, uma família, então fiquei completamente iludida, pensando que iriamos nos amar eternamente, mesmo que nunca tivesse trocado nada além de olhares envergonhados com Paul.


               “‘Uma tarde Paul me chamou em sua cabine e imediatamente eu me animei. Paul saiu da cabine assim que eu bati na porta e me anunciei, do lado de fora da cabine. Ele me olhou no fundo dos olhos, sorriu e, sem dizer nenhuma palavra, ele segurou em minha mão e me puxou para dentro da cabine e trancou a porta.


               “‘Ele disse que estava feliz por eu ter aceitado seu convite, e eu fiquei confusa. Ele não havia me convidado para nada. Ele chegou perto de mim e eu fiquei assustada. Notei algo muito ruim em seus olhos, não confiava naquele homem. O encanto que sentia por ele desapareceu assim que ele me tocou pela primeira vez.


               “‘Ele passou a mão pelas minhas costas, depois acariciou meu rosto e sorriu para mim. E então, ele tentou me beijar, e eu reagi. A força, ele me jogou na cama e sem querer rasgou meu vestido.' Enquando ela falava, olhei para ela e vi que o vestido dela estava rasgado na altura da cintura. Comecei a me perguntar se ia mesmo querer ouvir o final da história, mas a garota continuava sua terrivel história de morte: ‘Paul era muito forte. Ele gritava que me amava, que me desejava, e que ele tinha tudo o que queria, mesmo que fosse a força. Eu estava com muito medo! De repente, ele virou-me de costas e subiu em cima de mim. Ouvi o barulho de suas calças sendo desabotoadas.


               “‘Ele tirou minha calcinha enquanto dizia que tudo isso poderia ser diferente. Disse que eu tinha que ser dele pelo menos uma vez. Eu chorava de soluçar, estava apavorada.’ Ela não precisou continuar a história para eu saber o que havia acontecido depois. Ela parou de falar e abaixou a cabeça totalmente infeliz e eu esperei que ela continuasse, em silêncio. Mas ela continuou a contar:


               “‘Sir Nicholas, ele me machucou muito. Eu tentava me livrar dele dando socos e pontapés, mas ele era forte demais e eu estava exausta e chorava agoniada. Ele enfiou o pênis dele em mim, e eu gritei de dor. Aquilo era horrível. Ele continuou por longos minutos, os minutos mais longos e horríveis de toda a minha vida, e eu já não tinha mais forças nem mesmo para gritar. Quando ele finalmente se cansou e me largou, eu tentei me levantar, mas as minhas pernas estavam bambas e trêmulas e então, eu cai.'"


                Nick contava a história como se fosse a menina que estivesse contando a Harry. Ele gesticulava e, as vezes, imitava a voz aguda da garota – o que Harry achava muito engraçado. E Nick continuava sua história sem mal olhar para Harry:


                — ‘Mas havia algo pontiagudo no chão, e eu cai encima. Uma dor terrível tomou conta de mim, e eu senti o calor do sangue saindo do meu corpo, encharcando minhas roupas e o chão. Senti algo salgado na minha boca e cuspi. Havia muito sangue e eu estava ficando muito mais fraca. Logo, não conseguia me mexer, eu estava completamente imovel, não conseguia nem falar.


               “‘Paul olhou para mim desesperado. Ele não esperava que aquilo acontecesse. Tentou me levantar, mas eu não conseguia me mexer. Cai novamente e bati a cabeça na quina da mesa-de-cabeceira. Não sei o que houve, mas depois daquilo eu perdi completamente todos os sentidos mas eu conseguia ver tudo o que estava acontecendo.


               “‘Paul começou a chorar, desesperado. Ele achava que eu havia morrido. Eu ainda estava no mesmo lugar que cai e ele deu alguns passos para trás, e pisou em uma tabua oca. De repente, ele teve uma ideia. Puxou a tabua e sorriu. Puxou uma segunda tabua, a terceira e a quarta, olhando para dentro do buraco sem parar, com uma expressão em seu rosto de dar medo.


               “‘Então ele me pegou no colo e me enrolou em um cobertor velho. Com cuidado, ele me colocou dentro do buraco que ele havia feito no chão. Eu fiquei ainda mais desesperada. Pouco a pouco, ele foi recolocando as tabuas e me deixou lá, ainda viva. Não sei o que houve com ele depois, mas durante horas eu tentei gritar, em vão. Não tinha forças para nada. Depois de um tempo eu desmaiei, ou morri. Não sei. Só sei que eu acordei, mas não estava no meu corpo. Desde aquele dia eu vago por esse navio, presa a essa cabine maldita.’ Eu ainda estava assustado com a história, então demorei para entender. Quando voltei a mim, olhei em volta e notei uma grande mancha no assoalho e finalmente entendi: o corpo dela ainda estava ali”

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.