A garota precoce



Hermione Granger era uma garota inteligente e disso ninguém duvidava. Simples assim. Ninguém duvidava de Hermione.

Quando Hermione dizia "é assim", todos confirmavam com a cabeça e se calavam, pois a última palavra era sempre a dela. Não que as pessoas fossem submissas a Hermione Granger, mas que elas possuíam certo medo da mente brilhante daquela garota dos cabelos armados e amiga do Garoto que sobreviveu, ah, sim, eles tinham. E, sem fazer esforço, Hermione recordou de sua infância e chegou à conclusão de que tudo sempre tinha sido daquela maneira.

Precoce, foi como os médicos e psicólogos a apelidaram.

Um adjetivo meio forte e até feio de se dizer.

Uma garota precoce.

Andou cedo demais, falou cedo demais, aprendeu a escrever cedo demais...

Antes dos sete ela havia devorado os livros de Shakespeare, Camões, Victor Hugo, Oscar Wilde, Jane Austen, Jean Jacques Rousseau, Emmanuel Kant, Gustave Flaubert e até arriscara ler Confúcio, Aristóteles, Platão... E aquele comportamento não era adequado para uma criança. Não, não era. E os pais dela o bem sabiam. Não que o Sr. e a Sra. Granger não incentivassem e gostassem da inteligência da filha, mas a pequena Hermione gostava mesmo era de se isolar do mundo real e criar o próprio mundo mágico. Mergulhar, nadar e se afogar em diversas histórias era o passatempo favorito da menininha. Estranha.

Não, estranha não. Precoce.
Mas Hermione também gostava de contos de fada. Por mais que ela fosse um pseudo-gênio, as famosas histórias da carochinha a deixavam perplexa. As varinhas de condão das fadas madrinhas, os ratos que viravam cavalos e os vestidos que se transformavam de azul para rosa, de rosa para azul... Claro que também gostava muito dos príncipes montados nos alazões brancos. Poderia ser precoce – ela realmente não gostava daquela palavra -, mas ainda sim era uma menina. Uma menina que sonhava um dia dançar com algum garoto em algum baile, namorar, casar e ter dois adoráveis filhos.

Quando Hermione Granger contou para a Sra. Granger que um dia casaria, ganhou um sorriso. Não foi recebida com nenhum comentário... Apenas com um sorriso. E Hermione, pela primeira vez em seus sete longos anos, não teve o que falar. Será que ela também estava sendo precoce em imaginar-se casando? Uma garota de sete anos não podia pensar naquilo?

Hermione sentiu raiva.

Era tão difícil assim ser normal?

Depois daquele dia, ela resolveu que seria como todas as outras garotas. Brincaria de Barbie, pentearia o cabelo de suas bonecas, tomaria chá com os seus ursinhos e assistiria televisão nas manhãs de sábado enquanto comia panquecas. Deixaria que sua mãe prendesse os seus cachos em tranças longas, compraria uma mochila cor-de-rosa e mascaria sempre chiclete. Ela não seria mais precoce. Não, ninguém nunca mais a chamaria daquela forma, pois ela trocaria os livros de grandes gênios por livros de colorir. Trocaria Wolfgang Amadeus Mozart, Frédéric Chopin e Piotr Ilich Tchaikovsky por músicas escandalosas, bregas e "de moda". A única coisa que Hermione poderia manter era a sua fascinação por contos de fada. O "pirlimpimpim" e o "bibidi-bóbidi-bu" eram coisas de meninas normais.

Não existia nada de precoce em magia.

E Hermione tentou ser uma garota normal... Mas tentar nunca significou conseguir.

Com dez piorou.

Como a sua memória não possuía falhas, Hermione se lembrava perfeitamente bem do nome, do lugar e do que se sucedeu. A garota tinha um nome feio. Não que Hermione fosse o nome mais bonito do mundo, mas ainda assim era melhor do que Elidth Amurri. A dona daquele nome causaria arrepios nada agradáveis em Hermione pelos 365 dias que se seguiriam. O lugar da tortura era o colégio primário de Valley College. E tudo começou no primeiro dia de aula...

Hermione sentiu medo.

Elidth Amurri era o triplo do tamanho dela. Se Hermione era precoce em inteligência, a outra era precoce em tamanho. Infelizmente Amurri era o tipo de garota conturbada, com deslizes de humor e com a séria necessidade de chamar atenção. A brincadeira preferida de Amurri – apelidada carinhosamente de Demolidora – era perturbar as outras crianças. Como a tal da Elidth era maior até mesmo do que os meninos, ela conseguia causar medo em quem quer que fosse (se bobear, até mesmo nos professores) e utilizava aquele medo para suprir as suas carências. Sem nenhuma razão aparente, Amurri encontrou na pequena Granger o que ela nunca seria, afinal, quantas medalhas a segunda havia ganhado para o colégio? Quantos eram os professores que a adoravam? O nome dela estava em quantas paredes mesmo? Oh, pobre Hermione, se soubesse que ser inteligente doeria...

Na manhã do primeiro dia de aula, Hermione apanhou.

Sem mais, sem menos. Apanhou apenas. Ficou sem lanche, com lágrimas nos olhos e com medo. Muito medo. E outra vez ela sentiu raiva... Porque até então, ser precoce não havia lhe dado nenhum benefício, somente prejuízos. Oh, sim, Hermione odiou Elidth Amurri, mas não tanto quanto ela se odiou.

Todos os dias que foi para Valley College, Hermione chorou. Encolheu-se em um canto no recreio, com um livro a tiracolo, e chorou em silêncio. Muitas vezes lanchou no banheiro. Algumas outras, na recepção. Mas normalmente lanchava na sala da diretora. Havia problema em ser amiga da diretora do colégio? Ela achou que não, mas então Amurri começou a cantarolar uma música cruel, inventou um apelido desagradável e começou a atormentá-la ainda mais...

Hermione sentiu-se deslocada...

... Até o dia em que recebeu uma carta meio estranha.

Estava para completar onze anos e sua mãe gritava no andar debaixo: "Hermione, querida, você já fez a lista de convidados?", mas quem ela convidaria? Prudence McGory, a menina que às vezes lanchava com ela no banheiro? (Prudence tinha o intestino solto) Não, não seria uma boa ideia.

Hermione sentiu-se sozinha.

Respirou fundo, pegou um lápis, uma folha e começou a escrever.

Lista de convidados
Festa de Hermione Granger

· Prudence McGory
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Hermione pensou um pouco.

Prudence e ela não eram amigas.

Apenas conversavam cordialmente enquanto lavavam as mãos.

Achou melhor riscar.

Lista de convidados
Festa de Hermione Granger

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Demorou alguns minutos para ela desistir. Não tinha quem convidar. Nem ao menos aquela garota que estava sempre no consultório de sua mãe para ajeitar o aparelho gostava dela. Ninguém gostava dela. Só os seus pais, a diretora do colégio, os professores e... Ah, os adultos em geral.

Talvez quando ela crescesse, "ser precoce" fosse bom...

... Mas ela estava para completar apenas onze anos!

"Hermione, querida, você recebeu uma carta!", sua mãe voltou a gritar. Os olhos castanhos da garota se estreitaram. Uma carta? Para ela?

Largou o lápis e a folha no chão e desceu as escadas correndo, como se quisesse ter a certeza de que não estava sonhando. E o engraçado é que ela não estava. A Sra. Granger entregou-lhe a carta com ar de confusão. Conduziu a filha para a sala de estar confortável e bem organizada, onde o Sr. Granger lia o jornal e tomava uma xícara de chá. Hermione foi obrigada a sentar numa poltrona e abrir a carta ali, diante deles. E também foi obrigada a ler em voz alta.

Escola de Magia e Bruxaria Hogwarts. — os olhinhos voltaram e releram aquela primeira frase várias e várias vezes. — Diretor: Alvo Dumbledore. Ordem de Merlin, Primeira Classe, Grande Feiticeiro, Bruxo Chefe, Cacique Supremo, Confederação Internacional de Bruxos. — olhou para os pais, esperando que eles se pronunciassem, ou ao menos piscassem. — Prezada Senhorita Granger, temos o prazer de informar que vossa senhoria tem uma vaga na Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts. Estamos anexando uma lista de livros e equipamentos necessários. O ano letivo começa em 1º de setembro. Aguardamos a sua coruja até 31 de julho, no mais tardar. Atenciosamente, Minerva McGonagall. Diretora Substituta.

Que tipo de brincadeira era aquela? E qual era a finalidade?

Parecia que a única parte que reagia ao comando do cérebro de Hermione eram os olhos, pois o corpo seguia imóvel segurando o pedaço de papel, enquanto os olhos não paravam. Desciam para a carta e então subiam para os seus pais. Desciam outra vez e subiam novamente. Desciam, subiam, desciam...



— Precisamos arranjar uma coruja. — o Sr. Granger disse, sem utilizar daquele tom zombeteiro que era visível em suas piadas sem graça sobre dentes ou quando estava conversando com o irmão mais velho – conseqüentemente, tio de Hermione. – Ao contrário. O tom dele era moderado, um tanto quando curioso e levemente ansioso. — Querida, onde podemos comprar uma?
— Deixe-me ver o restante da carta, querida. — a Sra. Granger pegou o envelope perdido no sofá e leu com calma moderada o outro papel. — Aqui diz que nós podemos comprar tudo o que Hermione precisa em um lugar chamado Beco Diagonal.
— E diz qual é a rua onde fica o Beco Diagonal?
— Sim. — a Sra. Granger sorriu. — Podemos comprar o material na sexta-feira, depois da sua aula de natação. Pode ser, querida?

Hermione piscou os olhos várias vezes, sem acreditar.

Até os seus pais, sangue do seu sangue, estavam zombando dela?

— Não existe uma Escola de Magia e Bruxaria. — pareceu o mais sensato de se dizer. — Bruxas não existem. Magia não existe.
— Como também não existe uma criança de cinco anos que se interesse pela obra completa de Shakespeare, uma criança de seis anos que analise Rousseau e uma criança de sete anos que se interesse por Platão. — com orgulho na voz, o Sr. Granger respondeu: — Você é especial, querida. Nunca duvidamos disso.
— Vocês são bruxos? — Hermione arqueou as sobrancelhas e cruzou os braços, resolvendo participar daquele teatro.
— É disso que os nossos pacientes costumam nos chamar pelas costas. — a piada da Sra. Granger causou uma risada singela do marido e um suspiro alto da filha. — Meu amor, nós veremos se esse Beco Diagonal existe. Não custa nada. Se existir, tentaremos comprar uma coruja. Se comprarmos uma coruja, enviaremos uma resposta à Escola de Magia e Bruxaria Hogwarts. Não custa nada conferir.

Mas... — pela segunda vez na vida, Hermione não teve palavras para se expressar.
— Você tem um horário livre depois da natação.
— Está bem, mamãe. — por fim a pequena prodígio disse. — Mas lembre-se que magia não existe! Isso não faz sentido!
— As coisas vão muito além do que nós podemos enxergar, princesa. Se a gravidade existe, porque a magia também não pode existir?

O presente de onze anos de Hermione foi uma carta estranha que dizia coisas estranhas sobre um colégio estranho.

Todavia, Hermione sempre optava pelo lado racional das coisas. E um castelo, magia e bruxos com toda a certeza iam muito além da compreensão dela...

Mas de toda forma, Hermione sentiu o estômago revirar de ansiedade e as pontas dos dedos queimarem.

Naquele momento, Hermione sentiu-se especial

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Comentários (1)

  • Lana Silva

    Awwwwwwwwwwwww*-* eu já tinha lido esse capitulo. Não aqui na Floreiros, li no orkut até tentei acompanhar a fic mas era dificil e agora que vi aqui quero ler *-* Amei o primeiro capitulo lindo *-------------*

    2012-02-12
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