Tentada



Não pode estar falando sério!


— Claro que estou. É muito fácil trocar a marca ou a cor, se você quiser.


— Você não me entendeu! Não pode ser verdade você querer me dar um carro de presente de aniversário. Nunca esperei ganhar nada de você.


O riso desapareceu do rosto de Harry e seus olhos ficaram frios.


— Não foi por obrigação. Apenas acho que toda garota deve ganhar algo especial quando faz vinte e um anos.


— Mas um carro como esse!


— Se você gostou, fico contente.


— Eu adorei, mas não posso...


— Minha esposa vai ter que viver de acordo com a sua posição social.


— Esposa? Mas não vou me casar com você.  Chega de mentiras, Harry!


Ele sentou-se, então, numa das poltronas e disse:


— Sente-se, pois temos que conversar. Ginny desabou numa outra poltrona.


— Conversar?


— Sim, mas não entre em pânico quando ouvir o que tenho a dizer, está bem?


— Certo — disse ela, apreensiva.


— Olhe, acho que devíamos nos casar.


— O quê? — Ginny deu um salto da poltrona, mas Harry continuava aparentando a maior calma. — O que você acabou de dizer?


— Você prometeu que não entraria em pânico — afirmou ele. — Mas parece que não está conseguindo se controlar.


— Claro, mas quando concordei não sabia que você ia dizer um absur­do desses.


— Não é nada absurdo. Apenas sugeri que a gente faça o que todo mundo está esperando, isto é: casar. O que há de absurdo nisso?


— Mas nós não nos amamos...


— E isso tem importância?


— Para mim é imprescindível.


— Discordo. Em compensação temos uma coisa em comum, que tam­bém é importante.


— Temos?


Os olhos de Harry se turvaram e ele se levantou vagarosamente. Ginny sentia-se hipnotizada à medida que ele se aproximava dela. Nisso ele passou os braços pela sua cintura e a puxou para junto do corpo.


— O que é? — perguntou Ginny, tentando manter-se calma, embora perturbada com a proximidade dele.


— Será que não sabe? — murmurou ele, baixando a cabeça e passando de leve os lábios pelo pescoço dela.


Seus beijos começaram a deixar Ginny sem fôlego. Com esforço, lim­pou a garganta e respondeu:


— Não, eu... eu não sei.


Harry começou então a acariciá-la e prosseguiu:


— Oh, você sabe, Ginny. Seu corpo sabe muito bem.


Voltou a beijá-la com sofreguidão e Ginny desistiu de fingir que não sentia nada, sabendo que se traía ao mais leve toque das mãos dele.


— Harry...


— Não é possível que você ignore essa atração entre nós dois.


Não, Ginny não podia negar. Abraçou-se a ele, aproveitando aquele momento de maior intimidade.


— Você não sente? — insistiu ele.


— Sim, acho que sim... Mas que diferença isso faz? Você está apaixo­nado por Luna.


— Pelo amor de Deus, esqueça Luna! Agora só estou interessado em nós dois.


— Esquecer? Como é que eu posso me esquecer de uma mulher com quem você tem um caso?


— Isso já está me cansando — disse ele, apertando-a com força. -Mas eu desejo você, e acho que não vai se entregar a mim antes de se casar.


— E está certo.


— Tudo bem, então nos casaremos.


Ginny levantou a cabeça desafiadoramente.


— Você pode pensar o que quiser, mas não vou me casar com alguém que está apaixonado por outra.


— Você vai se casar comigo — prometeu ele. — Pode esperar.


Baixou a cabeça e recomeçou a beijá-la, deixando-a tão fora de si que Ginny nem sabia mais o que estava acontecendo.


— Você me deseja agora? — perguntou ele baixinho, junto aos lábios dela.


— Eu... — Ginny quase não conseguia responder, tal o prazer que sentia com as carícias dele. — Oh, Deus! Pare, por favor! Eu não estou agüentando mais...


— Você me deseja? — repetiu Harry.


Ela virava a cabeça de um lado para o outro, num esforço para escapar dos beijos dele.


— Não me obrigue a dizer, Harry — implorou. — Por favor, não me obrigue...


Ele agarrou-a com força, imobilizando-a.


— Diga que me deseja, Ginny! Diga!


— Desejo! Desejo! — gritou, desesperada.


— Então vai se casar comigo? — Apertou-lhe os pulsos com mais força, no empenho de fazê-la responder.


— Não, eu...


Mais uma vez ele a cobriu de beijos, sem que ela pudesse se defender. Harry quase não podia respirar, e Ginny também.


— Se você for esperta, vai concordar em casar comigo, Ginny. Talvez seja a única coisa que me impeça de possuir você aqui e agora!


Ginny sabia que ele era capaz de fazer o que dissera e sabia também que não conseguiria resistir. Curioso era que Harry queria casar-se com ela, mesmo sabendo que, na verdade, não precisaria fazê-lo para atingir seu objetivo. Era um homem experiente e poderia possuí-la quando quisesse, pois ela não tinha forças para evitá-lo.


Mesmo assim Ginny não aceitava a idéia de se casar com ele sabendo que tinha uma amante e que apenas a desejava na cama.


— Não posso! Não é direito.


— Direito! Que importância tem isso? O desejo é uma coisa que devo­ra a gente por dentro, e precisa ser saciado. Eu quero você e não estou a fim de entregá-la de mão beijada para meu irmão.


— O que David tem a ver com tudo isso?


— Meu irmão está meio apaixonado por você, e não adianta negar que eu sei que é verdade. E ele se casaria com você, coisa que eu não quero. Você é minha e não pretendo abrir mão disso!


— Não sou sua! — protestou Ginny, furiosa. — Pertenço a quem eu quiser.


— E a quem já pertenceu? Provavelmente já se entregou a outros ho­mens...


Dessa vez ela conseguiu escapar dos braços dele.


— O que eu fiz ou deixei de fazer não é da sua conta. Saia daqui ime­diatamente!


Harry olhou para ela e começou a ajeitar as roupas vagarosamente. Pa­recia se divertir e isso a deixou ainda mais irritada.


— Dê o fora! — disse ela, quase gritando.


— Você vai acabar me pedindo de joelhos para eu voltar, você vai ver! Vai me implorar para que eu me case com você...


— Você está muito enganado!


— Mas vai mesmo, Ginny. Vou deixá-la tão desesperada que enquan­to não se casar comigo não vai ter sossego.


— Você só pensa em sexo!


— Sem deboche — advertiu-a. — Você vai gostar, pode estar certa. — Deu-lhe um sorriso cruel. — Vou me divertir com o seu desespero.


— Vá para o diabo!


— Vou para casa — corrigiu ele. — Mas vejo você amanhã à noite.


— Amanhã à noite?


— Sim. Para começar a torturá-la.


— Não entendo você. Por que eu?


— E por que não? Eu desejo você para sempre. E tão difícil assim de entender? Podia possuí-la agora, mas você nunca iria me perdoar, por isso vou me casar com você.


— Mas... e quanto a Luna Longbotton?


— Não posso me casar com ela e você sabe disso. Além do mais, Neville é muito possessivo.


— Oh, estou entendendo. Você quer casar comigo porque não pode ca­sar com a mulher que ama de verdade.


Harry começou a rir.


— Você é tola demais! Não deu para perceber até agora o que sinto por você? Eu desejo você e mais ninguém. — Beijou-lhe os lábios de leve. — Amanhã começa a luta e espero que você esteja preparada.


— Oh, vá embora! — pediu-lhe, mais amedrontada pela ameaça do que desejava admitir.


Esperou que a porta se fechasse e caiu no choro. Os soluços sacudiam-lhe o corpo. Ele não tinha o direito de brincar assim com ela, nem de atormentá-la daquele jeito. E se ia mesmo cumprir sua promessa, as coisas só tendiam a piorar.


— Foi uma festa maravilhosa — comentou Jean na manhã seguinte.


— Obrigada — respondeu Ginny meio distante, desejando esquecer pelo menos o final da noite e esperando que Harry fizesse o mesmo.


— Todo mundo adorou! — Jean obviamente não notou a relutância de Ginny em relação ao assunto. — Harry é maravilhoso! Imaginei que fosse completamente diferente, superior a nós, simples mortais.


Que ilusão!, pensou Ginny. Harry era falso, egoísta e amoral! Usava as pessoas, pelo menos ela, sem o menor escrúpulo.


— É um homem que, como qualquer outro, precisa de uma mulher — disse ela, fingindo indiferença. Mas pão apenas uma, pensou. Provavelmente continuaria a se encontrar com Luna Longbotton mesmo obrigando-a a se casar com ele.


— Você parece meio... bem, meio zangada. Não está entusiasmada com o casamento? — perguntou Jean.


— Desculpe, Jean — disse ela com um sorriso amarelo. — É que estou muito cansada.


— Eu também. Mas achei que o Sr. Potter preparou uma surpresa tão... Parou de falar e Ginny viu por quê. Harry acabava de entrar na sala e caminhava em direção a elas.


Ginny enrubesceu à medida que ele se aproximava.


Ao chegar, ele beijou-lhe suavemente a mão esquerda. Parecia divertir-se com a reação dela.


— Ginny, querida, vou ter que sair durante o resto do dia — murmurou baixinho, sem soltar a mão dela.


Ginny queria perguntar o porquê daquilo tudo, mas sabia que não ia adiantar.


— Sim? — foi tudo o que conseguiu dizer.


— Vim com o seu carro... Você estava cansada demais para me levar para casa ontem à noite... — acrescentou, irônico. — Vou com ele a um encontro de negócios e passarei em sua casa às oito e meia para lhe entregar o carro.


— Obrigada. — Ela não queria aquela droga de carro e muito menos vê-lo à noite. Por que ele insistia em perturbar seu sossego?


Harry beijou-a demoradamente nos lábios. Ginny estava morta de vergonha e olhou furiosa para ele. Como se atrevia a beijá-la ali na frente de todo mundo?


— É só para eu conseguir agüentar até a hora do jantar, querida — murmurou Harry. Virou-se e sorriu para Jean, boquiaberta. — Até logo, senhorita. Espero que não tenha se cansado com a festa.


— Não, senhor, gostei demais — respondeu Jean, animada.


— Ótimo! Até logo, garotas. Vejo você mais tarde, Ginny.


Ela não respondeu, fingindo interesse na pessoa que se dirigia a ela. A coitada precisou repetir três vezes antes que ela lhe desse a informação solicitada.


Evitou olhar para Jean, mas no fim teve que fazê-lo. Suspirou e disse:


— Certo, Jean, você tem razão, ele é mesmo muito atraente. Mas me deixa nervosa, principalmente aqui no trabalho.


— Eu também ficaria nervosa se ele me beijasse daquele jeito! — concordou Jean, rindo.


— Ah, Jean, não caçoe. Já estou bastante envergonhada.


Às oito e quinze da noite, Ginny não agüentava mais a expectativa. O modo como Harry agira demonstrava claramente que ele faria qualquer coisa para que ela se casasse com ele.


Na verdade, Ginny queria isso. E desconfiava de que Harry estava mais do que certo de que ela não conseguiria resistir aos encantos dele.


Chegou exatamente às oito e meia, balançando as chaves do carro.


— São suas — disse, rindo.


— Se você não se incomoda, eu preferia não ficar com elas.


 


Harry ignorou as palavras dela e sentou-se à vontade no sofá. Vestia-se esportivamente.


— Você já jantou? — perguntou ele.


— Já, obrigada. Olhe, Haryy, eu não quero ficar com o carro.


— Eu também já jantei.


— Harry, você está fingindo que não me ouve!


— Não é isso, Ginny.


— Você sabe o que eu quis dizer. Eu não quero o carro. Parece uma forma de pagamento.


— Pagamento de quê?


— Não sei... Ah, sei, sim! Pagamento por serviço prestado!


Harry começou a rir, sem se sentir agredido com aquelas palavras. Ti­rou então a jaqueta de couro, dobrou os punhos da camisa e disse:


— Está muito quente, e você ainda não me ofereceu nada!


— Antes quero que você me prometa que vai ficar com esse maldito carro!


— Não é meu. Foi comprado e registrado em seu nome.


— Você não entende... ou não quer entender. Eu sou uma moça co­mum. No momento estou envolvida com você, mas quando tudo acabar eu não vou poder pagar nem o seguro do carro, quanto mais a gasolina.


— As coisas nunca vão se acabar entre nós, Ginny. Você é minha e logo vai acabar admitindo isso.


— De joelhos... — ironizou ela.


— Se for necessário.


— Nunca!


— "Nunca" é tempo demais, Ginny querida. E eu não desisto facilmente de uma coisa quando a quero.


— Eu sei muito bem como você é!


— Então por que não se senta e fica à vontade? Ginny afastou-se.


— Por que não vai ver Luna? Ela ficaria feliz com isso, apos­to.


— Duvido! Ela e Neville sempre passam o aniversário de casamento juntos e eu não gostaria de interromper.


— Oh!


Harry ria.


— Sente-se, Ginny. Não aí — disse, quando a viu aproximar-se de uma das poltronas. — Aqui, perto de mim.


— Não, estou bem aqui — respondeu, séria. — Quais são os seus pla­nos para hoje?


— Não vou fazer nada, absolutamente nada. — Harry esticou as per­nas para frente. — O que você gostaria de fazer?


— Nada, mas com certeza você não pretende ficar muito tempo a meu lado, não é?


— A noite toda, se você deixar!


— Não.


— Tinha certeza. Ligue o som, está bem?


— Que tipo de música prefere?


— Algo bem romântico.


— Romântico?


— É — respondeu baixinho. — Depois você pode vir sentar-se perti­nho de mim e eu sussurrarei palavras de amor em seu ouvido.


Ginny escolheu um disco de jazz, nada romântico.


Quando terminou a primeira faixa, Harry levantou-se e tirou o disco.


— Não é que eu não goste de jazz, mas esse tipo de música não combi­na com o meu estado de espírito.


— Foi por isso que eu o coloquei.


— Deu para perceber. — Harry procurou um outro disco. — O que prefere: Frank Sinatra ou Tony Benett?


— Frank Sinatra, por favor.


Em seguida, Harry sentou-se no braço da poltrona dela.


— Nós gostamos do mesmo tipo de música, sabia?


— Acho que é a única coisa que temos em comum — respondeu, resol­vida a não se perturbar com a proximidade dele. Não conseguia se esque­cer de seu caso com Luna Logbotton!


Harry tocou-lhe de leve o rosto.


— Não concordo e acho que teríamos muito mais se você deixasse as coisas acontecerem. É sempre tão inibida assim?


Ginny virou-se zangada e, antes que ele pudesse impedi-la, levantou-se e afastou-se dele.


— Eu não tenho inibições. É que... é que...


— O quê? — perguntou Harry, sentando-se na poltrona que ela desocu­para.


— Eu não quero ter um caso!


— Nem eu, a não ser que acabe em casamento. — Harry suspirou. — Sente-se, Ginny. Prometo que fico aqui. Vamos apenas conversar, está bem?


— Conversar sobre o quê?


— Você pode me contar mais sobre a sua infância. Essa sua tia, como é que ela era além de gostar de judiar de você?


Já que não se tratava de casamento, Ginny ficou mais à vontade para conversar e sentou-se no sofá.


— Ela era bem mais velha do que a minha mãe. Havia diferença de quinze anos entre as duas.


— E ela nunca se casou?


— Não, mas em parte talvez tenha sido por minha culpa. Uma criança de cinco anos assustaria muito um pretendente.


Harry sacudiu a cabeça.


— Sua tia já devia ter uns quarenta anos quando você foi morar com ela, portanto já tinha tido tempo suficiente para se casar.


— Não, é que ela também cuidou da minha mãe, durante muitos anos.


— Ah, estou entendendo...


— E precisa falar desse jeito?


— Bem, é que me pareceu...


— Sei muito bem o que pensou, mas tia Muriel sempre disse que não queria se casar.


— Então detestava homens.


— Pelo menos o meu pai.


Os olhos dele brilharam, interessados.


— Tem certeza? Quantos anos tinha o seu pai quando morreu?


— Ele era dez anos mais velho que minha mãe; devia ter uns trinta e cinco. — Ginny franziu a testa. — O que está insinuando?


— Acho que a sua tia não detestava o seu pai, talvez fosse outra coisa.


— Está sugerindo que ela podia gostar dele?


— É uma coisa perfeitamente possível.


— Isso é horrível!


— Por quê? O que há de anormal no fato de uma mulher se sentir atraí­da por um homem?


— Mas era meu pai, casado com a irmã dela!


— Isso não quer dizer nada. Ela podia ter se apaixonado por ele. Ginny levantou-se e ficou andando pela sala, de um lado para o outro.


— Não posso acreditar! Ela não... mas... — Harry estava certo!


Ginny percebeu de repente que ele descobrira a verdade. Era por isso que a tia tinha tanto ódio da felicidade da irmã! Durante todos aqueles anos Ginny havia tentado saber o porquê do ressentimento da tia e Harry des­cobriu no ato.


— Estou certo, não é verdade?


— Sim — concordou ela. — Acho que está.


Harry sentiu pena dela e foi sentar-se a seu lado no sofá.


— Eu não pretendia aborrecer você — sussurrou.


— É que... é que fiquei chocada — disse ela, encostada no peito dele.


— Mas eu podia ter falado com mais jeito. Posso estar errado, você sa­be.


— Não, não está. Eu devia ter pensado nisso antes... É que nunca me passou pela cabeça.


— Só se você tivesse uma mente suja como a minha — murmurou baixinho, os lábios próximos aos dela. — Oh, Ginny, Ginny, beije-me...


— Harry... — Beijou-o então como nunca tinha feito, entregando-se a ele sem barreiras. O que adiantava discutir se tudo o que importava era es­tar nos braços de Harry?


Sentia-se cada vez mais excitada.


— Ah, Ginny, como você é linda! Tão linda que eu tenho medo até de tocá-la!


Ginny abraçou-o com força e disse:


— Não tenha medo, Harry, eu gosto quando você me toca...


Harry afastou-se dela de repente e Ginny se sentiu arrasada. Arrumou a blusa com as mãos trêmulas.


— Está ficando tarde — disse Harry. — Preciso ir embora. Não preci­sa me levar para casa, eu pego um táxi. Boa noite. — E, sem olhar para trás, saiu e fechou a porta.

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