The Last One



O céu nunca esteve tão limpo. Nuvem alguma pairava no céu azul e o sol brilhava no alto; os raios dourados iluminando tudo e qualquer coisa em terra firme. O tempo parecia zombar dela, gargalhar sem censura na sua frente, rolar de rir, com lágrimas nos olhos.


Não só o clima, mas seus colegas também.


O último dia de aula era um tipo de evento mais esperado do ano letivo. Alguns de seus colegas marcavam calendários a espera das tão esperadas férias, e neste ano a alegria de voltar para casa, jogar os livros para o alto e dar adeus aos professores se duplicara. Aquele era o último ano em Hogwarts.


A formatura fora um sucesso, assim como a festa após a cerimônia. Sua melhor amiga e nomeada melhor aluna do ano, Lilian Evans, fizera um lindo discurso sobre os sete anos na escola de magia e bruxaria que fizera Minerva McGonagall se debulhar em lágrimas, assim como grande parte dos estudantes, inclusive ela, a eterna rocha impenetrável e fria, como Sirius Black a apelidara.


Marlene McKinnon fitava as grossas cortinas vermelhas do dormitório que fora seu lar durante os sete anos que acabariam assim que embarcasse pela última vez no Expresso de Hogwarts.


O malão jazia perto da porta aberta, o dormitório estava vazio, somente ela não era capaz de descer as escadas para dar adeus aos amigos. Ou não era capaz de encarar a felicidade alheia da qual ela não era agraciada a compartilhar.


Lily deveria estar nos braços de James lá embaixo. Após sete anos de brigas e berros, finalmente James pareceu amadurecer e conseguir conquistar o coração de sua amiga. O casamento do casal era apenas um boato pela escola, mas Marlene sabia que era a mais pura verdade. Ela até fora convidada para ser madrinha! Era quase impossível acreditar, a poucos anos atrás, James e Lily formarem um casal era quase uma blasfêmia.


Emmeline também estava feliz. Ela fora muito bem em seus N.I.E.Ms e seu sonho de trabalhar com Direito da Magia estava cada vez mais próximo.


Se sentia mal por não estar feliz pela felicidade das amigas, mas em um ponto de vista cruel, Lene não conseguira nada. Nada além de algumas notas altas e algumas tardes lustrando troféus pelas encrencas em que se metia e sempre, sempre, o culpado era o mesmo, Sirius Black.


Até ele deveria estar com um sorriso maldito naquele rosto arrogante e sarcástico, com aquele cabelo preto caindo sobre seus lindos olhos acinzentados.. Quando o inverno chegava seus olhos ganhavam um tom mais claro de cinza, e no verão – como naquele dia – seus olhos eram mais escuros.


Hoje, seus olhos deveriam ser só alegria. Ela não teve coragem o bastante para os encarar até aquele momento. Ela não queria os encarar pela última vez, era dramático demais. Não, uma despedida rápida e sem traumas como aquele “Boa noite” frio que ela murmurara enquanto subia as escadas para aquele mesmo dormitório era mais que o suficiente.


Então, alguém bateu na porta.


- Vai descer ou vou ter que te arrastar? – Perguntou Lily, os olhos esmeralda a encaravam com aquele olhar que Lene odiava. Por que sua amiga tinha que ser tão... Sensitiva?


- Eu já vou descer – disse Marlene em um choramingo.


- Você disse isso a meia-hora atrás, sabe?


E então Lily estava entrando no dormitório. Não! Ela não podia perder seu tempo com ela, não é? Ela tinha que vigiar o Potter, não tinha? Sim, ela tinha! Qual era o problema de Lily, afinal? Ninguém podia ter seu momento emotivo e melancólico de vez em quando?


Os olhos verde-esmeralda a encararam e Marlene teve que baixar os seus, encarando os próprios pés.


- Ainda aquele assunto?


- Que outro assunto pode ser?


Lily respirou fundo.


- McKinnon, você precisa deixar seu orgulho besta de lado, as vezes, sabe? – Ela disse e Marlene não deixou passar o uso do seu sobrenome – Você vive falando dele, mas é igual.


Marlene levantou os olhos, agora matadores.


- Você me faz me sentir muito melhor, Evans.


Os bolsos de seu casaco pareciam a ponto de rasgar de tanto que ela afundava suas mãos neles. Marlene desejou ter um casaco muito maior, para assim poder enfiar-se inteira dentro dele e não ter que passar pelo o que viria a seguir, após deixar o dormitório.


Lilian riu.


- Lene – ela começou mais amorosa – é sério, todos estão comemorando, e você aqui, como um urubu cercando a carniça! É o último dia de aula, Lene! Vai deixar passar em branco?


Enrolar os longos fios de cabelo preto em seus dedos parecia muito mais interessante que responder a pergunta de Lily.


- Vamos, Lene! – Exclamou Lily em busca de alguma ação mais motivadora – Onde está aquela menina que eu conheci no primeiro dia de aula, que dizia que, quando o último dia de aula chegasse, ela daria um super beijo no professor Slughnor? – Quis saber – Ou aquela menina que pra ela não existe tempo ruim, e esta sempre rindo e criando confusão?


Desta vez Marlene não pode deixar de rir.


- Ok, eu posso voltar atrás na promessa do Slug?


- Só se você descer comigo, agora, e deixar essa carranca aqui no quarto – propôs Lilian.


Marlene suspirou, pensou e acabou cedendo. Não iria mesmo adiantar ficar ali até a última chamada do Expresso. Ela não poderia voltar para Hogwarts de qualquer maneira, seus dias de estante estavam esgotados.


- Sabe, você se faz de tão forte, tão madura, mas no fundo você é um poço de emoção, Lene – declarou a amiga, enquanto a puxava para fora do dormitório.


E a porta foi fechada. Tudo bem, primeiro passo completo.


Não ouvia-se nenhum pio vindo da sala comunal e logo que chegou ao topo da escada Marlene soube porquê; todos já haviam ido embora. A sala comunal da Grifinória era apenas uma grande sala vermelha e dourada, um corpo sem alma, que eram os estudantes.


A cada passo uma parte dela era deixada para trás, mas assim, Lene pensou, deveria ser para todos. Hogwarts era acima de tudo uma escola, cheia de professores e coisas banais como deveres de casa, mas era o segundo lar de todos os seus alunos.


Seu coração batia mais forte enquanto as rodinhas do malão faziam um ruído estranho no chão de pedra dos corredores, fazendo um eco vazio pelo caminho. Seu arrependimento começou ali. Se tivesse descido com todos os outros, a lembrança dos corredores de Hogwarts seriam de alegria e festa, e não apenas o ruído vazio.


Na escadaria de mármore, Emmeline estava a espera delas. O sorriso de sempre curvando seus lábios rosados para cima e o pé esquerdo que não parava quieto, batendo em sintonia com seus dedos finos que tamborilavam no corrimão. Marlene não conseguiu não lembrar da professora McGonagall, impaciente e rígida, no primeiro dia que ela, ao lado daquelas mesmas garotas, subiram pela primeira vez aquela escadaria.


- Pensei que Lily fosse de trazer amarrada ou alguma coisa assim – disse Emmeline a dois passos de distância.


- Isso não é necessário quando se trata da McKinnon aqui – Lily sorriu, tanto um empurrão de leve no ombro de Marlene – É só questão de lembrá-la quem ela é. Sempre funciona. Mas para todos os casos mais graves, o James é muito bom em azarações...


Marlene riu.


- Eu ainda não me acostumei com essa Lily que gosta do Potter – declarou Emmeline, olhando assuntada para a amiga.


- E você acha que eu me acostumei? – Quis saber Marlene, ainda entre risadas.


No pátio todos se despediam. Não havia nada novo naquela cena, os últimos dias letivos sempre eram assim, mas a diferença deste entre os outros era melancólica, não haveria “ano que vem” para o consolo dos alunos do sétimo ano.


Foi fácil despedir-se dos professores, mais fácil do que ela pensava, mas a sua capacidade de sempre ver o lado bom das coisas se dissolveu quando James pulou para o lado de Lily e agarrou sua mão.


- Que aconteceu, McKinnon? – Quis saber James quando seus olhos encontraram os dele – Quem morreu?


- Ninguém ainda, Potter – respondeu friamente.


- OOOh! Estamos muito bravos hoje, heim? – continuou ele – Você e o Pads! Dois idiotas que não sabem aproveitar o bom do último dia de aula.


- James, por favor.. – pediu Lily em um sussurro para que Marlene não pudesse ouvir.


- O que pode ter em um último dia de aula? – bufou ela.


- Ah... – James girou os olhos, pensando – Sei lá... Porque é o último dia de aula, talvez? – Suas sobrancelhas estavam erguidas com tal obviedade.


É, era o último dia de aula, refletiu Marlene pela milésima vez, mas o sentimento de vazio ainda era o mesmo de quando pensou pela primeira vez. Era o último dia que estava em Hogwarts, o último dia que tinha os colegas todos reunidos daquela maneira, e talvez o último dia que o veria.


Depois de tantos insultos trocados e detenções lado a lado ela se apaixonara pelo ser mais arrogante, irônico e cheio de si que poderia conhecer. E por mais que tentasse negar de qualquer maneira, que seu orgulho falasse mais alto, o que todos diziam era a verdade. O desentendimento deles tinha apenas uma causa, e esta fazia toda a diferença: a personalidade idêntica. Quase almas gêmeas, mas se este fosse o caso, a estória seria um romance e não um drama.


Mas ainda havia tempo de torná-lo um romance, não? Não um conto de fadas com finais felizes, mas ao menos um capítulo feliz.


E para o inferno seu orgulho e a imagem de rocha impenetrável e fria! Não precisava deles neste dia.


- Onde está o Sirius? – Perguntou ela, eufórica de repente.


James assustou-se com tal urgência. Estava atônito quando respondeu:


- Eu o deixei com o Aluado no Salão Principal, mas... – ele continuou, mas aquela informação já era o bastante.


Por pouco não caiu no chão, ralando os joelhos das pedras do chão do pátio quando disparou para dentro do castelo. A escadaria de mármore pareceu não ter fim enquanto subia de dois em dois degraus, mas enfim chegou ao topo e as portas do Salão Principal estavam abertas, logo ali na frente.


Não precisou andar muito, uma vez que estava lá dentro. Sirius estavam logo ali, na ponta da mesa da Grifinória. Remus tinha uma mão em seu ombro, e parecia tentar consolar um trasgo montanhês estúpido que não entendia uma palavra do ele dizia.


Ela deve te feito algum ruído quando parou entre as duas portas, pois um segundos depois os olhares eram dela.


Marlene puxou o ar para os pulmões, respirando e tomando coragem para fazer o que teria que fazer.


- Sirius – ela começou.


- Ah... Vou, deixar vocês dois sozinhos – adiantou-se Remus, mas ela o impediu.


- Não, não precisa. Vai ser rápido.


E tinha que ser, ela não tinha coragem suficiente para uma verdadeira cena.


- Ah, tudo bem, então... – disse Remus sem saber muito bem o que dizer.


Então ela andou até eles. Sirius a encarava sem saber o que pensar.


- Eu agradeceria se você se levantasse – comentou ela.


Era sempre assim. Sirius era muito bom para ter boas maneiras.


Ele se levantou, ainda com a mesma expressão vazia no rosto. Ele geralmente tinha aquela expressão quando Marlene estava muito perto, seu rosto ficava sem cor e ele parava de passar a mão no cabelo.


Seus olhos acinzentados piscaram duas vezes para ela, esperando alguma reação, e isso foi o bastante para ela agarrar seu rosto com violência sem se importar com as marcas que suas unhas fariam em seu rosto bonito, e chapar seus lábios os dele.


De início Sirius pareceu não entender o que Marlene estava fazendo, mas depois a envolveu com seus braços e a beijou de volta, a obrigando interromper o beijo por um segundo, afim de respirar um pouco.


- Você demorou – disse Sirius, Marlene ainda em seus braços.


- Você podia ter chegado primeiro – retrucou ela em seu ouvido.


- Você nunca decidia qual era a linha de chegada.


- Aceite logo, Black, eu venci, eu cheguei primeiro – gabou-se Marlene, agora encarando os olhos dele – Pensei que você fosse mais... Como se diz? Ah, homem!


- Vou te ignorar – disse Sirius desviando de seus olhos – E você pode ter vencido, mas eu fiquei com o prêmio.


- Eu não sou um prêmio! – Exclamou ela, pisando duramente no chão, por pouco não o atinge.


- Ah, cale a boca, McKinnon! – Disparou no mesmo tom, a calando verdadeiramente com um beijo.


 

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