Estrela Cadente

Ela estava sentada no parapeito da janela, olhando para os jardins banhados de luar. Uma leve brisa penetrando sorrateiramente no quarto despenteava alguns fios de seus cabelos castanhos, acariciando sua face. Bela noite, diria ela. Mas uma lágrima fina escorreu pelo rosto.
-- Hermione.-- Sussurrou Harry, pálido como um fantasma. Ela sequer moveu o rosto para encará-lo.
Nada poderia reconfortá-la. Nenhuma palavra surtiria efeito. Nada no mundo faria com que ela se movesse. Era uma estátua, e todo o seu corpo jazia inerte. Não piscava, e a respiração era suave. Além da janela, Hogwarts mergulhava em um sono profundo.
-- É Ano Novo Mione. Não acha que deveria estar comemorando?
Ela parece despertar de seu devaneio. Virando a cabeça lentamente, encara o amigo. Os olhos de Harry estão inchados de tanto chorar. Ela pode ver que ele também estava sofrendo.
-- Nós precisamos ser fortes. E ter esperança.-- Ele diz, aos prantos. Os braços estendidos abraçam a amiga com desespero.
-- Eu não sinto vontade de comemorar. Não tem... não tem sentido.
-- Eu sei Mione. Eu sei.
-- Harry... será que ele...
-- Ron é forte. Ele vai ficar bem.
Silêncio. Ao olhar em volta, Hermione vê os resquícios de uma festa que foi feliz. O salão comunal da Grifinória estava totalmente deserto àquela hora, mas a bagunça reinava. Apurando os ouvidos, Hermione ouve os gritos das pessoas que festejam a chegada do ano. Ela deveria estar lá embaixo também, mas não podia.
-- Vou vê-lo.-- Ela diz, decidida. Pula da janela, apanhando seu robe felpudo que descansava na poltrona. Calça as sandálias e enxuga as lágrimas. Arruma o cabelo, tenta parecer normal.
Harry não faz nada para impedi-la, apenas suspira. Desamparado, ocupa seu lugar no posto de contemplação. Hermione o deixa pra trás, precipitando-se para o corredor escuro e deserto da escola, caminhando apressadamente rumo à enfermaria. Os raios de luar que penetram pelas janelas transformam-na em uma figura plácida, uma alma perdida, quem sabe. Sabia que era assim que devia estar parecendo. Todos estavam preocupados com ela, que há muito não falava. Seu silêncio era notável até mesmo nas aulas, que agora assistia no fundo, sem mover um músculo, sem sequer apresentar sinais de que ouvia algo. Às vezes derramava lágrimas do nada. Seu sofrimento era visível e irreversível.
-- Senhorita Granger!-- Exclama Madame Promfey, assim que ela irrompe pela porta.
-- Boa noite.-- Sussurra, procurando-o com os olhos.
-- Veio ver o senhor Weasley?
-- Sim. Queria falar com ele um pouco.
Franzindo as sombrancelhas, mas sem questionar, Madame Promfey acena a cabeça. “Pobre menina” pensa em seu íntimo. Se ela pudesse fazer algo mais pelo garoto ruivo deitado na cama, ela o faria apenas por aquela garota. Relembrou por alguns segundos o desespero daquele fatídica noite, há um mês, quando entraram todos na enfermaria, gritando e sangrando. Agora todos estavam bem. A batalha não havia deixado vestígios físicos, menos para aquele rapaz, que fora brutalmente atacado por dois comensais. Rapaz que resistira até os limites para proteger os próprios amigos e que agora vegetava na enfermaria, dormindo em um sono ilimitado.
-- Estarei no meu escritório, se precisar... de algo.-- Sussurrou a enfermeira, retirando-se suavemente.
Fungando, Hermione se aproximou da cama em que o amigo repousava, perto da janela. Ele está exatamente como das outras vezes em que ela fora visitá-lo. Branco como gesso, dormindo serenamente. Os cabelos vermelhos destacam um rosto sem vida, que outrora era tão expressivo. Mesmo sabendo que ele não sentia quase nada, Hermione ajeita seus cobertores, já que rajadas de vento o atingem.
-- Oi.-- Ela diz, hesitando.-- Vim aqui te desejar Feliz Ano Novo.
Ele continuava imóvel e ela sabia que aquilo era uma total perda de tempo. Mas algo a impulsionava a continuar falando, como se um instinto lhe dissesse que ele podia ouvir cada palavra que ela dizia. Quem sabe estaria até alegre por sua presença.
-- Está todo mundo ceando. Até felizes. Você sabe, aquela notícia que pegamos a última horcrux vazou. Agora todo mundo sabe que o Harry vai enfrentar Voldemort. Nós trouxemos esperança pra eles Ron, isso não é bacana?
Silêncio. Evitando cair no choro, Hermione se ajeita na cadeira.
-- Sua mãe esteve aqui hoje não? Ah, ela está muito preocupada com você Rony. Assim como todos nós. O Harry parece muito abalado desde aquele dia, mas até que anda melhorzinho. A Gina é tão orgulhosa... às vezes sinto vontade de abrir os olhos dela. Os dois se amam, mas ficam fazendo aquele joguinho. Sabe que acho que você tinha razão? As vezes acho que o Harry está agindo como um babaca.
Um pouco hesitante, Hermione jura ter visto um esboço de sorriso no rosto imóvel de Ron, mas tem certeza de que se trata de uma ilusão de ótica.
-- São tão complicados. Porque as pessoas não podem ser felizes ao lado de quem amam? Quero dizer, ficam se afastando quando deveriam estar juntos. Hunf. Feito... feito nós dois. Será que a gente devia ter mudado algo? Será que um dia você e eu poderia ter sido nós?
Um estrondo reboou nos jardins, iluminando a enfermaria por alguns segundos. Hermione sacode a cabeça, desconsolada.
-- Os fogos de Fred e Jorge estão fazendo muito sucesso por aqui.
Ela estende o braço, agarrando a mão gelada de Ron. Os dedos frágeis entrelaçados na mão enorme do amigo parecem ainda mais desesperados para tocá-lo. Apertando a mão contra seu rosto manchado de lágrimas, suspira.
-- Sinto sua falta.-- Ela sussurra, em tom choroso.-- Você nem sabe o quanto faz falta. Eu estou lá... e parece que me falta um pedaço. Todo mundo tem me perguntado o que eu tenho, todo mundo tem tentado me colocar para cima. Mas não consigo! Ron, voce tem que voltar para mim... tem! Eu acho que estou ficando louca. Fico sentada horas no salão comunal, olhando, esperando que você venha me encher o saco. Mas você não vem. Sinto tanto a falta da sua risada, das suas piadinhas de humor negro...
Não adiantou. Ela começou a soluçar desesperadamente, sentindo as lágrimas jorrarem sem controle. Sabia que era errado. Não deveria estar chorando perto dele, já que sabia que isso o deixaria triste. Mas... o que podia fazer?
-- Bem, acho que devo estar parecendo uma louca. Admito que tenho andado muito sensível ultimamente. A guerra e tudo mais... Esses dias estava me lembrando de uma coisa que você disse antes da... antes da batalha. Você tinha me dito que eu estava mesmo parecendo uma manteiga derretida. Estava certo. Eu nunca estive tão... tão sensível e tudo mais. E nem tenho estudado direito! Os Niem's estão ai, e não consigo estudar sem pensar na guerra. A mesma coisa com você. Eu não consigo fazer nada sem pensar em você, e em como quero que você fique bem logo. Nem que seja para brigar comigo. Nem que isso custe o resto das nossas vidas separados, sem ao menos ter oportunidade de expressar o que... bem, o que sentimos um pelo o outro.
“Feliz Ano Novo... Adeus Ano velho...”
A música entoada por um coro de vozes sob efeito de uísque alcançou os ouvidos de Hermione com precisão. Se levantando, caminhou até a janela para espiar o movimento dos jardins, onde os alunos farreavam, monitorados pelos professores. Olhando para o manto de veludo negro salpicado de estrelas que se estendia acima de suas cabeças, Hermione sorri tristemente quando uma estrela cadente corta o ar.
Um pedido. Ela fechou os olhos, sem pedir nada. Ora, já não acredita mais nessas coisas. Só havia uma coisa em todo mundo que ela realmente queria, e isso não depende de uma estrela.
-- Bem, acho que vou indo.-- Ela diz, aproximando-se do leito onde jazia o amigo.-- Feliz Ano Novo Ron, e boa noite.
Dando um beijo quente na testa sardenta, Hermione vira as costas, enxugando as lágrimas com a mão. Por uma fração de segundo enquanto marchava para a porta, ela teve a nítida impressão de que todo seu corpo congelou. Tudo quando ouviu a voz... de Ron.
-- Não é que você está mesmo uma manteiga derretida?
Virou-se tão rapidamente que jurava ter tido o pescoço deslocado. Deitado na cama, Ron movia-se lentamente. Hermione nunca ficou tão feliz ao ver aqueles olhos azuis abertos.
-- Ron!-- Ela gritou, correndo de volta para o amigo. Ele parecia sentir muita dor, mas sorria.
-- Você acordou! Você acordou!
-- Oh, oh... vai com calma ai Mione, ainda estou dolorido.
Ela solta uma gargalhada, jogando seus braços em torno dele. Seu peito começou a explodir de felicidade e por um instante ela sentiu-se capaz de cantar junto ao pessoal dos jardins.
-- Adorei você dizendo que estava sentindo minha falta!-- Ele sussurra, apertando-a contra si.
-- Fazer o que, eu estava mesmo!-- Ela responde, recuando a cabeça para encará-lo.
Os olhares se cruzam e pode-se ver um fogo ardente em ambas as pupilas.
-- Céus, acho que te amo mesmo!
Ron jogou a cabeça para trás, rindo.
-- Eu já tenho certeza disso há muito tempo.
Sem esperar nem mais um minuto, ele depositou um beijo desejado nos lábios de Hermione. Ela agarrou seus cabelos com fúria, puxando-o de encontro a si com paixão. Mataram a saudade nos lábios enfurecidos, acertaram as diferenças no contato quente entre as línguas entrelaçadas. Amor. Não precisava ser perito na arte para perceber que era amor.
-- Sr. Weasley! O senhor acordou...
Hermione descolou-se do amante, rindo loucamente ao ver Madame Promfey precipitar-se com os olhos arregalados para o paciente. Ela se afastou, deixando que a enfermeira se deliciasse também com o acontecimento, fazendo-se perguntas sobre como o milagre tinha acontecido. A garota não precisava de mais perguntas.
Seu desejo de Ano Novo havia se concretizado.

N\A: Tenho que dizer que não era isso que eu esperava para fechar a Finais. Por isso, podem esperar outro capítulo. É Ano Novo, então talvez eu faça algumas atualizações... afinal, eu sei como é bom ler uma fic, nem que seja essas aqui.

NOVIDADE ^^
Uma amiga minha (que por acaso tem o mesmo nome que eu xD), que escreve muitíssimo bem e tem bastante tempo, topou escrever a Finais Felizes 2. Por isso, mesmo se eu não tiver tempo, ela vai escrever alguns capítulos, que eu mesma vou avaliar. Se realmente der certo, passo o link p todo mundo acompanhar os capítulos dela, que com certeza serão tão bons quanto esses.
FELIZ ANO NOVO GENTE!

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