Único.



Era noite. A mulher estava se preparando pra dormir, vestia o usual roupão rosa-bunda e tomava o chá de alcaçuz que bebia desde criança, quando ouviu um estampido. Virou-se de costas, então, na tentativa de ver o que se passava.

- Quem está aí?

Foi quando um vulto negro se aproximou, trazendo consigo um farfalhar de capa.

- Tem certeza que você não sabe, coisa loira?

JK Rowling estremeceu. Aquela voz –e que voz!-, aquele cabelo que não via Garnier há quarenta anos, aquela pele macilenta, aquele nariz que fazia o Pinóquio se sentir favorecido, só podia ser...



- Severus Snape. Não acredito que você está invadindo meu escritório às 3h da manhã.



- E você esperava que eu deixasse barato o que você fez comigo, seu protótipo mal feito de Barbie britânica?! Você tem noção do que fez comigo? Me matou de COBRA! COBRA! E ainda fez com que eu perdesse minha vida inteira por causa de um amor ridículo incorrespondido pela minha melhor amiga. Sabe onde está a minha moral agora? SABE?



- Calado, seu morcego seboso ingrato dos infernos. Eu te fiz herói! De mais odiado vilão a herói! Tem noção do quão difícil foi te tirar da lama? Até hoje as posers ainda fazem meus pobres fãs chorarem de desespero ao assistirem o Enigma do Príncipe e xingarem você de todos os nomes possíveis.



- Você acha que me ajudou? Que me trouxe algum bem me transformando no coitado-do-Snape-que-sofreu-a-vida-toda-e-perdeu-aquela-que-amava-para-uma-bixinha-grifinória-cujo-patrono-era-o-bambi?! Acha?



- Me poupe, Snape. De todos os meus personagens você foi o único que...



- O único? Espere. Bem que eu tava achando estranho eles se atrasarem tanto...



Foi quando uma grande espiral pink iluminou o aposento. Iniciou-se uma chuva de purpurina e um ruído musical foi ouvido por todos ali presente. O volume foi aumentando, até que pode-se identificar a música ‘I Will survive’. De dentro da espiral surgiu uma mão fina e de dedos longos, com grandes unhas pintadas de rosa, acompanhadas por um velho homem vestido com uma grande túnica rosa com estrelas prateadas e um chapéu da Barbie. Atrás dele, seguiram um homem esguio de cabelos loiros-platinados, um moreno com uma cicatriz na testa e um esboço de criatura pálida com duas fendas onde já esteve um dia um nariz. JK estremeceu.



O velho vestido de rosa emitiu um gritinho.



- Excuta, vagabunda. De que in-fer-no você tirou essa história esdrúxula de fazer uma tirada do armário póstuma comigo?! É ele, ELE – Dumbledore gritava, apontando para Harry Potter -  que tem o patrono do viadinho! ELE que deu um beijo de menos de três segundos na menina Weasley depois de babar nela durante todas as férias! E pra ele você dá o que? Uma vadia peituda. E para mim um alemão das trevas chamado Gerard. O que você tem na cabeça além de água oxigenada? Cocô?


 


- E olha que nem chegou minha vez ainda. Você passou sete anos repetindo como eu era inteligente, astuto e quantas vezes eu sobrevivi, sobrevivi e sobrevivi. Mesmo assim, fez o favor de me dar três filhos com nomes bizonhos. James Sirius e Lily Luna dá até pra agüentar. Mas Albus Severus? ALBUS SEVERUS? Eu sei que o seu sonho secreto, sua pervertida do demônio, era ver o Dumbledore e o Snape fazendo sexo selvagem, mas sua agente literária te proibiu...


 


- Quê?! Como você sabe...


 


- Psh. Não me interrompe, espantalho disfarçado. Como eu ia dizendo, já que ela impôs a você o mínimo de decoro em respeito às crianças que ainda lêem essas coisas que você escreve, resolveu concretizar essa fantasia grotesca usando meus filhos. Você já pensou na tradução do nome desse coitado? Alvo Severo, ou seja, branquelo e chato, Weasley, no caso, roda. E Potter. Pot = Cocaína, já te disseram? Imagina o trauma que ele vai passar na escola. Imagina a grana que eu vou ter que pagar pra psiquiatras. Isso já te passou pela cabeça, se é que você tem uma?



- E eu? Em vez de me fazer ficar sozinho, ou me deixar com a Pansy já que as fãs já tinham se acostumado e, principalmente, já que ela JÁ TEM quem a interprete no cinema, não. Foi inventar a tal da Astoria. Da onde você tirou essa criatura, me responda? Sabe quem eles querem colocar pra interpretar essa coisinha? A Jade Gordon, namorada do Tom Felton. Te pergunto: você já viu aquela mulher? Já viu o tom da pele dela? Querida, é laranja. LARANJA. E a cara dela? Parece um orangotango mutilado. E tudo isso é culpa sua, sua ridícula. Sua e dessa sua mania anormal de proibir americanos de fazerem o filme. O sotaque do Johnny Depp é perfeito, ele daria um Rodolphus Lestrange maravilhoso, até porque, já ta tão acostumado a pegar a Helena Bonham Carter que o povo não ia mais estranhar. Mas não, a senhora tinha que se meter. Agora vão cortá-lo do filme. Tá feliz? Mais um personagem que tiram por culpa sua. Sabe o que conseguiu com isso? Mais posers. É isso o que você quer? É?


 


- CHEGA! Vocês são CRIAÇÕES MINHAS, entenderam? Dumbledore, se eu quisesse te juntar com um professor gordo e careca de matemática que trocasse  ‘r’ por ‘l’ que gostasse de humilhar as pessoas, eu poderia. Harry, se eu quisesse por o nome do teu filho de Astrogildo Virgulino, eu poderia. Draco, se eu quisesse te casar com uma guria gorda, emo, quase careca e com o pouco cabelo que tem ROXO (que, aliás, ia adorar, pelo que eu sei), eu poderia. Então recolham-se às suas insignificâncias e sintam-se satisfeitos com o destino que lhes dei. E foda-se, eu até acho que o Tom Felton não fica com a boi-bumbá até as gravações terminarem. E meu Deus, o Tim me picaria em diversos pedacinhos cúbicos e me jogaria ao Tamisa se eu juntasse o Johnny e a Helena num filme que não fosse dirigido por ele. Vocês acham que a culpa de tudo é minha? EU SOU ESCRITORA, NÃO SANTA MILAGREIRA, DAÍ. E MEU SONHO ERA SER QUEIJEIRA, ENTENDERAM?! EU SÓ NÃO FUI PORQUE UMA EDITORA QUIS PUBLICAR A HISTÓRIA EM QUADRINHOS QUE EU ESCREVI NO TREM COM DOR DE BARRIGA. AGORA SAIAM DA MINHA CASA IMEDIATAMENTE!


 


- Calma, beesha. Calma que ainda tem mais.


 


- Tem mais o que?! – Ela bufou, entre dentes.


 


- Falta eu.


 


Ecoou uma voz grave, que causou calafrios na mulher. Uma figura encapuzada surgiu por trás dos outros três, que deram um passinho para trás liberando a passagem. Quando o vulto tirou o capuz, a loira quase caiu para trás. Era ele.


 


- Vol...


 


- Não ouse dizer meu nome, sua boneca inflável despeitada, ou eu faço você engolir todas as varinhas que o Olivaras já produziu. Inclusive o varinhão.


 


- C-calma, Lorde. Eu jamais ousaria...


 


- Jamais o que, imbecil? Você me matou com um expeliarmus. Um expeliarmus, criatura. Nem um passarinho morre com um negócio desses. O que que te deu? O que eu te fiz?! Eu tava lá, quietinho no meu canto tentando exterminar os impuros quando de repente... puf. Desapareci. Pelas mãos de uma ignóbil criatura que poderia ser minha neta, e pior, por um expeliarmus. Você é normal?


- Até eu sou obrigado a concordar com ele dessa vez, JK. – Disse Harry, meio acanhado.


 


- Mas os fãs me matariam se eu deixasse você vencer! Você é o vilão! Você tem que morrer! E, além do mais, Harry, você tem uma coisa que ele nunca terá.


 


- O que? Família? Ah, ops. Família eu não tenho, você matou todos, né. Então o que é? Amor? Amigos?


 


- Um nariz, Harry.


 


Voldemort rosnou. JK tremeu até a ponta do pé.


 


- E você acabou com minha masculinidade! A Bella ali, se jogando pra cima de mim, falando comigo como a um amante, ainda a Helena Bonham Carter com a audácia de mostrar os peitos por cima daquele vestido preto quase transparente. E eu ali, parado, preocupado com o Harry Potter. Deixei ela morrer sem nem tirar uma casquinha...


 


- Mas pra isso existem as fanfics! Você não lê fanfic, cara de cobra? Vá ler a Herdeiras do Mal. A autora é ótima e ela ainda te dá uma filha gostosa com a Bella.


 


- Tá, querida. E eu, comofas? Tem fics por aí dizendo que eu dava pro Moody e que ele enfiava a perna de pau no meu...


 


- Me poupa, Dumbledore. Não posso evitar que os fãs imaginem esse tipo de coisa. Tem neguinha escrevendo Snape e Hermione desde o quarto livro. Existe cada ship bizarro que vou te falar. O que acha, Draco, da Gina? Da Hermione? Do Harry? Do Snape? Isso mesmo, queridos, todos vocês aqui já tiveram alguma coisa pelas fics afora. E olha que eu nem mencionei os que não estão presentes aqui.


 


- Mas que audácia. Pode me dizer onde encontramos essas mentes perturbadas? – Indagou Snape, visivelmente furioso.


 


- Claro. Procurem no Fanfic.Potterish. Mel Black, a escritora da Herdeiras. Procura por ‘Vanity’, também, que você vai gostar, Snape. Enfim, vocês tem mãos pra isso, não tem?


 


- Mesmo assim, cabelo-de-miojo. Não vamos nos esquecer de você.


 


- É, e eu infelizmente também não esquecerei de vocês. Agora vão embora, pelo amor de deus.


 


- Pode deixar. Não fico aqui nem mais um mi-nu-to. Tá acabando com a minha escova que fiz no megahair. Por quê fui descobrir meu lado fashion só depois da morte?


 


- Dumbledore, vá embora antes que eu revele à imprensa que você e Grindelwald alugaram uma barriga de aluguel e tiveram um filho hermafrodita chamado Dercy. Tá bom pra você?


 


- Cre-do. Você é realmente péssima com isso de nomes, hein. Tchau pra ti, colibri. Fui.


 


E os quatro saíram pela mesma espiral por onde chegaram, dessa vez com o fundo musical ‘Cinco Patinhos’, da Xuxa. JK suspirou, tomou mais um gole do chá pavoroso que tinha na mão e foi se deitar, pensando onde foi que errou.

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