Capítulo único




Voldemort caminhava ao redor dela, não parecia se importar com sua morte ou, muito menos, perder seu tempo tentando evitá-la. Ele viu com seus olhos ofídicos o quanto ela estava ferida, ensangüentada, praticamente despedaçada. Mas não havia dito nada. Nem dito, nem feito. Sequer moveu-se, não se deu ao trabalho de se aproximar. Ela não merecia o esforço de suas pernas ou o uso inútil de sua saliva. Na verdade, ele só preocupou-se com a continuidade da luta, com a certeza de sua vitória doentia. Enquanto Bellatrix sentia os inúmeros cortes se aprofundando cada vez mais, como se ácido corroesse sua pele. Ardência, pontadas, uma dor asfixiadora, dando a exata sensação de que sua pele estava por completo sendo arrancada. Parecia sentir ainda o material gelado das facas lhe rasgando a barriga, as pernas, o rosto... Já nem sequer tinha mais aparência, o rosto antes tão marcado e de feições fortes já sumia em sangue e pedaços. Como uma boneca de pano, cortada e deixada de lado por já não ter mais uso. E só o que queria era que ele não a abandonasse ali. A morte ia lhe tomando por dentro, lentamente, apodrecendo cada pequena parte de seu corpo e em breve a alcançaria por completo.
Mas o chão parecia gelado demais, o vazio era intenso, como se o vácuo já a estivesse engolindo. E ela sabia que ainda respirava mas já sentia-se morta. Pois ele, por quem vivia, já a tinha deixado. Logo ela que deitava-se ao chão pra que ele passasse por cima, ela que decorava o nome de todas as estrelas do céu e carregava uma dúzia delas no bolso pra largar por onde ele passasse. Mas seu único pedido Voldemort não atendeu. Deixou seu corpo ali, abandonado e perdido, esperando a morte solitariamente. Ela que havia pedido a ele que não largasse seu corpo. Morreria por ele, se necessário, mas que seu corpo não fosse abandonado. Ainda que dilacerado, ainda que já cheirasse à morte, ainda que agora seu sabor fosse somente o sangue viscoso que a cobria. Mas ele a havia deixado, ela obviamente não seria mais útil. Se viva não era digna de seus cuidados, que dirá morta. Bellatrix sentiu seu fôlego ir morrendo enquanto ouvia os passos dele ao longe. Mais pálida do que nunca, tão branca e frágil como uma boneca de porcelana, abandonada como uma de plástico e rasgada como uma de pano. Esperando, inutilmente, que ele voltasse pra costurar sua vida despedaçada.

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