Rosas de plástico e respiradou

Rosas de plástico e respiradou









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ISCARIOTES







Por Lyra de Lioncourt

Censura R

Classificação Drama, SLASH boyxboy, Harry Potter x Draco Malfoy, com um Blaise Zabini muito inconveniente.

Sumário Harry Potter acorda depois de um coma de três anos pós-Voldemort, e descobre da pior maneira que o tempo pode realmente curar qualquer ferida. Principalmente quando se é um Draco Malfoy que não tem mais nada a perder.

Disclaimer Não estou ganhando dinheiro, Harry Potter e definitivamente Draco Malfoy não são meus. Não me processem.





I. Rosas de plástico e respiradouros enfeitiçados






Now that the war is through with me

I'm waking up, I cannot see

That there's not much left of me

Nothing is real but pain now

Hold my breath as I wish for death

Oh please God, wake me

(…)

Hold my breath as I wish for death

Oh please God, help me

Darkness - Imprisoning me

All that I see

Absolute horror

I cannot live

I cannot die

Trapped in myself

Body my holding cell

Landmine - Has taken my sight

Taken my speech

Taken my hearing

Taken my arms

Taken my legs

Taken my soul

Left me with life in Hell



(One - Metallica)




---



O mundo não era tão complicado assim quando você não o enxergava totalmente.



E para ele estava tudo borrado, agora. Cores inexistentes fundindo-se em tons de cinza e preto - raios, feitiços, luz, brilho... e sangue. E o cheiro de sangue invadindo suas narinas, a dor de seus próprios cortes e feridas internas deixando seu corpo todo entorpecido, e ele mal enxergava, mal sentia, mal respirava....



Mas ainda ouvia o riso.



Aquela maldita gargalhada que ecoava em seus sonhos desde que se entendia por gente, aquele brilho esverdeado, e aquele chiado que ele aprendera a classificar como fúnebre assombrando-o desde sempre, e para sempre.



Ele sabia que não iria demorar muito, agora.



Na verdade, o que ele não sabia era o porquê de estar demorando tanto.



Apenas faça a dor parar, por favor, rápido, rápido, rápido...



Ele estava jogado no chão, encostado na parede, ouvindo seu coração bombear cada vez mais lentamente, ouvindo o sangue escorrendo por dentro e para fora, vendo os borrões fundindo-se em escuridão lentamente...



"Sabe... se você demorar muito, não vai ter mais Menino-que-Sobreviveu nenhum para você matar..." disse, ouvindo a própria voz baixa e mecânica, o gosto de sangue cada vez mais forte conforme movimentava os lábios e a língua para formar as palavras com dificuldade.



Alguém estava em cima de suas pernas, e ele estava vagamente consciente da faca perfurando seu peito.



Era isso, então.



Ele estava morrendo.



Quase engraçado que a dor fosse tanta e tão completa que ele mal a distinguia.



Abriu os olhos (ele os fechara?) e encontrou duas pupilas verticais imersas em íris de âmbar observando-o satisfeitas. E o homem (demônio?) que estava à sua frente inclinou-se para seu ouvido, e murmurou com sua língua de cobra que ele entendia tão bem "eu venci..."



E ele não sabia ao certo o porquê, nem como, mas respondeu com a mesma língua de cobra as únicas palavras que pareciam fazer algum sentido no momento, e era incrível o som que "Avada Kedavra" tinha nos lábios de um ofidioglota.



Alguma coisa estava saindo de seu corpo. Sua alma? Será que sua alma faria esse chiado peculiar, será que a energia de sua vida emanava essa luz esverdeada? Será que teria força o suficiente para fazer a pressão da faca enfiada em seu peito desaparecer e aquela figura disforme e pálida que há segundos atrás estava rindo tombar sobre ele?



Ou será que mais uma vez o destino metera-se entre ele e a morte?



...



Estava acabado.



Voldemort estava morto.



E Harry Potter estava indo para o Inferno.



---



Escuridão.



Avada Kedavra.



Um chiado insuportavelmente familiar.



Você joga quadribol?



Eu sou Ron Weasley. Este é o Perebas.



Meu nome é Hermione Granger.



Sirius está morto, Harry.



Cedric Diggory está morto.



Meus pais estão mortos.



Lucius Malfoy está morto.



Olhos tão lindos tão tristes tão longe...



Harry Potter? Aquele Harry Potter?



Ele matou os meus pais, não foi?



Eu te odeio.



Eu te odeio.



Eu amo você.



Ah, Harry. Mas não é bom viver em um mundo de sonhos...



..E esquecer-se de viver.



---



Ele parecia dormir.



Talvez ele estivesse dormindo, afinal.



Um sono sem sonhos.



Ela acariciou seu rosto imóvel, como fazia tantas vezes, sentindo a barba começar a crescer. Ela teria de dar um jeito nisso, mais tarde.



Quanto tempo fazia, agora?



Dois anos? Três?



...



De que importa?



Ele simplesmente estava lá, adormecido - quase morto



Era quase um Avada Kedavra, a julgar pelo diagnóstico. Totalmente saudável, não fosse o fato que seus olhos não se abriram em três anos e ele não mover um músculo sequer desde que o encontraram naquele estado.



Ela observava os cabelos muito negros chocando-se violentamente com a pele agora ainda mais pálida pela falta de Sol. Queria poder leva-lo para sentir um pouco de ar fresco, mas logo viria alguém para lembra-la de que ele não poderia respirar sem a aparelhagem e os feitiços.



Será que poderia observar alguma mudança nele? Quando você não sorri, as rugas não têm como aparecer, certo?



E sentia seu coração se partir quando olhava para aquele rosto esperando encontrar aquelas esmeraldas brilhando em resposta, e elas simplesmente não estavam ali. Elas estavam trancadas em uma tumba e a chave estava escondida em meio ao complexo conjunto de terminações nervosas e impulsos elétricos que deveriam faze-las cintilar.



Às vezes tinha vontade de levantar uma das pálpebras, só para ter certeza de que elas ainda estavam ali, mas alguma coisa dizia que tudo o que encontraria seriam dois buracos vazios.



Dizem que os olhos são os espelhos da alma.



Será que sua alma já havia partido, assim como o brilho esverdeado que ela se acostumara a amar, e que ainda podia ver se imaginasse com cuidado?



Deslizou a mão de seu rosto até a mão pousada no lençol de linho, fechando os olhos e desejando com todas as suas forças que a pressão pudesse ser correspondida.



E ele obedeceu, e ela gritou, e em breve todos os jornais estariam fazendo um estardalhaço e gritando aos quatro ventos que O Menino Que Sobreviveu Para Matar Aquele Merda Que Destruiu O Mundo Mágico E Virara Um Monte De Bosta Sem Vontade Própria estava respirando sozinho de novo.



Sim, ele estava vivo. E doido para quebrar alguma coisa.



---



Alguém estava apertando sua mão, mas ele não queria acordar agora, não agora... Só mais cinco minutos.



Mas, por algum motivo, abrir os olhos nunca pareceu mais importante. Alguém ia morrer se ele não piscasse, o mundo ia parar se ele não o iluminasse com seus grandes olhos verde esmeralda, ele tinha que abrir os olhos, tinha, tinha...



E eles pareciam.... tão pesados....



Abra os olhos.



Ele devolveu o aperto desesperado que aquela mãozinha pequena e fria oferecia à sua, e no mesmo instante sentiu que seus músculos haviam ficado tensos.



Abriu os olhos (tão fácil assim?), como se apenas tivesse esquecido-se de como faze-lo e a memória tivesse voltado sem avisar.



Aquela era Ginny Weasley?



Sim, era uma Ginny Weasley com alguma coisa diferente, que ele não saberia identificar... e não era só a expressão estupefata, era? Havia algo mais. Talvez o corte de cabelo. Ou aquela expressão angelical de pureza inigualável fora finalmente maculada pela dor? Porém, o mais gritante eram os olhos chocolate arregalados e a pequena boquinha cor de cereja entreaberta em choque.



"Alguma coisa errada?" perguntou, apreensivo, ouvindo a própria voz soar estranha e falha.



Ginny levantou-se desajeitadamente e deu alguns passos para trás, tropeçando nos próprios pés, para logo depois dar as costas e sair apressadamente daquele... lugar..? Harry olhou em volta e pela primeira vez deu-se conta dos fios espetados em duas mãos, bem como dos milhares de buquês ao seu redor. Ao lado de sua cama de lençóis de linho que poderiam figurar em algum comercial trouxa de sabão em pó, havia dois sofás vermelhos de aparência muito confortável. As paredes eram pintadas em algum tom pastel perdido entre o amarelado e o rosado, e havia uma única porta branca com uma maçaneta de alumínio por onde Ginny saíra, deixada levemente entreaberta.



Pensou em levantar-se, mas constatou que suas pernas estavam tão preguiçosas quanto o resto de seu corpo, e pareciam feitas de chumbo conforme ele concentrava-se para mexe-las um centímetro que fosse.



Som de passos no corredor.



Harry virou a cabeça lentamente, para observar melhor a porta, e sentiu alguma coisa incomodando sua garganta, como um colarinho apertado demais. Abandonou a tarefa de fazer suas pernas responderem, tentando ignorar o crescente pânico que se apoderava dele, e passou a lutar para levantar o braço e leva-lo ao pescoço. Porém, antes que pudesse sequer mexer os dedos, a porta se abriu com violência e Draco Malfoy entrou como um raio.



De branco.



Céus, ele ficava bem de branco.



---



"Por que eu tenho que tomar isso?"



Crianças não deveriam existir.



"Porque você não quer morrer, pirralho. Abra a boca."



"O meu pai disse que eu não deveria tomar nada que não fosse a doutora que me desse."



Pelos deuses! Ele não fora uma criança tão insuportável e mimada! Por que era obrigado a suportar isso, agora?



"Ok, você esta vendo alguma doutora aqui? Não, eu não estou. Mas o doutor aqui tem mais o que fazer, então se você não quer se responsável pela morte de alguém por falta de atendimento, pare de me fazer perder tempo, e engula a porr..."



"DRACO!!!!!"



Ele tirou a atenção por alguns segundos do garotinho, que estava quase sendo obrigado a engolir a colher inteira, e desviou os olhos para a direção de onde viera o grito.



"Ginny, querida, tudo bem com você?" sorriso falso.



"Draco" era incrível como depois de seu pai todo mundo evitava chamá-lo pelo sobrenome. Ridículo, na opinião dele. "ele está lá e ele FALOU!"



Levantou uma das sobrancelhas e encarou a ruiva de cabelos cortados rentes a cabeça parada na sua frente. Incrível o que o tempo fazia com as pessoas. Ginny de cabelos curtos, ele com os fios loiros caindo quase ate os ombros, ouvira falar que o tal do Jordan experimentara um alisamento japonês trouxa.... só faltava Dumbledore raspar a barba.



"VOCÊ ESTÁ PRESTANDO ATENÇÃO?"



"Perdão?" mexendo a colher na boca do garoto. Parecia que ele estava querendo falar alguma coisa.



"PUTA MERDA, DRACO!!!! ABRA BEM OS OUVIDOS PORQUE EU NÃO VOU REPETIR!!!! HARRY POTTER ACORDOU!!!"



Ok, Draco nunca achara que os Weasley eram grandes coisas em matéria de inteligência, mas gritar no meio de um hospital lotado podre de caro que um dos homens mais famosos vivos (ou quase) do mundo mágico acabara de acordar de um coma de três anos era no mínimo... idiota.



Mas no momento ele não estava muito preocupado com a capacidade de trabalho dos neurônios de Ginny Weasley, uma vez que estava correndo o mais rápido que suas pernas permitiam para a sala reservada para o Menino-Que-Sobreviveu.



---



As roupas eram diferentes, alguma coisa perdida entre médicos trouxas de manicômios de filmes de terror e... médicos trouxas atuais. Muito diferentes do amontoado de etiquetas que só serviam para identificá-lo como membro da alta sociedade bruxa.



Os cabelos estavam um pouco mais longos, também. Lisos e de um prateado quase branco, poderiam ilustrar um conto fantástico sobre veelas do sexo masculino, caiam aleatoriamente pelos olhos apertados de concentração.



Mas, fora a aparência, Draco Malfoy continuava o mesmo.



A mesma precisão milimétrica que ele presenciara milhares de vezes durante as aulas de poções, quando ele entrou como uma tempestade e a primeira coisa que fez foi arrancar uma agulha de cerca de dez centímetros de seu pescoço como se não fosse nada. Ginny la no canto murmurou alguma coisa sobre servir para regular sua respiração.



E de fato, no momento que ela abandonou sua pele, Harry sentiu sua garganta se fechando e o desespero da asfixia enquanto Draco preparava habilidosamente um coquetel de poções encontradas em seu cinto, que ele enfiou na sua boca sem a menor delicadeza, mas de modo a fazê-la descer incrivelmente rápido.



Queimando.



Harry sentou-se involuntariamente, arqueando o corpo para tossir com o gosto forte de álcool e remédio nos lábios, e soltou um palavrão antes de olhar para Draco e perceber que seus músculos estavam funcionando novamente.



"Que merda era essa?" ele perguntou, com uma expressão de nojo.



"Eu envenenei você. Sinto muito, são suas últimas vinte e quatro horas de vida." Draco respondeu, cruzando os braços e olhando para ele muito sério. Por algum motivo, Ginny soltou uma risadinha discreta e aproximou-se da cama, olhando para ele com um brilho nos olhos quase amedrontador.



"Eu senti tanto a sua..." ela começou, ajoelhando-se ao lado da cama, mas antes que pudesse sequer terminar a frase, Draco estava dando tapinhas em seu ombro e falando:



"Ok, Ginny, muito obrigado pela ajuda, você já pode ir lá fora cuidar da mídia e da parentada. Ou amigos, ou o raio que o parta. Pode ir..." e com um movimento muito parecido com o que se enxota um cachorro, e ignorando completamente os protestos de Ginny, Draco a empurrou porta afora.



"Enfim sós!" ele sorriu demoniacamente, fechando a porta atrás de si.



Harry não pôde deixar de sentir um calafrio quando viu Draco aproximando-se perigosamente, e inevitavelmente sentiu a decepção quando ele puxou um banquinho de baixo da cama e começou a trabalhar na remoção dos fios de suas mãos.



"Então, eu apaguei por muito tempo?" Harry perguntou, esfregando os pulsos para sentir a circulação.



"De fato, você esteve..." Draco assumiu a pose profissional novamente, e puxou uma pasta com uma infinidade de papéis.



"Ah, esquece." Harry jogou a pasta para um lado na cama e puxou a nuca de Draco para si, mas ele afastou-se no mesmo instante.



"Calma aí, Bela Adormecida, você não escova os dentes por três anos!"



Ele tentou ignorar o impacto das palavras, uma vez que estava trancado com Draco e seus novos cabelos longos, e por mais que um milhão de perguntas ribombassem em sua cabeça, tudo o que ele conseguiu verbalizar foi:



"Cala a boca, Malfoy."



"Você não faz idéia de como é bom ouvir isso..."



---



Blaise Zabini gostava de muitas coisas na vida, mas poucas se comparavam ao prazer de estar sentado no seu enorme sofá de couro preto, com um Sidecar gelado em uma das mãos e em boa, ou melhor... ótima companhia.



Na verdade, foi mais ou menos quando ele pensava que a vida não podia ficar melhor (pelo menos enquanto Draco não saísse do serviço) é que ouviu alguém chamando seu nome, mais ou menos na direção da lareira.



É, é claro que o maldito barulho, ou melhor, a pessoa estava na lareira. Levantou-se a contra gosto e deu a volta no sofá, amaldiçoando o dia em que resolvera deixar a lareira ligada constantemente na rede de Flu.



"BLAISE, VOCÊ ESTÁ AÍ???" ah, a terrível voz esganiçada da Weasley que trabalhava com... Draco. Céus. Ele deveria estar mandando algum recado por ela, e.. por Deus, como ele odiava a ruivinha!



Reconhecendo que seus pensamentos não estavam seguindo nenhuma linha de raciocínio lógico, e resignando-se a solucionar o problema e livrar-se logo da garota, contornou a sala até chegar ao outro ambiente e parou em frente da lareira, reconhecendo imediatamente os cabelos que se misturavam com as chamas e vendo que suas suspeitas estavam certas.



"Weasley, que surpresa!" estava prestes a dizer agradável, mas mentir nunca foi seu forte, e temendo que pudesse soar mais como algum tipo de gemido torturado, preferiu ficar calado e esperar para ouvir o que quer que ela tivesse para dizer.



"Eu tenho um furo para você." ela sentenciou, como se fosse grande coisa.



"Escute, Weasley, me trazem furos de cinco em cinco minutos, mas, infelizmente, a minha agenda não deixa que eu vá verificar cada um deles. E, se você não se importa, eu estou um pouco ocupado."



E no mesmo instante ouviu a voz aproximando-se da outra sala, e viu Travis apoiado na parede, sem camisa e sem sapatos, olhando para ele, com os drinques na mão.



"Quem está aí?"



Blaise moveu-se disfarçadamente para posicionar-se em frente à lareira, e disse rápido:



"Oh, ninguém. Era apenas... a... vizinha querendo açúcar, mas.. você sabe, eu não costumo guardar esse tipo de coisa em casa, afinal, para que eu ia querer açúcar, eu nem ao menos cozinho!" ele deu um sorriso amarelo e tentou forçar uma risada. "Só um minuto e eu já vou até aí, eu vou só.. vou.. ao banheiro..." torceu para que o leve tom de interrogação não tivesse ficado muito aparente, e agradeceu mentalmente quando Travis deu de ombros e voltou para o bar, deixando-o a sós com Weasley.



Esta, por sua vez, ele reparou, tinha os olhos embaçados e a boca levemente entreaberta, e quando ele chamou seu nome ela começou a formular alguma coisa que ele identificou como "quem".



"Oh, é Travis. Ele é.. hum... amigo meu. Boa pessoa, mas completamente trouxa. Modelo, sabe?"



"Aham..." ela murmurou, um tanto aérea, e então deu por si e olhou nos olhos dele parecendo impaciente. "Escute aqui, Zabini. Eu não estou com uma reportagenzinha medíocre. A qualquer momento a mídia vai estar chegando, e acredite, você não vai querer perder a chance de ver isso em primeira mão. Deve valer uma fortuna para qualquer jornal."



"Você sabe que o dinheiro não faz diferença, Weasley. Eu quero a glória."



"Eu acho que uma entrevista com Harry Potter glorifica qualquer carreira."



"De fato, se ele não estivesse reduzido a uma planta decorativa. E de péssimo gosto, eu devo dizer. Aquele cabelo... ugh."



"Zabini, ele acordou. Ele está com Draco agora e essa é a única chance da sua vida de conseguir uma reportagem dessas."



Ora, ora... O garoto-cicatriz tinha... acordado. De fato, ele beijaria Weasley se ela não fosse... bem.. a Weasley. Com uma entrevista dessas, o seu nome, que já vinha rapidamente galgando espaço desde que em um de seus súbitos caprichos resolvera ser repórter, atingiria a eternidade.



"Ok, Weasley, eu estou indo."



Ela acenou e preparou-se para ir, quando ele percebeu o que ela acabara de dizer.



"Espere aí, você disse que Potter está com Draco?"



"Isso. Exames padrão, esse tipo de coisa. Mas, bem... você sabe."



É, ele sabia. Ele sabia perfeitamente bem.



"Hum. Ok. E... Weasley?"



"Fala."



"Nenhuma palavra sobre o nosso amigo na outra sala, ok?"



Ela fez uma expressão confusa, meio que intrigada, e depois desapareceu nas chamas. Blaise deu um suspiro, sabendo que não tinha tempo a perder, e começou a pensar em um jeito de livrar-se de Travis, amaldiçoando a hora em que Potter resolvera acordar.



Desapareceu para a outra sala, não sem antes lançar um olhar à lareira, pensando em como a Weasley era burra.



---



Harry nunca imaginou que, no dia em que acordasse em uma cama de hospital, após derrotar Voldemort de uma vez por todas, a coisa que mais iria querer seria uma escova de dentes.



Ele tinha consciência que logo ao lado da sala onde se encontrava havia um banheiro muitíssimo bem equipado, com todas as escovas de dente que pudesse um dia querer, mas Draco não parecia disposto a deixá-lo levantar de maneira nenhuma.



Harry observava, sentado na cama com um pouco de receio, enquanto Malfoy fazia todos os tipos de poções ao lado de sua cama, mandando-o experimentar cada uma delas para verificar os resultados e anotando-os em um formulário. Harry não estava notando a menor alteração em si mesmo, mas Draco escrevia furiosamente a cada teste, mantendo um silêncio incômodo.



Aproximadamente de minuto em minuto, alguém batia na porta exigindo entrar para ver o que estava se passando na "sala em que Harry Herói Potter voltou à vida", mas Draco ignorava-os completamente.



"Então..." Harry começou, levantando a mão gentilmente com destino a uma das mechas do novo-cabelo-longo-presente-dos-deuses de Draco, mas ele nem ao menos levantou os olhos de suas anotações.



"Não se mexa."



"Malfoy, o que diabos está acontecendo?"



Draco continuou escrevendo, impassível.



"Você esteve em coma por três anos após derrotar Voldemort. Você acordou e eu estou realizando os procedimentos padrão para verificar..." Harry puxou a prancheta das mãos de Draco, jogando-a em um canto da cama, o que finalmente fez com que o loiro olhasse para ele diretamente dos olhos.



"Eu não estou falando dessa merda toda. Eu já sei disso, eu ainda não absorvi, mas eu já captei. Qual o problema com você?"



Draco continuou encarando-o em silêncio, o sol passando através das cortinas de seda na janela gradeada refletindo os tons prateados-quase-brancos em seus cabelos, os olhos cinzentos apertados em uma expressão decidida.



"Três anos são muito tempo, Potter."



Harry lutou contra a súbita sensação de gelo revirando-se em seu estômago, tentando por tudo manter uma expressão neutra.



"Conte alguma coisa que eu ainda não sei, Malfoy."



Draco inclinou-se para frente, apoiando uma das mãos na cama, logo ao lado da prancheta com as anotações sobre a saúde presumivelmente precária de Harry.



"Será que você quer ouvir alguma coisa que você não sabe, Harry?" o Menino que Sobreviveu sustentou o olhar ameaçador à sua frente, e estava abrindo a boca para responder quando os dois ouviram alguém literalmente socando a porta do lado de fora.



Draco deu um suspiro cansado e levantou-se, ficando a apenas alguns metros da porta.



"Suma daqui, eu estou tentando fazer..."



Do outro lado da porta, uma voz vagamente familiar respondeu no mesmo tom rude:



"Porra, Draco! Abra a maldita porta, eu estou batendo há vinte minutos!"



Harry, que bem ou mal conhecia Draco há quase dez anos, percebeu no mesmo momento a tensão que ele passou a irradiar assim que ouviu aquela voz, hesitando por um instante antes de estender a mão para a maçaneta e deixar a pessoa entrar.



Um homem de cabelos quase tão longos quanto os de Draco, mas tão escuros quanto os de Harry, entrou violentamente assim que a porta se abriu, virando-se com um olhar de censura para Draco. Assim que ele se pôs de frente e ergueu os olhos azuis diretamente em sua direção, Harry o reconheceu.



Blaise "Quero Roubar Seu Namorado" Zabini.



"Zabini." Harry deixou escapar entredentes.



"Para você é 'Mais Novo Contato Oficial Com O Mundo Mágico', Potter." e, virando-se para Draco com um olhar quase tão patético quanto a voz melosa. "Por favor, Draco! Você vai me dar dez minutos com ele?"



Draco cruzou os braços, lançando um olhar às poções que minutos atrás pareciam ser um caso de vida ou morte.



"E eu faria isso por quê...?"



Harry viu o perfil de Zabini, virado para Draco, formar um sorriso astucioso, lançando um olhar maquiavélico quase imperceptível na direção dele.



"Porque a recompensa pode valer muito a pena."



E nesse ponto, Harry estava quase pulando da cama e fazendo Zabini engolir aquelas malditas palavras junto com a prancheta de Draco. Mas o olhar exausto do loiro o fez mudar de idéia, e pela primeira vez Harry percebeu o quanto aquilo tudo deveria estar sendo cansativo para ele.



"Dez minutos, Blaise." e agora ele estava pouco se fudendo.



Draco rumou para a porta, mas antes que ele saísse, Zabini segurou seu braço e inclinou-se para roçar suavemente seus lábios.



"É por isso que eu amo você."



E antes que Harry pudesse sequer exigir uma explicação, perguntar porquê Draco estava tentando esconder aquele maldito sorriso ou levantar-se para espancar Zabini até a morte, Malfoy já tinha deixado o quarto.



E Harry começou a reconsiderar a hipótese da violência física quando Zabini virou-se para ele com um sorriso hipócrita nos lábios e ecoou as palavras de Draco:



"Enfim sós." e com um tom superior que demonstrava claramente o quanto ele estava se divertindo com toda aquela situação: "Três anos. Passam voando, não é?"



---



Draco fechou a porta atrás de si com um feitiço de tranca e apoiou-se nela, jogando a cabeça para trás.



Ele não merecia isso.



É claro, ele gostava de Blaise. Porra, há algumas horas ele estava positivamente convencido de que estava apaixonado por Blaise, por mais piegas que isso soasse.



Mas agora...



Merda. Merda, merda, merda.



Não era como se ele não soubesse que isso iria acontecer. Ele sabia que a possibilidade existia, mas depois de três anos dormindo...



Ele se lembrava perfeitamente bem do abismo em que caíra na noite em que trouxeram o corpo de Harry. No primeiro momento, ele achou que Harry estivesse morto. E aí o chão não existia mais, o ar de repente se transformara em alguma coisa densa demais para ser absorvida por seus pulmões e tudo parecia simplesmente... em vão.



Draco não acreditava em ideal algum naquela guerra. Ele colocara na cabeça anos atrás que se algum dia fosse necessário lutar, estaria do lado de seu pai, porque seu pai seria o lado vencedor e era isso o que importava.



Se eles iriam usar distintivos da Ordem da Fênix ou máscaras de Comensais não importava.



Mas então veio o imprevisível. Draco percebeu que vencer não era tão importante se você não teria para quem correr depois que a guerra acabasse. E o que ele se convencera que era apenas mais um de seus caprichos, apenas uma tensão sexual alta demais para ser ignorada e um fetiche por seu maior inimigo transformou-se em uma enorme piscina funda demais para que ele pudesse se orientar. Ele estava se afogando dentro de Harry Potter, Grande Herói do Mundo Mágico, e sabia perfeitamente bem disso.



E ele também sabia que Harry iria vencer. Harry iria derrotar Voldemort, porque se ele não fosse forte o suficiente para isso, nunca teria sido forte o suficiente para fazer com que Draco perdesse qualquer controle sobre si mesmo em troca dos dedos do Menino Que Sobreviveu percorrendo seus cabelos.



Draco disse ao pai que Harry iria vencer. Que eles estavam do lado errado, e que quando a guerra acabasse tudo estaria perdido. Mas Lucius estava tão cego de orgulho quanto acusava Draco de estar cego de luxúria. Eles nunca foram leais a nada em todo aquele tempo além de um ao outro, mas Draco estava trocando tudo isso pela simples certeza de braços que o envolveriam quando pudessem finalmente declarar que havia paz.



E quando o Profeta Diário chegou, alguns meses depois, dizendo que Lucius estava morto, que Lucius tinha sido assassinado por um Weasley, ele ficou tomado pela dor a cada momento que respirava. E ele de fato quis parar de respirar, e ir para qualquer Inferno em que o pai o esperasse, porque a única coisa que importava agora era que ele se fora, e Draco não estava lá.



Então veio Harry.



Harry abraçando-o e dizendo que ficaria tudo bem, e mesmo que ele não acreditasse nas próprias palavras ele faria com que elas se tornassem reais para os dois.



"Foda-se minha obrigação com a Ordem. Que se fodam todos eles, Draco, eu vou matá-lo e vou matá-lo para você. Eu vou matar Voldemort para nós. Eu vou matá-lo para você, Draco."



E na semana seguinte, Lupin chegou à base correndo com o corpo inerte de Harry nos braços, e nada mais fazia sentido. E ele queria quebrar todos os violinos que entoavam hinos à infinita nobreza de Harry Potter, ao seu martírio e ao seu, novamente histórico, triunfo. À paz.



De que importava se ele não estava mais ali?



De que valia um mundo para ser salvo se sem ele Draco nunca poderia salvar a si mesmo?



Desde cedo ele percebera sua habilidade com poções, e qualquer coisa relacionada a ervas medicinais, e, principalmente, cura. Favoritismo ou não, ele era o melhor em Poções. E influência monetária ou não, ele era o melhor Healer, e ele não sairia do lado de Harry enquanto ele não acordasse.



Porque Draco sabia que ele iria acordar.



Sabendo disso, ele não perdeu um único dia chorando. Ele mergulhou de cabeça no estudo da condição de Harry e nas possibilidades de um fim para o coma que parecia eterno.



E é claro que a cada segundo que Draco passou ao lado de Harry, Blaise ficou ao seu.



Você não tinha um melhor amigo que abandonava tudo o que acreditava em seu favor à toa, afinal. Draco sabia que Harry nunca gostara de Blaise, e que tinha aquelas idéias absurdas sobre Blaise ter intenções muito mais que puramente fraternais para com ele.



Draco não dava a mínima. Se tinha alguma coisa em que Harry não iria interferir, era em sua amizade com Blaise, porque em Blaise ele confiaria até o fim.



Só que... depois de três anos esperando em vão, sabendo melhor do que qualquer outro que não fora observada a menor mudança, ouvir "Eu te amo" do seu melhor amigo não era fácil.



"E eu quero dizer amor de amantes."



Draco não sabia porquê, mas não tinha pensado duas vezes em aproximar-se e envolver os lábios de Blaise nos seus. E tudo soara tão certo, e tão simples, e as coisas pareciam finalmente no lugar.



Até ele lembrar de Harry.



Então ele fizera a única coisa que parecera certo no momento: pediu que Blaise o deixasse organizar suas idéias. Apenas uma semana.



Ele sabia perfeitamente bem que Blaise entrara em colapso, e passara cada uma das noites bebendo e saindo com alguém diferente, totalmente mortificado que Draco pudesse repensar a amizade deles também e jogá-lo completamente para fora de sua vida.



Mas Draco nunca faria isso. De fato, Draco chegara à conclusão que, doloroso ou não, tudo havia passado.



Quando ele olhava para Harry, vinha a familiar dor no peito, mas agora Draco percebia que ela era muito mais nostálgica do que qualquer outra coisa. Ele ainda sentia uma terrível afeição por Harry, e ele estaria todos os dias ao lado de sua cama até a sua morte.



Mas amor eterno só existe em contos de fadas, e Draco sabia que a sua história era muito mais uma piada de horror do que qualquer outra coisa. Harry era passado. Um passado saudoso, distante, e terminado.



Ele passara a noite toda remoendo esses pensamentos, e quando chegou ao hospital estava com a plena certeza de que diria a Blaise, naquele mesmo dia, que não queria nada além dele.



E aí Harry Potter precisava acordar para jogar terra nos seus planos e complicar toda a sua vida recém resolvida. É claro que não era culpa dele. É claro que Draco estava feliz por vê-lo acordado de novo. Ele só temia estar feliz demais.



Mas quando ouviu a voz de Blaise do outro lado da porta, quando Draco o viu entrando pela porta... ele não teve mais dúvidas. Blaise estava visivelmente aterrorizado com a readquirida consciência de Harry, e ambos sabiam que ele não tinha o direito de ter beijado Draco dentro daquele quarto.



E o mais irônico daquilo tudo é que Draco não se importara.



Ele sabia o que ele queria. E, no presente momento, Draco Malfoy queria Blaise Zabini.



Ele só não fazia idéia que o mesmo abismo no qual despencara três anos atrás agora estava se formando sob os pés de um Harry Potter completamente desesperado, perdido e, acima de tudo, sozinho.



---



FIM DO CAPÍTULO 1




Próximo capítulo: Sem previsão; em andamento, mais da metade concluído.



N/A: Reviews estimulam a autora! (e a deixam muito feliz ^^)

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