Capitulo 8



CAPÍTULO OITO

--- Como é? — replicou Hermione, incrédula.
— Estou falando desse homem que a está acompanhando — declarou Alberta.
A antiga Hermione teria se escondido debaixo da mesa. A nova ficou olhando para a senhora até que esta baixasse o olhar.
— Que é que estão olhando? — indagou Alberta à pequena audiência que lanchava sob a mesma tenda. — Continuem co­mendo. É uma conversa particular.
Hermione trocou olhares espantados com Harry, que não parecia saber que estivera numa cadeia.
— Sente-se, Alberta, e esclareça toda essa história — ordenou Hermione, severa.
— Detesto ter que ser eu a lhe contar, mas esse homem tem uma passagem na polícia. É um desses hippies radicais.
— Harry tinha cinco anos na época dos hippies radicais — observou Hermione, racional.
— Não importa a denominação, ele tentou forjar suas próprias leis. Foi contra a autoridade.
— Faz idéia do que seja isso? — perguntou Hermione a Harry, que negou movendo a cabeça antes de abocanhar outra porção de alimento.
— Claro que ele nega — desdenhou a anciã. — O que esperava de um criminoso como ele?
— Veja bem a quem está chamando de criminoso — preveniu Hermione à senhora, estreitando o olhar.
Harry reconheceu aquele olhar; era de sua Mione campeã.
— O homem foi para trás dás grades — insistiu Alberta, tei­mosa. — Era culpado e passou um tempo engaiolado. Aposto como ele não contou isso quando estava pendurando sua lingerie no abajur!
Harry olhou para Alberta com tanta intensidade que a senhora recuou.
— É melhor não insinuar nada quanto à reputação de Hermione — rosnou ele.
— Foi você que arruinou a reputação dela indo à biblioteca do jeito que foi — rebateu a anciã.
— Minha reputação continua imaculada — garantiu Hermione, pousando a mão sobre a de Harry, que estava tensa.
— Isso mesmo! — manifestou-se a audiência à esquerda de Hermione.
— Certíssimo! — apoiou a audiência à direita.
— Então, do que é que está falando, Alberta? — inquiriu Hermione, raivosa.
— Pergunte a ele — desdenhou a senhora, apontando para Harry.
— Não faço idéia — comentou ele, dando de ombros.
— Devia ter imaginado que um homem como você ia mentir — retrucou Alberta. — Pois bem, impressões digitais não mentem, senhor calça-esperta. Fiz o xerife verificar seus antecedentes criminais.
— O que foi que ela disse? — O sr. Obersdorf, de noventa anos, ligou seu aparelho de surdez.;— Quem está passando filmes? Não me engane — repreendeu a filha de setenta anos. — Estou perdendo alguma coisa aqui.
— Passo um resumo escrito depois — prometeu Hermione, des­denhosamente, ao mais idoso residente de Greely.
— Vou ficar esperando. Não omita as partes boas — retrucou o sr. Obersdorf. — Já assinou as revistas Playboy?
— Estamos conversando em particular aqui, Silas — declarou Alberta. — Fique fora!
— O que tem lá fora? — perguntou o velhinho. Praguejando, Hermione agarrou a anciã e a levou para fora. Assim que chegaram a uma boa distância da barraca, declarou:
— É a sua última chance, Alberta.
A senhora lhe passou um pedaço de papel.
— Está tudo aí. Leia você mesma.
Hermione leu. Então, olhou desolada para a antagonista.
— Está escrito aqui que Harry foi detido por participar de uma manifestação contra a derrubada de um prédio histórico em Chi­cago.
Alberta assentiu.
— Eu disse que ele era um desses desobedientes civis.
— Você não apurou nada — opinou Hermione —, exceto que Harry é ainda mais esperto do que eu achava.
— Ora, obrigado — manifestou-se Harry, já a seu lado.
— Eu apoio o que Harry fez. Deus sabe como já há muitos estacionamentos em Chicago. - virando-se para Harry - Ela se refere a um incidente na época em que você cursava a faculdade — contou Hermione. — Quando protestou contra a derrubada de um prédio.
— Já tinha quase esquecido — refletiu ele.
— Mas as autoridades não — declarou Alberta.
— E por isso chamou Harry de ex-detento? — questionou Hermione, incrédula. — Foi?
— Isto justifica. — A senhora arrebatou o papel e o agitou debaixo do nariz de Hermione. — Ele tem uma passagem.
— Uma detenção por agitação civil não faz dele um criminoso. O que aconteceu com sua teoria de que ele era um impostor?
— Ainda não foi descartada — comentou Alberta. — E não vou desistir.
— O que a faria acreditar que eu sou mesmo Harry Potter? — indagou Harry. — Que tal a lembrança de que eu e Hermione rou­bamos de sua cozinha as maçãs que ia usar nas tortas para o concurso daquele verão?
A anciã alternou o olhar entre Hermione e Harry, o incidente ainda nítido na memória, apesar dos quase vinte anos. Foi o ano em que não ganhou a faixa azul no concurso de tortas da feira do distrito. Até fizera um escândalo, certa de que fora vítima de um ato de sabotagem dos adversários.
— Foram vocês? Ora, seus pivetes...
— Ah, ah, ah — riu Harry, apontando Alberta com o dedo.
— Se ele não é o verdadeiro Harry, como saberia disso? — perguntou Hermione.
— Simples. O Harry verdadeiro lhe contou.
— Eu desisto — resmungou ele. Hermione advertiu:
— Alberta, se se sente melhor achando que Harry é outra pessoa, então, problema seu. Mas, se eu souber que andou aprontando mais confusão, cancelo seu cartão na biblioteca. — Naturalmente, Hermione nunca faria uma coisa dessas, mas a anciã não sabia. — Estamos entendidas?
Assentindo irritada, Alberta foi embora.
— Lamento isso tudo — confortou Hermione.
Harry estendeu a mão e passou o indicador sobre seu rosto.
— Pensei que fosse eu que a protegeria.
— Velhos hábitos custam a desaparecer — replicou ela, sor­rindo.
— Uma vez campeã, sempre campeã, não é?
— Mais ou menos isso...
Ela notou que o olhar dele tinha a mesma expressão de candura. Essa troca de olhares rápida era um intercâmbio entre seus co­rações, constante como a pulsação. Tinha a ver com épocas pas­sadas e prometia secretamente quanto ao futuro.
O momento foi interrompido com a chegada de Beatrice:
— Sinto não tê-la prevenido sobre minha irmã — desculpou-se, desconsolada. — Ela não me contou o que estava tramando. Então, vi aquele gentil, senhor Killian e me distraí. Devia ter ficado de olho em Alberta, devia mesmo.
— Não se preocupe, Beatrice — tranqüilizou Hermione. — Não foi culpa sua.
— Ela fez muita cena?
— Para ser franco, ela é muito boa nisso — comentou Harry, e foi recompensado com o riso de Beatrice.
Batendo na mão de Hermione, a senhora disse:
— Lembre-se do que eu lhe disse sobre as folhas de roseira, Hermione. A não ser que não tenha mais dúvida — acrescentou, com um ar perspicaz.
— Dúvida de quê? — perguntou Harry.
— Nada — respondeu Hermione, embaraçada. — Era sobre... horticultura.
— Sei... — murmurou Harry, não muito convencido. A sra. Cantrell se aproximou correndo, sem fôlego:
— Vocês dois... precisamos de ajuda. Estamos com poucas duplas na corrida de três pernas!
— Com poucas duplas para quê? — perguntou Beatrice, confusa.
— Uma dupla. Um homem e uma mulher — esclareceu a sra. Cantrell. — Vamos. Vocês dois. — Praticamente empurrou Harry e Hermione para o local da partida. — É a última corrida e o último evento em que sou a responsável. E então, jamais me oferecerei para organizar jogos e eventos.
— Diz isso todos os anos — gritou alguém do meio da multidão.
— Este ano é sério. — A exausta sra. Cantrell tirou um lápis dos cabelos grisalhos e consultou sua lista de eventos. — Estou ficando velha demais para isso — resmungou, antes de pousar o lápis e os óculos. — O que os dois estão esperando? — indagou a Harry e Hermione. — Tomem os seus lugares, e preparem-se! Alguém passe as tiras para eles! Ali, agora. Sabe as regras, Hermione. Sua perna esquerda na direita dele, acima do joelho e no tornozelo. O primeiro casal a cruzar a linha vence.
Hermione pegou a tira de pano branca e se inclinou para amarrá-la no tornozelo. Harry não usava meias, e Hermione roçou-lhe a pele ao apertar o nó. Sentiu os dedos estremecerem ao dar um segundo nó, na altura das coxas. Já que ele estava de short, mais uma vez ela se viu tocando em sua pele quente, dessa vez mais intimamente.
Sentiu o rosto enrubescer e então mordeu um lábio para se con­centrar na tarefa de amarrar.
— Quer ajuda? — perguntou ele, solícito.
Ela balançou a cabeça, o que fez a franja cair em seu rosto. Afastando o cabelo da testa, tentou novamente, desta vez conse­guindo dar o nó. Sentia a pele estremecer dos tornozelos às coxas, aquecendo-se com aquela proximidade. 'Colado' nela... A idéia foi direto a seu coração, que palpitou.
Suspirando fundo, Hermione se endireitou, deliberadamente evi­tando olhar para Harry. Só então, percebeu que Wayne e Rosie estavam na corrida também. Eram cerca de doze casais alinhados, o que a fez imaginar por que a sra. Cantrell achara necessária sua participação com Harry.
Como se ouvisse seus pensamentos, a sra. Cantrell se mani­festou:
— Seria má sorte ter treze pares na corrida. — Voltando-se para o grupo todo, perguntou: — Todos prontos? — Quando a maioria assentiu, saiu do caminho. — Muito bem, nas posições, preparar, partida!
Hermione tivera problemas para se aprontar, e não esperava que a corrida fosse boa. Mas, para sua surpresa, ela e Harry se moviam em perfeita união, correndo emparelhados com os adversários. Harry a envolvia pela cintura, assim como ela mantinha o braço ao redor dele. Os pares se entrechocavam e caíam desajeitados, ela e Harry continuavam em frente, mantendo um ritmo que fazia a distância até a linha final diminuir. Hermione mal notou que ultrapassavam os desajeitados Wayne e Rosie. Só sabia que a multidão já aclamava os vencedores: ela e Harry!
Hermione se jogou nos braços de Harry e se deixou erguer, os olhos brilhando pela vitória triunfal.
— Conseguimos!
Harry segurava Hermione em seus braços, desejando que esse momento durasse para sempre. Mas sabia que o momento era efêmero, que se tratava de uma alegria a ser partilhada entre amigos, tanto que Hermione já se inclinava para desfazer os nós que os atavam. Ele podia ter ganho a corrida, mas não ganhara Hermione. Não ainda.
A sra. Cantrell já estava a postos para premiar Hermione e Harry com as faixas azuis de primeira colocação. Hermione prendeu sua fita no bolso e voltou-se para colocar a de Harry na camiseta vermelha.
Enquanto Hermione realizava essa tarefa, Harry olhou por sobre sua cabeça inclinada e viu Wayne observando-os com ciúme in­disfarçável. Apesar de estar acompanhado de Rosie, o cafajeste não tirava os olhos de Hermione. Ocupada em prender a fita no companheiro, ela não notou a reação do ex-noivo.
Mas Harry percebeu, e se lembrou do detalhe primordial: Hermione amava outro. “Além disso, lembrou a si mesmo, você não é nenhum prêmio extra, é um homem que nem mesmo sabe se é capaz de amar alguém”. Não que ele achasse que Wayne tivesse alguma capacidade nesse assunto. Mas realmente tinha confiança nos sentimentos de Hermione. E ela afirmara amar Wayne.
Quanto à paixão que sentiam um pelo outro, Harry atribuía à atração física. Sabia que as mulheres o achavam interessante ago­ra. E sabia que Hermione devia achar isso também, o que justificava ela ter correspondido ao seu beijo. Havia também o fato de ela estar se recuperando. Haviam se reencontrado quando ela estava muito vulnerável. Não era preciso ser acadêmico para saber disso. Nada levava a crer que ele representasse alguma coisa para ela.
Entretanto, essa explicação racional não resolvia seus senti­mentos por Hermione. Queria-a, mas ela amava outro, e era pri­mordial que ela fosse feliz. Deus sabia que ele não era especialista nesse assunto capcioso chamado amor. Seus próprios pais não lhe haviam incutido esse sentimento, tanto que logo se decepcio­nara.
Certa vez, o pai chegara a insinuar que ele não era seu filho de verdade, que deviam ter trocado os bebês na maternidade. Na época, contava oito anos e desejou que o pai estivesse certo. Assim, o fato de eles não o amarem se justificava; afinal, se ele não era seu filho legítimo, eles não eram seus pais. Seus pais de verdade estavam em algum lugar, e podendo o amariam.
Quando tinha dez anos, Harry ficou mais pragmático em relação às coisas, mais propenso a aceitar os fatos. O amor não lhe fora destinado, nem ele seria protagonista de algum. Aprendera a acei­tar essa situação, assim como fazia ao estudar matemática e as leis da gravidade.
Então, conhecera Hermione, naquele verão fatídico em que com­pletara onze anos, e as coisas mudaram. Tivera então uma pequena amostra do que era ter alguém que se preocupava, que o apoiava. Estava sedento por aquele sentimento, e dele usufruíra como se sua vida dependesse disso.
Mas tudo acabara cedo demais, em agosto, ao retomar a velha rotina. Mesmo assim, mantivera uma chama acesa, sabendo que alguém no mundo o considerava inestimável. Quando seu físico melhorou, mais uma vez começou a chamar a atenção. Mas então já era cínico nesse assunto, pois sabia tratar-se de algo superficial, a ser tomado com a mesma rapidez com que fora concedido. Não era algo verdadeiro. Hermione era.
E por isso ela merecia o melhor. Embora achasse que Wayne nem chegava perto do que considerava o melhor, não lhe cabia julgar. Wayne podia fazer Hermione feliz porque ela o amava. Tudo se resumia nisso.
Sendo assim, teria que engavetar seus sentimentos e fazer o que era melhor para Hermione, mesmo que isso implicasse desistir dela. Odiava a idéia. Quando não estava em jogo a opinião de Hermione, não era capaz de atos nobres de benevolência desinte­ressada, nem cavaleiro de armadura polida. Um cavaleiro teria mantido a distância. Não foi o que fez. Era humano. Era apenas um homem com muita carga emocional, mais suspeito que a maio­ria.
Wayne era o tal acostumado a vencer. Ele era o que traçava seu caminho em silêncio. Sozinho.
“Você venceu hoje”, lembrou Harry a si mesmo, olhando fixamente para a fita azul que Hermione acabara de prender em sua camiseta. “E Hermione está com você, não com Wayne”.
Só porque Wayne fora derrotado. Por enquanto. Harry fitou o outro homem. Wayne refletia, lamentava ter deixado Hermione es­capar. O idiota a descartara; não merecia uma segunda chance. No entanto, se tê-lo a fazia feliz, engoliria o desânimo e a dor e faria qualquer coisa para satisfazê-la. Porque ela fora a primeira pessoa a acreditar nele.
Agora, acreditava nela, e, se não era capaz de mais nada, no mínimo lhe mostraria que podia ser ela mesma, que era especial. Sua atitude pouco antes era a prova da autoconfiança, que ele injetara. Devia estar satisfeito com isso.
Mas bastava vê-la para que essas considerações racionais todas fossem para o espaço. Ela estava parada à sua frente, com aquele sorriso encantador, as franjas sedosas caindo em seus olhos. Oh, como a queria, agora mais do que nunca. Então, seria essa sua sina? Querer o impossível?
Hermione notou a melancolia nos olhos verdes e misteriosos de Harry, e ficou imaginando a causa.
— Algum problema? — perguntou ela. — Não está se diver­tindo? Quero dizer, acho que não é assim que passa seus feriados, participando de uma corrida de três pernas.
— Geralmente, trabalho nos feriados — revelou ele.
— Sabe, não consigo imaginar você de terno e gravata — confessou Hermione, sorrindo.
— Não é do meu gosto — admitiu Harry.
— Não que você não fique bem de terno e gravata — esclareceu ela.
— E mesmo? Não é sua tática para me fazer vestir terno e gravata para a dança de logo mais à noite, é?
— Por Deus, não. Vai ser uma quadrilha, totalmente informal. O que me faz lembrar: não se importa de me encontrar aqui no parque em vez de ir lá em casa? Tenho que ajudar Luna no centro comunitário, então fica mais fácil se eu o encontrar aqui. Na frente do prédio seria ótimo.
— Tudo bem. Não precisa de ajuda?
— Ajuda nunca é demais. Fique por aí e dê uma mão onde for preciso, quando estiver pronto.
O problema era que Harry estava pronto para tomar Hermione nos braços, para beijá-la, para amá-la. Mas não estava disposto a fazer isso contra a felicidade dela.

Hermione estava fora do centro comunitário, tomando fôlego após completar suas tarefas, quando viu Harry no meio do pessoal que ainda se encontrava na frente do edifício. Ficou encantada com o jeito como ele se movia, preciso, sem hesitação, confiante quanto a quem é e o que procura, com um objetivo, que era conquistar uma mulher. Conquistar a ela!
Não conseguia desviar o olhar dele. Ele tinha uma maneira de caminhar incrível, perambulando, pura poesia, levemente ar­rogante. Não, não arrogante, corrigiu-se a seguir. Autoconfiante. Harry não era arrogante. Ombros eretos, ele se movia como um nobre. Ou um cavaleiro.
Então, ele a viu. Embora estivesse a vários metros de distância, ela sentia seu olhar como se ele estivesse a seu lado. A multidão em volta deixou de existir enquanto ele se aproximava, jamais desviando o olhar. Pegando em sua mão, ele a afastou da entrada, para longe da agitação. Ela acompanhou, ansiosa, ainda capturada pela magia da aproximação.
Foram para baixo da copa de um salgueiro enorme atrás do centro comunitário, e todo o mundo ao redor parecia um encanto verdejante. Hermione sentia a aspereza do tronco da árvore em suas costas, através do fino tecido xadrezinho do vestido. Harry posi­cionou um braço acima de sua cabeça, a mão contra o tronco, e percorreu seu rosto com as pontas dos dedos, assim como os ramos da árvore acariciavam a relva sob a brisa suave.
— Você está linda — elogiou ele, suave.
Tinha a voz tão mágica quanto o caminhar, concluiu ela, so­nhadora. Falava suave, ainda assim mais potente que um grito, devido à voz imponente. Sentiu-se envolver por aquela melodia.
— Você também está muito bonito — replicou Hermione, timi­damente, as mãos próximas a sua camisa branca, como se quisesse tocá-lo, mas sabendo que não devia.
Harry sabia que não devia seduzir Hermione, que não ficar tentado. Mas não podia resistir.
Perdida na sombra da árvore, Hermione viu o desejo em seus olhos, olhos tão verdes quanto as folhas do salgueiro e misteriosos como a própria humanidade.
Ela baixou o olhar para a camisa branca, a qual já secava. Era a mesma que ela usara depois do banho no chalé, no dia da tempestade. A mesma que descartara em frente à lareira. Ou estava imaginando coisas? Harry provavelmente possuía várias camisas brancas. Não havia razão para achar que era a mesma. Mas achava.
Hermione voltou a encará-lo, na esperança de encontrar a res­posta. Ao invés disso, viu mais perguntas.
— Hermione, você está aí fora? — O som da voz da sra. Cantrell caiu como um raio. — O prefeito está a sua procura.
— É melhor nós irmos — opinou Hermione, lamuriosa. Harry assentiu. Quando ela baixou os braços e olhou ao longe, seus cabelos caíram, escondendo seu rosto. Harry gentilmente jun­tou as mechas sedosas e as prendeu atrás da orelha. Ele mantinha o sorriso, tão poderoso quanto um beijo, que a deixou sem fôlego. Quando entraram no centro comunitário, o local já estava to­mado.
— Oh, aí está você — festejou a sra. Cantrell, em alívio. — O prefeito estava à sua procura.
Um segundo depois, o prefeito se juntava a eles.
— Conseguimos quase mil dólares para o fundo da biblioteca hoje — anunciou ele, triunfante.
— Isso é maravilhoso! — exclamou Hermione.
— Acho que merece uma comemoração — sentenciou o pre­feito, passando a ela um copo de papel com ponche. Vendo Harry a seu lado, providenciou outro copo.
— Obrigado — disse Harry.
— Sou Tom Trout — apresentou-se ele, jovial. — Qual é o seu nome?
— Harry Potter.
— Bem-vindo a Greely, Harry — saudou o prefeito, com um aperto de mão forte, próprio dos políticos. — É a primeira vez que vem aqui?
— Não. Visitei Greely quando era garoto.
— Aposto que não achou o lugar muito mudado, certo?
— Algumas coisas mudaram — replicou Harry, os olhos em Hermione. — Algumas coisas melhoraram. Algumas estão melhores do que me lembro.
— É assim que se fala — disse o prefeito. — Bem, me deixe fazer um brinde. Primeiro, ao sucesso da arrecadação para a bi­blioteca.
Hermione ergueu seu copo para o brinde. Após tomar um gole, o prefeito prosseguiu:
— E a uma boas-vindas calorosa ao mais novo visitante de Gree­ly. Que ele encontre aqui mais coisas que mantenham seu inte­resse.
— Com certeza, encontrarei — afirmou Harry, erguendo o copo.
— Agora, Harry, você e Hermione vão se juntar a nós na qua­drilha?
— Não, senhor. Dança não é o meu forte.
— Não diria isso — sussurrou Hermione, sorrindo, recordando-se dos passos ligeiros ao som de rock-and-roll no chalé.
— Quadrilha não é o meu forte — esclareceu Harry.
— Bem, então, Hermione, acho que somos só eu e você — anunciou o prefeito.
— Oh, não, não posso...
— Claro que pode — incentivou ele, caloroso. — Essa primeira dança é especial para os iniciantes e ensina alguns passos. Apenas siga o animador — instruiu, já levando-a pela mão rumo à pista de dança, onde outros casais se posicionavam.
Eram oito pessoas, quatro casais. Hermione evitava esses eventos havia muito tempo, desde a sétima série, mais precisamente, quando participara de uma quadrilha e descobrira que aquela não era sua atividade favorita.
Lançou um olhar desanimado para Harry e viu que Peggy Sue já o acossava, como se tivesse um sensor infravermelho. Mal se afastara e a mulher já avançava sobre Harry, enquanto ela fingia ouvir as instruções do prefeito sobre os passos que deveriam dar.
O animador foi ao microfone, enquanto a banda, um violinista, um guitarrista, um tocador de acordeão e um de banjo, começava a dedilhar o ritmo conhecido. Hermione ouviu a abertura inconfun­dível:
"Todos juntos ao redor do salão. Quatro duplas, um grupo formarão."
Hermione achou difícil se concentrar no que fazia, uma vez que seus pensamentos estavam em Harry. E os olhos também.
"Mãos erguidas no centro da roda. Girando, girando, e dando a volta."
Ninguém podia acusar Peggy Sue de lerda, Hermione notou, com raiva, enquanto se movia pelo círculo com os outros. A mulher estava praticamente pendurada em Harry.
"Encarem seus parceiros, façam um dó-si-dô Vão para trás, e cada um fica só."
Harry era seu, não de Peggy Sue! O pensamento desequilibrou Hermione, que trombou com o prefeito.
— Preste atenção, menina — o prefeito chamou a atenção.
Hermione tentou se concentrar, mas estava difícil, pois pro­curava Harry, olhando por sobre o ombro, consequentemente se amontoando com os outros casais. Por sorte, a dança de abertura para iniciantes foi curta, uma repetição dos versos, logo se encerrando:
"Pode sair, pessoal de Greely, Mas tome cuidado, não deslize!"
Com esse refrão, o animador anunciava o fim da quadrilha, ao que a banda passava a tocar músicas suaves.
Hermione deixou a pista de dança, pedindo desculpas, quase sem fôlego, e foi direto ao encontro de Harry, estendendo a mão. Sentiu o coração bater mais rápido quando ele aceitou seu convite silencioso, deixando Peggy Sue zangada para trás.
Enquanto seguiam para a pista. Hermione se lembrou da última vez que dançaram juntos em completo abandono junto à lareira. Naquele momento, haviam sido as duas únicas pessoas na face da terra. E ainda tinha essa impressão, embora estivessem cercados de pessoas. De mãos dadas, palma contra palma, dedos entrela­çados, a magia tomou conta.
O conjunto começou a tocar uma canção de Paul Anka, da década de cinqüenta. Hermione obedeceu à letra da canção e a seus desejos, notando que o ombro de Harry parecia feito para isso. Ele não era alto demais a ponto de ela ter que dançar na ponta dos pés, nem baixo o bastante para que ficassem frente à frente.
De pé a frente dele, ela sentia os lábios dele tocarem sua testa. Além disso, a respiração dele lhe embaraçava a franja. E, quando ela se inclinava para a frente, como agora, sua cabeça descansava naturalmente sobre o ombro dele, sólido e seguro.
Ele a conduzia suavemente, deslizando para o lado, acompa­nhando seus outros movimentos. Ela fechou os olhos, tranqüila por ora, eliminando todos os pensamentos ligados ao ex-noivo. E assim foi durante as três canções seguintes.
Quando o conjunto parou para descansar, Harry foi buscar mais ponche. Nesse ínterim, Hermione percebeu que Rosie estava bem pró­xima, sorrindo descontraída, embora seu olhar fosse pouco amigável.
— Seu plano não vai funcionar — advertiu a mulher, agressiva. — Sei o que está planejando. Quer Wayne de volta e acha que pode fazer ciúmes nele. Isso não vai funcionar — repetiu, des­peitada. — Ele é meu agora, e não vai tê-lo!
Atônita diante do ataque verbal de Rosie, Hermione perdeu a fala. Seu silêncio pareceu enfurecer a mulher ainda mais.
— Acha que é muito esperta, não é? Trazendo esse homem para cá e se exibindo com ele na cara de Wayne. Não é como se ele estivesse a fim de você há anos.
— Pretendo ser mais seletiva que você, Rosie — rebateu Hermione. — E não pretendo ficar aqui discutindo com você. Com licença. — Com a cabeça bem erguida, retirou-se.
— Tem alguém lá fora querendo falar com você — informou um desconhecido a Harry, que estava na fila do ponche.
Harry se voltou para ver Hermione e não a encontrou na multidão. Ela devia estar fora esperando por ele. Deixando a fila, cortou caminho em meio à multidão e foi para a entrada.
Fora, o ar estava muito úmido. Um pequeno grupo se aglo­merava de um lado, sob um grande salgueiro. Lembrando que não se viam árvores grandes assim em Chicago, Harry tomou a direção do grupo, procurando Hermione.
Já estava bem perto quando ouviu a declaração hostil;
— Harry Potter, não precisamos de tipos como você por aqui.
Um segundo depois, Harry viu um soco vindo direto em sua direção!

Hermione finalmente conseguiu sair, depois de esbarrar em inúmeras pessoas. Precisava de algum tempo consigo mesma, após o confronto com Rosie. O ar quente lhe chegou como um golpe, assim como a visão de Harry sendo agredido! Alguém tentava esmurrá-lo!
Alguns bêbados do pequeno grupo pareciam encorajar o agres­sor, que Hermione não conseguia identificar. Já corria em socorro de Harry quando o viu deslocar-se rápido como um raio. Um segundo depois, o atacante estava no chão. Em instantes, os bê­bados se dispersaram como sementes ao vento.
— O que está acontecendo aqui? — inquiriu o xerife Edelman. Só Harry, o agressor e um outro homem permaneciam, prestando depoimento ao xerife.
— Fiz um pergunta, rapaz — repreendeu ele a Harry, o tom hostil. — Não gostamos desse tipo de comportamento aqui.
Hermione congelou, incapaz de compreender a violência que aca­bara de presenciar. Por que alguém agrediria Harry?
— Me informaram que havia alguém aqui fora querendo falar comigo — explicou ele.
— Então saiu e partiu para a briga.
— Não — Harry mantinha a voz firme e calma. — O outro cara é que deu o primeiro soco. Eu só me defendi.
O xerife se voltou para o agressor, que praguejava sentado no chão.
— Foi isso que aconteceu, Johnny?
— Que inferno, não! — negou o rapaz. — Eu estava conver­sando com meus amigos quando esse cara chegou.
— Por que eu atacaria você? — questionou Harry, razoável. — Nem o conheço.
Hermione o conhecia. Johnny Givens era um arruaceiro, aliás, a última conquista de Peggy Sue. A mulherzinha se envolvia com tipos cada vez mais jovens e problemáticos.
Johnny grunhiu ao invés de responder à pergunta de Harry, majorando suas dores.
— Acho melhor acabarmos com essa conversa na delegacia — declarou o xerife. — Vamos, os dois.
— Espere um minuto. Wayne viu o que aconteceu — lembrou Harry, bruscamente.
— Foi, Wayne? — perguntou o xerife.
— Não pude ver o que acontecia — respondeu Wayne, com apenas uma pitada de complacência. — Não posso dizer o que estava ocorrendo.
— Pois bem, porque eu posso dizer o que estava acontecendo — anunciou Hermione, juntando-se ao grupo. — E cheira mal! — Seu comentário se dirigia a Wayne, que ficou branco ao vê-la. Voltando-se para o xerife, ela informou: — Eu estava ali junto ao prédio e vi tudo. Johnny deu o primeiro golpe.
— Tem certeza? — questionou o xerife.
— Eu vi.
Franzindo o cenho, o xerife continuou com o interrogatório:
— Fazia quanto tempo que estava lá?
— Tinha acabado de chegar.
— Ah, então, pode não ter visto Harry atacando Johnny e sim Johnny se defendendo.
— Não — garantiu Hermione, segura.
— Como pode ter tanta certeza?
— Porque conheço Harry. E você conhece Johnny, xerife. Devia, pois o vê com muita freqüência.
O xerife se enrijeceu constrangido, virando-se para Wayne à procura de apoio. Hermione sabia muito bem que o xerife era fã de futebol e tinha Wayne em alto conceito, tão alto que se sujeitaria a uma armadilha como essa armada por ele.
Hermione direcionou a fúria para o ex-noivo:
— Não acredito que tenha armado isso! Ora, não se conformou com a derrota naquela corrida de três pernas? Ou é a sua maneira infantil de me afrontar por ter ignorado você o dia todo?
— Não estou sendo infantil, você é que está — rebateu Wayne, com raiva. — Me fazendo ciúmes com esse cara.
— Então armou esse incidente para colocar Harry em dificul­dades. É muito adulto mesmo.
— Não fiz nada disso — protestou Wayne.
— Bati no cara por vontade própria — inseriu Johnny. — Ninguém tem que me dizer o que fazer. Wayne me disse que esse Harry Potter estava dando em cima da Peggy Sue, e decidi dar uma lição nele.
— Aí está, xerife. Uma confissão — anunciou Hermione.
— De um homem bêbado — ponderou o xerife.
— E de um conhecido arruaceiro — completou ela.
O xerife permaneceu em silêncio por um momento, fazendo suas considerações, voltando o olhar para Wayne. Então, encon­trando uma solução, calmamente levantou Johnny.
— Acho que é melhor você se recuperar lá no xadrez. — Voltando-se para Harry, o xerife perguntou, relutante: — Pretende dar queixa deste incidente?
Harry fez que não.
— Já entendi a que se deve esse mal-entendido — comentou ele, a voz calma, mas o olhar perigoso em direção a Wayne.
— Eu também — apoiou Hermione.
Wayne ficou vermelho, se de raiva ou culpa, Hermione não tinha certeza, e foi embora.
Harry voltou-se para encarar Hermione.
— Se não me engano, você disse que o espetáculo de fogos não começaria antes do anoitecer.

— Tem certeza de que está bem? — perguntou Hermione pela centésima vez desde que haviam chegado ao lugar escolhido para ver os fogos.
Harry sugerira o lago. O terreno ao redor de Greely era bem plano, e eles teriam uma visão privilegiada, com os fogos se refletindo na superfície do lago.
— Estou bem — assegurou ele. — Pare de se mexer. Está desequilibrando o bote.
— As pessoas inquietas costumam fazer isso — informou ela. Estavam num bote a remo, o mesmo usado por ocasião daquela tem­pestade. Nessa noite, porém, o céu estava limpo, e as estrelas brilhavam.
— Não disse que era inquieta — corrigiu Harry. — Disse que estava agitada. Não é a mesma coisa. — Sorriu lânguido, cheio de intenções.
Hermione se estendeu para tocar em seu queixo.
— Ainda bem que ele não machucou você. Sinto que isso tenha acontecido.
— Eu não — respondeu Harry, suave, pressionando sua mão contra o próprio rosto antes de beijá-la. Como dizer-lhe que com­pensava levar dez socos em troca daquele olhar dela?
— Onde aprendeu a fazer aquilo... aquilo que fez para se proteger?
— É Tai-chi-chuan, uma arte marcial taoísta.
— Nunca ouvi falar.
— A idéia básica é usar o seu adversário, usar a própria energia do ataque ou desviá-la, mantendo o outro desequilibrado.
Hermione sabia por experiência própria que ele era especialista em mantê-la desequilibrada.
— Outras pessoas combatem fogo com fogo, mas prefiro com­bater o fogo com água — ponderou Harry.
Nem sempre ele fazia isso, notou Hermione. Com um sorriso so­nhador, recordou a paixão que partilharam em frente à lareira... quan­do ele combatera o fogo de sua paixão com outro ainda mais intenso.
As reminiscências sensuais foram interrompidas pela explosão de luzes no céu limpo. Harry posicionara o bote de maneira que Hermione ganhasse uma dor no pescoço, a menos que fosse para junto dele. Considerando o espaço estreito, ela teve que se alojar entre o V de suas pernas, recostando-se contra seu peito. Harry a envolveu pela cintura, apoiando o queixo sobre sua cabeça.
Deitada tão perto dele, Hermione sentia a atração crescente entre os dois a cada suspiro. Assim como os fogos de artifício, seu relacionamento com Harry começara com uma pequena explosão, antes de caminhar para uma grande final. O espetáculo de fogos já ia terminar, e ela sabia que chegara a hora do grande final para eles também.
Harry remou de volta ao atracadouro. Hermione aceitou pronta­mente seu convite para um refrigerante. Em vez de esperar na varanda, entrou com ele no chalé. O clima estava quente demais para acender a lareira, mas ideal para outro tipo de fogaréu...
As almofadas estavam em frente à lareira, como da outra vez, durante a tempestade. Agora, porém, Hermione sabia o que queria, sabia o que a faria feliz. Afundando-se nas almofadas, esperou Harry inspecionar a geladeira.
Olhando para ela, por cima da porta do congelador, ele informou:
— Tem refrigerante e cerveja. — Mostrou as duas latinhas para que ela escolhesse. — O que vai ser?
Hermione já se oferecia a ele, desabotoando os três últimos botões do vestido lentamente, enquanto respondia com voz rouca:
— Acho que é hora de acabarmos o que começamos.




Obs:Oiiii pessoal!!!!Eu peço que me desculpem por ter demorado tanto para postar mas, além da faculdade, eu estou com problemas no meu pc.Espero que tenham curtido o capitulo!!!!Logo logo tem fic nova na área!!!!Bjux!!!!Adoro muuuuuito todos vcs!!!!

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Comentários (1)

  • Isis Brito

    AAAAAHHHH!!! QUE LINDOOOO!! *-* A Mione percebeu q gosta do Harry... \o/

    2011-08-27
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