Capitulo II



Capitulo II


- Olá.
Ela olhou para o dono da voz e se surpreendeu. Fechou o livro que lia e correspondeu ao sorriso dele.
- De novo aqui, Senhor Potter! – ela falou, vendo-o sentar-se ao seu lado, num dos bancos do enorme jardim. – Escolheste o dia errado para voltar, acredito que irá chover em breve.
Ambos olharam para o céu, nublado, nuvens escuras se juntando. Uma tempestade estava por vir. Ele apenas deu de ombros com um sorriso desengonçado.
- Minha presença a incomoda, senhorita? – ele indagou, com graça.
- Certamente que não. Mas faz apenas uma semana que esteve aqui. Voltaste muito rápido. Todas as pessoas que visitam este convento nunca mais voltam.
Ele riu.
- Essas pessoas talvez não conheceram o convento como eu conheci. Tive uma excelente guia.
- Ah, por certo que teve. São poucos que tem tal sorte, Senhor Potter, deveria orgulhar-se.
- E gabar-me também, suponho.
- Claro.
Ela sorriu.
- Justamente sobre isso que vim lhe falar, senhorita.
- Sobre o que?
- Sobre ter me levado para conhecer o convento. O fizeste com maestria e eu nem a agradeci.
- A Madre não deixou.
- Exato. Achei que seria de bom tom voltar aqui para agradecê-la pela gentileza.
- E conseguiste entrar aqui alegando a Madre que virias me agradecer? – ela questionou, incrédula.
- Por certo que não. – ele abaixou o tom da voz. – Disse-lhe que vim apenas para avisar o dia que traria as coisas de minha irmã pra cá.
- E ela o deixaste vir até aqui para ver-me?
- Ela pensa que fui embora. – ele falou, abaixando mais ainda a voz.
A menina o olhou incrédula e abafou uma gargalhada com as mãos.
- E o que pensas que estás fazendo aqui, na vista de qualquer irmã que passar.
- Achei que valeria a pena correr o risco. – ele a fitou, o brilho dos olhos dela cintilou.
- Queres saber a verdade? – ela falou, se levantando.
- Claro.
- Nunca há pessoas aqui com quem eu possa conversar. Estou aqui há mais de um mês e o senhor é a primeira pessoa nesse lugar com que eu conversei por mais de cinco minutos.
- Levas uma vida enfadonha e monótona então.
- Sim. E não vou desperdiçar a chance que Deus me mandou. – ela disse, com ironia. – Acompanha-me num passeio, Senhor Potter?
- Encantado. – ele respondeu, levanto-se e oferecendo um dos braços pra ela.
- Hum, que formal. – ela comentou, enlaçando seu braço ao dele. – Normalmente não gosto muito de formalidades.
- Suponho que somente velhos ricos tenham lhe oferecido o braço para uma caminhada. – ele falou, rindo, começando a caminhar com ela em meio às flores do jardim.
- A maioria. E os jovens... Oh! Todos feios! – ela respondeu, fazendo-o rir mais.
Andaram sentido ao outro extremo do jardim, oposto ao convento, quase a orla do bosque da propriedade. O vestido longo da moça ia arrastando pelo chão, acompanhando os movimentos dela.



- Deixe-me adivinhar. Cultivas café!
- Sim.
- Tens cara.
- Cara de café? – ele indagou.
- Não. – ela respondeu, rindo. – Cara de cafeicultor.
- Claro. Mas também cultivo uvas para produção de vinho.
- Fascinante. Não tens cara de quem cultiva uvas. – ela comentou, distraidamente.
- A senhorita também não tem cara de quem lê sobre socialismo e comunismo.
- Tenho cara de que, então?
- Dessas moças finas da alta sociedade, que só estão à espera do marido ideal.
Ela riu com vontade.
- Acredite. Não estou à espera do marido ideal.
- Por quê?
- Porque não existe marido ideal.
- Quem lhe disse isso?
- Ninguém. Mas eu vejo. Casamento não passa de um negócio para as famílias. União de bens, aumento da fortuna, e os pais casam suas filhas como se fossem um objeto, visando apenas o lucro que elas irão lhe proporcionar.
- Meus pais se amavam. – ele falou, admirado com a opinião dela.
- Caso raro.
- Mas pode acontecer.
- O senhor realmente acredita que vai encontrar a mulher ideal? A mulher da sua vida? – ela perguntou, séria, fitando-o com seu olhar determinado.
- Tenho certeza.
- Esqueça, Senhor Potter, um raio não cai duas vezes no mesmo lugar. Só lamento que o senhor terá que casar-se, de qualquer forma, visto que tua irmã seguirá a vida religiosa. Precisa de herdeiros, não?
- Tão jovem e tão descrente ao amor.
- Não acredito no amor. Acredito na conveniência. Talvez eu me case um dia, quem sabe... Se eu achar um homem que seja capaz de me provar que morre por mim... Talvez... – ela falou, convicta. – E não sou tão jovem quanto pensas, já tenho dezoito.
Ele não podia negar, era uma mulher forte, determinada, com opinião própria e nem um pouco influenciável.
- Se não acreditas no amor, o que pretende fazer da vida?
- Fazer a diferença. Mostrar aos homens que as mulheres podem ser melhor que eles. Fazê-los engolir esse machismo inútil e mostrar do que uma mulher é capaz.
- Sabes que será muito difícil. Tens consciência da sociedade repressora que vivemos.
- Sei. Mas ninguém conseguirá me derrubar, sou forte.
- Eu sei.
Eles se calaram por um momento.
- Deves me achar louca, não é? Nem o conheço e...
- Acho que é uma mulher admirável. – ele falou, fazendo-a parar.
Ela o encarou. Nunca tinham tratado-a assim, nunca haviam levado as idéias dela em consideração. A achavam louca, ou jovem demais para entender das coisas da vida.
- Os outros ainda me chamam de menina...
- Podes ser uma menina na aparência, mas é uma mulher forte e determinada em seu interior. Acredite senhorita, nunca conheci ninguém com tanta determinação e garra... Vontade de vencer.
- Diz isso para agradar-me.
- Não, digo isso por que é a verdade. – ela o fitou, tristonha, respirou fundo.
- Agradeço-te por me ouvir e... – mas ela se calou ao sentir uma gota fria cair em seu ombro, seguida de outras gotas grossas.
- Realmente, tinhas razão. – ela falou, tirando o casaco apressadamente, colocando-o sobre ela. – Está chovendo.
Ela sorriu enquanto ele olhou em volta.
- O convento está longe.
- Mas precisamos voltar.
- Vamos nos desfazer no meio de tanta água se voltarmos. Estamos do outro lado do jardim, levaria muito tempo para voltarmos.
- Mas...
- Venha comigo. – e sem pudor nenhum ela o tomou pela mão e saiu correndo puxando-o consigo. Entraram bosque adentro correndo o mais rápido que podiam. Ela o guiava como se soubesse o caminho de cor, protegida pelo casaco dele.
A chuva cada vez mais forte, fazia as gotas arderem ao tocar a pele. Misturado com um vento cortante e uma porção de trovões e trovoadas.
- Onde estamos indo?
- Confie em mim. – ela falou, fazendo-o correr mais depressa.
Os pés deles afundavam na terra molhada, o vestido que ela usava colara em seu corpo e estava com a barra completamente suja de lama, assim como a calça e os sapatos dele.
Então Harry avistou um casebre de madeira numa clareira e entendeu pra onde estava sendo conduzido.
A moça parou ofegante na porta e a abriu, entrou com pressa e esperou ele passar para fechá-la.
- Estou... Encharcado. – ele falou, quando conseguiu olhar pra si mesmo. Tinha água em todos os lugares possíveis.
- Estaria muito mais se tivéssemos ido para o convento... Levaríamos uns bons minutos correndo até lá. Não demoramos nem cinco para chegar aqui. E tem outra coisa: você não poderia aparecer no convento em hipótese alguma, ou arrumaria sérios problemas com a madre superiora.
- Tens razão. Obrigado.
- Não há o que agradecer. – ela respondeu, tirando o casaco dele. – Ah, obrigada, me foi realmente útil.
- Por nada. – ele respondeu olhando em volta.
A casa era pequena, toda de madeira. Mas bem limpa e organizada. Tinha uma lareira e uma poltrona velha na frente, logo depois uma cama e do outro lado da casa um fogão a lenha, uma mesa e uma caixa com algumas coisas de comer, incluindo frutas.
- Quem mora aqui? Não há perigo de chegar?
- Eu moro aqui. – ela respondeu, soltando os cabelos molhados, deixando os cachos lhe cair pelo meio das costas.
- Como?
- Descobri essa casa logo que vim pra cá. A limpei, arrumei, trouxe umas coisas. É meu refugio, é o único lugar aqui onde posso ser eu mesma e agir como quiser. Sem meus pais ou as freiras me dizendo o que fazer e como fazer.
- Então... Vens sempre cá? – ele perguntou, abobalhado, começando a sentir frio.
- Normalmente, durmo aqui.
Ela andou até a cama e largou o casaco dele pendurado nela. Dirigiu-se para a lareira e começou a mexer ali, a procura de lenha.
- Nunca fugiu de uma tempestade numa floresta, não é, Senhor Potter? – ela perguntou, rindo.
- Não. Como sabe? – ele indagou, sentindo um frio súbito correr-lhe o corpo, provocando um leve tremor.
- Porque enquanto te puxava pra cá, o senhor passava pelas frestas entre as copas das árvores, enquanto eu tentava puxá-lo para mais perto do tronco, onde as copas são mais densas, portanto chove menos.
Ele ponderou.
- Tens toda razão.
- Tenho sim. Enquanto eu só molhei a barra do vestido o senhor se molhou inteiro.
- É a falta de prática... – ele falou, fazendo-a rir e balançar a cabeça.
- Tem vela na gaveta da mesa. – ela falou.
Ele a observou por algum tempo, toda molhada, com os cabelos soltos. Sua ninfa era uma mulher de verdade, cheia de encantos e mistérios.
- Senhor Potter? Importar-se-ia de acender algumas velas, já está escurecendo.
- Ah, claro.
Ele foi até a mesa e fez o que ela pediu. Colocou as velas em lugares estratégicos, fazendo toda a casa ficar iluminada.
- Pode sentar-se. Fique a vontade. Terá de espera que a chuva passe, e não me parece que será logo. – ela falou, sentando-se na cama.
- Me desculpe pela situação. Sei que não é apropriado, nem certo... Pode mandar-me embora a qualquer hora se sentir-se incomodada. – ele falou, meio envergonhado, começando a tremer.
Não era normal um homem e uma mulher que mal se conheciam ficarem juntos, sozinhos, numa mesma casa, isolados.
- Por favor, Senhor Potter. Não sejas tão formal. Não o deixaria na chuva por tamanha besteira. Confio no senhor, tenho certeza que não me fará mal algum.
- Tenha certeza disso senhorita, mas...
- Chega. Não fale mais nisso. – ela falou, se levantando. – Quer comer alguma coisa? Tens fome?
- Não, senhorita, obrigado.
- Se tiver, pode pegar alguma coisa... Não tem muito, mas acho que dá pra agüentar por toda a noite. – ela falou, mordendo uma maçã.
- Por toda a noite? – ele indagou, encarando-a.
- Não achas que essa tempestade findará em uma hora, achas? – ela disse, com perspicácia.
- Mas...
- Sente-se e ficará tudo bem. – ela voltou a sentar-se na cama, subiu ligeiramente o vestido para tirar as botas imundas de lama. - Acho que devias tirar os seus também. – ela falou, olhando para os sapatos dele. – Pés gelados é um horror...
Ele acabou rindo, e sentou-se na poltrona, tirou os sapatos cheios de água, e as meias encharcadas. Esticou as pernas e colocou os pés rentes a lareira, que fora acesa pela moça, porem, a falta de lenha impediu que as chamas aumentassem, o fogo ali era quase inexistente, suas mãos tremiam bruscamente, ele passou a esfregá-las uma na outra na tentativa de se esquentar.
- Bem melhor agora, não? – ela falou, deitando-se na cama. De onde estava podia ver o perfil do jovem contra as poucas e fracas chamas da lareira.
- Sim. Com certeza.
- Senhor Potter? – ela chamou.
- Sim?
- O senhor gostava de seus pais? – ela perguntou meio tímida e tristonha.
Ele a fitou com certa dúvida.
- Sim, claro que gostava.
- Você os amava?
- Os amava muito. Sempre foram bons comigo e com minha irmã. Eram ótimos pais, diferente de muitos...
- Diferente dos meus. – ela falou, baixinho.
- Por que diz isso?
- Acho que... Eles não me amam. – ela confessou, triste, fitando os olhos verdes dele.
- Ora, deixe de bobagem... Claro que a amam.
- Não são bons comigo. Nunca foram. Sempre me deram coisas caras, presentes finos, importados, roupas da moda, desenhadas especialmente pra mim...
- E isso não é bom?
- ...mas não me deram amor. – ela completou.
Harry viu uma lágrima escapar dos olhos dela e ficou com o coração da mão, tremendo cada vez mais.
- Não digas isso. Eles pensaram que estavam fazendo o melhor pra ti.
- Mas não estavam. Eles deviam ter me perguntado o que era melhor pra mim. – ela disse, secando as outras lágrimas que rolavam pelo seu rosto.
- Não fiques assim, por favor... – ele falou, penalizado, e sem poder se conter, saiu de sua poltrona a ajoelhou-se ao lado dela, apoiando uma das mãos no colchão.
- Nem um abraço, ou uma palavra... – ela sussurrou, com um misto de tristeza, raiva e frustração.
- A senhorita disse que não acreditava no amor...
- Eles me fizeram desacreditar. Casaram-se por conveniência, e viveram toda a vida se suportando.
- Eu sinto muito...
- Às vezes acho que sou mais feliz aqui sozinha, do que lá com eles. – ela falou, em voz baixa.
Um raio iluminou o céu, seguido de um trovão forte.
Ele olhou para a janela enquanto a mão dela agarrou a dele, instintivamente, sobre a cama.
- Me desculpe, eu... – ela começou, puxando sua mão de volta.
- Tudo bem. – ele falou, com um sorriso.
- Está tremendo...
- É só frio. – ele desconversou. Era muito frio, seu corpo todo tremia.
- O fato é que... Tenho medo de tempestades. – ela falou, em um meio sorriso.
- Estás falando sério? Parece-me muito independente para ter medo de tempestades. – ele comentou, com graça.
- Não consigo dormir. – ela falou, meio envergonhada.
- Se segurar minha mão vai ajudá-la nisso, fique a vontade. – ele falou, rindo, oferecendo-lhe a mão.
Ela sorriu e a aceitou.
- Obrigada. – ela sibilou.
Ele se sentou no chão, encostou-se a parede, segurando firme a mão dela.
Os minutos se passaram e ele a observou fechar os olhos relutante, cada trovão era um pulo que ela dava, ele ria. O frio o consumindo como nada o fizera antes, tremia loucamente agora.
Ela virou-se para o outro lado, soltou a mão dele.
Dormira.
Ele ficou feliz com isso. Conseguira ajudá-la em seu temor.
Levantou-se e voltou à poltrona, aproximou-se mais da lareira em busca de um calor inexistente, mas seu corpo parecia frágil. Largou-se na poltrona e dormiu instantaneamente.

***

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Obrigada Aninha, sempre fiel. Espero que tenha gostado do capítulo.


Beijooos.

Paulinha.

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