November rain (reescrito)




 
 

Capítulo 8 – November rain


 


             A euforia da primeira tarefa já havia passado, o outono morno se desmanchava nas chuvas frias de início de inverno. O dia 31 de outubro amanheceu nublado, e sob as nuvens cinzentas, o teto do Salão Principal estava cheio de abóboras esculpidas para a noite do Halloween.


            Depois da primeira tarefa, Remus vinha passando cada vez mais tempo com Nathalie, a garota da Corvinal de quem ele gostava. Os dois se sentavam juntos nas aulas de feitiços e conversavam quando se encontravam no corredor, e qualquer idiota conseguia ver o quanto a garota estava interessada. Menos o próprio Remus, é claro, que ficava nervoso toda vez que a via. Os dois formavam um casal tão fofo que era de se impressionar que não fossem ainda um casal. Foi bem no Halloween, quando os Marotos deixaram Remus para trás conversando com Nathalie antes do almoço, que James entrou numa briga.


            Ele, Sirius e Peter vinham andando em direção ao Salão Principal, e alguém esbarrou no ombro no de James, quase derrubando os livros que o garoto segurava. Ele não teve muita surpresa ao ver quem era.


            - Qual é o seu problema, Snape? - Ele perguntou, e o sonserino se virou para ele, um brilho de raiva passando em seus olhos escuros.


            - Quem vai ter problemas aqui é você, Potter. - Snape se aproximou de James, encarando-o com superioridade, apesar de não ser muito mais alto que o outro. Haviam dois outros sonserinos com ele, Mulciber e Nott, e os garotos cruzaram os braços, tentando parecer intimidadores.


            - Não estou muito interessado em ter problemas, já passei dessa fase de arrumar brigas que não valem a pena. Nada pessoal, Ranhoso, eu adoraria quebrar sua cara, é só que algumas pessoas amadurecem mais rápido. - James não se intimidou pela ameaça implícita na atitude de Snape, e Sirius soltou uma boa risada das palavras do amigo, aquela risada que parecia um latido, o que pareceu irritar o sonserino ainda mais.


            - Então é isso, não é? Você está se fingindo de maduro e inteligente pra ela se encantar por você. Não vai funcionar, Potter, porque você é apenas um idiota mimado e não consegue esconder isso.


            - Diferente de você, Ranhoso, eu não preciso fingir nada. - James bagunçou seus cabelos, aquela pose arrogante tão típica dele. - A Lily anda comigo porque me prefere, do jeito que eu sou, a você. Acabou, Snape, você perdeu, admita isso.


            Snape sacou a varinha e a apontou para a cara de James, e o grifinório imitou o gesto. Os dois se encararam, a raiva muito clara no rosto de ambos.


            - Você vai engolir sua arrogância, Potter. Sectusempra! - Snape bradou, mas James conseguiu bloquear o feitiço e mandar um outro contra ele, que também foi bloqueado pelo sonserino.


            Peter se encolheu num canto, e Sirius sacou sua varinha, pronto para defender o amigo, mas foi atacado por Mulciber antes que pudesse interferir na briga dos dois. Nott saiu correndo, deixando os dois pares duelando no corredor deserto, afinal, todos estavam almoçando naquela hora. Ambos os duelos pareciam equilibrados, e se pareciam muito mais com duelos de verdade do que com briguinhas de alunos nos corredores. Praticamente só lançavam feitiços não-verbais, com uma velocidade e uma fúria dignos de batalhas de vida ou morte. Eles não estavam de brincadeira ali.


            Mulciber começou a sucumbir, ele não era um duelista tão bom quanto Sirius, e ele já estava quase caindo quando Nott voltou, e, como qualquer bom sonserino, ele não voltou sozinho. Haviam outros dois projetos de Comensais junto com ele, McNair e... Regulus Black. Aquilo não ia prestar. Mulciber olhara para trás para ver quem chegara, e Sirius aproveitou para estuporá-lo. Regulus veio direto de encontro ao irmão, atacando com uma força que Sirius não sabia que o garoto tinha. Nott também atacou Sirius, enquanto McNair se juntava a Snape contra James. Dois contra um, do jeito que os Comensais gostam. E, pelo jeito de duelar, não havia de fato muita diferença entre os sonserinos e Comensais da Morte; eles eram rápidos e impiedosos, e parecia haver um certo bocado de artes das trevas no meio dos feitiços que eles lançavam.


            - Desista, maninho, você nunca foi páreo para mim. - disse Sirius em meio aos feitiços, e Regulus atacou com mais força.


            - Pelo contrário, eu estava há muito tempo querendo te encontrar numa batalha, para poder acabar com a desgraça que você é para o meu nome. - O garoto, tão franzino perto do irmão, além de um ano mais novo, o encarava como um igual, e lançava mais feitiços contra Sirius do que Nott.


            - Olha só, você está falando igual a nossa mãe. Quer ser igual a ela quando crescer, um velho amargurado e odioso? Se você sobreviver por tanto tempo, claro.


            - Melhor ser igual a ela do que igual a você, a vergonha da família. E é você quem não vai sobreviver por tanto tempo, eu mesmo vou garantir isso. - Regulus jogou um filete de chamas pela varinha, e Sirius teve que conjurar uma parede de água para se defender, molhando todos eles quando se espatifou no chão. Mas isso deu espaço para que Nott acertasse um feitiço em Sirius, que abriu um corte em seu ombro, e o grifinório teve que redobrar o esforço para se defender dos dois.


            A briga de James não estava muito diferente, a vantagem que os projetinhos de Comensal tinham em número estava se fazendo valer, e eles estavam atacando muito mais que se defendendo agora. Foi então, quando James e Sirius estavam quase sucumbindo, que alguma força separou os duelistas, jogando-os para trás e mantendo-os separados. Os seis garotos olharam para a direção da qual o feitiço tinha vindo e viram a professora McGonnagal andando até eles, com uma expressão de dar medo em seu rosto.


            - Não acredito no que estou vendo. Quanta vergonha, duelando no corredor! Cinquenta pontos serão retirados das suas casas, e vocês seis cumprirão detenções por um mês. Francamente, atacar colegas é inadmissível, e vocês sabem muito bem disso! Principalmente, você, Sr. Black - ela disse olhando para Sirius, que abaixou a cabeça, e Regulus cerrou os punhos. - que devia ser um exemplo, já que é o campeão do Tribruxo! Estou muito desapontada...


            McGonnagal continuou com sua bronca, tentando não parecer muito espantada com o nível de estrago daquele duelo. Além de estarem todos molhados, os seis tinham arranhões, marcas vermelhas nos rostos e rasgos no uniforme, os óculos de James estavam trincados, um corte no ombro de Sirius não parava de sangrar, e do nariz de Snape escorria sangue em vez de ranho. Minerva nunca vira uma briga de alunos desse jeito, elas eram sempre uma azaração boba como Cara-de-Lesma ou Furunculus, nunca um duelo sério como aquele. E ela sabia exatamente a razão daquilo: a guerra estava chegando a Hogwarts.


**


            - Inacreditável. Eu dou as costas por dez minutos, e vocês dois arrumam confusão com os Sonserinos. Vocês não vivem mesmo sem mim, não é? - Remus falou, brincando, depois que James e Sirius contaram para ele o que havia acontecido. Eles estavam almoçando, já haviam se secado com um feitiço e concertado os óculos de James, mas o ombro de Sirius ainda sangrava.


            - Não acredito que vocês vão pegar detenções com a Minerva por um mês inteiro, acho que isso é um tipo de recorde até. - Alice comentou, e os garotos riram. - E ainda deram sorte por ela ter liberado vocês hoje pro jantar de Halloween.


            - Deram sorte foi por ela ter chegado lá, vocês estariam acabados se ela não tivesse parado a briga. - Lily disse, com o cenho franzido. Ela não havia gostado nada daquela história, estava cansada dessas brigas idiotas entre James e Severus.


            - Que isso, Lily, nós estávamos dando a maior surra neles. Snape e os amiguinhos dele nunca conseguiram ganhar da gente, não é dessa vez que conseguiriam. - James deu um sorriso convencido, mas no fundo sabia que aquilo era mentira. Ele nunca tivera um duelo como aquele, a coisa fora muito mais séria do que ele esperava.


            - Eu concordo com a Lily, e vocês dois estão se esquecendo de uma coisa: eles não são mais só “Snape e os amiguinhos dele”, são projetinhos de Comensais da Morte, e eu aposto dez galeões que eles têm treinado artes das trevas em casa, se é que não treinam aqui na escola também. Isso não foi só uma briguinha de corredor, foi um ataque de Comensais. - todos se calaram diante das palavras de Emilly. Ela estava certa, Hogwarts estava se tornando uma extensão da guerra que acontecia lá fora, e isso ficava cada vez mais claro.


            As aulas recomeçaram normalmente depois do almoço, exceto para Sirius, que foi para a ala hospitalar curar o corte do seu ombro. Ele não queria ir, mas Lily dissera que, se aquilo fora feito com magia negra, não pararia de sangrar tão cedo, e ele ficou preocupado. Madame Pomfrey também se preocupou ao ver o ombro dele.


            - Garoto, como você conseguiu esse corte? Consigo sentir magia negra nele de longe! Não vai ser fácil curar isso.


            - Foi num duelo. Ai! - ele reclamou quando a enfermeira pingou uma poção em seu ombro, que ardeu como se ela tivesse pingado limão.


            - Vou reportar isso para a professora McGonnagal. Quem quer que tenha feito esse feitiço está muito encrencado. - ela agora lançava uma série de feitiços no corte, que aos poucos parava de sangrar e se fechava um pouco.


            - Bom, isso é um alívio, saber que o Nott vai se encrencar mais que eu. - ele brincou, e Madame Pomfrey começou a fazer um curativo em seu ombro, ignorando a piada.


            - Isso é o máximo que eu posso fazer, Sr. Black. Vai demorar alguns dias para se curar completamente, e provavelmente vai deixar uma cicatriz. É muito difícil curar ferimentos feitos por magia das trevas. Se a situação piorar, volte aqui, certo?


            Sirius agradeceu e saiu da enfermaria. Já havia se passado mais da metade do horário de Transfiguração, e ele resolveu esperar até a próxima aula. Ele gostava de andar em Hogwarts quando os corredores estavam vazios, e gostava, principalmente, dos segredos que haviam naquele castelo, segredos que poucos conheciam. Se aproveitando de um desses segredos, Sirius afastou uma tapeçaria na parede, revelando uma passagem que ele sabia sair próxima ao retrato da Mulher Gorda. Tinha que terminar alguns deveres, e esse meio horário livre caíra como uma luva.


**


            Abóboras cobrindo as velas, gostosuras e travessuras cobrindo as quatro mesas do Salão Principal, sorrisos cobrindo os rostos dos alunos das três escolas que se reuniam ali. Rabicho se entupia de comida, Remus e Nathalie conversavam, sorrindo um para o outro, e Jessy observava Sirius de longe com sua costumeira cara de doida. Os demais jantavam e conversavam animadamente, o incidente do almoço quase completamente esquecido.


            - Ah, acho que já nos entupimos o suficiente das gostosuras... - disse James, batendo na barriga, com um sorriso malicioso no rosto. - agora é hora de contribuirmos com as travessuras.


            Sirius soltou uma risada e bebeu um gole de seu suco de abóbora antes de tirar das vestes um pacote com o emblema da Zonko's.


            - Eu estava guardando isso especialmente para o dia de hoje. - ele falou, enquanto James espiava o conteúdo do pacote. As mais variadas bombinhas e fogos de artifício, um mundo interminável de maravilhas, aos olhos dele.


            - Vamos jogá-las no corredor da sala do Filtch, ele vai ficar louco! - sugeriu James, e os amigos riram.


            - Hoje é o dia da minha ronda, eu cubro pra vocês. Mas cuidado, já se meteram em confusão o suficiente por um dia. - Remus falou, já pensando num jeito de despistar o zelador.


            - Vocês são loucos, se forem pegos, ganham mais um mês de detenção – falou Lily, em reprovação, mas Sirius já tinha a resposta na ponta da língua.


            - É Halloween, Lily, e todo mundo sabe que o Pirraça gosta de aprontar no Halloween, a culpa vai toda pra ele. Além do mais, nós já estamos ferrados mesmo, não pode piorar muito mais.


            Não é que eles não se preocupassem em serem pegos, eles até se preocupavam um pouco. Acontece que armar essas travessuras no Halloween era uma tradição deles, e, com tanta coisa mudando em tão pouco tempo, era bom se apegar a tradições.


**


            Sete de novembro era sempre um dia complicado. Não para todo mundo, é claro, mas para uma pessoa em especial. Emilly Carey. A garota mais bonita e popular de Hogwarts, provavelmente também a mais sorridente e divertida, ficava calada e pensativa no dia sete de novembro. A maioria das pessoas nem notava essa mudança, e os que notavam nunca tinham coregem de perguntar o porquê. Pouquíssimos eram os que sabiam o significado daquela data, apenas suas três melhores amigas e um garoto que costumava ser seu amigo também.


            Assim que acordou, Emilly foi abraçada por Lily e Alice, apesar de ter dito que estava bem. Para o resto da escola, porém, aquele era um dia comum, e, como em qualquer outro dia, as corujas invadiram o Salão Principal durante o café da manhã para trazer o correio dos alunos. Os costumeiros pacotes de Profeta Diário e cartas de família voavam para as mãos das pessoas. Como esperava, Emilly não recebeu nada de sua mãe, provavelmente a megera nem se lembrava de que dia era aquele. Jessy, porém, recebeu uma carta embrulhada num envelope de aparência mofada.


            - Meu pai me mandou uma carta! - anunciou a garota, e as três amigas levantaram os olhos para ela. “Infeliz coincidência”, pensou Emilly, o pai de sua amiga resolver escrever para ela exatamente no dia em que completavam oito anos que o pai de Emilly morrera. Ainda assim, ela não deixou seu pesar transparecer, Jessy não tinha nada a ver com aquilo, afinal. - Ah, papai é tão atencioso! Ele sempre se lembra de mim, me conta tudo que está acontecendo lá em casa...


            Emilly não conseguiu sustentar o sorriso enquanto Jessy continuava a tagarelar sobre como o pai dela era ótimo. Não era possível que ela estivesse fazendo isso por mal, não é? Elas eram amigas, afinal. A garota devia apenas ter esquecido que dia era aquele, Emilly tentou se convencer disso.


            - Ele até mandou fotos! Que sorte eu tenho de ter um pai como ele. Estou até com saudades do papai... - Não tinha mais como se convencer da inocência de Jessy, veneno escorria dos lábios dela, e havia um brilho malicioso em seus olhos esbugalhados. Lily e Alice estavam atônitas, e os nós dos dedos de Emilly já estavam brancos, de tanta força com que ela segurava os talheres. A morena se levantou de súbito, fuzilando Jessy com o olhar.


            - Não vou ficar aturando isso. Vejo vocês na aula. - ela saiu do Salão mais rápido que o decoro permitia. Alice se levantou para ir atrás da amiga, mas Lily a segurou pelo braço.


            - Deixa, ela precisa ficar um pouco sozinha. - disse e ruiva, e Alice assentiu. Emy sempre precisava ficar um pouco sozinha naquela época do ano, e as duas aproveitariam para ter uma conversa séria com Jessy.


            Assim que saiu do Salão Principal, Emilly correu pelos corredores praticamente vazios da escola, indo diretamente para o único lugar que a trazia algum conforto. Seus pés já faziam sozinhos o trajeto, e ela estava sentada sob a estátua de javali, olhando para o vitral banhado pela tempestade que caía lá fora. As chuvas de novembro, as últimas chuvas antes que o frio de verdade começasse, mas para Emilly aquele era o dia mais frio do ano.


            Como é que Jessy tivera coragem de fazer aquilo? E, principalmente, qual era o propósito de ficar esfregando na cara de Emilly que tinha um pai vivo e feliz, justamente no dia em que, há oito anos, Emilly perdera seu pai? Se isso viesse de alguma outra pessoa, talvez nem a tivesse afetado tanto assim, Emilly sabia lidar com gente maldosa, mas vindo de Jessy?! Elas eram amigas desde o primeiro ano, por Merlin! Mesmo que implicassem uma com a outra, elas só faziam isso de brincadeira. Emilly nunca fora tão próxima de Jessy quanto era de Alice ou de Lily, mas ela gostava muito da amiga e sempre tentava ajudá-la. Por que, então, Jessy fizera aquilo com ela, por que resolvera de repente pisar em suas feridas? Seus olhos se encheram de lágrimas, mas Emilly as conteve, ela não queria chorar pelo que Jessy dissera, não queria dar esse gostinho para ela.


            Passos ecoaram no corredor, e ela se virou. Ele viera, ele sempre vinha. Sirius se sentou ao seu lado, mas ela se levantou e andou até a janela, encarando o desenho do vitral. Estava com medo de se aproximar demais dele e sucumbir às lágrimas que insistiam em subir aos seus olhos.


            - Eu ouvi o que ela disse. Não dê importância pra ela, Emy, ela só quer te atingir. - Sirius falou, e ela viu o reflexo dele se aproximando do dela. Seu coração deu um salto quando ele a abraçou pela cintura, colando suas costas no corpo dele.


            - Mas por quê? O que foi que eu fiz? - ela escorou a cabeça em seu ombro e suspirou, deixando uma única lágrima escorrer por seu rosto. Sirius a virou de frente para ele, enxugou sua lágrima com o polegar e deixou que sua mão continuasse acariciando o rosto de Emilly, mandando arrepios pela espinha dela.


            - Você não fez nada, Emilly, você é a melhor pessoa que eu conheço, e a Jessy é uma idiota se ela não dá valor a isso. Não sofra por causa dela. - Emilly enlaçou seus braços no pescoço dele e deitou a cabeça em seu peito, deixando finalmente que as lágrimas se libertassem e molhassem a blusa dele.


            Palavras ali não se faziam mais necessárias, e Sirius apenas acariciou os cabelos sedosos dela com uma das mãos, enquanto a outra apertava firmemente sua cintura. Eles ficaram assim por um longo tempo, até as lágrimas dela se acabarem. Emilly sabia, naquele momento, que era apenas com Sirius que ela dividia suas tristezas, sempre fora assim, e por alguma razão ela sabia que isso nunca mudaria. Apenas ele conhecia esse seu lado frágil, apenas ele a compreendia, e era tão certo estar nos braços dele, como se só assim ela estivesse completa.


            Foi Sirius, contudo, que percebeu mais coisas naquele momento. Ele percebeu que não suportava ver Emilly triste, mas que queria estar sempre com ela quando ela assim estivesse, para poder consolá-la e fazê-la feliz. E ele percebeu, assim, que a amava, que amava cada detalhe nela, que a amava quando estava triste e quando estava feliz, que a amava mais do que já amara qualquer coisa. E, por mais que conseguisse arrumar mil explicações de por que a amava, nenhuma satisfazia; ele a amava simplesmente porque amava, e isso o preenchia de tal maneira que era apenas o que bastava.


            Uma sineta ecoou pelo corredor, despertando-os para a realidade. Era o primeiro sinal, avisando o fim do café da manhã. Emilly levantou a cabeça do ombro dele, mas Sirius não soltou sua cintura. Os dois permaneceram muito próximos, os olhares se encontrando e não se largando mais.


            - Desculpe, eu molhei sua camisa... - ela falou, limpando o vestígio das lágrimas em seu rosto. A mão dele ainda acariciava seu rosto, e ela sentia aqueles dedos como brasas em sua pele.


            - Você sabe que não me importo. - Sirius disse, sorrindo de leve, e ela retribuiu o sorriso.


            - Obrigada, Sirius, você não tem ideia do quanto isso é importante para mim. - Emilly se permitiu acariciar também o rosto dele, como um gesto de agradecimento, mas ela sabia que era muito mais que isso. O contato visual entre os dois era tão intenso, e estavam tão imersos um no outro, que não haviam percebido o quão próximos estavam. Só quando o segundo sinal tocou, os chamando para a aula, que os dois se afastaram, assustados ao perceber a proximidade, as bochechas de Emilly corando levemente.


**


            - O Baile de Inverno é uma tradição do Torneio Tribruxo, e não quero viver para ver os alunos da Grifinória desonrarem o nome da nossa escola, se comportando como trasgos durante o baile.


            Foi assim que McGonnagal começou sua aula dupla de uma segunda-feira em meados de novembro. Ela deu um breve discurso sobre bom comportamento, tradições do Baile de Inverno e regras de etiqueta, e depois começou a ensinar os alunos a valsar. Foi, provavelmente, uma das aulas mais divertidas do ano, principalmente porque ela usou Sirius como cobaia para demonstrar aos alunos como dançar valsa, e era impossível não rir das caretas que o garoto fazia ao ter que colocar a mão na cintura da professora e girá-la no ar.


            Mas o verdadeiro alvoroço havia começado um pouco antes dessa aula, durante o café da manhã, quando Dumbledore anunciara aos alunos sobre o Baile. Uma grande euforia de instalou entre os alunos das três escolas, o dilema de quem levar ao baile ocupando a cabeça de todos. Não surpreendeu ninguém que Frank convidasse Alice, a grande surpresa foi que, antes do final daquela semana, Remus apareceu no jantar dizendo que convidara Nathalie para o Baile.


            - E ela disse sim? - perguntou Rabicho, com a boca cheia, e Remus assentiu, mal se contendo de felicidade. Apesar de felizes pelo amigo, aquilo deixava James e Sirius numa situação complicada, nenhum dos dois queria ser o último a convidar alguém.


             Lily e Emilly vinham recusando vários convites, nas mais inusitadas situações. Um garoto do quarto ano havia convidado Emilly no meio do pátio aos berros, e depois saíra correndo. Um menino do segundo ano aparecera com uma flor, convidando Lily, que tivera que passar uns cinco minutos explicando que ele sequer podia ir ao baile. As duas acabavam rindo muito desses convites inusitados, mas elas sabiam que aquilo era tudo folia. Os convites realmente sérios só começaram no fim de novembro, quando Lily foi parada a caminho da sua aula de Feitiços pela última pessoa que ela esperava.


            - O que você quer, Sev... Snape? - ela perguntou, abraçando seus livros numa pose defensiva. O sonserino olhou significativamente para as três garotas que estavam ao lado de Lily, claramente pedindo privacidade.


            - Eu encontro vocês na aula. Podem ir, eu vou ficar bem. - a ruiva disse para as amigas, que assentiram contrariadas e se foram. - Fala logo, eu não quero passar muito tempo com você. - as palavras dela pareceram feri-lo como uma arma, mas Lily não se importou. Severus já a havia magoado de mais para que ela se importasse.


            - Lily, por favor, me dá uma chance de mostrar que eu estou arrependido. Vai ao baile comigo. - ele foi direto ao ponto, mais rápido do que Lily esperava. Melhor assim, quanto menos tempo tivesse que aturá-lo, melhor.


            - Ir ao baile com você? Depois de tudo que você disse, depois de tudo que você fez? Severus, você me magoou como ninguém havia antes, acha mesmo que eu vou deixar que me magoe de novo? Você já teve sua chance, de escolher entre mim e os Comensais, agora não tem mais volta. Inclusive, você não parecia muito arrependido da sua escolha quando atacou o James mês passado, não é? - ela praticamente jogou as palavras em cima dele, mostrando toda a sua raiva. Como ele tinha a audácia de convidá-la ao baile, depois de tudo o que passaram?!


            - James, é assim que você o chama agora... Já está tão íntima do Potter assim? - ele falou com amargura.


            - Muito mais que você imagina. - ela disse isso apenas para machucá-lo, e funcionou. Ele franziu o cenho e recuou um passo, e Lily sabia que aquilo fora uma facada no coração dele. Que bom, já era hora dele sair ferido, para variar. - Com licença, Snape, não quero me atrasar por sua causa.


            Ela saiu andando a passos largos, seus cabelos vermelhos esvoaçando atrás de si, deixando um Snape destroçado para trás.


 


            - Arrasou, Lily! - exclamou Emilly quando Lily terminou de contar às amigas a conversa com Severus. - acho que você nunca deu uma resposta tão bem feita em toda a sua vida, e isso é dizer muita coisa!


            - Com certeza, e a Emy nem está exagerando dessa vez. Queria ver a cara daquele narigudo quando ouviu isso. - Alice falou, com os olhos brilhando. As quatro conversavam aos sussurros durante a aula de feitiços.


            - Sabem, isso quer dizer uma coisa: os caras que realmente querem ir com a gente no baile estão começando a tomar coragem para nos convidar. Já não era sem tempo. - observou Emilly, enquanto copiava a matéria do quadro.


            - Bom, espero que meus próximos convites sejam melhores que esse, não quero repetir o que aconteceu hoje. - disse Lily, também começando a copiar.


            - É claro que os próximos serão melhores, o James não convidou ninguém ainda, você sabe... - sussurrou Alice, com um tom malicioso, e Lily cotovelou a amiga.


            - Vou ignorar isso, Lice... - ela brincou, revirando os olhos, e as outras riram. Como se elas não soubessem que Lily estava esperando o convite dele.


            - Meu Siriuquinho também não convidou ninguém ainda. – suspirou Jessy, com um olhar sonhador. - Tomara que ele me convide logo...


            Emilly estava prestes a dizer para Jessy desistir, mas se conteve. Não ia adiantar, ela conseguia ver que amiga estava num daqueles momentos de alucinação em que nada a conseguia tirar de suas fantasias, momentos esses que se tornavam cada vez mais frequentes. Jessy sossegara o facho depois da conversa que Lily e Alice tiveram com ela, e as coisas haviam voltado ao normal. Emilly não conseguia ficar ressentida com a amiga, de qualquer jeito. Ela só não conseguia entender por que Jessy fazia aquilo consigo mesma, ficar se iludindo, se magoando, e magoando os outros. Emilly queria tanto poder ajudar a amiga, mas não sabia como fazer isso, nenhuma delas sabia.


**


            Depois das aulas, Remus, Peter e as quatro garotas estavam na biblioteca fazendo um trabalho de Astronomia, alguns dias depois do convite de Snape. James e Sirius estavam na detenção, Lily e Emilly vinham recebendo menos convites inusitados, Jessy tinha voltado a ser irritante, enfim, as coisas estavam mais calmas em Hogwarts. Foi então que uma mão pousou no ombro de Emilly, e ela se virou para ver quem era. Jack Andrews, da Corvinal. Eles haviam namorado no ano anterior, mas Emilly terminara porque Jack estava muito ciumento. Ainda assim, ele tinha sido seu melhor namorado, além de ser lindo, com cabelos loiros e olhos verdes.


            - Posso falar com você, Emilly? - ela assentiu e os dois foram conversar atrás de uma estante de livros ali ao lado. Eles mal haviam saído de vista e as garotas começaram a comentar.


            - Aposto um galeão ele vai convidá-la pro baile. – disse Lily, esquecendo-se totalmente do seu dever de casa.


            - Nada apostado, eu tenho certeza que ele vai. Pobre Jack... - falou Alice, escorando o queixo entre as mãos e os cotovelos na mesa.


            - Ué, por que você diz isso, Lice? - perguntou Jessy, confusa, tentando esconder seu desconforto por ainda não ter sido convidada por ninguém.


            - Porque ela vai recusar, claro. Você já viu a Emy voltar atrás depois que ela termina com alguém? - Alice respondeu, erguendo uma sobrancelha, e Lily deu de ombros.


            - Bom, sempre tem uma primeira vez, não é, nunca se sabe... - falou a ruiva, e, antes que Alice pudesse responder, Emilly voltou, sentando-se novamente em seu lugar à mesa.


            - Ele me convidou para o baile – sussurrou ela, sorrindo, e as três se inclinaram em sua direção, pedindo que continuasse. - eu disse que ia pensar. Na verdade, eu não quero ir com ele, mas é bom tê-lo como reseva se mais ninguém me convidar. Além disso, eu não queria magoá-lo recusando assim, na hora...


            Lily e Alice se entreolharam, sorrindo. Emilly sempre conseguia surpreendê-las.


**


            Já era madrugada, mas Emilly não conseguia dormir, sua cabeça estava cheia com os últimos acontecimentos. Estavam quase no final de novembro, e Remus tinha viajado para sua casa no dia anterior, por causa de sua saúde frágil. Ela se perguntava que doença era aquela que ele tinha. Os garotos eram sempre evasivos quando se tratava da saúde de Remus, dizendo que era uma doença rara e que não se sabia muito sobre ela. Mas o quão grave seria essa doença? Emilly se preocupava com o amigo, mas essa não era única coisa que ocupava sua mente.


            Há uns dois dias, Cole Markham, o garoto do Clube do Slug, a convidara para o baile, e Emilly recusara na hora. Ela teve até um pouco de pena dele, mas não podia ficar dizendo “vou pensar” pra todo mundo. Depois que dissera isso pro Jack, parece que os caras tomaram como incentivo, e agora ela não parava de receber convites pro baile, já estava se sentindo como uma peça de leilão! Certo, talvez ela estivesse exagerando só um pouquinho, afinal, só tinha sido convidada por mais três caras desde o Jack. Mas quem ela realmente queria que a convidasse ainda não tinha dito nada. Emilly tentava repetir para si mesma que a última vez que ficara sozinha com Sirius fora no aniversário de morte de seu pai, por causa das detenções dele, e que não custava nada esperar só mais um pouco...


            O que mais a preocupava, entretanto, não era o Baile de Inverno, nem a doença de Remus, mas com a notícia que lera no Profeta Diário essa manhã. Outro vilarejo trouxa havia sido atacado, um muito próximo de sua casa, e vinte famílias havia morrido. Famílias inteiras, com mulheres e crianças, todos inocentes. Emilly costumava passear naquele vilarejo durante as férias, os rostos daquelas pessoas a assombravam quando ela fechava os olhos. Alguém tinha que fazer alguma coisa para parar Voldemort e seus seguidores, e ela se sentia tão impotente ali, presa naquele castelo, presa naquele quarto.


            Emilly se levantou, desistindo de tentar dormir. Colocou um robe de seda sobre sua camisola e calçou seus chinelos felpudos antes de descer as escadas para o Salão Comunal. Às quatro da manhã, ela não esperava encontrar ninguém acordado, mas um movimento a surpreendeu num sofá em frente à lareira. Ela se aproximou devagar e viu Sirius sentado lá, apenas com uma calça de moletom e uma camiseta regata branca, que deixava seus ombros largos e braços fortes expostos. Que Merlin abençoasse quem quer que tenha inventado o Quadribol, ela pensou, mas se forçou a não babar demais, pois percebeu que havia machucados espalhados em seus braços, pequenos cortes e arranhões que se destacavam na pele clara dele. Inclusive, Sirius estava com a varinha apontada para um corte particularmente grave em seu ombro, murmurando algum feitiço de cura.


            - Sirius, o que aconteceu? - ela perguntou, preocupada, sentando-se ao seu lado. O garoto levantou a cabeça, espantado, mas sorriu de lado ao vê-la.


            - Resquício da luta contra os projetos de Comensal. - ele falou, apontando com a cabeça para o corte no ombro. - Ele está piorando, não sei por quê. - Emilly se espantou com o nível de estrago daquele duelo.


            - Tudo isso foi no duelo? Quer dizer, alguns parecem tão recentes, e o duelo foi há quase um mês...


            - Madame Pomfrey disse que cortes abertos por magia das trevas demoram mais para cicatrizar. - ele falou, se torturando em pensamento por ter que mentir para Emilly. Mas tecnicamente, ele tentou se justificar, estava apenas omitindo os detalhes.


            - Caramba, Sirius, você levou uma surra! - ela brincou, tentando esconder a preocupação que sentira por ele.


            - Você devia ver o outro cara. - ele devolveu a provocação, e os dois riram. Um pequeno momento de silêncio caiu sobre eles, um silêncio ao mesmo tempo confortável e tenso.


            - Esse seu corte está é começando a infeccionar. Me empresta sua varinha, eu acho que consigo resolver isso. - ela falou finalmente, quebrando o silêncio, e Sirius assentiu, entregando a varinha para ela. Houve um pequeno choque elétrico quando seus dedos se tocaram na passagem da varinha, mas os dois tentaram ignorá-lo.


            Emilly colocou o cabelo atrás da orelha antes de começar a recitar o encantamento, concentrada no corte do ombro dele. A garota havia aprendido aquilo no ano passado, acompanhando Jessy na enfermaria quando a amiga conseguira arrumar uma infecção na ponta do dedo se cortando com papel. Era até engraçado como Jessy conseguia se machucar com as coisas mais simples, e fazer o machucado mais superficial se tornar a doença mais complexa. Pelo menos servia para Emilly aprender feitiços de cura como esse, contra infecções.


            Infelizmente, era um feitiço bem doloroso, e Sirius ficava o tempo todo contraindo o músculo do braço para tentar esconder ou amenizar a dor, deixando o trabalho dela muito mais difícil. Foi por isso que, em certo ponto, Emilly teve que segurar o braço dele com uma das mãos, para ver se ele ficava quieto. Pareceu funcionar, ele ficou totalmente imóvel com o contato físico, mas aquilo era uma faca de dois gumes. Ela não conseguia ignorar a consciência de que estava segurando o braço dele, aquele braço musculoso, aquela pele macia... Foi difícil manter a concentração necessária para terminar o feitiço, mas, enfim, a infecção retrocedeu e Emilly devolveu a varinha para ele.


            - Obrigado, Emy. - Sirius falou, e ela sorriu ao ouvir seu apelido. - Hey, você ouviu sobre esse último ataque de Comensais? Foi num vilarejo perto da sua casa, deve ser ruim pra você...


            - Sim, incomoda pensar que eu conhecia algumas daquelas pessoas, entende? - Emilly disse, e ele assentiu com a cabeça. É claro que entendia, ele era um dos poucos que a entendia. - Eu me sinto tão impotente aqui, Sirius, eu sei que eu poderia ajudar, mas é como...


            - Como se estivéssemos presos, não é? Como se estivéssemos presos num aquário, vendo inocentes morrerem do lado de fora, e sem poder sair para impedir. - ele completou, tirando as palavras da boca dela.


            Os dois conversaram por mais um tempo, mas o assunto foi morrendo aos poucos, até que eles mergulhassem no silêncio. Assim que se instalou, era aquele silêncio confortável de duas pessoas que se contentam apenas com a companhia uma da outra, mas logo começou a se tornar um silêncio pesado, por causa dos olhares que eles lançavam um ao outro.


            - Emilly, – ele quebrou o silêncio, hesitante – eu estava pensando, se você gostaria de... você sabe, ir ao bale comigo.


            - Pensei que não fosse mais perguntar. - ela falou, sorrindo. Ah, aquele sorriso o deixava completamente tonto, e ele até demorou um pouco para voltar ao seu normal e sorrir de volta.


            Eles ficaram apenas se olhando, com medo de dizer alguma coisa e estragar o momento. Foi então que o retrato da Mulher Gorda começou a se mover, e os dois levantaram a cabeça, espantados ao se lembrarem de que havia outra coisa no mundo além deles dois.


            - Só pode ser a tia Mimi, ela não vai gostar de me ver aqui. Boa noite, Sirius. – Emilly disse, e saiu correndo para o seu dormitório antes que ele pudesse falar ou fazer qualquer coisa.


            Quando o retrato se abriu, contudo, não era McGonnagal do outro lado. Era James Potter, todo machucado e sujo. Ele tinha segurado as pontas com Aluado sozinho essa noite, porque o Sirius em forma de cão estava começando a mancar devido ao machucado no ombro, e James insistira para ele vir se cuidar.


            - Que cara de besta é essa, Almofadinhas? - ele perguntou, se jogando no sofá ao seu lado, visivelmente cansado.


            - Eu convidei a Emilly pro baile, e ela aceitou!


            - Não acredito. Eu quase me matando naquela casa, enquanto você estava aqui namorando? - brincou Pontas, e Sirius socou seu ombro de leve, mandando-o calar a boca.


            - Falando nisso, como é que ele tá? - perguntou Sirius, mudando da brincadeira para a coisa séria. Ele ainda se sentia culpado por não ter ajudado o amigo hoje.


            - Aluado? Está levando, ficou quase bonzinho hoje, por causa da poção, mas você sabe que é difícil... - disse James, se levantando do sofá. - Vamos subir, talvez a gente ainda consiga umas duas ou três horas de sono.


**


            - Agora estou me sentindo culpada – disse Emilly para as amigas na aula de Trato de Criaturas Mágicas. O professor os mandara formar grupos de três e procurar Xedofrivos, e, graças a Merlin, Emilly ficara com Lily e Alice, e não com Jessy. A garota havia feito um escândalo pela manhã, quando Emilly contara sobre o convite de Sirius, e estava com a cara amarrada desde então.


            - Culpada por quê? - perguntou Alice, distraída, olhando de trás das árvores e moitas atrás dos Xedofrivos.


            - Por causa da Jessy, óbvio! Eu não devia ter aceitado tão rápido o convite dele, na verdade, eu nem devia ter aceitado. Não parece certo sair com o objeto de desejo de uma amiga.


            - Mas Emy, não é você mesma que vive dizendo que a Jessy precisa acordar pra vida real? Talvez isso a ajude a acordar, de alguma forma. - disse Lily, e de fato ela tinha um ponto.


            - Sem contar que você não pode sacrificar sua felicidade pelas fantasias da Jessy. Quero dizer, se não fosse só uma obsessão, se ela gostasse mesmo dele, ou se houvesse alguma chance do Sirius gostar dela... mas nós sabemos que não é assim. - concordou Alice.


            - É, vocês estão certas. Mas eu não quero perder a amizade da Jessy. - falou Emilly, procurando também pelos Xedofrivos. Aquelas coisinhas eram boas mesmo em se camuflar.


            - Você não vai perder a amizade dela, Emilly, fica tranquila. Você vai ver, amanhã ela já vai ter voltado a falar com você.


No dia seguinte, porém, Jessy continuou ignorando Emilly, e no domingo estava tão emburrada que se esqueceu que aquele dia era o aniversário de Sirius. Era um dia 27 de novembro, e o céu estava tão cinzento quanto os olhos do garoto. Ao contrário de Jessy, seus amigos não se esqueceram da data. Emilly, que tinha uma certa amizade com os elfos domésticos da cozinha, conseguiu que um deles fizesse um pequeno bolo para eles, e James conseguiu escapar ilegalmente para Hogsmeade e comprar um presente para o amigo e algumas garrafas de cerveja amanteigada para o grupo.


Cantaram parabéns para ele no Salão Comunal, e fizeram o que podiam para que fosse um bom aniversário. Remus ainda estava em casa por conta de sua doença, e todos sabiam que a festa não estava completa sem ele, mas Sirius ficou muito grato pelo que os amigos fizeram por ele. O bolo estava uma delícia, e, por mais simples que fosse, a comemoração foi muito boa. Tudo fica melhor quando se está com os amigos, não é isso o que dizem? A melhor coisa daquele aniversário para Sirius, porém, foi quando Emilly o abraçou para lhe desejar parabéns. Ele faria aniversário todos os dias se fosse possível, só para envolver aquela cintura fina nos braços e sentir o cheiro adocicado de seu perfume.


Logo o domingo chegou ao fim, e durante a próxima semana, Jessy foi voltando aos poucos a falar com Emilly, mas ela ainda pareia um pouco estranha. Uns três dias depois daquilo, por exemplo, ela virou para a garota e falou:


- Emilly, eu tenho um vestido de baile antigo, eu posso alugar ele pra você, se você quiser. - aquilo saíra meio do nada, e pegou as três amigas de surpresa, que ficaram olhando atônitas para Jessy. Elas quatro estavam se arrumando no dormitório, e Emilly, que passava maquiagem, chegou a borrar o lápis de espanto.


            - Eu tenho meu próprio vestido, Jessy, estava na lista de uniformes desse ano, lembra? E mesmo que eu não tivesse, um vestido seu nunca serviria em mim, você sabe disso. - foi o máximo que a morena conseguiu dizer. Ela podia ter acrescentado que tinha milhões de vestidos de baile no seu closet quilométrico na Mansão Carey e que não precisava alugar um vestido velho e sem estilo de Jessy, mas não queria magoar a amiga. Jessy, pelo contrário, parecia decidida a magoá-la.


            - Bom, é que eu pensei que, se você usasse um vestido meu, talvez o Siriuquinho te achasse mais bonita no baile. - a ideia era no mínimo cômica, mas parecia fazer um baita sentido na cabeça de Jessy. Emilly a encarou por um momento, tentando se acalmar.


            - Eu não precisei vestir uma roupa sua pra ele me convidar, precisei? - ela falou, o maxilar endurecido pela raiva, enquanto limpava a maquiagem borrada em volta do olho. Jessy se calou, na falta de um boa resposta. Emilly não aguentaria esse clima hostil entre elas por muito tempo. Merlin, será que Jessy não conseguia aceitar os fatos, pelo menos uma vez na vida?


**


            Quando Remus voltou de sua viagem, pálido e debilitado, ele e Lily ficaram até mais tarde no Salão Comunal, para que ela o passasse as anotações e deveres que ele havia perdido. Já era mais de meia noite quando o garoto disse que estava cansado e foi se deitar. Lily, contudo, não subiu imediatamente para seu dormitório, ficou um tempo lendo em frente à lareira, esperando o sono chegar. Foi exatamente aí que James apareceu, descendo as escadas correndo, de encontro a ela. Lily arqueou as sobrancelhas e fechou seu livro enquanto o garoto se aproximava.


            - Lily, que bom que você ainda está aqui. Eu quero falar uma coisa com você. - ele disse, parecendo nervoso.


            - Sou toda ouvidos. - respondeu a ruiva, já adivinhando o que era.


            - Eu quero saber se você quer ir ao baile comigo. - ela não teve tempo de responder, pois James começou a tagarelar, desesperado – Não recuse ainda! Eu vou entender se você não quiser. De verdade Lily, eu fiz muita besteira, até mereço o seu desprezo, mas pensa um pouco antes de responder, por favor, eu estou mudando, por você! E nós podemos ir só como amigos, certo? Eu só sei que esse baile não vai ter a mesma graça se eu não for com você e... - ele foi interrompido pelos dedos de Lily tocando seus lábios, calando-o. Ela soltou uma pequena risada antes de responder.


            - Quem disse que eu ia recusar?


            Lily viu um dos maiores sorrisos do mundo se abrir no rosto dele, e gostou do jeito que seus olhos brilharam com aquele sorriso.


            Depois disso, os dias se arrastaram até o Baile de Inverno. Os deveres de casa não deixavam ninguém pensar direito, e a maioria dos alunos planejava seu feriado de Natal, que começaria um dia depois do baile. Aparecera um boato em um grupinho de garotas da Lufa-Lufa de que Sirius iria ao baile com Jessy, boato inventado, é claro, pela própria Jessy. Isso causou um grande tumulto nessas garotas, tão iludidas quanto Jessy, que começaram a andar atrás da grifinória como se ela fosse a pessoa mais sortuda do mundo.


            As frias chuvas de novembro passaram, e começava o inverno impiedoso. As nevascas, os alunos de capas fechadas e cachecóis, o teto quase sempre branco do Salão Principal, os dias mais curtos, as noites mais longas. Tudo isso indicava aos alunos que o solstício de inverno estava chegando, e com ele o tão esperado Baile. E é claro que quando algo é muito esperado, sempre demora a chegar.







NA: Só para deixar claro, os desenhos do banner desse capítulo não são de minha autoria, eles foram achados na internet, mas a montagem foi feita por mim.

Também gostaria de agradecer a todos que vem comentando na fic. O incentivo de vocês é muito importante, continuem dando opiniões, fazendo elogios ou críticas. Muito obrigada!       

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.