Violação do Impenetrável



O dia calmo. A delicada luz entrando pela janela.
A sala impregnada de manchas cinza, projetadas...
Lá fora, ao som do vento, soa a música da melancolia.
O tempo já não é obstáculo, é companheiro.

Um corpo imóvel jogado na poltrona aparentava falta de vida. Respirava demoradamente, como se não tivesse vontade de fazê-lo realmente.
O ambiente que um dia fora alegre e iluminado, agora estava coberto pela penumbra. A solidão estava impregnada nas paredes encardidas. A dor era tão grande, que chegava a ser palpável.
As lágrimas pararam de escorrer pelo seu rosto cansado há tempos. Sua vontade não era de chorar, não mais.
Sentia vontade de gritar pelo nome dela. Sair porta a fora implorando para que a devolvessem. Daria qualquer coisa para tê-la de volta, daria sua vida, daria o mundo.
Hermione Granger, seu porto seguro, sua melhor amiga, sua irmã, seu amor, sua vida. A coisa mais importante, o presente divino que lhe foi concedido e arrancado de suas mãos tão repentinamente; Causando-lhe uma dor insuportável, uma dor que ele jamais pensara em sentir antes. Uma dor que ultrapassava qualquer nível de entendimento, que estraçalhava seu coração e corroia sua mente pouco a pouco; Dor essa, que congelava seu sangue e sugava sua alma lentamente.
Desejava sonhar com ela, embriagar-se de lembranças, sentir seu sorriso sincero, tocar seus olhares profundos e reveladores, reencontrá-la.
Tentava por vezes, buscar sua presença em tudo e em todos; Estabelecendo parâmetros e correlações. Porém, a busca sempre se revelava estéril; Ela era imbatível e inigualável, e não haveria eufemismo que amenizasse a perda de Hermione Granger.

Olhava-se no espelho e desejava profundamente ver a face de Hermione ao invés da sua própria; Iria abraçá-la e nunca mais deixá-la partir. Não sabia, porém, se saberia ser capaz de demonstrar em palavras ou gestos, todo o desespero cravado nas paredes de seu coração e a saudade que havia ali.

Ouviu a esposa o chamar e não demonstrou qualquer reação. Apreciava a música do vento que agora ecoava pelo jardim, quando Gina abriu a porta da sala cuidadosamente e sentou-se no braço da poltrona.

- Você vem almoçar? – ela perguntou, perpassando suas mãos por entre os cabelos descuidados do marido. O homem não respondeu, apenas balançou a cabeça em forma de negação, observando as sombras na parede mal iluminada. – Harry... – disse ela – já faz tanto tempo... Todos nós nos sofremos com a perda dela, mas... – ela hesitou. Harry pode perceber pelo seu tom de voz, que a mulher estava cansava de repetir as mesmas palavras e os mesmos argumentos furados. Ela tentava de todas as formas, trazê-lo para a realidade novamente; Mas ele tinha a consciência que o sentimento de negação partia de si mesmo.
A realidade do homem era aquela; Inerte e calma. A realidade, era Hermione. - tentamos seguir nossas vidas. O destino quis assim, querido, e se afundar neste quarto durante mais três anos, não vai fazê-la voltar...

- Nem uma força é forte o suficiente para me fazer esquecê-la – ele sussurrou, fitando o porta-retrato dela. Seus olhos antes verde-esmeralda e tão cheios de vida, agora eram mais escuros; A cor era opaca e eles não demonstravam nada, não mais...

- Um dia... – disse a mulher, levantando-se da poltrona com violência e mirando o marido com os olhos cheios de lágrimas – eu vou me cansar, Harry. Eu estou do seu lado todo esse tempo, enquanto a única coisa que você faz é lamentá-la; Você não acha que talvez eu mereça um pouco mais de consideração? – disse trêmula e com a respiração descompassada.

- Hermione permaneceu ao meu lado durante os sete anos em que fui perseguido constantemente pelo maior bruxo das trevas, e nunca sequer reclamou. Permaneceu ao meu lado, salvou minha vida, apoiando-me e dedicando-se integralmente a mim. – ele disse, sem retirar os olhos da cortina – Ela dedicou sua vida inteira a mim, e até no último segundo antecedente à sua morte ela esteve ao meu lado incondicionalmente. E aí está você! Chorando... (ela nunca chorava) e me abandonando... (ela nunca me abandonaria)... Como ela nunca faria.

Gina lançou-lhe um olhar de profunda repugnância e frieza - MALDITA SEJA! – a mulher gritou, saindo do aposento aos soluços.

Harry permaneceu quieto; Na mesma posição de sempre e sem transparecer ter notado qualquer movimento ou som anormal na sala.
Não se importava com nada, não mais. Queria mesmo que Gina fosse embora e o deixasse ali em paz, para que assim, pudesse lamentar sua saudade e relembrar cada traço de sua Hermione.
Ela poderia ser feliz, coisa que ele jamais seria novamente. Não enquanto estivesse vivo, e longe dela.
Suspirou pesadamente ao ouvir os gritos da mulher pela casa e o barulho de portas se fechando com violência.
Ele ainda poderia ouvir os gritos de Gina ecoando pelo jardim, tomando o lugar da música que antes, apreciava.
Ele sentia a fúria das palavras da esposa, mas não entendia nada do que ela dizia.

Fechou os olhos lentamente. Em sua mente, formava-se outra vez, a imagem exata de Hermione. Seus cabelos que ele nunca cansaria de acariciar, seu sorriso largo, seus olhos brilhantes, sua voz doce e decidida, e sua expressão centrada e racional. Manteve a imagem em sua mente por alguns segundos, apenas apreciando.
Abriu os olhos novamente; Deparou-se com o retrato dela cuidadosamente situado na mesinha de centro, fazendo-o sorrir fracamente.

Para Harry Potter, não haveria mais sonhos e nem fantasias. Aquelas conversas noite à dentro, por vezes cheias de riso, outras cheias de tristeza, permaneciam em sua mente; Assim como cada traço de suas feições e cada momento que tinha passado junto a ela.
Aquela que o conhecia como uma mãe, o amava como uma esposa, o entendia como uma amiga e o ensinava como um livro.
Não havia espaço para mais nada em sua vida. Apenas para suas lembranças, apenas para ela, sempre ela.


Já não se encontrarão os meus olhos nos teus olhos. Já não se adoçará junto a ti a minha dor; Mas por onde for, levarei o teu olhar e para onde fores, levarás a minha dor.

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