Em Estado de Choque



Harry arrumava as suas malas no quarto enquanto Ron o observava mal-humorado.



- Hunf, eu bem que queria ir com você, mas mamãe não me deixaria ir de maneira alguma!



- É, não deixaria mesmo.



Harry estava muito sério, estava temendo o que viria pela frente. Sabia que era algo de importante, e ficava se perguntando até onde esse ataque de Voldemort poderia ir. Qual seria toda a repercussão que poderia ter e os efeitos que poderia causar.



Lupin entrou.



- Pronto, Harry?



- Quase, só mais um minutinho.



Era incrível como ambos estavam sérios. Havia uma certa tensão entre os dois por causa de tudo o que havia sido dito.



- Quando terminar desça, eu e Hermione estaremos esperando.



- Está bom!



Ron ficou apenas olhando a frieza com que se tratavam, não sabia o que dizer, então preferiu ficar quieto. Harry já terminara a mala e assim que ia saindo pela porta, Ron teve tempo de lhe falar:



- Se cuida, hein, cara!



Harry olhou-o e sem saber o que dizer, só deu um aceno com a cabeça.



Saiu pelo corredor e desceu as escadas. Lupin e Hermione esperavam-no ao pé da escadaria. A Sra. Weasley veio correndo.



- Harry, querido, você tem certeza de que ficará bem?



- Tenho sim, Sra. Weasley. Pode ficar descansada - disse ele meio fechado e constrangido por toda a atenção.



- Então vamos, não podemos nos demorar por muito mais tempo - disse Lupin secamente.



Eles dirigiram-se à lareira da cozinha e Lupin pegou o Pó de Flu.



- Nós vamos passar primeiro no St. Mungus - disse Hermione, claramente tentando puxar conversa e aliviar o clima.



- Eu sei - continuou Harry secamente.



- Você está bem, Harry? - perguntou a garota hesitante.



- Ótimo.



- Não sei, você parece meio… estranho.



- Eu estou normal - respondeu ele cortante, e a menina calou-se.



Lupin jogou o pó.



- Lembrem-se, quando entrarem na lareira digam: "Rotmilk Street, n° 9".



Harry e Hermione acenaram positivamente com a cabeça.



- Hermione, vá primeiro.



- Sim - respondeu ela afirmativamente.



A garota pulou na lareira e disse o endereço claramente e desapareceu em meio às chamas verde-esmeraldas.



- Agora você, Harry - continuou Lupin, ainda secamente.



Harry foi em direção à lareira sem olhar para o homem e se jogou na lareira dizendo "Rotmilk Street, n° 9" com cuidado para não acabar indo parar na mansão dos Malfoy.



O garoto imergiu em um caleidoscópio de cores que rodavam ao seu redor. Sentiu-se meio enjoado, aproximou os braços do corpo e fechou os olhos. Até que sentiu cair no chão frio de joelhos, dando um gemidinho pelo impacto do baque.



Olhou em volta. Estava em um local escuro, antigo, completamente sujo, uma grande casa de madeira, com paredes e móveis enegrecidos e janelas com vidros quebrados. Viu Hermione mais à frente pesquisando o local. Lupin apareceu atrás dos garotos.



- Que lugar é esse Lupin? - perguntou Hermione.



- Uma casa abandonada que os membros da Ordem tem usado para ter um local para onde aparatar quando vir para Londres. Uma pena que não poderemos utilizá-lo por muito tempo.



O porquê de a Ordem não poder utilizar a casa por muito mais tempo ficou claro quando eles saíram da casa, através da porta semi-derrubada.



- Essa casa pegou fogo há algumas semanas, e temos utilizado a sua lareira.



De fora a casa parecia assombrada, com suas paredes negras e janelas quebradas.



- Mas logo o governo dará um jeito nela, então não poderemos utilizá-la por muito tempo.



- E os proprietários? - perguntou Hermione.



- Morreram no incêndio - disse Lupin meio indiferente à pergunta.



- E eles eram bruxos ou trouxas.



- Trouxas.



Ele disse isso de modo meio seco, o que fez Hermione se calar. Harry vinha logo atrás escutando a conversa mas sem dizer uma palavra sequer. Queria perguntar como que estavam conectando tantas lareiras clandestinamente, mas não queria falar com Lupin, não sentia-se à vontade.



- Pegaremos um ônibus para chegar ao centro, não fica muito longe, demoraremos apenas alguns minutos.



E assim o fizeram, pegaram um ônibus e em uns quinze minutos chegavam ao centro. Começaram a andar pela cidade à noite, o céu ameaçando chover. Finalmente chegaram à rua em que ficava a loja que dava passagem ao hospital. Ela estava praticamente vazia.



- Passar por aqui à noite, quando a rua está vazia assim não é uma boa idéia… - comentou Lupin incomodado.



Eles olharam para os lados esperando ver se alguém estava reparando neles, e para sua sorte a rua ficou vazia. Lupin aproximou-se do manequim feio de peruca torta e disse:



- Viemos trazer voluntários para ajudar os feridos do ataque à Azkaban.



Ele disse isso baixinho, e a manequim respondeu-o.



- Ah, finalmente alguém que vem ajudar e não pedir ajuda, podem entrar!



Lupin esperou Hermione e Harry atravessarem o vidro e entrou após eles.



Harry viu o hospital muito mais movimentado do que a última vez em que o vira. Pessoas se acotovelavam apressadas para todos os cantos e macas corriam para lá e para cá. Diversas pessoas ocupavam os bancos de espera e a recepção estava cheia de gente pedindo informação sobre parentes feridos.



- Oh, meu Deus, isso aqui está um caos! - disse Hermione espantada.



- Tem certeza de que quer ficar por aqui, Hermione? - perguntou Lupin, atencioso.



- Tenho sim, vendo isso aqui tenho mais ainda - respondeu a garota determinada.



Ele acenou com a cabeça.



- Venha aqui, vamos tentar pegar alguma orientação de algum funcionário, já que a recepção está impossível. Harry, você aguarda na sala de espera, certo?



Harry fez que sim com a cabeça e realmente estava dirigindo-se à sala, quando algo o distraiu. Ele olhou para a recepcionista. A coitada estava louca com a multidão que a cercava e que já começava a querer pular para trás do balcão para atrair a sua atenção. Ela berrava para alguns: "você tem algum problema? Leia o edital!" e para outros: "Não ouse atravessar esse balcão, eu estou autorizada a estuporar qualquer um que se atreva!". Harry sentiu pena dela.



Estava à frente das cadeiras da sala de espera em frente à recepção e viu, no corredor, esperando por socorro, uma mulher, semi-encoberta por um lençol. Apenas o seu rosto era visível deitado de lado, o seu lado direito e o seu pescoço estavam queimados seriamente e a mulher ofegava desesperadamente.



Harry ficou ali, olhando para ela, esperando que um curandeiro aparecesse para levá-la, para salvá-la. Pensou consigo: "eu ajudei a salvá-la dos escombros". Mas penou o seu estado deplorável, todo o seu pescoço a parte do seu ombro eram visíveis agora, ela estava toda queimada, e já não tinha mais cabelo, provavelmente se incendiara também, já que o seu couro cabeludo estava todo vermelho e em carne viva em outras partes. Harry sentiu uma profunda pena encher o seu peito, queria ter o poder de curar a dor da moça. Sofria junto com ela ao vê-la ali, ofegando como se tentasse não deixar a vida escapar com a respiração.



Já ela fixava-o com os olhos vermelhos e sujos de sangue, esbugalhados, cheios de desespero, como se quisesse dizer algo para ele. Ele olhou em volta, nenhum curandeiro estava à vista. Ele olhou novamente para a mulher e ela começou a respirar mais rapidamente, com um tom de desespero, e olhava-o com olhos tementes, e cheios de súplica. Harry achou que ela estava tendo alguma espécie de ataque, a sua respiração só tornava-se mais e mais acelerada, e seus gemidos já estavam dando para serem ouvidos pelo corredor, mesmo com a balbúrdia dos transeuntes.



Harry começou a aproximar-se da mulher, ela não estava bem. Mas a sua respiração foi cessando vagarosamente até parar, e seus olhos repletos de angústia fixados em Harry. O garoto ficou ali, olhando para o rosto da mulher. Ele não pudera fazer nada para salvá-la. Ele havia ajudado-a antes, mas não pudera evitar a sua morte agora. Ele ficou parado ali, chocado demais para fazer ou dizer qualquer coisa.



Uma equipe de curandeiros passou correndo e levou a maca consigo sem sequer perceber que a mulher já estava morta. E o corpo da moça se foi com o rosto inerte fixado em Harry. E ele ficou ali sem saber o que deveria fazer.



Diversos grupos de bruxos passavam para lá e para cá, empurrando os outros. Um passou por Harry e empurrou-o dizendo: - Saia da frente, garoto!



Ele olhou ao redor e vendo as cadeiras da sala de espera, sentou-se em uma delas na primeira fila. O garoto ficou ali, olhando para o chão desolado, mas a sua atenção foi atraída por um bruxo que veio correndo desesperado com um Profeta Diário em mãos, conversar com o bruxo ao lado dele.



- John, o Profeta acabou de sair em nova edição especial. Veja!



O homem pegou o jornal ansioso. Harry tentou esticar-se para ler o que estava na capa, mas não conseguiu. Para sua sorte o homem começou a ler em voz alta, e Harry concentrou-se para conseguir ouvir em meio à balbúrdia.



- O Ministério vai à loucura com o ataque à Azkaban, fontes confiáveis afirmam que Wizengamot, a Corte Suprema dos Bruxos irá reunir-se essa noite para decidir o futuro da administração do mundo bruxo. Segundo essas mesmas fontes, não é de desejo deles que o atual Primeiro Ministro da Magia, Cornélio Fudge seja deposto, de acordo com eles, o Ministério estando desestruturado atualmente somente iria aumentar a chance de outro ataque de Você-Sabe-Quem, e é isso o que irá acontecer se eles ficarem sem um Ministro. Porém, a pressão sobre a Corte é forte, protestos daqueles que acham que Fudge é fraco demais para manter o cargo estão cada vez cada vez mais freqüentes. Este, por sua vez não foi encontrado para dar o seu parecer sobre a invasão. E a população firma a intenção de pôr Alvo Dumbledore, o atual diretor da Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts no cargo. Segundo eles, Dumbledore é o único de quem Você-sabe-quem já teve medo, e sendo assim é o único que poderá intimidá-lo, deixando o Ministério fortificado e fazendo com que se torne a força correspondente do mundo bruxo decente em relação ao poder de Você-sabe-quem.



- Segue-se a isso um grande comentário sobre os escombros de Azkaban e depois sobre o St. Mungus - afirmou o bruxo que viera com o jornal em mãos.



Harry ficou ali com seus pensamentos. Fudge era fraco, mas o Ministério estaria realmente desestruturado se depusessem-no. Antes ter alguém que era facilmente manipulável do que o Ministério estar desestruturado, sem um líder. Aí sim tudo viraria um caos. Dumbledore não deixaria Hogwarts, mas então, se Fudge acabasse sendo deposto, quem assumiria o posto? E será que a pressão popular seria tão forte ao ponto de forçar a decisão de Wizengamot? Afinal de contas o que eles poderiam fazer para que a sua vontade fosse imposta?



Ainda questionando-se, Harry levantou-se e começou a perambular pelo corredor principal, de um lado para outro. Lupin estava demorando. Viu mais uma maca chegar trazida por voluntários, um funcionário gritava para deixá-lo no corredor que levava aos outros andares. Eles abandonaram-no ali e seguiram o seu caminho. O homem já havia recebido a medicação de socorro necessária. Ele possuía a perna enfaixada e um vidro de poção ligado à perna por um caninho de plástico.



De repente uma multidão de gente encheu os corredores para lá e para cá, gente correndo apressada atrás de seus parentes, gente em busca de ajuda e gente correndo para conseguir ajudar alguém.



Uma mulher, voluntária, corria para lá e para cá pelo corredor, controlando o fluxo de gente, cuidando para que não ferissem os pacientes que enchiam os corredores, uma vez que precisavam ser examinados para ser encaminhados para o setor correto. E o número de curandeiros não estava dando conta dos feridos em Azkaban, quem dera dos parentes que tinham ataques cardíacos ao saberem que seu marido, ou filho, ou irmão morreu.



A mulher, alta, de fina beleza, com um porte senhorial que lembrava a Sra. Malfoy, mas sem toda aquela arrogância no rosto; ao contrário, seu rosto estava marcado pela caridade e pelo sacrifício de estar ali ajudando aquela gente. Seus cabelos castanhos caíam-lhe às costas, despenteados, e seus olhos amendoados brilhavam lacrimejantes.



Em meio à confusão, um dos bruxos que corriam para lá e para cá acabou puxando com o pé o cabo de plástico que caía ao chão, que ligava a poção à perna do paciente que acabara de ser trazido, o cabo desprendeu-se da perna do homem, e o vidro com a poção caiu no chão, espatifando-se, e imediatamente o bruxo acordou. Inconsciente do que fizera, o homem continuou seu caminho, correndo.



A mulher voluntária corria pelo corredor sem ter visto o ocorrido. Até que o bruxo, deitado na maca, começou a espernear os braços como se estivesse com falta de ar, tentando agarrar qualquer transeunte que fosse para ajudá-lo. Ele agarrou firmemente a voluntária por trás e puxou-a. Esta, quando virou-se, assustou-se com o homem e tentou desvencilhar-se pulando para trás, mas o bruxo, que segurava-a firmemente, caiu da maca impulsionado pela mulher. Ambos caíram no chão e o bruxo começou a ter uma espécie de ataque.



A mulher começou a acudi-lo desesperada, sem saber o que fazer com ele.



- Por favor, alguém me ajude! Alguém, por favor! Ele está morrendo, esse homem vai morrer! - gritava a mulher para as pessoas, mas todas a ignoravam distraídas.



A imagem da mulher carbonizada que acabara de morrer olhando para Harry veio-lhe à mente, e ele, sem conseguir conter-se, correu em direção ao homem e à mulher caídos no chão.



- O que ele tem? - perguntou Harry.



A mulher olhou-o com um olhar agradecido.



- Eu não sei, não sei o que ocorreu!



- Naquele vidro no chão havia uma poção que estava ligada à perna dele! - disse Harry ofegante.



Ela olhou-o desesperançosa, enquanto o homem continuava a ofegando e esperneando, olhando temeroso para a perna.



- De que cor era essa poção? - perguntou a mulher, descabelada.



- Marrom - respondeu Harry estranhando a pergunta.



O olhar de desesperança aumentou no olhar da mulher.



- O cabo que ligava a poção à perna dele estava caído no chão e um homem passou e acabou puxando-o com o pé sem ver… - Harry começou a explicar falando sem parar.



A mulher puxou a perna do paciente desesperada para olhá-la, e um olhar de desespero cobriu o seu rosto.



- Era o que eu temia - sussurrou para si mesma.



Harry olhou para a perna do homem, estava toda preta.



- O que é isso? O que está havendo? - perguntou desesperado.



- Esse homem não podia ter ferido a perna, ele tem uma doença séria…



- Que doença é essa?



- Eu não me recordo do nome, mas a minha tia morreu assim, ele não podia ter ferido essa perna de maneira alguma…



- Por quê?



- Porque a partir do momento em que você tem essa doença, e você fere seriamente alguma parte do seu corpo fazendo o seu sangue escorrer, forma-se um coágulo de ar no local, que sobe ao cérebro e mata a pessoa.



Harry olhou-a paralisado.



- Aquela poção devia estar impedindo que essa bolha se formasse.



- E agora…



O olhar da mulher foi distraído para a perna do homem, ela começou a inchar, e o inchaço começou a subir vagarosamente.



- Oh, meu Deus, precisamos fazer alguma coisa…



- Mas o que? - perguntou Harry desesperado. Ele queria fazer alguma coisa para ajudar aquele homem a não morrer, mas não fazia a mínima idéia do que poderia fazer para impedir a sua morte, Hermione sim era boa para esse tipo de coisa, não ele!



Harry apertou a perna do homem com que para impedir de o inchaço de subir, mas ele passou vagarosamente por debaixo de sua mão, como se nada estivesse impedindo-o.



- Não adianta! O que a gente pode fazer? Eu vou atrás de um curandeiro! - disse ela se levantando e correndo pelo corredor.



- Não me deixe aqui sozinho com ele - gritou Harry, mas a mulher já tinha ido.



O homem começou a gemer.



- Não, não me deixe morrer… minha… minha família… minha filha…



Isso foi como um motor de arranque em Harry. Fez lembrar-se de si mesmo. Precisava fazer algo, mas o que? O inchaço subia cada vez mais em direção à coxa.



De repente Harry avistou a mulher vindo em direção a eles, sozinha, e seu coração afundou, ela não tinha conseguido encontrar ninguém. Mas no meio do caminho ela foi em direção ao compartimento de alarme, na parede, quebrou-o com a varinha, pegou o machado e correu em direção a eles.



- Precisamos amputar.



- O QUE? - gritou Harry incrédulo do que a mulher estava dizendo.



O homem deu um gemido alto ao ouvir o que a mulher dissera.



- Precisamos imputar ou ele morre! - disse ela sem fôlego, sentando no chão ao lado do homem.



- Mas não há nenhum curandeiro por aqui…



Não, não há, eu fui procurar, não há nenhum! Nós precisamos amputar… - disse ela com toque de pavor da voz.



- NÓS? - gritou Harry novamente.



- Sim, nós - disse ela meio desorientada, passando o machado para a mão de Harry.



- O que exatamente você espera que eu faça com isso? - disparou Harry esganiçado.



A mulher apontou a varinha para o machado e deixou a lâmina dentada, como num serrote.



- Arranque - disse ela esganiçada, colocando a cabeça do homem no seu colo e segurando os seus braços.



- Não, nós não podemos fazer isso!



- O coágulo está subindo! - gritou ela. - Faça.



- Não, eu não posso.



- Se você não fizer ele vai morrer! - continuou ela gritando.



- Não! Faça você.



- Eu não posso, eu não tenho força suficiente. Corte a perna dele ou ele morre.



- Mas precisamos dar algo para ele não sentir dor - disse Harry choroso.



- O coágulo já está na coxa, corte agora!



- Mas…



- CORTE OU ELE MORRE!



Harry fixou o inchaço subindo pela perna do homem, se alcançasse a bacia nada poderiam fazer, não poderiam cortá-lo ao meio. Ele precisava arrancar a perna do homem, ele tinha que deixar aquele homem aleijado, mas vivo.



De repente a imagem da mulher carbonizada voltou-lhe à cabeça. Ele não pôde fazer nada, não fora culpa dele. Mas ele poderia ter feito algo, poderia ao menos ter tentado, mas o seu medo não deixou. E agora, olhando para aquele homem, vendo que se aquele inchaço subisse um palmo a mais tudo estaria perdido. Ele podia fazer algo, mas ele não tinha capacidade, ele não podia meter aquele serrote na perna daquele homem e arrancá-la fora, mas ele tinha que fazer algo.



Veio-lhe então à cabeça a lembrança do que dizia a profecia. O futuro dessas pessoas, de uma maneira ou de outra, cabia a ele. Suas vidas estavam em suas mãos. Ele precisava cortar, o problema é que não tinha coragem de o fazer. Se ele cortasse ele salvaria a vida dele, era só meter os dentes do serrote na perna do homem e friccionar com força, com muita força! Ele precisava se apressar ou não conseguiria arrancá-la, não haveria tempo! O inchaço subia e a voz da mulher ecoava-lhe longe: - Ele vai morrer!



A imagem da mulher morrendo à sua frente, com o rosto queimado, gemendo. Sirius caindo pelo véu. Não, ele não podia deixá-lo morrer, se estava nas suas mãos a vida daquele homem, ele não podia deixar de fazer aquilo. Ele deveria ser tão importante para alguém quanto Sirius era para ele. E então ele se lembrou: - minha… minha família… minha filha…



A filha dele não ficaria sem pai, ela não merecia passar por tudo o que ele passou por causa de Voldemort. Dependia apenas dele. E como se ele acordasse de um longo sonho ele viu-se ali, com o serrote na mão.



- Garoto, ou você amputa ou ele vai morrer! - gritou a mulher esganiçada já sem esperanças.



Harry olhou a perna do homem, o inchaço subira demais.



O homem olhou para ele com os olhos suplicantes, os mesmos olhos da mulher carbonizada.



- NÃO! EU NÃO VOU DEIXAR VOCÊ MORRER! - gritou ele de repente e todo o corredor parou para olhar, finalmente parecendo se tocar da seriedade do que estava acontecendo.



Harry meteu o serrote com ímpeto na perna do homem, e o sangue espirrou-lhe no rosto, e tomado por um espírito de determinação que ele nunca tivera antes, ele serrou a perna do homem compulsivamente. Assim que o serrote tocou a perna do homem, ele gritou intensivamente, fazendo todos se aproximarem para ver, muitos escondendo os rostos. Mas com a dor ele logo desmaiou.



O garoto serrou o osso com voracidade, e arrancou-lhe a perna antes que o inchaço conseguisse alcançar o local da secção. Ele caiu para trás, encostando-se na parede, ofegando desesperado pelo que acabara de fazer.



Conseguira! Ele conseguira salvá-lo! Não ficaria com a dúvida percorrendo-lhe a mente pelo resto da vida.



A mulher abraçava o homem maternalmente, mesmo ele sendo mais velho do que ela. Os curandeiros vieram atraídos pela confusão, e carregaram o homem em outra maca, levando-o dali, para cuidar da sua perna. A mulher caiu de costas na parede ao lado dele, mesmo descabelada, suada, ofegante, conservava o seu porte senhorial.



Todos olhavam para eles e muitos começaram a aplaudi-los. Mas tudo parecia distante de Harry. Na verdade ele estava bastante transtornado, nunca imaginara fazer algo do tipo, nunca imaginou que teria coragem. A mulher virou o rosto para olhá-lo.



- Você foi muito corajoso, garoto! Vendo as coisas agora, com a cabeça fria, vejo que exigi demais de um adolescente, mas no ímpeto do momento não consegui perceber a gravidade daquilo que pedi para você fazer. Peço que me desculpe e que não fique traumatizado, foi um procedimento exagerado, mas foi necessário. Só espero que compreenda!



Harry balançou a cabeça negativamente.



- Não precisa pedir desculpas! Aliás, sou eu quem deve agradecer a senhora. Se não tivesse me pressionado eu não teria conseguido tomar alguma iniciativa, graças à senhora eu pude salvar a vida daquele homem!



Ela olhou-o admirada.



- Qual o seu nome, garoto?



- Potter, senhora. Harry Potter.



A incredulidade percorreu os olhos da mulher, que olhou-o, ao mesmo tempo, com espanto e admiração. O seu olhar então, percorreu, naturalmente, a sua cicatriz, e ela ficou sem palavras, e apenas acenou afetivamente com a cabeça.



- HARRY! - gritou Hermione que, junto a Lupin, só agora tinham conseguido atravessar a multidão e chegar ao garoto.



- Harry, você está bem? Nós vimos o que você fez, foi brilhante! - disse Lupin ajoelhando-se ao lado do garoto.



Harry, quase involuntariamente, abraçou Lupin. Este ficou surpreso mas abraçou-o reciprocamente. Apesar da convivência com o garoto mal tocara nele, sempre evitara, ele lembrava-lhe demais Tiago, e agora se via abraçado a ele.



Enquanto isso, Harry tinha um olhar quase maníaco no rosto.



- Você está um tanto quanto traumatizado, venha! - disse Lupin levantando-o pelo braço e guiando-o pelos ombros através da multidão.



- Ele está em estado de choque, Lupin, não seria melhor levá-lo de volta para Grimmauld Place? - disse Hermione baixinho próximo ao ouvido de Lupin.



- Sim, é o que farei!



- Não! - disse Harry de repente. - Eu vou para o Ministério! Não adianta nem tentar me persuadir do contrário!



A oportunidade de ver de perto a conturbação política através do ministério corroía-o por dentro e ele não deixaria essa oportunidade escapar-lhe.



Olhou para trás, a mulher seguia reto, ofegante, pelo corredor, indo ajudar novos pacientes.







Hermione ficou no St. Mungus, mesmo muito preocupada com Harry. Já ele seguiu com Lupin para o Ministério. Saíram do hospital e pegaram outro ônibus para chegar à cabine telefônica. Chegando, Lupin discou o 62442 e após as mensagens, eles desceram pelo elevador.



Mas enquanto o elevador descia Harry ouviu um barulho elevado de multidão, e quando as portas se abriram ele ficou perplexo. Uma verdadeira multidão enchia o saguão do Ministério da Magia.



- Ah, como eu imaginava! - disse Lupin desgostoso.



Harry escutava diversos gritos do que parecia um protesto. Reparando melhor ele viu diversas bandeiras, mas estando atrás deles não conseguia ler o que diziam.



- Imaginei que não tardaria, os protestos para a retirada de Fudge começaram.

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.