Capítulo 21



N/A: Desculpe pela demora, estou muito ocupada, blábláblá!!! Vocês já devem estar cansados dessas demoras não? Mas vamos logo ao capítulo!

Capítulo Vinte e Um

Enquanto Hermione vestia as roupas ainda úmidas, o capitão Lupin atrelou a égua à carruagem. Depois de ajudá-la a tomar seu lugar, montou seu próprio cavalo. A chuva diminuíra, transformando-se em uma garoa persistente, mas como já anoitecia, ele a acompanhou até Gryffindor.
— Não é preciso me acompanhar até lá — Hermione protestou. — Conheço o caminho.
— Está enganada. As estradas não são seguras, depois do anoitecer. Na semana passada, uma carruagem foi assaltada, perto da vila, e um de seus ocupantes foi morto. Há quinze dias, uma das meninas mais velhas do orfanato saiu para um passeio, à noite. No dia seguinte, encontraram seu corpo no rio. Como se tratava de uma garota retardada, não foi possível saber o que aconteceu.
Embora ouvisse as palavras do capitão, a mente de Hermione dirigia-se a Harry. Seu coração estava repleto de ternura pelo homem que lhe dera um lar, quando ela chegara à Inglaterra, além de roupas bonitas. Ele também lhe oferecera conforto para a sua solidão e, por fim, havia se casado com ela. Era verdade que Harry também se mantinha distante na maior parte do tempo, mas quanto mais considerava a questão, mais acreditava que o capitão Lupin tinha razão. Harry devia gostar muito dela. Do contrário, não teria arriscado um novo casamento.
Lembrou-se da paixão contida nos beijos dele, antes de casamento, e ficou ainda mais convencida disso. Apesar dos tormentos que sofrera quando criança, em nome da religião, ele aceitara se casar na igreja, somente porque Hermione assim lhe pedira.
— Acho melhor o senhor não continuar, a partir daqui — Hermione pediu, ao se aproximarem dos portões de Gryffindor.
— Por quê?
— Porque se Harry souber que passei a tarde na sua casa, vai suspeitar de que o senhor me contou algo sobre ele, assim que eu passar a agir de maneira diferente.
Lupin ergueu as sobrancelhas.
— Pretende agir de maneira diferente?
Hermione assentiu.
— Provavelmente. Acho que vou tentar domar uma pantera.
— Nesse caso, tem razão. É melhor não contar a Harry que esteve comigo. Há dois chalés abandonados, pouco antes de meu. Diga que se abrigou em um deles. Porém, você precisa saber de uma coisa: Harry detesta mentiras. Não deixe que ele descubra.
— Também tenho aversão à mentira. E, mais ainda, de ser apanhada mentindo por Harry.
— Receio que ele esteja preocupado e furioso, se já voltou para casa e descobriu que você saiu sozinha nesse temporal.
Harry havia retornado. Estava, decididamente, preocupado e furioso. Hermione ouviu sua voz assim que entrou pelos fundos, depois de acorrentar Wolf. Sentindo-se ao mesmo tempo alarmada e ansiosa para vê-lo foi diretamente ao escritório. Ele andava de um lado para outro, falando a um grupo de seis criados de expressões aterrorizadas. A camisa branca que usava estava encharcada e suas botas, cobertas de lama.
— Diga-me, mais uma vez, o que lady Potter falou — ele vociferou para Angelina. — E pare de chorar! Comece do início e repita as palavras dela, exatamente como ela falou!
A criada torceu as mãos.
— Ela... ela pediu que um cavalariço escolhesse o cavalo mais manso e a menor carruagem, pois não estava acostumada a conduziu carruagens. Então, pediu que eu dissesse à senhora Pomfrey... a cozinheira... para embrulhar os restos de comida da festa de ontem e mandar colocá-los na carruagem. Eu a avisei de que uma tempestade estava a caminho, mas... ela disse que não choveria durante horas. Então, ela me perguntou se... se eu tinha certeza de que o senhor havia deixado a propriedade. Eu disse que sim. Então... ela partiu.
— E vocês permitiram! — Harry explodiu com os criados. — Deixaram uma mulher visivelmente nervosa, que não tem a menor experiência em conduzir carruagens, sair debaixo de um terrível temporal, levando comida suficiente para um mês! — Virou-se para o cavalariço: — Ouviu-a dizer ao cachorro que estavam “finalmente livres” e não achou estranho?
Sem esperar pela resposta, Harry se aproximou de Slughorn, que mantinha a sua postura rígida e ereta, como um homem diante do pelotão de fuzilamento, pronto a enfrentar com dignidade um destino injusto e terrível.
— Conte-me outra vez, exatamente, o que ela lhe disse.
— Perguntei a lady Hermione o que eu deveria dizer ao senhor, quando chegasse — Slughorn respondeu. — Ela disse: “Diga-lhe que eu disse adeus”.
— E você não percebeu nada de estranho nisso? — Harry inquiriu, irado. — Uma mulher recém-casada sai de casa sozinha, mandando dizer adeus ao marido!
Slughorn corou até a raiz dos cabelos.
— Considerando outros acontecimentos, milorde, essa situação não me pareceu estranha.
Harry parou de andar de um lado para outro e encarou-o, estreitando os olhos.
— Considerando que “outros acontecimentos”? — indagou, ameaçador.
— Considerando o que o senhor me disse ao sair, uma hora antes de lady Hermione, concluí, naturalmente, que os dois haviam tido uma briga e que ela estava abalada por isso.
— O que eu lhe disse ao sair? — Harry persistiu, parecendo mais perigoso a cada momento.
Os lábios de Slughorn tremeram de ressentimento.
— Quando o senhor saiu, pela manhã, eu lhe desejei um bom-dia.
— E?
— E o senhor respondeu que “já tinha outros planos”. Naturalmente, concluí que o senhor não pretendia ter um dia bom e, quando lady Hermione desceu, anunciando que iria sair sozinha, calculei que havia algum problema entre os senhores.
— É pena que você não tenha “concluído” que ela estava me deixando e não tenha tentado impedi-la.
O coração de Hermione se apertou de remorso. Harry havia acreditado que ela o abandonara. E, para um homem como ele admitir isso diante dos criados, só poderia estar muito desesperado. Jamais ocorreria a Hermione que Harry pudesse chegar àquela conclusão. Agora, porém, sabendo do que Cho fizera, era fácil compreender-lhe a reação. Determinada a salvar o orgulho de seu marido, Hermione forçou um sorriso largo e conciliatório, antes de se aproximar.
— Slughorn jamais seria tolo a ponto de imaginar que eu pudesse deixá-lo milorde — falou em tom alegre, segurando o braço de Harry com um gesto afetuoso.
Harry virou-se com tamanha violência, que quase a derrubou. Hermione recuperou o equilíbrio e continuou:
— Posso ser uma mulher nervosa, mas não sou idiota.
Os olhos de Harry se iluminaram de alívio, mas o alívio foi imediatamente substituído pela fúria.
— Onde diabo você se meteu? — ele inquiriu entre os dentes.
Com pena dos criados, já mortificados, Hermione murmurou:
— Tem todo o direito de se zangar comigo e vejo que pretende me dizer exatamente o que pensa de minha atitude. Só lhe peço que não o faça diante dos criados.
Harry respirou fundo, como se seu controle estivesse por um fio e, então, com um leve aceno de cabeça, dispensou os criados. No silêncio pesado que se seguiu, todos eles deixaram o escritório apressados. O último a sair fechou a porta atrás de si. No instante seguinte, Harry deu vazão a sua fúria.
— Sua idiota! Revirei os campos a sua procura!
Hermione olhou para o homem atraente e viril a sua frente, mas o que viu foi um garotinho sujo, sendo surrado por ser o “demônio”. Um nó se formou em sua garganta e, invadida por profunda ternura, acariciou-lhe a face sem pensar.
— Sinto muito — sussurrou.
Harry se afastou com um gesto violento.
— Sente muito? — repetiu com sarcasmo. — Sente pelo quê? Pelos homens que ainda estão na chuva, a sua procura? Ou pelo cavalo que derrubei na lama?
— Sinto muito que tenha pensado que eu o havia abandonado — Hermione explicou com voz trêmula. — Eu jamais faria isso.
Harry lançou-lhe um olhar irônico.
— Considerando que ontem você quase me abandonou no altar e que hoje me pediu o divórcio, suas palavras são surpreendentes! A que se deve essa “crise de fidelidade”, agora?
Apesar da atitude de sarcasmo e indiferença, Hermione reconheceu a mágoa na voz de Harry, quando ele mencionou que ela quase o abandonara no altar. Sentiu um forte aperto no peito ao se dar conta de quanto isso o perturbara.
— Milorde...
— Ora, pelo amor de Deus! Pare de me chamar de “milorde”! E não se humilhe, pois detesto isso!
— Não estou me humilhando! Só estava tentando dizer que minha intenção era levar comida para o orfanato. Lamento tê-lo deixado preocupado e prometo que isso não voltará a acontecer.
Ele a fitou com ar cansado, a ira abandonando lentamente as suas feições.
— Você é livre para fazer o que quiser, Hermione. Nosso casamento foi o maior erro que já cometi na vida.
Hermione hesitou, sabendo que nada do que dissesse o faria mudar de idéia, especialmente enquanto Harry estivesse naquele estado de ânimo. Após alguns momentos, pediu licença e foi para o seu quarto, trocar de roupa. Harry não jantou com ela e Hermione foi se deitar, certa de que ele se juntaria a ela na cama, ao menos para forçá-la a cumprir a sua parte no acordo e lhe dar um filho.
Harry não a procurou naquela noite, nem nas três seguintes. Na verdade, ele fez o possível para evitá-la completamente. Passava o dia todo no escritório, ditando cartas ao seu secretário, o sr. Benjamim, e discutindo negócios com cavalheiros que vinham de Londres. Quando encontrava Hermione durante uma refeição, ou pelos corredores da mansão, limitava-se a cumprimentá-la com cortesia, porém com frieza, como se ela fosse uma completa estranha. Quando terminava seu trabalho, ia para o quarto, trocava de roupa e, então, partia para Londres.
Como Luna viajara para o sul da Inglaterra, a fim de visitar um irmão cuja esposa estava prestes a dar à luz, Hermione passava a maior parte do tempo no orfanato, organizando brincadeiras com as crianças, e visitando os residentes da vila, para que continuassem a se sentir à vontade com ela. Mas, por mais ocupada que se mantivesse, sentia falta de Harry. Em Londres, passavam muito tempo na companhia um do outro. Ele a acompanhava a quase todos os lugares, incluindo festas, bailes e peças de teatro e, embora não passasse o tempo todo a seu lado, Hermione se sentia segura por saber que ele estava por perto, sempre muito protetor. Agora, ela sentia falta de suas brincadeiras e até mesmo se seus momentos de zanga. Nas semanas que haviam se seguido à chegada da carta da mãe de Draco, ele havia se transformado em um amigo muito especial.
Agora, Harry era um estranho que talvez até precisasse dela, mas que fazia questão de mantê-la a distância. Hermione sabia que ele já não estava zangado. Simplesmente, cuidara de expulsá-la do coração e da mente, como se ela não existisse.
Na quarta noite, Harry foi para Londres mais uma vez. Hermione ficou acordada em sua cama, os olhos fixos no teto, perdida em fantasias tolas sobre dançar com ele como haviam dançado tantas vezes antes. Era delicioso dançar com Harry, pois ele possuía movimentos leves e...
De súbito, uma pergunta ocorreu a Hermione: o que Harry fazia em Londres, à noite? Depois de muito pensar, concluiu que ele passava o tempo jogando em um dos clubes que freqüentava.
Não quinta noite, Harry nem se deu ao trabalho de voltar para casa. Na manhã seguinte, durante o café da manhã. Hermione folheava a Gazette, quando descobriu como Harry ocupava suas noites em Londres. Ele não fora jogar, nem se reunira a cavalheiros para tratar de negócios. Harry comparecera a um baile em casa de lorde Longbottom e dançara a noite inteira com a jovem esposa do lorde de meia-idade. O jornal também mencionava que, na noite anterior, lorde Potter fora ao teatro na companhia de uma loira, dançarina de ópera. Hermione sabia três coisas sobre a amante de Harry: seu nome era Fleur, ela era dançarina de ópera e loira.
O ciúme tomou conta de Hermione e foi um sentimento tão violento, que abalou seu equilíbrio, pois ela jamais sofrera desse mal antes.
Harry escolheu justamente aquele momento para entrar na sala de jantar, com as mesmas roupas que usara quando partira para Londres, na véspera. A diferença era que, agora, ele levava o paletó descuidadamente atirado sobre o ombro, a gravata desamarrada, pendendo do pescoço, e a camisa aberta no colarinho. Era evidente que não dormira em sua mansão, em Londres, onde contava com um guarda-roupa completo.
Limitou-se a cumprimentar Hermione com um aceno de cabeça, antes de se servir de um xícara de café.
Hermione levantou-se lentamente, tremendo de raiva.
— Harry — chamou-o com voz fria e controlada.
Ele olhou por cima do ombro, mas ao perceber a expressão sombria da esposa, virou-se para encará-la.
— O que é?
— Lembra-se de como se sentia quando sua primeira esposa estava em Londres e se envolvia em casos escandalosos?
— Perfeitamente — ele respondeu, impassível.
Surpresa e, até mesmo impressionada com a própria coragem, Hermione lançou um olhar significativo para o jornal, antes de erguer o queixo e declarar.
— Nesse caso, espero que não me faça sentir o mesmo de novo.
Harry olhou rapidamente para o jornal, antes de voltar a fitá-la.
— Se bem me lembro, eu não dava importância ao que ela fazia.
— Pois, eu dou! — Hermione explodiu, incapaz de manter o controle por mais tempo. — Compreendo perfeitamente que maridos civilizados tenham amantes, mas espera-se que sejam discretos. Vocês, ingleses, têm regras para tudo, até para a discrição. Quando você sai por aí, com sua... sua amiga ao lado, sinto-me humilhada e magoada.
Com essas palavras, Hermione saiu, sentindo-se como um sapato velho deixado de lado.
Parecia uma linda rainha, com os cabelos soltos balançando às costas, o corpo movendo-se com graça inigualável. Harry observou-a sair, esquecendo-se da xícara de café que tinha nas mãos. Foi invadido pelo desejo familiar de tomá-la nos braços e mergulhar o rosto naqueles cabelos castanhos, mas não se moveu. O que quer que Hermione sentisse por ele, não era amor, nem desejo. Ela considerava “civilizado” da parte dele manter uma amante, discretamente, para satisfazer seus desejos repulsivos. Por outro lado, seu orgulho havia sido ferido quando Harry fora visto em público ao lado de outra mulher
Sim, tratava-se de orgulho ferido, nada mais. Porém, ao se lembrar do duro golpe que o orgulho de Hermione sofrera com a traição de Draco, Harry descobriu-se incapaz de magoá-la ainda mais. Compreendia os sentimentos dela, pois lembrava-se com clareza de como ele mesmo se sentira ao descobrir a traição de Cho.
Passou no escritório para apanhar alguns documentos e, então, subiu a escada lendo os papéis e carregando o paletó.
— Bom dia, milorde — o valete cumprimentou com um olhar de reprovação para suas roupas amarrotadas.
— Bom dia, Gilderoy — Harry respondeu, sem tirar os olhos dos documentos recém-chegados.
Gilderoy preparou os apetrechos de barbear de Harry e, em seguida, pôs-se a escovar o paletó que o patrão acabara de lhe entregar.
— Seu traje para esta noite deverá ser formal ou informal, milorde?
Harry virou a página do documento.
— Informal — respondeu, distraído. — Lady Potter acha que tenho passado tempo demais fora de casa, à noite.
Encaminhou-se para o banheiro, sem perceber a expressão de prazer que iluminou as feições do valete. Gilderoy esperou que Harry entrasse no banho para, então, correr ao andar de baixo e dar a notícia a Slughorn.
Até lady Hermione invadir a casa, meses antes, destruindo a ordem e disciplina tediosas ali reinantes, Gilderoy e Slughorn haviam mantido suas posições de confiança com unhas de dentes, ardendo de ciúme um do outro. Na verdade, tinham se evitado escrupulosamente durante anos. Agora, porém, os dois antigos adversários haviam unidos esforços e interesses em favor do bem-estar do patrão e da patroa.
Slughorn estava no hall de entrada, encerando uma mesa. Olhando em volta a fim de se certificar de que não havia criados de menor escalão por perto que pudessem ouvi-los, Gilderoy se aproximou do mordomo, ansioso para partilhar as novidades do romance tumultuado do lorde, ou melhor, da ausência de romance. Em troca, queria ouvir qualquer novidade que Slughorn tivesse que contar. Inclinou-se para o confidente, sem perceber a presença de McLaggen, que se encontrava no salão contíguo, o ouvido colado à parede.
— O lorde anunciou que jantará em casa esta noite, senhor Slughorn — o valete sussurrou em tom conspiratório. — Reputo isso um bom sinal.
Slughorn endireitou-se mantendo a expressão impassível.
— Trata-se de um acontecimento incomum, considerando-se a ausência do lorde nas últimas cinco noites. Porém, não julgo a notícia tão encorajadora.
— Acho que não compreendeu! O lorde foi muito específico: vai ficar em casa porque lady Hermione assim o deseja!
— Ah, isso, sim, é encorajador, senhor Gilderoy! — Então, foi a vez de Slughorn olhar em volta, a fim de se certificar se ninguém mais os ouvia. — Creio que o motivo do pedido de lady Hermione foi um certo artigo na Gazette desta manhã, insinuando que lorde Potter tem desfrutado da companhia de uma certa dançarina de ópera, em Londres.
McLaggen descolou o ouvido da parede e, saindo pela porta lateral do salão, correu para a cozinha.
— Ela conseguiu! — anunciou, triunfante, ao chegar lá.
A sra. Pomfrey parou de misturar a massa de torta que estava preparando, tão ansiosa para saber das novidades, que nem se importou quando McLaggen apanhou uma das maças que ela deixara sobre a mesa.
— O que ela conseguiu?
— Conseguiu impor sua vontade a lorde Potter! Ouvi a conversa de Slughorn e Gilderoy. Lady Hermione leu no jornal que lorde Potter esteve com a senhorita Fleur e disse a ele que ficasse em casa, onde é seu lugar. E é exatamente o que ele vai fazer. Eu disse a todos vocês que ela capaz de lidar com ele. Soube disso no momento em que ela me contou que é irlandesa! Mas lady Hermione é uma lady de verdade, além de ser muito gentil e alegre.
— A pobre criança tem se mostrado a imagem da tristeza nesses últimos dias — a sra. Pomfrey comentou, preocupada. — Mal toca na comida, quando ele não está em casa. E tenho preparado todos os seus pratos prediletos! Ela sempre agradece com tanta gentileza, que tenho vontade de chorar. Não consigo entender por que ele não tem dormido com ela, como deveria...
McLaggen sacudiu a cabeça, também preocupado.
— Ele não a procurou desde a noite de núpcias. Angelina tem certeza absoluta disso. E lady Hermione não tem dormido na cama dele, pois as criadas têm ficado de olho no quarto do lorde e garantem que, todas as manhãs, encontram um único travesseiro amarrotado.
Em silêncio pensativo, McLaggen devorou sua maça e estendeu a mão para apanhar outra, mas dessa vez, a sra. Pomfrey o impediu.
— Pare de roubar as minhas maças, Cormac. Eu as apanhei para fazer uma torta de sobremesa. — Um súbito sorriso iluminou as feições da cozinheira. — Pensando melhor, pode comer as maças. Vou preparar algo mais festivo que uma torta, para a sobremesa de hoje.
A mais jovem das ajudantes de cozinha, uma garota gorducha, de dezesseis anos, decidiu participar da conversa:
— Uma das criadas da lavanderia estava me falando sobre um pó que deve ser colocado no vinho para fazer um homem desejar uma mulher, se o problema for sua virilidade. Todas as criadas, lá, concordam que o lorde deveria provar um pouco do pó... Talvez ajude.
As demais ajudantes concordaram com entusiasmo, mas McLaggen soltou uma gargalhada.
— Por Deus, garota! De onde vocês tiram essas idéias? O lorde não precisa de pó algum. Pode dizer às criadas da lavanderia que eu garanto isso. John, o cocheiro, apanhou um resfriado crônico por ter esperado na carruagem, ao relento, todas as noites do inverno passado, até o lorde deixar a cama da senhorita Abbott, que foi a amante do lorde, antes da senhorita Fleur.
— Ele esteve com a senhorita Fleur, ontem à noite? — a sra. Pomfrey inquiriu. — Ou foi apenas mexerico de jornal?
— Ele esteve com ela, sim — McLaggen respondeu com seriedade. — Ouvi os cavalariços confirmarem a notícia. Só não sabemos o que aconteceu, enquanto ele estava lá. Talvez estivesse apenas se livrando dela.
A sra. Pomfrey exibiu um sorriso nada convicto.
— Bem, ao menos, ele vai jantar em casa com a esposa, esta noite. Já é um começo.
McLaggen assentiu em concordância e se dirigiu ao estábulo, a fim de dar a notícia ao cavalariço que o informara sobre as atividades de lorde Potter na noite anterior.
E foi por isso que, das cento e quarenta pessoas residentes em Gryffindor, só Hermione se surpreendeu ao ver Harry entrar na sala de jantar, naquela noite.
— Ficará em casa, esta noite? — perguntou, aliviada.
— Tive a impressão de que era isso o que você queria que eu fizesse.
— E era — Hermione admitiu, perguntando-se se a escolha do vestido verde-esmeralda fora adequada e desejando que ele não houvesse se sentado tão longe, na outra ponta da mesa. — Só não esperava que você ficasse. Isto é... — parou de falar quando McLaggen se encaminhou em sua direção, com um brilho de determinação no olhar.
— Seu vinho, milady — ele anunciou, apanhando um dos copos e colocando-o sobre a mesa com um floreio exagerado que, como só poderia ser, resultou em um acidente.
Todo o vinho foi derramado sobre a toalha, bem diante de Hermione.
— McLaggen...! — Slughorn repreendeu-o de sua posição, ao lado da mesa das comidas, de onde costumava supervisionar o serviço dos lacaios durante as refeições.
McLaggen lançou-lhe um olhar inocente, antes de puxar a cadeira de Hermione e conduzi-la até a outra ponta da mesa, onde Harry estava sentado.
— Peço que me perdoe, milady — ele se desculpou com ar exageradamente arrependido, quando a acomodou à direita de Harry. — Providenciarei mais vinho imediatamente. Então, limparei a toalha. O cheiro de vinho derramado é terrível, não é? Será melhor milady fazer sua refeição longe de lá. Não sei como fui fazer isso. Deve ser meu braço... Tenho sentido muitas dores. Não é nada sério, nada que deva preocupá-la. Apenas um osso que quebrei, quando criança.
Hermione ajeitou o guardanapo no colo e fitou-o com um sorriso de simpatia.
— Lamento saber que seu braço o incomoda, senhor McLaggen.
McLaggen virou-se para lorde Potter, pronto a recitar mais desculpas falsas, mas sentiu a boca secar ao deparar com o olhar penetrante de Harry, que passava lentamente o dedo pela faca, como se testasse seu corte.
Depois de limpar a garganta, McLaggen voltou a se dirigir a Hermione:
— Vou providenciar outro copo de vinho, milady.
— Lady Potter não bebe vinho durante as refeições — Harry assinalou em tom irônico. — Ou você mudou seus hábitos, Hermione?
Ela sacudiu a cabeça, sem compreender a comunicação que parecia ocorrer, sem a necessidade de palavras, entre Harry e o pobre McLaggen.
— Mas acho que vou beber um pouquinho esta noite — acrescentou, tentando resolver a estranha situação.
Os criados se retiraram, deixando-os sozinhos. Um silêncio pesado persistiu durante todo o jantar, quebrado apenas pelo ocasional tilintar dos talheres de prata contra a porcelana. Tal silêncio tornou-se ainda mais constrangedor para Hermione quando ela pensou na animação que estaria cercando Harry em Londres, se ele não tivesse ficado em casa com ela.
Quando os pratos foram retirados da mesa e a sobremesa foi servida, a infelicidade de Hermione já havia se transformado em desespero. Por duas vezes, tentara quebrar o silêncio com comentários inócuos sobre o tempo e sobre a excelência dos pratos preparados pela sra. Pomfrey. As respostas de Harry, porém, haviam sido monossilábicas e nada encorajadoras.
Hermione sabia que precisava fazer alguma coisa depressa, pois o vazio que os separava tornava-se maior a cada momento, mais profundo a cada dia. Em breve, não existiriam meios de repará-lo.
Sua ansiedade cedeu um pouco quando McLaggen, mal escondendo o sorriso maroto, entrou com um bolo, decorado com duas bandeiras enlaçadas: a inglesa e a americana.
Harry examinou o bolo e ergueu o olhar cínico para o chefe dos lacaios.
— Pelo que vejo, a senhora Pomfrey está se sentindo particularmente patriota, hoje. Ou a sobremesa foi preparada no intento de me fazer lembrar que sou casado?
O lacaio empalideceu.
— De maneira alguma, milorde — respondeu e, assim que Harry o dispensou com ar de desagrado, desapareceu.
— Se o bolo deveria representar nosso casamento — Hermione comentou com humor impensado —, a sra. Pomfrey deveria tê-lo decorado com duas espadas, não duas bandeiras.
— Tem razão — Harry concordou.
Ele parecia tão desinteressado pelo estado lastimável de seu casamento, que Hermione finalmente tomou coragem para abordar o assunto que quisera discutir desde o início do jantar.
— Não quero ter razão, Harry. Por favor, quero que as coisas sejam diferentes entre nós.
Harry reclinou-se na cadeira, fitando-a nos olhos, sem esconder uma pontada de surpresa.
— O que, exatamente, você tem em mente?
— Bem, em primeiro lugar, gostaria que fôssemos amigos. Nós costumávamos conversar e rir juntos.
— Então, vamos conversar.
— Há algum assunto que você gostaria de discutir?
Os olhos de Harry fixaram-se nos dela, enquanto ele pensava: “Quero discutir por que você precisa se embriagar para enfrentar a idéia de ir para a cama comigo. Quero saber por que os meus carinhos a fazem sentir doente”.
— Nada em particular — ele respondeu em voz alta.
— Muito bem... Gosta do meu vestido? É um dos que madame Maxime fez para mim.
Harry baixou os olhos para a pele alva exibida pelo decote do vestido. Hermione ficava linda de verde, pensou, mas precisava de esmeraldas para completar o traje. Se as coisas fossem diferentes, ele dispensaria os criados e a sentaria em seu colo. Então, desabotoaria o vestido, expondo os seios fartos ao seus lábios e as suas mãos. Então, depois de beijá-la e acariciá-la, a levaria para o quarto, e eles fariam amor até esgotarem suas forças.
— É um belo vestido, mas merece um colar de esmeraldas.
Hermione levou a mão ao pescoço, lembrando-se de que não possuía um colar de esmeraldas.
— Você também está muito bem — elogiou, admirando o paletó azul que ele envergava com elegância tão natural. — Você é muito bonito — acrescentou com ternura.
— Obrigado — Harry agradeceu, visivelmente surpreso.
— De nada — Hermione replicou e, por achar que ele gostara do elogio, decidiu explorar aquele tópico de conversa. — Sabia que, quando o vi pela primeira vez, eu o achei assustador? É verdade que já escurecia e eu estava muito nervosa, mas... bem, você é tão grande, que chega a ser assustador.
Harry engasgou com o vinho.
— Do que está falando?
— Do nosso primeiro encontro — ela esclareceu, inocente. — Eu me encontrava lá fora, segurando um leitão nos braços. Então, você me arrastou para dentro, onde estava bem mais escuro e...
Harry se levantou de súbito.
— Sinto muito se não tratei você com cortesia. Agora, se me der licença, vou trabalhar um pouco.
— Não! — Hermione protestou, levantando-se depressa. — Por favor, não trabalhe. Vamos fazer alguma coisa juntos... algo de que você goste.
O coração de Harry disparou. Viu o convite naqueles olhos suplicantes e, no mesmo instante, foi invadido pela esperança e pela incredulidade, que se explodiram em seu peito. Sem pensar, ergueu a mão e acariciou a face de Hermione, para então afagar-lhe os cabelos sedosos.
Hermione estremeceu de prazer, pois ele finalmente a tratava com carinho. Deveria ter tentado aquela aproximação dias antes, em vez de sofrer em silêncio.
— Podemos jogar xadrez — sugeriu, animada. — Não sou muito boa, mas se você...
A mão de Harry congelou no ar e seu rosto se transformou em uma máscara.
— Desculpe, Hermione. Tenho trabalho a fazer.
Passou por ela e se fechou no escritório, onde ficou pelo resto da noite.
Desapontada, Hermione passou o tempo tentando ler. Na hora de se deitar, estava determinada a impedir que ele voltasse a tratá-la como uma estranha, custasse o que custasse. Lembrou-se de como ele a fitara, antes de sua sugestão sobre jogarem xadrez. Fora igual ao modo como ele costumava fitá-la, antes de beijá-la. Seu corpo reconhecera aquele olhar imediatamente e reagira daquela maneira inexplicável que sempre reagia quando Harry a tocava. Talvez ele houvesse preferido beijá-la, em vez de jogar xadrez. Ora, talvez ele quisesse fazer aquela coisa horrível com ela, de novo...
Hermione estremeceu diante da idéia, mas estaria disposta até mesmo a isso, se pudesse restaurar a harmonia. Sentiu o estômago revirar ao pensar no modo como ele estudara seu corpo, com olhar indiferente, na noite de seu casamento. Talvez não tivesse sido tão ruim se ele a houvesse tratado como a tratava, quando a beijava.
Esperou até ouvir Harry entrar no quarto dele e, usando seu robe de cetim turquesa, abriu a porta de comunicação, que fora devidamente substituída, com exceção do trinco, e entrou.
— Harry, preciso falar com você — anunciou, sem preâmbulos.
— Saia daqui, Hermione — ele retrucou, irritado, acabando de tirar a camisa.
— Mas...
— Não quero conversar — ele a interrompeu com sarcasmo. — Não quero jogar xadrez, não quero jogar cartas.
— Então, o que você quer fazer?
— Quero que saia daqui. Fui claro?
— Eu diria que sim — Hermione respondeu com dignidade. — Não voltarei a incomodá-lo.
Voltou para o seu quarto e fechou a porta atrás de si, embora continuasse firmemente determinada a tornar seu casamento feliz e sólido. Não fazia idéia do que Harry esperava dela. Mais precisamente, não o compreendia. Porém, conhecia alguém que compreendia Harry. Harry tinha trinta anos, era bem mais velho e experiente que ela, mas o capitão Lupin era mais velho que Harry e, sem dúvida, saberia aconselhá-la sobre o que fazer.

N/A: Muito obrigada ao pessoal que comentou e a Luana que fez essa capa linda pra fic! É o incentivo de vocês que me faz continuar postando!!
Bjs,
Jéssica Malfoy

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