A Garota do Colar de Rolhas



— CAPÍTULO SETE —
A Garota do Colar de Rolhas




Era inacreditável. O que Draco Malfoy e Pansy Parkinson estavam fazendo ali? A primeira reação de Hermione foi pensar que tinham entrado no vagão errado, mas constatou que além dela e de Rony representando a Grifinória e Draco e Pansy representando a Sonserina, estavam Ernesto Macmillan e Ana Abbott, da Lufa-Lufa, e Antônio Goldstein e Padma Patil, da Corvinal.
— Que diabos...? — Rony começou a perguntar a ela, em voz baixa, mas foi interrompido pela entrada de um casal de alunos do sétimo ano que Hermione conhecia apenas de vista.
— Olá, — disse a garota — sejam muito bem-vindos. Meu nome é Rosie Woodsen, sou da Lufa-Lufa, e este é Ricardo Larson, da Corvinal. Somos os monitores-chefes. É uma honra receber vocês, os novos monitores de Hogwarts.
— Não sei se já sabem — disse Ricardo Larson — mas os monitores são escolhidos a cada dois anos; são quatro pares, cada um representando uma das casas. Todo o ano, porém, é escolhido um par de monitores-chefes, de qualquer uma das quatro casas, que esteja no sétimo ano. Os escolhidos deste ano fomos nós, e nosso trabalho é justamente orientar vocês.
— E quanto ao seu trabalho; — Rosie Woodsen retomou a palavra — ele consiste em manter a ordem nos corredores, orientar os alunos novos pelo castelo, conduzi-los até suas casas nas primeiras semanas de aula, tudo com o intuito de colaborar para o bom funcionamento da escola.
Durante cerca de quarenta minutos, Rosie e Ricardo explicaram os deveres dos monitores e os procedimentos de que faziam uso. Apesar de seu enorme interesse, Hermione não pôde evitar dispensar uma parte de sua atenção ao par de monitores da Sonserina. Quem olhasse naquele momento para Draco e Pansy pensaria que eram alunos exemplares, pela maneira com que balançavam as cabeças afirmativamente a cada instrução, com expressões compenetradas nos rostos.
— Que palhaçada — murmurou Rony, quando ele e Hermione saíam do vagão dos monitores, ele com a gaiola de Pichitinho na mão e ela com Bichento no colo. — Não me sinto mais nem um pouco honrado em ter sido escolhido monitor.
— Ora, Rony, pense bem... — Hermione retrucou. — Não há ninguém que preste na Sonserina, então Draco e Pansy não teriam sido pior escolha que quaisquer outros.
— Não? Eles são a pior escolha possível!
— Além do mais, pode ser que Dumbledore pense em dar a Draco essa chance de se redimir.
— Dumbledore? Aposto como foi Snape quem deu um jeito de colocar Malfoy lá.
— Pode ter sido uma opinião influente, mas a decisão final deve ter sido de Dumbledore, você não acha?
— Espere aí! — disse Rony, indignado. — Você não parece estar incomodada por Malfoy e Parkinson serem os monitores da Sonserina!
— Não seja estúpido, é claro que estou! Odeio a idéia tanto quanto você, mas é uma coisa com a qual teremos que conviver, não é? — ela apontou para uma das cabines. — Veja, Harry está ali.
— Oh, não! — Rony exclamou, como se estivesse vendo uma catástrofe. — Não! Que droga!
— O que houve? — ela perguntou, preocupada. — O que está acontecendo?
— O carrinho de comida, veja... Está lá no fim do corredor; já passou por aqui.
Hermione revirou os olhos, abrindo a porta da cabine onde vira Harry. Viu que além dele estavam Gina, Neville Longbottom e uma garota que não conhecia.
— Estou morrendo de fome — disse Rony entrando, pegando um sapo de chocolate que Harry lhe estendia e sentando-se ao lado do amigo.
Ela percebeu que Gina e Harry os olhavam interrogativamente, provavelmente querendo detalhes sobre o que acontecera no vagão dos monitores. E então ela percebeu como seria horrível ter que lhes dar a notícia sobre Malfoy e Pansy Parkinson. O pior é que Rony tem razão, pensou. Já começo a não sentir tanto orgulho em ser monitora quando Pansy Parkinson também é.
— Bem... — disse. — São dois monitores do quinto ano para cada casa, um garoto e uma garota.
— Tente adivinhar quem é o monitor da Sonserina... — disse Rony, com a boca cheia de chocolate.
— Malfoy — Harry respondeu, provavelmente apostando na pior possibilidade que conseguira imaginar.
— Claro — disse Rony com desânimo, pegando mais um sapo de chocolate.
— E aquela vaca da Pansy Parkinson — Hermione disse, com raiva. — Como ela conseguiu ser monitora?
— Quem são os das outras casas? — Harry quis saber.
— Ernesto Macmillan e Ana Abbott são os da Lufa-Lufa, — ela respondeu — e Antônio Goldstein e Padma Patil os da Corvinal.
— Você foi ao baile de inverno com Padma Patil — disse a garota que Hermione não conhecia, que antes estivera lendo uma revista, mas agora olhava para Rony com uma expressão sonhadora no rosto.
Hermione não gostou nem um pouco. Analisando a garota com mais atenção, viu que ela usava um colar de rolhas de garrafa de cerveja amanteigada e lia um exemplar de O Pasquim, uma revista que ela sempre ouvira dizer ser uma publicação sensacionalista e até invencionista, de péssima qualidade, e que a garota segurava de cabeça para baixo. Seus cabelos eram louros, longos e desgrenhados, e seus olhos pareciam estar sempre arregalados.
— Eu sei que fui — disse Rony, um tanto surpreso com a intromissão.
— Ela não gostou muito — disse a garota. — Reclamou que você não dançou com ela. Eu não teria me importado; não gosto muito de dançar.
E por que exatamente aquela garota estava fazendo aquele comentário? Hermione começou a se irritar. Gina, por sua vez, segurava o riso com dificuldade. Rony não parecia ter se importado com os comentários da garota, e agora comentava com Harry e Neville: — Temos que patrulhar os corredores de vez em quando, e podemos punir quem estiver se comportando mal. Mal posso esperar para pegar Goyle e Crabbe.
— Você não pode abusar da sua posição, Rony — Hermione disse, irritada.
— Claro que não, e Malfoy certamente não abusará da dele. — ele retrucou, sarcástico.
— Mas você vai descer ao nível dele?
— Não; só quero pegar os amigos dele antes que ele pegue os meus. Vou fazer Goyle escrever, eu sei que ele odeia. — Rony pigarreou e passou a incorporar uma imitação de Goyle, como se estivesse escrevendo. — Eu... não.. devo... ter... cara... de... bunda de macaco.
Todos riram, e Hermione também o fez. Aquela garota que lia O Pasquim, contudo, foi quem riu mais alto, tanto que até assustou Bichento. Sua gargalhada era alta, estridente e forçada, e ao final, sob os olhares espantados de todos os outros, ela disse:
— Isso foi engraçado!
E voltou a rir, os braços enroscados ao redor da própria barriga e os olhos fixos em Rony o tempo todo. Harry era o único que não assistia ao espetáculo da garota; Hermione observou-o juntar do chão a revista que a garota derrubara.
— Posso olhar? — ele perguntou, e a garota sinalizou que sim ainda sem tirar os olhos de Rony, que começava a corar com a situação.
Harry folheava a revista enquanto os outros ficavam em silêncio. Rony, muito vermelho agora, virou-se para o amigo para perguntar se ele estava lendo algo de bom.
— Claro que não — Hermione disse, antes que Harry pudesse responder e sem esconder sua irritação. — O Pasquim é um lixo, todo mundo sabe disso.
— Com licença — disse a garota, olhando para Hermione com desdém e completamente recuperada do acesso de riso. — Meu pai é o editor.
— Ah... bem... — Hermione balbuciou, um tanto desconcertada, mas a garota não lhe deu atenção; pegou a revista de volta e voltou a erguê-la à frente do rosto, de cabeça para baixo.
— Quem é essa maluca? — Hermione perguntou a Gina apenas com o movimento dos lábios. Gina respondeu da mesma maneira.
— Luna Lovegood. — disse ela. — Está no mesmo ano que eu.
Achando o nome esquisito, Hermione franziu o cenho. No instante seguinte, a porta da cabine se abriu e Malfoy reapareceu diante de seus olhos, desta vez acompanhado por Goyle e Crabbe. Harry suspirou alto e perguntou com rispidez:
— O que é?
— Modos, Potter — disse Malfoy com arrogância. — ou terei que lhe dar uma detenção. Afinal, ao contrário de você, fui nomeado monitor e posso distribuir punições.
— É, mas ao contrário de mim, você é um babaca. — Harry respondeu, impaciente. — Saia e nos deixe em paz.
Hermione riu com gosto, junto com Rony e Gina. Malfoy pareceu lutar para não demonstrar sua irritação, e fez nova investida:
— E então, Potter, como se sente perdendo a liderança para o Weasley?
Como Malfoy se atrevia? Harry e Rony eram melhores amigos, não havia competição entre eles. Pelo menos, Hermione pensou, não havia competição capaz de abalar a amizade deles, embora às vezes a atrapalhasse.
— Cala essa boca! — ordenou com aspereza.
— Vejo que toquei num ponto sensível... — disse Malfoy, sorrindo. — Bem, Potter, cuide-se pois eu vou estar caçando você como um cão caso saia da linha.
— Cai fora! — Hermione ordenou, levantando-se e levantando também o tom de voz. Antes que tivesse tempo de sacar a varinha do bolso, os três alunos da Sonserina se afastaram, aparentando sentirem-se bem satisfeitos com algo.
Cão? O que Malfoy quisera dizer? Sirius estivera na estação para despedir-se de Harry, em sua forma de cão; poderia Malfoy estar fazendo alguma referência a isso? Hermione bateu a porta da cabine e olhou imediatamente para Harry, para ver se ele também parecia intrigado com o que Malfoy dissera, e os olhos dele de fato pareciam encobertos por densas nuvens de preocupação.
Durante o resto da viagem, a cabine não voltou a ser aberta exceto quando Hermione e Rony saíam ao corredor para inspecioná-lo rapidamente. Sentada em seu lugar, ela dirigia vez ou outra um olhar furtivo a Luna Lovegood, achando-a cada vez mais esquisita. O que eram aquelas rolhas de garrafa ao redor do pescoço? E por que diabos segurava a maldita revista de ponta-cabeça? E qual era, afinal, a natureza de tanto interesse pelas piadas de Rony ou por quem tinha sido o par dele no baile de inverno?
Quando o Expresso de Hogwarts parou na estação de Hogsmeade, Hermione e Rony saíram antes dos outros para supervisionar o desembarque. Rony parecia um tanto confuso sobre a direção para onde teria que ir ou como deveria agir, e não demorou muito para que se perdessem um do outro em meio à multidão. Foi então que ela ouviu a voz detestável de Malfoy mais uma vez.
— Está vendo o que você fez? — dizia ele, em tom ameaçador. Ela virou-se e viu que ele se dirigia a um aluno do primeiro ano. — Pisou no meu pé! Sujou o meu sapato! Agora trate de lambê-lo até tirar toda essa poeira imunda, se não quiser ganhar uma detenção.
— O que pensa que está fazendo? — Hermione perguntou, aproximando-se.
— Volte ao trabalho, Granger. A função dos monitores é supervisionar os alunos, e não os outros monitores.
— Vou contar o que está fazendo à profa. McGonagall! — ela dirigiu-se ao garoto do primeiro ano. — Pode ir, e fique tranqüilo.
O garoto não esperou segunda ordem; saiu com tanta pressa que no segundo seguinte já não era mais possível vê-lo por entre os outros alunos. Malfoy virou-se de frente para Hermione.
— E eu vou contar ao prof. Snape sobre a maneira como você me desautorizou na frente dos alunos. Ele vai adorar saber.
— Como podem ter escolhido você? Como podem ter pensado que você faria algum bom uso desse distintivo?
— Me admira terem escolhido você e Weasley. Será que não tinha ninguém pior? Weasley não tentou derreter o distintivo, na esperança de que fosse ouro, para poder vender e comprar um conjunto de vestes novas?
Antes que pudesse perceber, Hermione levantou a mão para golpear o rosto de Malfoy com toda a sua força. Deteve-se, porém, ao pensar que seria invariavelmente punida se o agredisse. O garoto sorriu satisfeito e agarrou o braço que ela levantara.
— Granger... — ele sacudiu a cabeça de um lado para o outro. — Você já deveria ter aprendido a não se meter comigo.
Ela tentou se desvencilhar e pegar a varinha, mas antes que pudesse fazer isso Malfoy empurrou-a com força, derrubando-a sentada no chão, e disse: — Às vezes eu até penso que é uma pena você ser uma sangue-ruim imunda. Uma pena...
Malfoy se retirou, deixando-a ali no chão. Hermione levantou-se, limpando as vestes e decidida a não tentar entender o que Malfoy pudera querer dizer com “uma pena”.
— Alunos do primeiro ano, por aqui!
Hermione estivera esperando ouvir aquela frase, porém não com a voz da profa. Grubbly-Plank, que chamava para perto de si os alunos novos. Ela viu que a professora começou a indicar aos alunos os botes em que atravessariam o lago até a escola. Procurou ansiosamente com os olhos esperando ver a pessoa que normalmente executava aquela tarefa, mas Hagrid não estava em parte alguma. Ele não poderia estar escondido atrás da multidão, pois tinha cerca de três metros de altura. E se estivesse por ali, a professora não o estaria substituindo, como já fizera em algumas aulas de Trato das Criaturas Mágicas no ano anterior.
Quando desistiu de procurar Hagrid, ela avistou Rony, Harry e Gina parados perto das carruagens sem cavalos, e correu até lá. Quando chegou, contou-lhes brevemente sobre a atitude de Malfoy com o garotinho do primeiro ano e aliviou Gina do peso de Bichento, que ela trazia no colo.
— Venham, vamos pegar uma carruagem antes que estejam todas cheias — disse.
Por alguma razão, só Gina a seguiu. As duas entraram em uma carruagem e sentaram. Gina, animada, comentou:
— Foi bom isso, porque quando vocês tiveram que se separar de Harry, eu fiz companhia para ele. Só que... — a expressão de Gina se anuviou — aquela Cho apareceu para dizer oi para ele. Ela entrou só para dizer oi para ele!
Hermione ia perguntar por que eles tinham deixado Luna Lovegood viajar na mesma cabine, mas naquele momento viu Luna se aproximando de Rony com a gaiola de Pichitinho na mão. Deixou o queixo cair e virou-se para Gina, sem fôlego.
— Ele estava esperando por ela? Por isso não veio com a gente até a carruagem? Eles têm alguma coisa?
— Não seja boba, Mione. É que a Luna se ofereceu para carregar o Pichitinho quando estávamos saindo da cabine. Você sabe, tivemos que trazer as bagagens de vocês dois além da nossa. Como Harry já estava cheio de coisas para carregar, a Luna se ofereceu para pegar a gaiola.
— Ah, se ofereceu, é? Não é a primeira vez que ela demonstra interesse por ele.
— Você acha?
— O que foi aquele comentário? “Eu não teria me importado, não gosto de dançar!”
Hermione sentiu o rosto corado de raiva. Gina riu dela.
— Bem, a coitada não tem chances, não é? — disse a garota. — Afinal, o coração dele já tem dona.
— Eu não tenho tanta certeza assim.
— Talvez você devesse se apressar, então, se tem medo disso. Como eu já disse, o momento é esse. Vocês gostam um do outro; o que estão esperando?
Harry, Rony e Luna vinham se aproximando da cabine, então Hermione não respondeu. Pigarreou, ajeitou-se no assento e segurou Bichento com mais força no colo. Rony subiu na carruagem e sentou-se ao lado dela, seguido um pouco mais tarde por Luna e Harry.
As carruagens puseram-se em movimento e Gina comentou:
— Vocês viram a Grubbly-Plank? Hagrid não pode ter saído, pode?
— Eu ficaria feliz se ele saísse, — disse Luna, tão inconveniente e irritante quanto podia parecer — ele não é um professor muito bom, é?
— Claro que é! — saltaram Gina, Rony e Harry instantaneamente.
Harry encarou Hermione raivosamente, provavelmente porque ela não se manifestara.
— Sim, claro — ela apressou-se em dizer. — Ele é ótimo.
— Bem, nós da Corvinal o achamos uma piada — retrucou Luna com displicência.
— Então o senso de humor de vocês é péssimo — Rony disse com rudeza, mas aparentemente sem afetar a garota.
Hermione observou que ela continuava lançando ao garoto aquele seu olhar sonhador e interessado, detestavelmente interessado. Virou-se para a janela e não voltou a olhar para Luna, temendo não resistir a algum impulso de atirá-la para fora da carruagem.
A viagem pareceu mais longa que o normal, e foi um alívio enorme quando as carruagens ultrapassaram os portões e pousaram em frente ao castelo. Apressados, os alunos desembarcaram e começaram a subir correndo as escadas da entrada. Hermione desceu junto com Gina, e Bichento saltou de seu colo quando adentraram o saguão de entrada, provavelmente em direção à torre da Grifinória.
O percurso de Hermione, Gina, Rony, Harry e Luna até o salão principal era interrompido a todo o instante por pessoas que se abraçavam em reencontro, comentando sobre as férias de verão, para onde tinham viajado ou o que tinham feito. Avançavam com dificuldade entre as pessoas, Hermione lançando olhares a Luna para verificar se ela olhava para Rony ou tentava aproximar-se dele. Luna não dirigia o olhar a Rony, aliás, Hermione não conseguia distinguir a que ela dirigia seu olhar, agora tão sonhador e perdido que parecia a primeira vez que a garota entrava no castelo.
— Estou dizendo, — Gina cochichou-lhe no ouvido. — ela é avoada. Sabe como as pessoas a chamam pelas costas? Di-Lua. Não se preocupe com ela.
Hermione voltou a olhar para Luna, e não pôde deixar de sentir alguma compaixão pela garota, que tinha os olhos brilhando de encanto enquanto enroscava no dedo o colar de rolhas de garrafa. Mesmo assim, ficou mais feliz quando ela separou-se deles para sentar à mesa da Corvinal.

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.