Phobos



Tiago observou os grossos pingos de chuva se chocarem contra a janela de seu quarto. Tinha acabado de chegar em casa do trabalho e se jogara na cama.

Um mês... Um mês que Lílian saíra de casa, um mês que ela o evitava, um mês que ela... O rapaz respirou fundo. Não queria pensar nisso agora, não queria pensar nisso nunca, na verdade. Preferia apagar da sua vida a existência da ruiva. Só que isso era impossivel.

Não podia esquecê-la pelo simples fato de que ainda a amava. Por diversas vezes estivera a um passo de voltar para o chalé e voltar a encará-la. Por mais que tudo o que ela dissera o tivesse magoado, ainda gostava dela. Desesperadamente. A idéia de a ruiva o traíra jamais entraria em sua cabeça. Ele sentia que tudo era uma mentira, mas isso não tinha a menor importância diante dos fatos. O que importava ele sentir alguma coisa pela ruiva se...

A chuva aumentou. Pelo visto aquele início de primavera seria bem chuvoso. Não que isso importasse. O mundo poderia explodir naquele exato instante que ele não se importaria. Não mais. O que uma garota não é capaz de fazer... Da mesma maneira que elas podem levá-lo ao Paraíso, é nas mãos delas que seu destino se transforma num inferno.

Tiago levantou a cabeça apenas o suficiente para se ver no grande espelho que dera a Lílian em um de seus aniversários de namoro.

- Cara, cê tá horrível... - o espelho disse numa voz sonolenta.

- Não enche... - Tiago respondeu.

Mas o espelho tinha toda a razão. Grandes olheiras estavam sob seus olhos, e não havia brilho algum por trás dos óculos. Sirius estava preocupado com ele, e creditava o estado do amigo à saudade de Lílian. Tiago não contara nada a ele e pretendia continuar assim, pelo menos por um tempo. Preferia deixar que todos acreditassem no que Dumbledore dissera. Lílian estava numa missão para a Ordem e não podia se comunicar com ninguém.

De algum ponto do nada, voou uma pena vermelha. Ela se equilibrou na ponta do nariz dele. Tiago retirou a pena, juntamente com os óculos. Aquilo era um sinal de Dumbledore. Estava havendo uma reunião da Ordem.



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Pedro observou curioso os participantes da mesa. Aquela era a primeira reunião da Ordem da qual participava, por indicação de Tiago. Voldemort ficara muito feliz quando soubera daquilo. O único problema é que até agora Dumbledore estava falando coisas que o comensal já sabia. Então, por hora, só o que podia fazer era observar seus novos companheiros.

Alastor Moody parecia inquieto ao lado de Carátaco Dearborn, que conversava com Edgar Bones. Dédalo Diggle, um colega da época de Hogwarts, não parecia tão excitável como quando o conhecera. Estúrgio Podmore com seu ridículo chapéu, Elifas Doge, Rúbeo Hagrid, Susan Timms, Emelina Vance, Os Prewett, os Longbottom... Todos membros da Ordem.

O rapaz sorriu ao perceber que Gideão olhava pensativo para o assento vazio ao lado de Tiago. O lugar de Lílian, provavelmente. Dumbledore dera alguma estúpida desculpa sobre a ausência da ruiva, mas ele sabia exatamente porque ela não estava ali. Entre Sirius e Remo, Tiago parecia muito distante de tudo. Pedro se perguntava se ele sabia o que acontecera com a namorada ou também acreditava na mentira do velho diretor.

Finalmente ele prendeu sua atenção nas duas últimas ocupantes da mesa: Marlene McKinnon e Dorcas Meadowes. Sobre a primeira ele não sabia muita coisa além de que ela era uma inominável. Quanto à segunda, Voldemort adoraria saber onde fora parar.

A reunião acabou e Pedro viu todos saírem, exceto por Sirius e Dumbledore. Gostaria de saber sobre o que eles conversariam. Mas Remo e Tiago estavam esperando por ele. Pensando no encontro que teria mais tarde com seu Lorde, ele apressou-se a seguir os amigos.

- Ei, Potter!

Tiago estancou ao ouvir a voz de Gideão. Não havia ninguém no corredor, todos já tinham deixado o castelo. Remo fechou os olhos, já adivinhando o que viria a seguir.

- O que quer, Prewett? - o rapaz perguntou, estranhamente calmo, ajetando os óculos que teimavam em escorregar pelo nariz.

- A Lily conversou com você?

Foi extremamente rápido. Num segundo Gideão estava parado diante de Tiago e no segundo seguinte ele estava no chão, a boca sangrando. Pedro observou com interesse o amigo, que ainda mantinha o punho fechado, como se quisesse mais briga. Remo puxou o amigo enquanto Gideão se levantava, sem entender o que estava acontecendo.

Tiago estava se sentindo bem mais leve, embora a vontade de acabar com Gideão o dominasse. Não bastava lhe roubar a namorada, ainda vinha tripudiar... Gideão não conseguiu entender o que Remo falava, era muito baixo e rápido, mas graças a isso Tiago saiu bufando pelo corredor, logo desaparecendo ao lado dos dois amigos.

Sirius saiu da sala de Dumbledore nesse momento, encontrando o outro auror ainda em pé, pensativo, enquanto segurava o maxilar.

- O que aconteceu? - Sirius perguntou.

- Seu amigo deve ter enlouquecido ou coisa do tipo.

- Tiago? Ele deve estar se mordendo de ciúmes. Afinal, a Lílian está no seu chalé, pesquisando para a Ordem.

- Como sabe disso?

- Dumbledore acaba de me contar. Ele pediu para que eu levasse algumas coisa pra ela amanhã, já que você vai estar numa ronda. Só não entendi porque ele não pediu isso para o Tiago. Talvez o velho ache que ela vá se "distrair" do trabalho...

- Ele não disse nada sobre o porquê dela estar lá.

Sirius olhou o rapaz, curioso.

- Ela se afastou para continuar suas pesquisas, não?

- Acho que estou começando a entender porque o Potter me socou. Bem, não serei eu a contradizê-la. Mas, me faça um favor, Black, converse com a sua amiga.

- Do que está falando?

- Você vai saber quando encontrá-la. Até logo, Black.

Gideão também desapareceu no corredor, deixando Sirius sozinho e extremamente pensativo.



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"- Jamais obtereis paz - disse o Ancião dos dias - Todo aquele que tiver nos traído nunca descansará. Teria sido melhor para vós que jamais houvesses nascido.

- Estás nos condenando a uma guerra sem tréguas - respondeu o primeiro dos anjos - Pois não aceitaremos teu julgamento. Onde está escrito que tu és nosso soberano?

- Ouça o que digo, Nefilim: pela eternidade tu tentarás se retirar do Abismo, mas nós resistiremos. Até o dia do Ragnarock, quando pela loucura de mortais voltaremos a nos unir para, de uma vez por todas, resolver nossa insolúvel questão."

Lílian fechou o livro, irritada. Primeiro o Olimpo, agora uma mistura do Apocalipse com mitos nórdicos. O que viria a seguir? Só faltava mesmo aparecer o saci naqueles livros sem pé nem cabeça...

- Nefilim, no mitos hebraicos são os anjos caídos. Então esse Ancião dos dias deve ser... Deus. Ragnarock é coo os povos nórdicos "apelidavam" o fim do mundo. Agora, alguém pode me dizer o que tudo isso tem a ver com a Antiga Magia. E, mais importante, como esse monte de baboseiras pode me ajudar?!

Ela respirou profundamente. Até agora não descobrira nada que pudesse reverter a maldição. Absolutamente nenhuma pista. Ao final, não encher Tiago de esperanças fora a melhor alternativa.

- Tiago... Por mais que eu tente, sempre acabo voltando a você...

Ela escondeu o rosto nas mãos. Nunca imaginara que ele lhe faria tanta falta. Porque tinha que amá-lo tanto? Mas agora não havia mais o que fazer. Ela não iria atrás dele por motivos óbvios e, para sua sorte, Tiago jamais passaria por cima de seu orgulho. Talvez até já tivesse arranjado outra, voltado a agir como o idiota que ela "odiara" na escola.

Digamos que, por alguma hipótese muito absurda, ela conseguisse reverter a Thanatus. Poderia voltar a conviver com seus amigos e parentes (se Petúnia tivesse a caridade de não enxotá-la...) mas, e Tiago?

- Raios, porque eu sempre tenho que voltar a essa questão?!

- Lily, porque você gosta tanto de falar sozinha?

A ruiva levantou de chofre, encontrando Sirius parado na porta, cheio de sacolas.

- Sirius, como... O que está fazendo aqui?

- Dumbledore pediu que viesse. Ele queria saber se você está bem e mandar mantimentos.

Lílian observou o moreno começar a tirar o conteúdo das sacolas, colocando-a sobre a pequena mesa.

- Antes que eu me esqueça, Dumbledore mandou dizer que não traiu sua promessa. - Sirius fez uma careta - Você pediu para não contar, mas não falou nada sobre trazê-lo aqui. Eu não sei o que significa essa mensagem, mas ele disse que faria sentido pra você.

- Dumbledore está começando a ficar caduco. - ela respondeu, voltando a ficar irritada e vigiando cada movimento do amigo para que ele não chegasse perto demais.

Sirius sorriu e finalmente acabou de fazer seu trabalho. Ele observou a pilha de livros que havia junto ao sofá.

- E então, como tem ido com sua missão? Já descobriu alguma coisa sobre a Antiga Magia que possa nos ajudar?

- Quanto você está sabendo, Sirius?

Ele sorriu. Era hora de "jogar verde para colher maduro", como a própria Lílian dissera certa vez.

- Tudo. Gideão me contou depois de levar um soco de Tiago. Mas eu gostaria de ouvir a história de você.

- Tiago estava lá quando ele te contou? - a ruiva empalidecera.

- Não. Mas, e então Lily, eu estou esperando.

- Sente-se, Sirius. Essa história é bem longa e começa muito antes da "visita" de Voldemort no dia do ataque a vocês.

Sirius sentou-se, tentando não demonstrar surpresa. Voldemort estivera no ataque. Ele devia ter aparecido depois dele e de Tiago terem desmaiado. O que ele poderia ter feito com Lílian?



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Miranda sentiu pela terceira vez o baque de seu corpo no chão. Sirius não tinha vindo para a aula, pois estava em alguma missão, então, ela estava sozinha com Tiago, que nesse momento se sentara sobre a barriga dela, imobilizando seus braços.

- Está inspirado hoje, Potter. O que houve?

- Eu sempre estou inspirado. - ele respondeu com um sorriso, inclinando-se sobre a mulher.

Tiago fechou os olhos, e a imagem de Lílian apareceu bem clara em sua mente. Estava traindo ela. Que se danasse, ela não o traíra primeiro? Tudo o que queria agora era afastar aquela imagem de si, e, com alguma sorte, conseguiria voltar a ser o mesmo Tiago Potter da época do colégio, que disputava palmo a palmo o título de maior conquistador de Hogwarts com Sirius.

Quando já estavam muito próximos, Miranda conseguiu soltar as mãos e, com um impulso no corpo, deu uma cambalhota, invertendo as posições.

- Pensei que tivesse uma namorada, Potter.

Ele estreitou os olhos. Miranda tinha deixado seus braços livres. Teria sido um esquecimento ou ela o estava provocando?

- Eu TINHA uma namorada.

Antes que ela pudesse reagir, ele a envolveu pela cintura, conseguindo roubar um beijo de Miranda. Ela, de início, não reagiu, mas logo estava correspondendo. Tiago sorriu. Ele era realmente irresistível. Nenhuma mulher conseguiria resistir a ele. Exceto por Lílian...

Um barulho alto veio da porta fechada e Tiago imediatamente se levantou, deixando a moça sem fôlego sentada no chão. Um resmungo alto veio das escadas fora da sala. Provavelmente alguém deixara alguma coisa rolar escada abaixo. O moreno olhou para o relógio. Eram seis horas da noite. A aula havia acabado há meia hora.

- Você mora aqui perto da academia, não? - Tiago perguntou, sem olhar pra ela.

- Como sabe?

- Eu já vi você entrando num prédio do fim da rua. Você pode deixar seu filho com a vizinha?

Miranda o observou por alguns instantes, curiosa. O que acontecera com o rapaz? O mais afobado sempre fora Sirius, mas nem ele nunca tentara uma abordagem como aquela, tão... desesperada. O que teria acontecido entre Tiago e a namorada? Sim, porque ela tinha certeza que tudo aquilo tinha a ver com a namorada do rapaz. Ela respirou fundo.

- Posso, mas...

Tiago sorriu, caminhando para a porta.

- Esteja pronta às oito.

Miranda ficou sozinha no salão. Mas que cara-de-pau! Ele nem esperara ela responder! Enquanto isso, Tiago deixava a academia na moto de Sirius, que pedira ao amigo para guardá-la enquanto fazia um favor a Dumbledore... Pouco depois estava em casa.

Tiago abriu a gaveta de sua cômoda, tirando dela uma pequena caixinha de veludo e se jogando na cama, como sempre fazia. Aquela caixa estava ali há... pouco mais de quatro anos. Comprara para dar de presente a Lílian no primeiro natal depois deles terem começado a namorar.

Com um estalo a caixa se abriu, revelando um belo anel. Uma aliança. Tentava dar aquele presente a Lílian todo natal, mas ela sempre acabava por recusar dizendo que não era hora. Bem, agora ele não precisava mais se preocupar em dar o anel a ela. Nunca mais. Ele sentou-se subitamente na cama, arremessando a caixa aberta com toda a força contra a parede. O anel rolou pelo chão e Tiago voltou a se jogar na cama.

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