Début



Finalmente chegou o fim daquele período e nossas famílias voltaram a se reunir no costumeiro festejo, mas, ironicamente, eu não pude ouvir nenhum discurso sobre mim ou sobre Lucius. Ele estava crescido. Seus cabelos, à semelhança de longos fios de ouro branco, lhe caíam leves sobre a espádua. O rosto tornara-se mais anguloso, conferindo-lhe um aspecto mais másculo, acompanhado por todo o corpo que parecia emanar poder. Eu, na minha pré-adolescência, ainda mantinha o rosto pueril, mas certamente perdera a graciosidade do porte de uma criança para um corpo esguio e sem curvas. Senti-me frustrada. Ele agora era a figura do príncipe dos meus sonhos, mas não voltou o olhar à mim nem mesmo para se mostrar superior. Sim, ele estava entretido com minha irmã do meio. Bellatrix, que debutara havia poucos meses, desabrochava em sua melhor forma. Seus longos cabelos negros estavam parcamente presos, caindo num movimento selvagem sobre a nevada planície de suas costas que o vestido deixava ver. A cintura fina contrastava com quadris provocantes e seios já bem desenvolvidos. Ela adquirira um ar vivo e um andar sensual que atraía meu jovem noivo. Ela, porém, também já era prometida a alguém. Rodolfo Lestrange era o nome de seu noivo que então já contava quatro lustros e, mal podia conter a onda de ciúmes que o assaltava em decorrência do desejo que Lucius, por ser ainda inexperiente, não conseguia disfarçar.
Teria caído em depressão se não fosse o conforto que minha irmã mais velha me deu durante aquelas férias. Andrômeda era estranha. Não apreciava os costumes da nossa sociedade e estava sempre pronta a desafiá-los, desagradando a nossos pais e dando desgostos à família. Nunca entendi porque agia assim, mas também não me importava muito, afinal, ela sempre fora obsequiosa e cheia de carinhos para comigo. Quando soube o que me atormentava, riu-se, mas percebendo minha situação, consolou-me dizendo, paciente, que eu ainda viria a ganhar proporções como as de Bellatrix. Disse-me também que ficava feliz em ver que eu me interessava por Lúcio, pois ela mesma não pudera suportar o que lhe fora destinado e, para a vergonha da família, o compromisso acabara sendo cancelado. Alguns meses depois eu vim a saber que minha irmã fugira e unira-se a um trouxa, tendo sido, obviamente, banida do clã. Não posso dizer que não senti por ela, mas sabia que não era nenhuma vítima, agira voluntariamente, embora possa parecer inverossímil que ela tenha abandonado a família Black por tal motivo. Nunca vou entendê-la.
Durante o segundo ano de escola, fiz muitas amizades em Hogwarts. Garotas de famílias tradicionalíssimas estudavam lá e meu círculo de amizades só englobava as melhores. Mais que apenas relevantes em aspecto político, alguns dos contatos que fiz na escola eram também extremamente interessantes: admirava a beleza de minhas colegas, sempre achei a figura feminina imensamente bela, no aspecto artístico. Um novo aspecto começou a surgir em minha mente durante o terceiro ano... Convivia com elas rotineiramente, nada mais que bonecas bonitas, até o dia em que, por mero acaso, prestei a devida atenção à uma delas, que tirava as vestes para colocar o traje de dormir. A delicada cútis rosada não tinha mais aquelas formas amenas e regulares, apresentava agora estranhas reentrâncias e curvas que, pude notar, me despertavam ainda mais estranhas sensações. Um leve formigamento se apossou de meu corpo... Sim, eu já havia sentido isso anteriormente, algumas raras vezes, mas não sabia o porque. De fato, só ligaria o efeito à causa alguns dias depois. Junto do formigamento veio uma vontade, que era mais uma enorme curiosidade de tocar a pele de minha colega, descobrir todos os seus mínimos detalhes, tocar aquele corpo que eu achava que conhecia. Instintivamente, passei as mãos sobre minha própria pele: era a de sempre... Fiquei boa parte daquela noite me contorcendo debaixo das cobertas, os olhos pesados de sono, o corpo agitado pelo estranho formigamento e a razão perdida num turbilhão de dúvidas que eu não lembraria um segundo após vê-las passando aos meus olhos.
As luas que se seguiram acompanharam-me curiosa e um tanto entristecida. Todos os dias observava as colegas e os espelhos numa incansável cruzada para encontrar minha própria beleza. Nada em mim me parecia bom o suficiente. Sabia que estava crescendo, mas via que cada vez mais me distanciava do ideal que eu enxergava em Bellatrix. E foi nestes tempos lacrimosos que, estando na biblioteca da escola distraidamente a escrever um trabalho qualquer, fui interrompida subitamente. A colega que deveria estar me ajudando na tarefa tinha um estranho brilho nos olhos, a face corada, a mão suada e com a voz entrecortada falou-me aos sussurros sobre coisas que me produziram o mesmo efeito. Foram breves minutos quase que surreais onde trocamos muitas dúvidas e poucas respostas sobre algo que nos afigurava proibido.
Tal conversa selou um decreto implícito que nos tornava confidentes. Era algo novo para mim, de certa forma. Sempre estive rodeada de muitas amigas, mas jamais imaginara abrir-me como me abria agora com Nimue - e este era o nome daquela que agora eu considerava amiga. Senti-me então mais confiante, abandonando minhas perturbantes comparações. Nossas conversas ganhavam tons mais secretos a cada dia, nos tornamos mais íntimas e vimos o dia em que nossa curiosidade culminou em algo que talvez nos tornasse mais que amigas. Mais do que compartilharmos segredinhos sobre nosso primeiro beijo, nós o compartilhamos.
Era quase Natal e nós conversávamos a sós numa hora tardia próximas à lareira da sala comunal. A conversa se estendera bastante e eu sentia o sono tornar pesadas minhas pálpebras ao mesmo tempo em que uma lassidão invadia meu corpo e uma espécie de hipersensibilidade tomava minha pele. O assunto girava em torno de garotos, da relação de conhecidas nossas com esses seres desconhecidos para nós e conjecturávamos como seria tudo aquilo. Entre risadinhas que tentavam vencer a timidez uma de nós - não posso dizer ao certo qual, talvez ambas - sugeriu que experimentássemos. Não sem algum constrangimento tocamo-nos os rostos uma da outra com as delicadas mãos trêmulas e com alguma dificuldade unimos nossos lábios. Passado o primeiro instante nossas línguas se tocaram numa desajeitada e quente dança que aparentou durar uma pequena eternidade. Olhamo-nos um tanto encabuladas e trocamos breves e truncados comentários sobre a experiência antes de irmos para nossas camas ostentando tímidos mas inevitáveis sorrisos.

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