A Aberração da Sonserina



Slytherin Pride

Capítulo 1.2 – A Aberração da Sonserina

Todos os primeiranistas seguem o enorme homem por um caminho muito escuro. Agora, a noturna brisa gelada fazia com que eles estremecessem e as árvores em volta farfalhassem. Esse era o único som que se ouvia, todos estavam bastante ansiosos.
Russell não é exceção. Segurando Pink no colo, ela olha para tudo à sua volta, admirada. Já estivera em florestas antes, mas nunca à noite. E a sensação era ótima.
Ao seu lado, ela repara num garoto que também segurava um gato branco com grandes manchas negras. À luz fraca da lâmpada do enorme homem, um pouco à frente, ela pôde ver que o garoto tentava manter o gato quieto enquanto caminhava, sem sucesso.
_ Pára com isso Fedido! A gente já tá chegando! – o garoto sussurra irritado para o gato, que se esquivava e arranhava-o, tentando livrar-se do dono.
_ Se você fosse um bom dono, ele não iria querer fugir de você... – Vick constata com altivez, erguendo uma sombrancelha.
_ Que?! Olha aqui garota eu cuido muito bem dele, ele está só... ansioso pra chegar na escola e jantar... – diz o garoto, asperamente, entre uma e outra investida do gato para longe de seus braços. – Não é, Fedido?
O bichano responde com um miado e mais um arranhão no braço do dono. O garoto abafa um grito de dor com a mão, e rapidamente alisa os cabelos escuros e espetados, desalinhando-os ainda mais. Solta um sorrisinho enquanto repara em Vicktoria por trás dos óculos redondos. Mas a garota franze a testa e ri:
_ Fedido... Agora eu compreendo que o gato queira ficar mesmo bem longe de você...
_ Hey, quem é você pra dizer que eu não sou um bom dono? – o garoto volta a se aborrecer, enforcando o gato com uma mão e apontando o dedo para Pink com a outra. – Repara um pouco nesse pano velho que você está segurando... Você andou botando fogo nos pêlos dele?
Alguém atrás deles solta uma risada alta. Eles olham para trás e Vicktoria reconhece o primo das irmãs Black, Sirius.
_ Essa foi boa, cara... – Sirius aperta a mão do garoto de óculos, que com isso abre um sorriso largo. – Sirius Black, e você?
_ Tiago Potter. – diz enquanto enforca o gato novamente.
_ Eu não pude deixar de ouvir vocês... – diz Sirius, reconhecendo a garota da cabine de sua prima. – E fiquei curioso pra saber o nome do seu “gatinho”. – sussurra ironicamente, adiantando-se para Vick poder ouvi-lo. – Com certeza, “Peludo” não deve ser... – e faz uma careta de dúvida, enquanto Potter ri.
_ Você nunca aprendeu que é feio ouvir a conversa alheia, Black? – Vick silva maliciosamente, olhando para algo que se abria cintilantemente à frente deles. – Posso pedir para sua priminha Bellatrix ensina-lo, se quiser...
Sirius Black não tem tempo de responder. O enorme homem-guia vira-se de supetão e um garoto ao lado deles bate o nariz em seu imenso joelho.
_ Agora, subam nos botes com cuidado. – ele diz, e uma enxurrada corre em direção ao lago. – Apenas quatro em cada bote!
Vicktoria caminha sem pressa e sobe num bote em que só sobrara um lugar. Ajeita Pink, que ronrona sonolento, em seu colo, e poucos minutos depois todos os botes partem juntos, deslizando pelo lago escuro e brilhante.
A garota olha para a água e vê seu reflexo branco sob a luz da lua. Pensa no quanto aprendera até ali, e no quanto ainda havia para aprender. Sabia que aquela noite estaria para sempre em sua memória, a noite em que conheceria Hogwarts, sua segunda casa pelos próximos sete anos.
Ouve-se um grito, seguido por uma agitação na água. Todos olham na direção de um dos últimos botes. Vicktoria contou apenas três alunos nele. Uma garota no bote de Vicktoria avisa desesperadamente o guia de que alguém havia caído no lago.
_ PARE! – ele ordena, e todos os botes estacam. Rapidamente, ou o quanto o peso do próprio bote lhe permite, o guarda-caça rema na direção do aluno que se debate na água, e vários pescoços atrás dele se espicham para ter uma visão melhor.


_ Aqui, me dá sua mão garoto. – diz o guarda-caça, enquanto agarra o aluno pelo colarinho e o devolve ao bote, onde dois garotos gargalhavam.
_ Se a lula-gigante tivesse atacado ele, queria ver se vocês iam achar alguma graça... – brada o guarda-caça aos garotos.
_ Ela está dormindo à essa hora, Hagrid... – Potter diz ironicamente, e Sirius Black pára de rir, ao seu lado.
_ Tem uma lula-gigante nesse lago? – pergunta Malfoy, sério, enquanto Snape tossia encharcado à sua esquerda.
_ Eu já disse que tem. – ele diz rispidamente. – Então é bom vocês... se comportarem! Fique com isso, garoto. – e jogou seu pesado casaco encima de Snape, que tossiu e fungou ainda mais.
Ninguém falou ou riu até que o guarda-caça retomasse seu lugar à frente dos botes e eles continuassem a navegar.


Encarrapitado no alto de uma montanha rochosa, surge o castelo, minutos depois. Ouve-se um suave “oohh!” de excitação por parte dos alunos, e à medida que eles chegam mais perto, os olhos de vários deles brilham enquanto percorrem as janelas acesas e as várias torres e torrinhas.
Depois de entrarem por uma abertura na montanha, os botes estacam num pequeno cais. Hagrid, o guarda-caça, ajuda os alunos a descer e guia-os por um corredor escuro. No fim dele, há uma porta de carvalho, que logo em seguida é aberta por uma mulher.
_ Teve problemas, Hagrid? Porque se atrasou? – ela diz, num tom preocupado, enquanto os alunos adentram o castelo iluminado.
_ Er... Um aluno caiu no lago, Profa. McGonagall. – disse Hagrid. – Mas ele está bem. – acrescentou rapidamente, vendo a expressão de pânico da professora.
McGonagall olhou para o monte de panos que era Snape espirrando sofregamente, e mordeu os lábios finos.
_ Depois eu quero saber como isso aconteceu. – diz a professora num tom ainda mais severo. – Agora vamos, a seleção precisa começar.
Os alunos seguiram McGonagall aos tropeços pelos corredores do castelo. Com os cabelos e a roupa pingando e lutando para não ter um acesso de tosse, Snape quase caiu sob o peso do casaco de Hagrid e, com raiva, deixou-o no corredor.
_ Bem-vindos, primeiranistas. – diz McGonagall, quando eles param em frente a uma grande porta de madeira, de onde se ouvia o barulho de centenas de vozes. – Enquanto estiverem em Hogwarts, cada um de vocês pertencerá à uma das quatro casas: Lufa-lufa, Corvinal, Grifinória ou Sonserina. – ela passa os olhos severamente pelos alunos. – Sua casa perderá ou ganhará pontos se vocês merecerem, portanto, sua casa terá que ser motivo de orgulho para vocês e vocês, motivo de orgulho para ela. Agora, em fila, por favor, vamos entrar.
Sentindo as centenas de olhares sobre eles, os novatos entram num enorme salão iluminado por velas que flutuavam acima deles. “Este sim seria um lugar perfeito para uma festa de Halloween” – pensa Vicktoria, olhando para o teto enfeitiçado, que era muito mais bonito visto de perto que pela ilustração que vira no livro. Voltando seu olhar para frente, ela viu um banquinho de três pernas, e encima dele já estava à postos o Chapéu Seletor.
McGonagall apanhou um pergaminho comprido e chamou o primeiro aluno da lista:
_ Abbott, David.
O garoto apavorado que Vicktoria viu no trem adianta-se, tremendo, e senta-se no banquinho de três pernas. A professora coloca o chapéu sujo e amassado no garoto, e sob os olhares curiosos no salão, uma rachadura no chapéu grita:
_ Lufa-Lufa!
Uma salva de palmas vem da mesa da lufa-lufa, e Abbott corre para ela, sorrindo de nervoso. Pouco depois, as palmas cessam. É a vez de Frida Allyein, a garota loira que estava junto de Abbott, ser colocada na Grifinória.
Vicktoria olha para trás, enquanto a mesa da grifinória aplaude Allyein, e de relance encontra o olhar malicioso e a boca cheia de dentes do garoto moreno que a importunara na estação. Ele a vê e acena para ela animadamente, apontando-a para que alguns colegas próximos pudessem vê-la. “Se eu cair na grifinória, não duro uma noite na escola... vou ser expulsa e acusada de assassinato.” – ela pensa, irritada, voltando a olhar para frente, desta vez para a mesa dos professores, logo atrás do banquinho de três pernas.
Um homem de vestes púrpura brilhantes, com barba e cabelos muito compridos e brancos, acompanha a seleção, observando tudo séria e serenamente por trás dos óculos de meia-lua. À sua esquerda, está um imensamente gordo homem careca, que sorri intensamente e acena para alguns alunos, entre novatos e veteranos.
Uma dor intensa no pé esquerdo faz Vick voltar sua atenção para a seleção. A profa. McGonnagall tinha acabado de chamar Sirius Black, e ele, aos tropeços, caminha em direção ao banquinho de onde sua prima, Narcisa Black, tinha acabado de sair, sorrindo, sob uma chuva de aplausos da mesa da Sonserina.
Vicktoria segura-se para não soltar um palavrão para o garoto por ter propositalmente pisado em seu pé. Em lugar disso, fuzila-o com o olhar, enquanto metade do rosto dele é encoberto pelo chapéu seletor.
_ Dois Blacks esse ano... – uma menina cochicha pateticamente para outra, logo atrás de Vick. – E os dois pra sonserina, eu aposto...
_ Grifinória! – grita o chapéu, em seguida, um boquiaberto Sirius Black anda até a mesa da grifinória. “Por que eu tenho o palpite de que as irmãs Black não vão gostar nada disso?” – pensa Vick, sob alguns cochichos, abafados pelos aplausos dos grifinórios. Mas logo afasta esses pensamentos, esse não era seu problema.
O próximo a ser chamado é um garoto de nome Andrew Drymore. Vicktoria lembra de tê-lo visto com a mãe na estação. Ele parece nervoso, mas logo o chapéu grita Sonserina! E ele, aliviado, junta-se aos novos colegas.
Alguns grifinórios, corvinais, lufa-lufas e sonserinos mais tarde, e Lúcio Malfoy é chamado. O chapéu não precisou tocar em todos os fios de seu cabelo claro para manda-lo para a Sonserina, e o garoto, sorrindo, junta-se às irmãs Black, que o aplaudem com fervor.
Vicktoria começa a ficar um pouco ansiosa, faltam cerca de dez alunos agora. Olha para Snape, ainda todo encharcado, que acabara de adiantar-se ao seu lado. Ela não ousa falar, talvez porque ele nem sequer olha para ela. Parece concentrado, olhando para frente, para o chapéu seletor que agora manda Tiago Potter para a grifinória. A menina pega-se imaginando como Snape teria caído no lago, e uma hipótese surpreendente, porém aceitável naquele instante para ela, era a de que o mais novo grifinório tinha culpa no cartório, considerando a maneira com que Snape parecia fuzila-lo com o olhar, por baixo dos cabelos negros, úmidos e despenteados.
Snape tosse de repente jogando água para os lados e Vick disfarça olhando para a profa. McGonnagall. Mais uma vez, aquilo não era seu problema.
A garota que havia cochichado sobre Black é selecionada para a grifinória, e depois disso, os alunos cujos sobrenomes iniciavam-se com a letra R começam a ser chamados. Vick agora olha fixamente para a professora, esperando seu nome ser dito, à qualquer hora, agora.
_ Russell, Vicktoria.
Vick caminha decididamente até o banquinho. Não havia medo nem insegurança em seu olhar. “Mesmo se eu cair na grifinória, na pior das hipóteses, ainda há a chance de fazer parecer um acidente...” – ela pensa, com um sorriso malvado, quando a professora coloca o chapéu em sua cabeça, e ele desce até seu nariz, tapando sua visão.
A menina percebe ter ficado surda de repente. Mas espera, calmamente, que o chapéu grite em que casa estaria. Porém, sua voz sai baixa, quase um murmúrio:
_ Hm... é curioso... – ela ouve o chapéu pensando. – Curioso... porém, desafiador...... SONSERINA!
Vick sente novamente o ar entrando em seus ouvidos e o som de aplausos quando McGonnagall retira o chapéu seletor de sua cabeça. A menina se levanta, as palavras totalmente insanas do chapéu ainda em sua cabeça, e então caminha para a mesa de sua nova casa. Nesse instante mira os sonserinos que já conhecia, e pensa em sentar-se com eles, afinal, não eram ruins sem aquela coruja maluca por perto.
_ Inaceitável! – Bellatrix levanta-se e diz, num tom alto, claro e muito irritado, olhando para todos na mesa e lançando um olhar de puro ódio e desdém para a menina. Vários sonserinos à volta dela imitam seu olhar à Vicktoria, e a garota, sem entender, para à frente de Bellatrix, erguendo as sombrancelhas.
_ Sente-se, Bella, pelo menos espere a seleção acabar... – diz Andrômeda numa voz nervosa, ao lado da irmã. Bellatrix pareceu pensar sobre o que estava fazendo, e obedeceu, mas agora quase toda a mesa Sonserina estava olhando a cena, e uma boa parte deles cochichavam entre si, olhando desdenhosamente para Russell.
_ Nem pense em sentar-se com a gente. – diz Narcisa, diretamente à Vicktoria, numa expressão de nojo, que Malfoy acompanhou, ao seu lado.
Vicktoria não pensa duas vezes. Torce o nariz para eles, e sem olhar para trás, dirige-se altiva e decididamente para o fim da mesa, na ponta do salão. E lá fica sentada, sozinha, à pelo menos um metro e meio de distancia dos outros sonserinos, ainda sob os olhares desdenhosos e curiosos de alguns deles. Fosse qual fosse o motivo daqueles olhares, ela imagina, eram bobos o suficiente para nenhum deles ser digno de sua companhia.


_ Hey, Snape. – Lúcio chama, indicando um lugar ao seu lado. O garoto tinha acabado de ser selecionado para a Sonserina também. Silenciosamente, ele toma seu lugar à mesa. Tinha parado de tossir, mas ainda tinha o cabelo e as roupas úmidas. Narcisa lança-lhe um olhar incomodado antes de reclamar:
_ Um Black na Grifinória e uma filha de trouxas na Sonserina, o que mais falta acontecer hoje?
Nesse momento, quase todo o salão explode em risadas. A última aluna da lista da professora McGonnagall havia caído de costas levando com ela o banquinho e o Chapéu Seletor, que voou até a mesa dos professores, parando aos pés do diretor.
_ Levante-se srta. Trelawney. – diz a professora, num tom reprovador, enquanto o diretor se levantava e dirigia-se à frente da mesa. Com um cabelo encaracolado e muito armado caindo sobre seus olhos, a garota fica tateando o chão em busca de seus óculos, e mais risadas ecoam no salão. McGonnagall encontra os óculos da garota e ajuda-a a se levantar, enquanto Dumbledore apanha calmamente o chapéu seletor e o devolve à professora.
_ Você está bem? – o diretor diz numa voz calma e acolhedora à menina que, corando furiosamente, ajeita os óculos e assente com a cabeça, meio chorosa. – Certo. Agora, a Lufa-Lufa te espera.
A garota anda apressada até a mesa da Lufa-Lufa e senta-se desajeitadamente. Olhando para os óculos de lentes grossas da menina, que aumentavam consideravelmente seus olhos que já eram enormes, Narcisa comenta, ironicamente:
_ Bom, agora não falta mais nada, podemos jantar em paz.



No dia seguinte, Vicktoria acorda cedo. Tão cedo, que prefere ficar na cama, ouvindo o som dos pássaros e refletindo sobre todos os acontecimentos da noite passada, enquanto as outras garotas dormem profundamente. Ela já começara a entender o motivo pelo qual aqueles sonserinos olhavam torto para ela, e embora isso no fundo a decepcionasse, a idéia de ter a maioria dos colegas contra ela não a incomodava, afinal, sempre fora impopular. “Ótimo, assim não perco tempo com conversas fúteis, uso-o aprendendo magia.” Ela pensa, enquanto Narcisa Black desperta na cama ao seu lado.
O dormitório da Sonserina era imperioso e acolhedor. As paredes de mármore verde eram deslumbrantes quando anoitecia e a luz da lua invadia o quarto, iluminando os lençóis e as cortinas de veludo.
Agora, sob a luz fraca da manhã, as paredes adquiriam um tom de verde claro incomum, enquanto o cheiro da grama molhada invadia os narizes das garotas que acordavam. Vick fecha os olhos, ouvindo os bocejos, cochichos e passos pelo quarto.
_ Bom dia Aliccia. – diz Narcisa, acenando da beirada de sua cama para uma menina de ondulados e longos cabelos castanhos na cama oposta.
_ Bom dia Cissy. – responde a garota. – Er... ouvi suas irmãs chamando-a assim ontem, posso...
_ Claro que pode. – diz Narcisa com um sorriso. – Eu vou chamar você de Ally, ok?
_ Ally, gostei. – sorriu a outra. – Bom, eu vou me trocar... Você me espera?
Narcisa assente e, enquanto Aliccia se dirige ao trocador, também apanha seu uniforme no malão. Lança um olhar incomodado à cama de Russell, que acabara de virar-se, sonolenta, para o outro lado. “Hoje mesmo vou escrever uma carta à mamãe sobre isso. Onde já se viu, uma Black dormir no mesmo quarto com uma sangue-ruim? E quem sabe, a Bella sendo monitora, não consegue que, pelo menos, mudem essa garota de dormitório?” Feliz com essa possibilidade, ela também vai se trocar.
Quando a porta do trocador acaba de se fechar, Vick abre os olhos e senta-se na cama. Veste seu uniforme ali mesmo enquanto uma outra garota, corpulenta e de rosto redondo, que Vick tinha visto na noite anterior conversando com Aliccia Lohane, vira-se na cama, roncando. Vicktoria abafa o riso para não acordar a garota, e ajeita os longos cabelos num rabo de cavalo. Em seguida, pinta os olhos de preto como de costume, e sai com a pesada mochila de livros nas costas.
A sala comunal estava quase vazia, apenas alguns alunos maiores que provavelmente esperavam seus amigos para subir até o salão principal. Um deles, moreno, alto e forte, seguiu-a com o olhar até que ela saísse da sala, então voltou a ler seu jornal.


O dormitório dos garotos do primeiro ano não era muito diferente do das garotas. As paredes de mármore reluziam com a luz do sol e o mesmo cheiro de grama molhada invadia o quarto e o nariz de Snape, que fora o primeiro a acordar e se vestir. Ele não escondia que estava ansioso para ter sua primeira aula. Estar naquela escola foi seu projeto de vida durante toda a sua infância até ali, e ele não poderia decepcionar sua mãe, e principalmente a si mesmo.
Malfoy então se levanta ao seu lado. Com os cabelos compridos despenteados, caminha até o trocador, com o uniforme na mão. Snape senta-se na cama e começa a arrumar seus livros, sempre fora bastante organizado com suas coisas, e todos os seus livros já estavam empilhados encima do malão ao pé da cama, mas não custava nada conferir tudo uma última vez.
_ Bom dia. – diz um garoto de cabelos curtos e castanhos ao seu lado. – Snape é o seu nome, não é?
_ E você é Andrew Drymore. – diz Snape, em sua voz grave e séria.
_ Como sabe? Eu não...
_ Está na cabeceira da sua cama. – ele diz olhando para o garoto e mordendo os lábios. Drymore olha para sua cama e solta um sorrisinho amarelo.
_ Hm... – Andrew morde os lábios olhando para Snape. – Você e Lúcio Malfoy são amigos? – ele pergunta, deixando escapar no olhar a intenção de fazer essa pergunta desde o princípio.
Era uma pergunta estranha, observa Snape. Por um momento pensou que o garoto ia perguntar algo sobre sua “queda” no lago na noite anterior, pois percebeu-o no jantar cochichando com o quarto ocupante do dormitório – lia-se em sua cama Evan Rosier –, ambos olhando em sua direção.
_ O conheci no trem. – diz simplesmente. – E vocês?
_ Ah, meu pai e o dele se conhecem à séculos... já nos visitamos algumas vezes.
Então Lucio sai do trocador já vestido e penteado, os cabelos compridos e loiros puxados para trás, com um sorriso no rosto.
_ Ansiosos para o primeiro dia? – ele diz, indo até sua cama e apanhando a mochila. Andrew sorri e responde:
_ Só pro primeiro, porque, daqui a algum tempo, eu tenho certeza que vou querer fugir voando desse castelo.
_ Trouxe sua vassoura? Olha, quando você for me avisa! – diz Malfoy, e ele e Andrew começam a fazer planos mirabolantes para uma fantástica fuga em massa no fim de Outubro enquanto se arrumam. Snape apenas os observa, em silêncio, esperando-os para que descessem juntos para o café.


O salão principal exibe um céu azul-turquesa com poucas nuvens. É uma imagem bonita de se ver, e os novatos, vez ou outra, se pegam olhando para o teto. Vicktoria, porém, lia seu horário, que acabara de ser entregue pelo professor imensamente gordo que se sentara à esquerda do diretor na noite passada.
A cena era curiosa, pois, como na noite passada, ninguém na Sonserina ousava sentar-se à menos de 2 metros da menina e decididamente todos eles olharam-na reprovadoramente pelo menos uma vez enquanto conversavam. Muito pouco preocupada com isso, porém, ela tentava decorar seus horários enquanto comia torradas. A comida, na sua opinião, era uma das melhores coisas que já descobrira em Hogwarts e compensava perfeitamente a falta de alguém para conversar.
Sua primeira aula, ela observou, era Transfigurações com Minerva McGonnagall. A professora de expressão séria e severa, que guiou os alunos do primeiro ano até o Salão Principal para a seleção, parecia ser o tipo de pessoa a qual não se deve provocar, e muito provavelmente, não suportaria atrasos. Mas a expectativa da garota com relação à essa aula era boa, pelo que já lera sobre o assunto, era uma matéria complexa. Além do que, sempre imaginou bruxas que transformavam pessoas em sapos ou em algo bem asqueroso, era a visão que trouxas tinham de bruxas, e ela estava divertindo-se com a ironia de um dia poder fazer isso.
“E eu tenho até uma idéia de quem pode servir como cobaia...” – ela pensou com um sorriso malvado, ao notar Aliccia Lohane e as Black entrando no salão. – “O difícil vai ser escolher quem vai ser a primeira”.


_ E sabe o que ele teve a ousadia de dizer, Andie? – sibilou uma Bellatrix irritada, sob os olhares das irmãs.
_ Não tenho idéia... – disse Andrômeda.
_ Que se eu não fosse com ele, eu não iria com mais ninguém! Hunf! Como se ele fosse a única pessoa que me convidaria...
Narcisa suspirou e disse:
_ Eu interpretaria essa frase de outra maneira...
_ Ele é um maldito convencido. – ela estava irredutível.
_ Isso ainda vai dar em casamento, Bella... – comentou Andrômeda, e as outras sorriram, menos Bellatrix, que fuzilou-as com o olhar.
_ Vamos mudar de assunto. – ela ordenou, enquanto o grupo sentava-se à mesa da sonserina. – O que mesmo você queria me pedir, Cissy?
Narcisa e Aliccia trocaram um olhar antes de se sentarem.
_ Quero escrever à mamãe, não estou contente com o dormitório onde me colocaram na sonserina... – respondeu Narcisa. – E você pode me ajudar, sendo monitora?
Bellatrix pareceu entender. Pegou com violência uma torrada e uma faca, que enterrou no pote de geléia.
_ Não acredito que colocaram você no mesmo aposento que aquela... sangue-ruim! – sibilou ela, furiosa.
_ E também não acredito que Aliccia e Evelyne estejam contentes... – reclamou Narcisa, ao que Aliccia mexeu com a cabeça em sinal de aprovação. – Portanto, é justo que, pelo menos, mudem ela de dormitório, já que, pelo que sei, a decisão daquele chapéu velho é irrevogável...
_ Infelizmente, ela é... – disse ela, com um olhar cruel à Sirius, que tinha acabado de entrar, acompanhado de um garoto de óculos, também grifinório.
Narcisa virou-se para olhar Sirius, enquanto Malfoy, Snape e Drymore sentavam-se à mesa, próximos às meninas.
_ Ah... ele já arranjou um amiguinho na grifinória... – disse com rispidez. - Mancha na família! O que tia Walburga vai fazer quando descobrir? Deserda-lo, talvez?
_ Seja o que for que ela fará, vamos descobrir logo, Cissy. – Bellatrix sorriu com malícia. – Mandei uma carta à nossa querida tia ontem mesmo.
_ Você fez o que? – disse Andrômeda, incrédula, ao que Narcisa sorriu satisfeita.
_ Ora, Andie, não comece! – ordenou Bella. – Foi você mesma quem disse que ele não poderia ter feito uma coisa dessas... disse, não foi?
_ É, eu disse... – suspirou ela, olhando tristemente para o primo.
_ Talvez agora você pare de defende-lo um pouco... – constatou Narcisa, embora tivesse dúvidas quanto à isso.
Sirius acenou para Andrômeda, da mesa da grifinória. A menina sorriu e acenou de volta, mas murchou quando sentiu o olhar fuzilador de Bellatrix sobre ela.
_ Vergonha da família, merece muito mais do que ser deserdado. – desdenhou Narcisa, imitando o olhar de Bellatrix à Andrômeda.
_ Do Sirius podemos cuidar depois, Cissy. – diz Bellatrix, com os punhos fechados sobre a mesa. – Quanto à Russell, receio não ter poder para tanto...
_ Se você fosse a chefe, quem sabe... – lamentou ela, e Bellatrix engoliu uma torrada para não se aborrecer ainda mais com esse outro assunto. - Mesmo assim, não creio que a vida dela em Hogwarts será das melhores... Olhe para ela, tão...
_ Esquisita? – Ally, ao lado dela, completou. – Concordo, aquela maquiagem é horrorosa...
_ Eu diria repugnante. – diz Drymore, um garoto alto de cabelos castanhos e olhos azuis, à frente das meninas, dando um rápido olhar à Russell, em seguida mirando Narcisa. – Pra mim, meninas tem que ser mais... delicadas...
_ As normais são, Drymore. – constatou Lúcio, com um charmoso sorriso. – Mas estamos falando justamente de uma anormalidade... uma aberração.
Todos olharam-no aprovando, com exceção de Snape, que parecia alheio a toda essa agitação do primeiro dia de aula. Enquanto seu chá esfriava, ele lia o mesmo livro sem título que tinha mostrado à Narcisa no trem. Não demorou muito, o correio-coruja chegou tomando as atenções deles. Duas corujas com vários pacotes para as Black, junto com uma carta de felicitações para Narcisa, pousaram no lugar onde segundos antes estava o copo e as torradas de Bellatrix. Aliccia mostrou à amiga o postal que recebera de uma tia da Itália, enquanto Andrew lia sorrindo uma carta de sua mãe.
Lúcio, por sua vez, não abriu a carta que uma coruja pequena e marrom trouxera, lançando para o alto o pedaço de bolo de caldeirão no prato do garoto quando aterrissou.
_ Eu achei que minha mãe não fosse estar muito contente por eu não ter caído na Corvinal, mas pelo jeito ela não achou ruim, segundo ela, “pelo menos não é Lufa-Lufa, e seu pai está muito feliz por você ser da mesma casa que ele!”. – comentou um Andrew contente.
_ Seu pai já voltou da Geórgia? – pergunta Lúcio.
_ Não. Minha mãe diz aqui que ele me escreverá em breve. Ele deve estar bastante ocupado agora. – diz o garoto. – Aqueles duendes são problema atrás de problema, ele vive dizendo...
_ Criaturinhas irritantes. Não sei como meu pai agüenta. – disse Lúcio num tom de desdém.
_ Não vai abrir a sua carta, Lúcio? – pergunta Narcisa, polidamente, no instante em que Andrew ia fazer a mesma pergunta.
_ Não acho que preciso... – respondeu ele no mesmo tom de desdém, embora de forma mais gentil para a garota. – Sei exatamente o que está escrito aqui.

_ Sei exatamente o que está escrito aqui... – disse Sirius, do outro lado do salão, lançando o envelope vermelho intencionalmente nas chamas da vela que flutuava acima da mesa.
_ Isso não foi uma boa idéia, cara. – James nem teve tempo de avisá-lo que aquela não era uma carta comum, era um berrador. Mas Sirius pareceu ter percebido e se arrependido assim que o envelope começou a pular e se contorcer acima dele. Um segundo depois, uma boca fumegante havia se aberto e sua voz ecoava chamando a atenção de todo o salão.
_ SIRIUS-BLACK! COMO OUSA TENTAR QUEIMAR UM CARTA DE SUA MÃE! – a voz estridente de Walburga Black enchia o salão, que ficou completamente em silêncio, ouvindo. – SE JÁ NÃO BASTASSE A VERGONHA DE SER O ÚNICO BLACK A QUEBRAR UMA TRADIÇÃO MILENAR, AINDA ME DÁ MAIS ESTE DESGOSTO? MANCHA NA FAMÍLIA! OQUE EU FIZ PARA MERECER UM FILHO TÃO INGRATO? DESERTOR! EU DEVIA ERA TIRÁ-LO DA ESCOLA, EU DEVIA FAZER VOCÊ TER AULAS PARTICULARES! – ela continuou com uma voz chorosa. - MAS NÃO GASTAREI UM CENTAVO A MAIS COM VOCÊ, POIS SEI QUE DE VOCÊ SÓ VOU RECEBER INGRATIDÃO E DESRESPEITO! – desfez a voz melancólica e transformou-a numa voz doce e feliz, virando-se para a mesa da sonserina. – Aproveito para desejar felicitações à Narcisa, minha adorável sobrinha, - Narcisa se encolheu em seu assento. - ELA SIM, É UM EXEMPLO DA SOBERANIA BLACK! - a carta terminou cuspindo no prato de Sirius, e desfazendo-se em pedaços.
O silêncio perdurou por alguns instantes, enquanto Bellatrix sorria maliciosamente para Sirius, que olhava com ódio para a prima.
_ Cara, nem sei oque dizer... – disse James.
_ Ela pegou leve, James. – disse Sirius, ainda encarando Bellatrix. – Tenho certeza que vem mais por aí. Mas quer saber? Não me importo. Estou ainda comemorando a minha liberdade! – dito isso ele olhou para as garotas à sua volta. Todas elas estavam de queixo caído com o exemplo transgressor de Sirius. James propôs um brinde, à liberdade.

Perto dali, na mesa da Sonserina, os murmúrios começavam, quase todos falavam dos Black e seu desertor. Bellatrix olhava perplexa enquanto o primo brindava com os amigos.
_ Quem ele pensa que é para sapatear encima da tradição da própria família? – disse Narcisa acompanhando o olhar da irmã.
_ Pobre Sirius... – soltou Andrômeda.
_ O que disse, Andie? – silvou Bellatrix.
_ N-Nada Bella, apenas disse... – gaguejou Andrômeda, disfarçando. – Que tenho pena dele...
_ Pena? – esganiçou Bellatrix. – Aquele cachorro não é digno de pena... Aquilo é pior que um sangue-ruim... Aquilo é.... – ela parou pensativa. – Falando em sangue-ruim, acho que tenho uma idéia sobre aquele seu pedido, Narcisa. – ela sorriu maliciosamente.
_ Que idéia? – ela disse, os olhos brilhando de curiosidade.
_ Espere e verá... – disse Bellatrix, bebendo mais um gole de suco, sem tirar o sorriso malicioso da face.
O café da manhã prosseguiu tranqilamente enquanto a turma sonserina descobria mais sobre a família de Aliccia (uma família grande de origem francesa, com alguns italianos, todos, segundo ela, sangues-puros) e posteriormente de Evan Rosier, que era filho único e morava com a mãe e um padrasto (o pai foi preso por aurores antes mesmo de ele ter nascido e morrera dois anos depois em Azkaban).
_ Seu pai era um bruxo das trevas? – perguntou Lúcio, cheio de interesse, e Snape fechou o livro para escutar.
_ Nem mesmo minha mãe sabe ao certo o que ele fez para ter sido levado para Azkaban. – continuou o garoto, olhando para as torradas em seu prato, que pareceram, de repente, muito interessantes. – Ninguém da minha família gosta de muito de falar sobre isso...
_ Se você quiser saber, posso escrever ao meu pai. – disse Lúcio, obedecendo aos seus instintos curiosos. – Ele tem amigos no Departamento de Execução das Leis da Magia que não encontrariam problemas em revirar os arquivos.
Evan Rosier tirou os olhos das torradas para pousa-los no suco de abóbora e Narcisa observou que o garoto pareceu ainda mais constrangido.
_ Acho que é melhor nós irmos mais cedo para a primeira aula. – ela disse, olhando de Lúcio para Aliccia e Bellatrix. – Eu não estou habituada com as escadas e as passagens ainda, e mesmo com as suas dicas, Bella, não quero correr o risco de me atrasar para a aula da McGonnagall.
_ Tem razão. – disse Bellatrix, limpando delicadamente a boca com um guardanapo, num tom característico de liderança. – Aquela bruaca não suporta atrasos, e não é muito “tolerante” com sonserinos... É melhor que vocês cheguem mais cedo.
Narcisa levantou-se seguida de Aliccia, que também já havia terminado. Lúcio e Andrew não quiseram ficar para trás e chamaram Snape, que os acompanhou sem ter tocado na comida. Evan quis terminar seu café e só saiu da mesa da sonserina quando o sino tocou, cinco minutos depois.



_ Eu só quis ajudar. – disse Lúcio num tom de inocência, encarando a menina quando eles saíram do salão.
_ Você viu como ele ficou. – avisou a menina. – Ser apenas curioso não vai ajuda-lo, Lúcio...
_ Eu acho que ele tem o direito de saber porque prenderam o pai dele. – retrucou Lúcio parando de andar e baixando o tom.
_ Sei que você estava curioso porque eu também estava. – ela disse encarando-o calmamente. – E Aliccia, Andrew e Snape estavam. – ela mirou os três que também pararam de andar e eles olharam para lados opostos. – Mas Rosier não queria falar sobre aquilo, estava com vergonha... Não deve ser fácil para ele...
Com uma leve expressão de indignação, Lúcio observou, estático, os cabelos compridos de Narcisa balançarem enquanto ela prosseguia pelo corredor, junto com Aliccia.
_ Se meu pai fosse um bruxo das trevas, eu não sentiria vergonha. – comentou Lúcio em voz baixa para Snape e Andrew, que continuaram ao seu lado.
_ Seja como for, eu acho que a Black tem razão. – ponderou Snape, inocentemente interessado. – Porém, é o SEU pai quem pode descobrir alguma coisa, e Rosier não precisa ficar sabendo em primeira mão.
Lúcio sorriu para o garoto, decidindo afinal que ter entrado na cabine onde aquele menino pálido, de cabelo gorduroso e com um nariz grande enfiado num livro se encontrava isolado tinha sido uma atitude bastante proveitosa.

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