ONESHOT



Nós havíamos pegado o elevador que nos levaria até o meu escritório, no andar de Execução das Leis de Magia, e ao dele, que, para minha felicidade, era o mesmo escritório.


Enquanto subíamos, relembrei o momento em que Rony descobrira a novidade:


FLASHBACK


– Bom dia, Rony - sorriu Kingsley Shackebolt através da porta do escritório. Ele se virou e deu uma piscadela para mim.


Eu me apressei e sentei em cima da mesa, chupando a pontinha da pena-tinteiro, com as pernas propositalmente cruzadas. Minha deusa interior dava risada só de imaginar a surpresa de Rony quando entrasse.


– Oi, Ministro - a voz de Rony veio pela fresta da pota, confusa, mas alegre - o que faz aqui tão tarde?


– Só vim lhe apresentar sua nova secretária do escritório. Achei que seria uma boa hora para conhece-la - o esgar no canto da boca de Kingsley era com certeza um sorriso irônico reprimido.


Kingsley abriu a porta para Rony, que entrou com uma expressão curiosa. Quando pôs os olhos na minha direção, ficou boquiaberto, o queixo tremendo, como se tivesse dado de cara com um cão de três cabeças.


– Você já deve conhecer Hermione Granger - disse Shackebolt, dando uma risadinha baixa.


Rony me olhava de cima para baixo, piscando atordoado.


– Oi, chefe - eu disse, num tom tão açucarado e sedutor que até eu me assustei com minha cara de pau.


– Hermione? - Rony gemeu, olhando para Kingsley como se pedisse socorro.


– Bom, vou deixar os dois a sós para... bem... conversarem sobre a rotina de serviço - Kingsley enfatizou a palavra "serviço". Se era sarcasmo ou não, não podia dizer.


Quando a porta se fechou, Rony me olhou de novo, seus olhos tremendo levemente quando minha perna abaixou.


– Você? Secretária? - a voz dele pingava incredulidade, sarcasmo e... algo mais. Seria ternura? Humm...


– Faço qualquer atividade administrativa - eu disse, tentando não tremer com minha ousadia - mas posso fazer outras atividades... extraprofissionais... incluindo em hora extra. Pode me usar do jeito que quiser.


Santa Mãe. Ele teria notado algum duplo sentido? Essa última me escapou durante minha insanidade.


Provavelmente sim, por que seu sorriso incrédulo se curvou para cima num inconfundível sorriso malicioso.


– Bom... vou precisar de você depois das cinco horas da tarde, então... pra um servicinho especial.


Eu fiz a única coisa que não esperava fazer. Eu corei.


Ah, eu não ia amarelar agora, ia?


– Fechado - respondi, empinando meu busto numa tentativa patética de parecer superior. Tudo o que eu consegui foi deixar os olhos azuis dele ficarem anuviados. E aquilo só podia significar uma coisa: que eu estaria enrascada mais tarde.


E acertei. Por mais insano que fosse, fizemos o "servicinho" no escritório, depois do período - claro, depois de lançarmos uns cinco abafiattos e dois collocorpus na porta. A última coisa que eu queria era ser flagrada em cima da mesa com meu marido por um auror atrasadinho.


E, por mais insano que fosse, foi maravilhoso. Nossa segunda noite de amor, apesar de ser num lugar inusitado, foi tão perfeita quanto a primeira.


FIM DO FLASHBACK


Eu sorri ao relembrar aquela noite. Rony percebeu.


– O que foi?


– Nada - eu disse. Eu é que não ia rememorar aquilo com ele bem no elevador.


De qualquer modo, naquele dia, o destino parecia conspirar contra mim.


O elevador sacudiu violentamente e parou, guinchando. As luzes piscaram, e então tudo ficou quieto.


– O que foi isso? - indaguei, assustada.


– Olá? Tem alguém aí? - uma voz soou através do alto-falante interno do elevador. Era a de Ana Abbott, que estava trabalhando na Manutenção naquele dia.


– Dois funcionários, Ana - respondeu Rony, preocupado.


– Weasley? Que falta de sorte - disse Ana - quem mais está aí?


– Hermione.


– Ah - ela fez uma longa pausa - bom, talvez não seja tanta falta de sorte assim - ele riu com malícia.


Fala sério. mais duplos sentidos?


– Ana, faz um favor - eu disse, numa voz azeda - em vez de fazer insinuações sem graça, sua loira assanhada, que tal dizer o que aconteceu com o elevador?


Ana fez outra pausa; pude imaginar ela fechando a cara e mostrando a língua.


– Ok, secretária...


– Ai. Golpe baixo... - acabei rindo. Ana era uma peste, mas era uma pessoa legal.


Ela riu também.


– Quando as comadres pararem a fofoca, podem me dizer o que aconteceu, tá? - bufou Rony, aborrecido.


– Ui, tá legal, Weasley - Ana suspirou - foi uma pane nas engrenagens do elevador. O pessoal já foi arrumar, mas vai demorar um bocado.


– Defina "um bocado" - revirei os olhos.


– Ah - Ana respondeu como quem não queria nada - coisa de meia hora.


– Meia hora?? Tá brincando? - gemeu Rony.


– Ah, eu sei que dá pra vocês fazerem muita coisa em meia hora - Ana brincou, com mais uma dosezinha de duplo sentido na voz.


– Tchau, Ana - bufei, desligando o alto-falante.


Rony olhava para o teto quando me virei. Parecia pensativo.


– Legal. E agora?


– Não dá pra aparatar de dentro do elevador? - ele perguntou, vagamente.


– Não. Desde aquela loucura do Ministério nas mãos do Voldemort, eles lançaram feitiços em tudo que foi canto. Só imagino porque...


– Para prenderem Comensais dentro do elevador? Ou nascidos trouxas? - Rony comentou, ainda olhando para cima.


– No que está pensando, Rony? - perguntei, curiosa. Ele ficara anormalmente quieto desde que Ana dissera sobre a demora no elevador.


Ele desceu os olhos até meu rosto. E o que vi ali me fez tremer nas bases.


Ah, não. O olhar nublado havia voltado.


– Rony? - sussurrei, sem saber o que fazer.


– Que foi? - ele também falou em um sussurro.


– Você... não está pensando em... bom... você sabe... aqui no elevador, está?


A perspectiva devia me apavorar.


Mas estava me provocando outra reação, muito diferente... e insana.


Ele não respondeu. Pelo menos, não com palavras.


Já estava pronta para o pior - ou melhor, talvez - quando ele me enlaçou pela cintura e me beijou. Mas pude perceber que não estava tão enrascada quanto da última vez.


Ele me beijava de um jeito leve mas profundo; não era um beijo do tipo que antecipava uma noite de amor; era um beijo doce e tímido, do tipo que um garoto de quinze anos daria em sua namorada, que me derreteu toda.


Mas qualquer semelhança com um amasso de colegial parou ali. Sua mão passeava pelas minhas costas, até que chegou em minha perna direita. Ele a puxou gentilmente para cima, me encaixando no apoio do elevador. Com a outra, acariciava meus cabelos, enquanto seu corpo prensava delicadamente o meu contra a parede. Tremi ao sentir o contato mais íntimo que nossos corpos começavam a estabelecer com o baixo-ventre.


Mesmo ali, com um leve toque de excitação, me sentia segura de que ele não faria o tipo de loucura que fizemos no escritório.


Ele afastou a boca da minha, apenas para beijar meu pescoço, de um jeito tão cândido que contrastava com o marido loucamente apaixonado e possessivo que eu havia conhecido no escritório. Parecia mais o marido tímido e terno de nossa primeira noite.


E conclui que gostava dos dois. Garoto complicado.


– Por que? - suspirou ele, voltando o rosto para mim - eu não entendo até hoje...


– O quê? - indaguei, confusa.


– Por que eu? Eu só te fiz mal a vida toda... sou só um legume insensível, lembra?


Eu sorri, com candura.


– Sim, você é um legume insensível. Mas sabe de uma coisa?


Ele me olhou, curioso.


– O quê?


Puxei seu rosto, até que sua orelha ficasse a um centímetro dos meus lábios.


– A diferença é que é o MEU legume insensível - sussurrei.


Rony sorriu de um jeito sofrido. Fiquei aflita ao ver que o passado dele ainda o condenava. O que vi nos olhos dele, em um único momento, me incomodou. Uma garota de laço o beijando após uma vitória no Quadribol... uma figura solitária numa barraca, no meio de uma floresta... um medalhão exibindo fantasmas piores que as próprias Trevas, destilando um veneno tão mortal quanto o do basilisco... um grito ensurdecedor numa mansão...


– Rony... - balancei a cabeça, abraçando-o - esqueça tudo.. estou aqui, para você. Para sempre - levantei minha mão, mostrando minha aliança - até que a morte nos separe, lembra?


– Ou além dela - disse Rony, me abraçando com fervor.


Ficamos por um bom tempo abraçados, sentados no chão do elevador, relembrando alguns momento felizes e outros nem tanto.


– Você estava tão linda no Baile de Inverno...


– Que bom que achou... por que você estava um bagulho.


Nós ríamos tanto com algumas que chegávamos a lacrimejar.


– É LeviOsa, e não LeviosÁA - Rony resgatou essa pérola.


Eu ri.


–Você me chamando de pesadelo foi a melhor.


Ele franziu as sobrancelhas.


– Nunca falei coisa mais idiota que essa.


Eu corei, agradavelmente surpresa.


De repente, a porta do elevador seabriu, e o rosto sorridente de Ana Abbott surgiu na nossa frente.


–Ah, estão vivos... e com roupas - essa última foi uma clara provocação feita para mim - ei, Windsor, eles estão bem!


Um bruxo careca deu um adeusinho para nós do outro lado da porta.


– Chegamos... o escritório - disse Rony, me ajudando á sair do elevador.


Windsor sorriu.


– Que bom que os senhores estão bem - ele acenou com a cabeça para nós - já resolvemos o problema do elevador.


– Que pena - brinquei, falando baixinho no ouvido de Rony.


Quando chegamos ao limiar do escritório, Rony sussurrou de volta:


– Nem pense que você se safou. Ainda vou pedir um serviço pra você naquele elevador.


Bom, e ali ficou a ameaça, pairando no ar como uma serpente venenosa e sedutora.


Deveria ter fingido medo, mas me limitei á sorrir. Se os "servicinhos" fossem para provar o quando eu o amava, então por ele eu faria hora extra.


FIM

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