CAPÍTULO UM



CAPÍTULO UM


 


A ocupação de desvendar assassinatos exigia tempo, paciência, habilidade e tolerância à monotonia. A tenente Gina Weasley tinha tudo isso. Sabia que o ato de matar não exigia nenhum desses fatores. Muitas vezes uma vida era tirada por impulso, acesso de raiva, divertimento ou simplesmente burrice. Foi esse último item, na opinião de Gina, que levara um sujeito chamado John Henry Bonning a atirar um tal de Charles Michael Renekee pela janela do décimo segundo andar de um prédio na avenida D.


Gina estava com Bonning na sala de interrogatório e calculou que ia levar no máximo mais vinte minutos para arrancar-lhe uma confissão, outros quinze para fichá-lo e redigir seu relatório. Era capaz de chegar em casa cedo.


- Qual é, Bonning? - Era o velho papo da tira veterana com o bandido veterano, falando de igual para igual. Era a praia dela. - Faça um favor a si mesmo. Confesse tudo logo, e então você poderá alegar legitima defesa ou insanidade temporária. Podemos encerrar esse assunto antes da hora do jantar. Ouvi dizer que hoje vão oferecer um rodízio de massas na carceragem.


- Mas eu nem toquei nele! - Bonning apertou os lábios gordos e tamborilou sobre a mesa com os dedos compridos e rechonchudos. - O babaca pulou!


Dando um suspiro, Gina se sentou sobre a pequena mesa de metal da Sala de Interrogatório A. Não queria que Bonning resolvesse apelar para os seus direitos e reivindicasse um advogado, pois isso ia melar o bom andamento dos trabalhos. Tudo o que precisava fazer era impedi-lo de dizer as palavras fatídicas: “Quero um representante”, encaminhá-lo na direção para a qual já estava pendendo e, depois, era só correr para o abraço.


Traficantes de drogas químicas, especialmente os de segunda classe como Bonning, eram sempre tapados. O problema e que, cedo ou tarde, ele ia acabar reclamando que estava sem acompanhamento jurídico. Era um jogo de troca-troca, tão antigo quanto o próprio crime de assassinato. Apesar de o ano de 2058 já estar quase chegando ao fim, o jeito de lidar com assassinatos continuava basicamente o mesmo.


- Ele pulou. - repetiu Gina. - Saiu correndo e decolou para fora da janela, de repente. Ora, eu fico me perguntando, por que será que ele faria uma coisa dessas?


Bonning apertou o cenho, lançando a testa larga parecida com a de um gorila em pensamentos profundos, até dizer:


- Será que além de filho-da-puta ele era maluco? Pode ter sido isso...


- É, pode ser. Sua tentativa foi boa, Bonning, mas não vai dar para classificá-lo para a segunda fase do bolão que o pessoal aqui da policia faz para eleger o melhor “enrolador de tiras”.


Ele levou trinta segundos refletindo se ela estava de gozação com ele, até que seus lábios se abriram em um sorriso.


- Engraçado... muito engraçado mesmo, Weasley.


- É, ando até pensando em fazer bico como comediante em algum bar por ai. Enfim, voltando ao meu trabalho aqui, acho que vocês dois estavam fabricando um pouco de Erótica em um laboratório portátil na avenida D, e Renekee, como era um filho-da-puta maluco, se sentiu incomodado com alguma coisa e pulou pela janela, atravessando o vidro, mergulhou doze andares e quicou no teto de um táxi que passava, fazendo os passageiros, inocentes turistas de Topeka que estavam no banco de trás, quase se cagarem nas calças com o susto; depois, o doidinho rolou de lado e caiu no chão com os miolos escorrendo pela calçada.


- Puxa, e olha que ele quicou mesmo! - comentou Bonning, dando um sorriso leve ao se lembrar da cena. - Quem diria, né?


Gina não queria enquadrá-lo em assassinato em primeiro grau e percebeu que, se tentasse acusá-lo de homicídio em segundo grau, o advogado de defesa ia pleitear homicídio simples. Um traficante que apagava outro não fazia a justiça cega levantar a pontinha da venda e sorrir de alegria. Bonning ia conseguir uma pena maior pela parafernália de drogas ilegais do que por homicídio. Mesmo combinando as duas condenações, porém, ia cumprir no máximo três anos.


Gina cruzou os braços sobre a mesa, inclinou-se para a frente e perguntou:


- Bonning, eu tenho cara de otária?


Aceitando a pergunta ao pé da letra, Bonning estreitou os olhos e fez uma avaliação cuidadosa do rosto a sua frente. Ela possuía olhos castanhos grandes, mas não pareciam bondosos. Tinha uma boca bonita, com lábios cheios, mas não sorria. Terminando de olhar, respondeu:


- Não. Você tem cara de tira.


- Boa resposta. Agora, pare de me tratar como idiota, Bonning. Você e seu sócio tiveram uma discussão, você ficou puto e encerrou a relação pessoal e profissional que tinha com ele lançando sua bunda caída pela janela. - Levantou a mão para impedir que Bonning tornasse a negar o crime. - Essa é a minha versão. Você se enfureceu, talvez por algum problema com a divisão dos lucros, com os métodos que usavam ou, quem sabe, por causa de alguma mulher. Ambos ficaram de cabeça quente. Você tinha que se defender, certo?


- Todo homem tem direito de se defender. - concordou Bonning, balançando a cabeça para a frente e sentindo que começava a gostar da história. - Mas a gente não chegou a se pegar não... ele simplesmente resolveu voar.


- E onde foi que você arrumou esse lábio sangrando e o olho roxo? Por que as juntas dos seus dedos estão arranhadas?


Bonning não se abalou e exibiu um sorriso cheio de dentes.


- Briga de bar, tenente.


- Foi mesmo? Quando? Onde?


- Ora, quem é que consegue se lembrar dessas coisas?


- Pois é melhor você se lembrar. E com detalhes, Bonning, porque vamos fazer testes no sangue que colhemos de seus dedos gordinhos e vamos achar o sangue de Renekee misturado com o seu. Vamos fazer o teste de DNA nele para confirmar, e vou acusar você de crime premeditado. Sabe que isso significa prisão de segurança máxima sem direito a condicional.


Os olhos dele piscaram depressa, como se o cérebro estivesse processando os novos e assustadores dados.


- Ah, qual e, Weasley, isso e papo furado seu! Você não vai convencer ninguém de que eu fui até lá pensando em matar o tampinha. Éramos velhos amigos.


Com os olhos fixos nele, Gina pegou o comunicador, avisando:


- Essa é a última chance que tem para se ajudar. Vou chamar minha assistente e mandá-la trazer o resultado dos testes. Vou indiciar você por assassinato em primeiro grau.


- Mas não foi assassinato! - Ele queria acreditar que ela estava blefando. Não dava para avaliar bem aqueles olhos, pensou, passando a língua sobre os lábios. Nem dava para ver o que se passava por trás daqueles olhos de tira. - Foi um acidente. - argumentou, inspirando com força. Gina simplesmente balançou a cabeça para os lados. - Foi sim, nós nos atracamos um pouco e ele... acabou perdendo o equilíbrio ao esbarrar no peitoril e voou de cabeça pela janela.


- Agora você está me insultando! Um homem adulto não voa de cabeça ao esbarrar no peitoril de uma janela de um metro de altura! - Ligando o comunicador, Gina chamou: - Policial Granger!


Em poucos segundos, o rosto redondo e sóbrio de Hermione surgiu na tela do comunicador.


- Sim, tenente!


- Preciso do resultado dos exames de sangue de Bonning. Mande-os direto para a sala A e avise ao promotor que temos um assassinato em primeiro grau.


- Ei, ei, ei!... Espere um instantinho! - Bonning passou as costas da mão sobre a boca. Lutou consigo mesmo por um instante, tentando se convencer de que ela jamais iria conseguir enquadrá-lo em pena máxima. O problema é que a tenente Weasley tinha fama de conseguir esmagar contra a parede insetos muito maiores do que ele.


- Você teve a sua chance, Bonning. Granger...


- Ele voou em cima de mim, como você disse. Foi ele que veio para cima de mim. Ficou maluco... Vou lhe contar como tudo aconteceu, a merda toda. Quero fazer um depoimento formal.


- Granger, espere um pouco antes de cumprir as ordens anteriores. Informe ao promotor que o Sr. Bonning está se oferecendo para apresentar um depoimento a respeito da... merda toda.


- Sim, senhora. – Granger permaneceu séria.


Gina enfiou o comunicador de volta no bolso, tornou a cruzar as mãos na ponta da mesa e sorriu com simpatia.


- Vamos lá então, Bonning. Conte-me como aconteceu tudo.


Cinqüenta minutos depois, Gina entrou em sua apertada sala na Central de Policia de Nova York. Ela realmente parecia uma policial, não apenas pelo coldre pendurado no ombro com a arma a mostra, nem pelas botas gastas e os jeans desbotados. A palavra “tira” estava impressa em seus olhos, olhos que não deixavam passar nada. Tinham um tom de uísque e raramente mostravam medo. Sua face era quadrada, tinha maçãs do rosto salientes que acompanhavam uma boca surpreendentemente generosa e uma covinha no queixo.


Caminhava a passos largos, com estilo elegante, mas sem pressa. Satisfeita com o seu trabalho, passou os dedos pelos cabelos vermelhos com corte despojado enquanto se sentava a sua mesa.


Ia preencher o relatório, enviar copias a todas as partes interessadas e dar o dia por encerrado. Do lado de fora da janela estreita, o trafego estava em estado caótico. O ronco pesado dos ônibus aéreos e o constante zumbir das hélices dos helicópteros para controle de trafego já não a incomodavam mais. Afinal, tudo aquilo era o acompanhamento da canção-tema de Nova York.


- Ligar! - ordenou ao computador e bufou de raiva quando a maquina permaneceu implacavelmente apagada. - Droga, não comece com isso! Ligar! Vamos, acenda essa tela logo, sua velharia filha-da-mãe!


- A senhora precisa informar a sua senha. - avisou Hermione, que entrava na sala.


- Mas eu achava que esse troço já estava aceitando novamente comando de voz.


- Estava mesmo, mas tornou a pifar. Acho que vão acabar de consertar o sistema até o fim dessa semana.


- Mas que pé no saco! - reclamou Gina. - Quantos números mais vou ter que guardar de cor? Dois-cinco-zero-nove! - E expirou com força ao ver que a máquina acendeu, fazendo um ruído estranho. - Seria bom se eles instalassem logo o novo sistema que prometeram para o departamento. - Ela enfiou um disco na unidade. - Salve esses dados com o nome de Bonning, John Henry, caso número 4572077-H. Envie uma cópia de tudo para o comandante Lupin.


- Foi muito legal... você resolveu tudo bem depressa com Bonning, Weasley.


- Sabe qual é a diferença entre o cérebro daquele cara e um grão de ervilha? É que a ervilha é bem maior. O idiota varejou o sócio pela janela por causa de uma briga idiota envolvendo vinte fichas de crédito. E ele ainda estava tentando me convencer que foi legítima defesa e que atacou o outro para salvar a própria vida. O cara era cinqüenta quilos mais leve do que ele e vinte centímetros mais baixo. Que babaca! - completou, com um suspiro de resignação. - Podia ao menos inventar que o baixinho estava com uma faca na mão ou o ameaçou com um taco de beisebol.


Recostou-se, massageou o ombro e sentiu-se agradavelmente surpresa por sentir que quase não havia tensão ali para ser dissipada.


- Todos os nossos casos podiam ser tão fáceis como esse. - Suspirou.


Ouviu sem prestar atenção o ronco e o zumbido do tráfego aéreo que começavam a aumentar fora de sua janela. Um dos bondes aéreos de conexão estava proclamando em altos brados as tarifas baixas, a praticidade e o conforto para o passageiro:


“Bilhetes semanais, mensais ou anuais! Associe-se ao BONDE FÁCIL, seu meio de transporte aéreo tradicional, amigo e confiável. Comece e termine o dia de trabalho com estilo.”


Se você gosta do estilo lata-de-sardinha, pensou Gina. Com a garoa típica do mês de novembro que caíra o dia todo, ela imaginava que os nos no tráfego, tanto o de rua quanto o aéreo, seriam terríveis. Um final perfeito para o dia de trabalho.


- Já chega! – sentenciou Gina, pegando o casaco de couro surrado. - Estou saindo fora e dentro do horário pelo menos uma vez na vida! Tem algum plano quente para o fim de semana, Hermione?


- Humm... O de sempre. Vou derrubar homens como se fossem moscas e depois abandoná-los, deixando-os todos com o coração partido e a alma aos prantos.


Gina lançou um sorriso gaiato para a sua ajudante, que continuava séria. A forte e confiável Hermione, pensou. Uma policial perfeita, desde os fios do cabelo curto e escuro, com franja reta, até a sola dos sapatos rigorosamente dentro dos regulamentos.


- Você é realmente muito fogosa, Hermione. - brincou Gina. - Consegue fazer da vida uma eterna festa.


- Sim, essa sou eu, uma legítima baladeira de plantão. - Com um sorriso seco, Hermione colocou a mão na maçaneta no exato instante em que o tele-link tocou. As duas olharam com cara feia para o aparelho. - Puxa Weasley, por trinta segundos podíamos ter escapado dessa ligação e já estaríamos descendo pela passarela aérea.


- Deve ser o Harry ligando para me lembrar que temos convidados importantes para um jantar de gala lá em casa. - Gina atendeu a ligação. - Aqui fala Weasley, da Homicídios.


A tela se encheu de cores escuras e dispersas que se uniam e separavam em um padrão psicodélico estranho e incômodo. Uma música em tom grave e ritmo lento saia pelo alto-falante. Por instinto, em uma reação automática, Gina ligou o rastreador de ligações e notou a mensagem de “Não foi possível identificar o local da chamada” que surgiu na base da tela.


Hermione pegou na mesma hora o seu tele-link portátil, saiu de lado a fim de se colocar fora do campo de visão da pessoa que ligara e acionou o controle central no instante em que uma voz se fez ouvir:


- Dizem por aí que você e a melhor policial da cidade, tenente Weasley. Você realmente é tão boa assim?


- Ô seu engraçadinho... não se identificar e usar misturadores de sinal para entrar em contato com uma oficial da policia é atividade ilegal, sabia? Considere-se informado de que a sua ligação será rastreada pelo CompuGuard e tudo esta sendo gravado.


- Sei disso. De qualquer modo, já que eu acabei de cometer o que a sociedade chama de assassinato em primeiro grau, não estou muito preocupado com detalhes incômodos, como violações eletrônicas. Fui abençoado pelo Senhor.


- Ah, foi? - Que beleza, pensou Gina, aquilo era só o que faltava para completar o seu dia.


- Sim. Fui chamado para realizar o trabalho Dele e lavei minhas mãos no sangue do Seu inimigo.


- E Ele tem muitos inimigos? Isto é, eu achava que Ele simplesmente os esmagava sozinho, sem precisar convocar você para fazer o trabalho sujo.


Houve uma pausa, uma longa pausa, durante a qual tudo o que se ouviu foi a melodia fúnebre.


- Já devia esperar uma atitude irreverente e petulante de sua parte. - A voz estava mais agressiva agora, com menos equilíbrio. A raiva mal conseguia ser controlada. - Como uma mulher sem Deus conseguiria compreender o conceito de retaliação divina? Vou baixar as coisas para o seu nível. Uma charada. Aprecia charadas, tenente?


- Não. - Olhou com o rabo do olho para Hermione e viu um frustrado balançar de cabeça. - Mas aposto que você aprecia.


- Elas relaxam a mente e confortam o espírito. O nome desta pequena charada é “Vingança”. Você encontrara o primeiro conterrâneo aninhado no colo do luxo, no alto da torre de prata ao pé da qual um rio escuro corre e uma cachoeira despenca de grandes alturas. Ele implorou por sua vida, e depois implorou por sua morte. Como não se arrependeu de seu imenso pecado, já foi condenado.


- Por que motivo você o matou?


- Porque esta é a tarefa para a qual nasci.


- Deus lhe disse que você nasceu para matar? - Gina continuava tentando rastrear a ligação e lutava para esconder a frustração. - Diga-me... como foi que Ele lhe revelou isso? Ligou para o seu tele-link? Enviou-lhe um fax? Talvez tenha se encontrado com você em algum bar...?


- Não duvide de minhas palavras! - Sua respiração tornou-se audível, mais ofegante e trêmula. - Acha que por ser uma mulher com cargo de autoridade e melhor do que eu? A dúvida não se manterá por muito tempo. Fui eu que a procurei, tenente, lembre-se de que este ato foi meu. As mulheres podem guiar e confortar o homem, mas o homem foi criado para proteger, defender e vingar.


- Foi Deus quem lhe falou tudo isso também? Acho que isso prova que Ele é homem, afinal... e com um ego gigantesco.


- Você vai estremecer diante Dele, e diante de mim.


- Ah, é?... Sei... - Torcendo para que ele a estivesse vendo com toda a clareza, Gina examinou as unhas com descontração. - Nossa, já estou até tremendo de medo!...


- Minha missão é sagrada. É terrível e divina. Está em Provérbios, tenente, capítulo 28, versículo 17: “Se um homem carregar o fardo do sangue de outro, deverá fugir a vida toda até encontrar a própria morte; e que ninguém o ajude.” Os dias de fuga deste homem terminaram hoje... e ninguém o ajudou.


- E se você o matou, em que isso o transforma?


- Na ira de Deus. Você tem vinte e quatro horas para provar que é boa no que faz. Não me desaponte!


- Não vou desapontá-lo, babaca! - murmurou Gina quando ele desligou. - Conseguiu algo, Hermione?


- Nada. Ele misturou os sinais e enganou o sistema rastreador muito bem. Não deu para descobrir nem se estava ligando do planeta ou fora dele.


- Está aqui no planeta. - resmungou, ajeitando-se na cadeira. - Quer ficar bem perto, para poder apreciar.


- Talvez seja apenas um maluco.


- Não, acho que não... Fanático, sim, mas não maluco. Computador, faça uma busca de todos os prédios comerciais e residenciais em Nova York que tenham a palavra luxo no nome, vista para o East River ou para o Hudson. - E tamborilou com os dedos sobre a mesa. - Detesto jogos de adivinhação.


- Pois eu adoro! - Franzindo as sobrancelhas, Hermione se inclinou sobre os ombros de Gina olhando para a tela com atenção enquanto o computador trabalhava.


 


Motel Nos Braços do Luxo


Luxo Cristais e Pratarias


Mesa & Luxo Restaurante


Torres do Luxo


 


Gina deu um pulo, ordenando:


- Apresente arquivo visual das Torres do Luxo!


 


Processando...


 


As imagens surgiram... Era um edifício prateado, muito alto, em cujo revestimento externo de aço se refletiam os raios de sol e o rio Hudson que cintilava placidamente. No lado oeste, uma cascata gigantesca se lançava com muito estilo sobre um complexo decorativo cheio de tubos e canais.


- Achamos!


- Não pode ser assim tão fácil. - observou Hermione.


- Ele queria que fosse fácil. - Porque, pensou Gina, alguém já estava morto. - O cara quer brincar e precisa se exibir. Não consegue nenhum dos dois, se nós não entrarmos na brincadeira. Computador, quero acesso aos nomes das pessoas que residem no último andar das Torres do Luxo.


 


Processando... A cobertura pertence ao Grupo Brennen, é a residência nova-iorquina de Thomas X. Brennen, de Dublin, na Irlanda. Ele tem quarenta e dois anos, é casado, tem três filhos, presidente e diretor-geral do Grupo Brennen, atuando na área de entretenimento e comunicações.


 


- Vamos até lá conferir, Hermione. Ligamos para a emergência no caminho.


- Quer que eu solicite reforço?


- Antes, vamos dar uma olhada no local. - Gina ajustou a correia do coldre e vestiu o casaco de couro.


O trafego estava horrível, como Gina suspeitara, e elas foram andando e parando, arrastando-se por ruas molhadas, e os veículos que circulavam acima delas pareciam abelhas desorientadas. Carrocinhas de comida se apertavam sob imensos guarda-sóis e, aparentemente, estavam com pouco movimento. Nuvens de vapor subiam de suas grelhas, obscurecendo a visão e lançando um fedor de gordura no ar.


- Peça a telefonista para contatar a residência de Brennen, Hermione. Se isso for um trote e ele estiver vivo, e melhor que a história fique apenas entre nós.


- Certo. - disse Hermione, pegando o tele-link. Aborrecida com a lentidão do tráfego, Gina ligou a sirene. Se tivesse colocado a cabeça para fora e berrado, teria dado no mesmo. Os carros permaneceram juntinhos, como amantes, e não se moveram nem um centímetro para lhe dar passagem.


- Ninguém atende. - anunciou Hermione. - Na caixa postal há uma mensagem avisando que ele ficará fora por duas semanas, a começar de hoje.


- Vamos torcer para que ele esteja enchendo a pança de cerveja em um pub de Dublin. - Gina olhou pelo retrovisor, analisou o engarrafamento e resolveu tomar uma medida drástica. - Temos que ir por via aérea!


- Ai, tenente, não nesse carro!... - Hermione, a intrépida policial, rangeu os dentes e apertou os olhos, aterrorizada ao ver que Gina colocou o veículo em modo vertical. O carro estremeceu, estalou e conseguiu se elevar vinte centímetros do solo, despencando novamente no chão com um baque que reverberou nos ossos das duas ocupantes.


- Que droga de carro! Seu monte de bosta! - reclamou Gina, usando o punho dessa vez, agredindo os controles com tanta força que arranhou as mãos. O carro voltou a se elevar, de forma vacilante, balançou para os lados e finalmente continuou a subir, decolando enquanto Gina socava o acelerador sem parar. Durante a subida, o veículo arrancou a ponta de um dos imensos guarda-sóis que cobriam os carrinhos de lanche, provocando a ira do vendedor, que se pôs a perseguir o carro de Gina com fúria, em altos brados, por meio quarteirão.


- O Zé Mané do vendedor quase conseguiu agarrar o pára-choque dessa lata velha, viu só? - Mais divertida do que chateada, Gina balançou a cabeça. - Um cara calçando botas turbinadas quase conseguiu ultrapassar um carro da polícia. Onde é que esse mundo vai parar, Hermione?


Com os olhos fechados e recusando-se a abri-los, Hermione não moveu um músculo e balbuciou:


- A senhora está interrompendo minhas orações, tenente.


Gina manteve a sirene ligada e conseguiu levá-la em segurança até a entrada principal das Torres do Luxo. A aterrissagem foi tão brusca que Gina sentiu os dentes de baixo se chocarem com os de cima como castanholas, e o carro não abalroou o pára-lama de um reluzente XRII conversível movido a jato por questão de centímetros.


O porteiro surgiu na calçada como uma bala, exibindo no rosto um misto de insulto e horror enquanto abria com cortesia a porta do calhambeque bege que acabara de parar junto do meio-fio e avisava:


- Madame, a senhora não pode estacionar esta... coisa aqui.


Gina desligou a sirene e exibiu o distintivo, afirmando:


- Ah, posso sim!


A boca do empregado ficou rígida enquanto ele olhava para a identificação.


- Se a senhora tiver a bondade de encaminhar o seu veículo para a nossa garagem, tenente...


Talvez o motivo de Gina agir do modo que agiu em seguida foi o fato de aquele porteiro a fazer lembrar de Moody, o mordomo que desfrutava da afeição e da lealdade de Harry, e aturava o desprezo de Gina. Ela colocou o rosto próximo ao do empregado, com os olhos brilhando, e falou:


- O carro fica onde eu o coloquei, meu chapa. Quanto a você, a não ser que queira que minha auxiliar o enquadre por obstrução ao trabalho de uma agente da lei, e melhor me levar até a cobertura de Thomas Brennen.


- Isso não vai ser possível. - reagiu ele, inspirando com força. - O Sr. Brennen está fora.


- Hermione, anote o nome deste... cidadão e a sua identidade, e providencie para que ele seja transportado até a central de polícia para ser fichado.


- Sim, tenente.


- A senhora não pode me prender! - Suas botas impecavelmente engraxadas executaram passos nervosos de dança sobre a calçada. - Estou desempenhando minhas funções!


- Mas está interferindo nas minhas, e tente adivinhar qual trabalho o juiz vai considerar mais importante... o seu ou o meu?


Gina observou com interesse o modo como a sua boca se moveu antes de se fechar, formando uma linha fina que transmitia desaprovação. Ora, ora, pensou, ele era o próprio Moody, sem tirar nem por, embora fosse uns dez quilos mais gordo e uns oito centímetros mais baixo do que o suplício de sua existência.


- Muito bem. Mas a senhora pode estar certa de que vou entrar em contato com o chefe de polícia e com o meu supervisor de segurança para contar-lhes a respeito de sua conduta... - Olhou novamente para o distintivo, completando: -... Tenente.


- Sinta-se a vontade para fazer isso. - Fazendo sinal para Hermione, Gina seguiu o porteiro, que caminhou com o corpo duro como uma tábua até a entrada do prédio, onde ativou um andróide, deixando-o assumir a portaria.


Por trás das brilhantes portas prateadas, no saguão das Torres do Luxo, havia um magnífico jardim tropical, com palmeiras altas, hibiscos coloridos e pássaros que chilreavam. Uma imensa piscina envolvia uma fonte murmurante com formato de uma mulher com curvas generosas, nua até a cintura e segurando um peixe dourado.


O porteiro digitou um código no painel de um elevador cilíndrico todo de vidro e gesticulou para que Gina e Moody o acompanhassem. Sentindo-se pouco à vontade com aquele tipo de transporte nada privativo, Gina manteve-se no centro da cabine, enquanto Hermione ficou com o nariz quase colado no vidro durante toda a subida.


Sessenta e dois andares acima o elevador se abriu, dando acesso a um saguão um pouco menor do que o do térreo, mas não menos luxuoso. O empregado parou diante de uma tela de segurança colocada do lado de fora de portas duplas em arco revestidas de aço polido.


- Porteiro Strobie acompanhando a tenente Weasley, da polícia de Nova York, e sua auxiliar.


- O Sr. Brennen não se encontra em casa no momento. - informou uma voz com um típico sotaque irlandês, quase musical.


- Trata-se de uma emergência policial. - interferiu Gina, empurrando o porteiro para o lado com o cotovelo. - Nosso acesso é imperativo!


- Um momento, tenente. - Ouviu-se um leve zumbido enquanto o rosto de Gina e sua identificação foram registrados por um scanner, seguido por um suave estalo de fechaduras que se abriam. - Entrada permitida. Por favor, saibam que esta residência está protegida pelo sistema SCAN-EYE.


- Comece a gravar, Hermione. Para trás, Strobie! - Gina colocou uma das mãos na porta e a outra na arma, e empurrou-a com o ombro.


O cheiro a atingiu em cheio e a fez soltar um palavrão. Gina já sentira tantas vezes o cheiro de morte violenta que não havia dúvidas. O sangue manchava as paredes revestidas de seda azul na sala de estar, formando uma pichação apavorante e incompreensível. Viu o primeiro pedaço do corpo de Thomas X. Brennen jogado sobre o carpete macio. Sua mão decepada estava com a palma virada para cima e os dedos recurvados na direção dela, como se a estivessem convidando a seguir em frente ou expressando súplica. A mão fora cortada na altura do pulso.


Gina ouviu Strobie emitir um som de terror que lhe ficou preso na garganta e sentiu que ele cambaleou para trás, voltando para o saguão em busca do ar com perfume floral. Pegando a arma com a mão firme, ela a balançou de um lado para outro, cobrindo todo o aposento. Seus instintos lhe diziam que o que acontecera no apartamento já havia terminado e o autor já estava a salvo, longe dali, mas quis se manter dentro do regulamento, caminhando lentamente sobre o carpete, desviando-se das manchas de sangue sempre que conseguia.


- Se Strobie já acabou de vomitar, pergunte-lhe em que direção fica a suíte principal.


- No fim do corredor à esquerda, - informou Hermione - mas o porteiro continua lá no saguão, botando as tripas pra fora.


- Arrume um balde para ele e depois vigie o elevador e a porta de entrada.


Gina seguiu pelo corredor. O cheiro foi ficando mais forte, mais penetrante. Ela começou a respirar pela boca, por entre os dentes. A porta da suíte não estava trancada. Pela porta encostada dava para ver o brilho de lâmpadas artificiais e ouvir os sons majestosos de Mozart.


O que restara de Brennen jazia estirado sobre uma cama imensa, cercada por quatro colunas sofisticadas e um baldaquino espelhado. Um dos braços fora acorrentado a cabeceira da cama. Gina imaginou que os pés estivessem em algum lugar do espaçoso apartamento.


Sem dúvida as paredes eram totalmente a prova de som, pois o homem certamente berrara alto e por muito tempo antes de morrer. Quanto tempo teria levado, perguntou-se enquanto analisava o corpo. Quanta dor um homem era capaz de suportar antes que o cérebro se desligasse e desistisse de lutar?


Thomas Brennen deveria ter descoberto o tempo exato, com todos os segundos.


Estava completamente despido e uma das mãos e os dois pés haviam sido amputados. O olho que lhe restara estava virado para cima, como se fitasse com uma expressão de horror cego a imagem refletida de sua forma mutilada. Ele fora estripado.


- Meu Jesus Cristo! - sussurrou Hermione da porta do quarto. - Santa Mãe de Deus!


- Preciso do meu estojo de trabalho. Vamos lacrar tudo e dar o alarme. Descubra onde está a família dele. Entre em contato com a Divisão de Detecção Eletrônica, se possível direto com Neville, e peça para ele ligar o misturador de sinais antes de fornecer qualquer outro detalhe sobre o caso. Aliás, vamos manter os detalhes em segredo o máximo que pudermos.


- Sim, senhora. - Hermione teve que engolir em seco duas vezes para não colocar o almoço para fora.


- Vá pegar Strobie e mande-o ficar de bico calado, senão ele vai sair espalhando o que viu aqui para todo mundo.


Quando Gina se virou, Hermione notou um lampejo de pena em seus olhos, mas de repente aquilo passou e seu olhar era novamente duro e frio quando ela disse:


- Vamos à luta! Quero eletrocutar esse filho-da-puta!


 


Já era quase meia-noite quando Gina chegou, depois de se arrastar pelos degraus da frente. Seu estomago parecia estar em carne viva, os olhos ardiam e a cabeça rugia. O fedor de morte violenta parecia estar grudado nela, mesmo depois de ter se esfregado tanto sob o chuveiro do vestiário, antes de ir para casa, que quase arrancara fora uma camada de pele.


O que ela mais queria era mergulhar no esquecimento, e fez uma prece desesperada e sincera para que o que sobrara de Thomas Brennen não aparecesse a sua frente ao fechar os olhos para dormir.


A porta se abriu antes que ela tivesse a chance de alcançar a maçaneta. Moody apareceu diante dela com a silhueta recortada contra a luz fulgurante do lustre as suas costas. Seu corpo alto e ossudo parecia tremer de insatisfação.


- Seu atraso é imperdoável, tenente. Os convidados já estão se preparando para ir embora.


Convidados? Sua mente sobrecarregada lutou com a palavra antes de Gina se lembrar. Um jantar de gala?... Será que ela ainda ia ter de receber convidados em um jantar sofisticado, depois de tudo pelo que acabara de passar?


- Não enche o saco! - reclamou, passando direto pelo mordomo.


- Como esposa de Harry, espera-se que a senhora cumpra certas obrigações sociais. - Seus dedos esqueléticos a seguraram pelo braço. - Entre essas obrigações está a de anfitriã, ajudando seu marido a receber pessoas em jantares importantes como o desta noite.


A fúria derrotou a sensação de fadiga em menos de um segundo. Seu punho se fechou, ao lado do corpo.


- Sai da minha frente antes que eu...


- Querida Gina!...


A voz de Harry conseguiu transmitir boas-vindas, divertimento e precaução em apenas duas palavras, e interrompeu a trajetória do punho fechado de Gina, antes de ele atingir o alvo planejado. Olhando de cara feia, ela se virou e o viu na porta da sala de estar. Não foi a sua roupa preta e formal que a fez perder o fôlego. Gina já sabia que seu marido tinha um corpo musculoso e esbelto, capaz de fazer o coração de qualquer mulher parar de bater, não importa o que ele vestisse... ou não vestisse. Seus cabelos balançavam de leve, pretos como a noite e quase encostando nos ombros, emoldurando um rosto que ela sempre associava a alguma pintura renascentista. Harry tinha um físico admirável, olhos mais verdes do que esmeralda, a boca moldada para sussurrar poesia, dar ordens e levar uma mulher a loucura.


Em menos de um ano ele penetrara em suas defesas, destrancara o seu coração e, o mais surpreendente de tudo, conquistara não apenas o amor dela como também a sua confiança. E ainda conseguia deixá-la perturbada. Gina o considerava o primeiro e único milagre de sua vida.


- Cheguei atrasada. Desculpe. - A frase parecia mais um desafio do que um pedido de desculpas e foi lançada com a força de uma bala. Ele aceitou a frase com um sorriso descontraído e a sobrancelha arqueada.


- Tenho certeza de que foi algo inevitável. - Estendeu-lhe a mão. Quando Gina atravessou o saguão para tocar nele, Harry sentiu-lhe a mão rígida e fria. Em seus olhos com a cor de uísque notou fúria e cansaço. Ele já se acostumara a ver as duas coisas em seu olhar, mas ela também estava pálida e isso o deixou preocupado. Percebeu que as manchas escuras em seus jeans eram de sangue ressecado e torceu para que não fosse o dela.


Dando em sua mão um apertão afetuoso e íntimo, ele a levou aos lábios, com os olhos fixos nos dela.


- Você está muito cansada, tenente. - murmurou com um vestígio do mágico ritmo irlandês na voz. - Nossos convidados já estão se retirando. Quero apenas alguns minutos seus para as despedidas... pode ser?


- Claro... tudo bem. - Começou a se sentir mais calma. - Desculpe-me por ter estragado a sua noite. Sei que era um jantar importante. - Atrás dele, na sala de estar magnificamente mobiliada, ela viu umas dez ou doze pessoas, homens e mulheres elegantes, vestidas de modo formal, cobertas de jóias cintilantes e sedas sussurrantes. Um sinal de relutância deve ter transparecido em seu rosto sem que ela conseguisse evitar, pois Harry riu, dizendo:


- São apenas cinco minutos, Gina. Duvido muito que isso seja mais duro de enfrentar do que o que você viu esta noite, o que quer que tenha sido.


Empurrou-a com delicadeza em direção a sala. Harry era um homem que se sentia tão a vontade em ambientes ricos e cheios de mordomias quanto em meio ao fedor de becos violentos. Sem perder a pose, apresentou a esposa aos que ela ainda não conhecia, deu-lhe as dicas dos nomes dos convidados aos quais ela já fora apresentada anteriormente e, ao mesmo tempo, foi encaminhando os convidados para a saída com toda a classe.


Gina sentiu o aroma de perfumes caros e vinhos finos, além do cheiro agradável das toras de macieira que ardiam discretamente na lareira. Por baixo de tudo, porém, a lembrança sensorial do sangue e dos coágulos permanecia em seu nariz.


Harry se perguntou se Gina tinha consciência de sua presença incrivelmente marcante ali em pé entre os brilhos e as jóias, com o seu casaco de couro surrado, os jeans manchados e os cabelos curtos despenteados que circundavam um rosto pálido, com olheiras e ar cansado, e um corpo sinuoso que tudo agüentava com firmeza, em uma mostra de pura força de vontade.


Ela era, pensou ele, a coragem em forma de gente.


Quando a porta se fechou atrás do último convidado, no entanto, ela balançou a cabeça, desabafando:


- Moody tem razão... eu não estou preparada para a missão de ser a esposa de Harry.


- Mas você é a minha esposa de verdade.


- O que não significa que sou boa no papel. Deixei você na mão... devia ter... - Parou de falar, porque a boca de Harry já estava pressionada contra a sua, quente e possessiva, até desfazer os nos que sentia na nuca. Sem perceber, Gina já colocara os braços em torno da cintura dele e se deixou ficar ali, largada.


- Pronto. - murmurou ele. - Assim é melhor... esses são os meus negócios. - Levantou o seu queixo, passando o polegar de leve sobre a covinha em seu queixo. - Esse é o meu trabalho. Você tem o seu.


- Mas era um lance importante. Uma fusão de duas empresas ou algo assim, não era?


- A fábrica Scottoline. Na verdade, foi mais uma transferência de controle acionário, mas isso só deve ser resolvido na semana que vem. Deu tudo certo, mesmo sem a sua encantadora presença a mesa do jantar. De qualquer modo, você devia ter avisado. Eu já estava preocupado.


- Esqueci... nem sempre consigo me lembrar, ainda não estou acostumada com isso. - Enfiou as mãos nos bolsos e caminhou por toda a extensão da sala, voltando em seguida. - Realmente ainda não me acostumei. Às vezes penso que sim, mas então percebo que não. Especialmente quando entro em uma sala lotada de multimilionários e me sinto uma mendiga.


- Nada disso, você parecia uma policial. Creio que vários dos nossos convidados ficaram muito impressionados com a ponta da arma que viram saindo do coldre, por dentro do seu casaco, bem como com as manchas de sangue em seus jeans. Sangue, aliás, que não é seu, eu espero...


- Não. - De repente, ela sentiu que não se agüentava mais em pé. Foi em direção a escada, subiu dois degraus e se sentou. Como era Harry que estava ao seu lado, permitiu-se cobrir o rosto com as mãos.


- Foi tão ruim assim? - perguntou ele, sentando-se ao seu lado e passando o braço sobre os seus ombros.


- Muitas vezes nós dizemos que já vimos algo tão horripilante ou até pior, e quase sempre é verdade. Dessa vez não dá para falar isso. - Seu estômago continuava embrulhado. - Nunca vi nada pior.


- Quer me contar? - Ele conhecia as coisas com as quais ela convivia e já assistira pessoalmente a muitas delas.


- Não, por Deus, não... não quero nem pensar no assunto, pelo menos por algumas horas. Não quero pensar em nada.


- Nisso eu posso ajudar...


- Aposto que pode. - Pela primeira vez em varias horas, ela sorriu.


- Vamos começar logo, então. - propôs ele, levantando-a no ar e colocando-a no colo.


- Não precisa me carregar não. Estou bem.


- É que talvez isso faça eu me sentir mais viril. - Lançou-lhe um sorriso, enquanto começava a subir as escadas com ela nos braços.


- Nesse caso... - Ela enroscou os braços em volta do pescoço dele e deixou a cabeça repousar sobre seu ombro firme. Aquilo era gostoso. Muito gostoso... - O mínimo que eu posso fazer, depois de ter deixado você na mão esta noite, é fazer com que você se sinta mais viril.


- Sim, isso é o mínimo. - concordou ele.


 


 

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.