Capítulo Único
“Desprezível, é isso que você é.”
Foi o que tive vontade de gritar quando nossos olhares se encontraram enquanto ele adentrava o salão principal para o café da manhã. Scorpius Malfoy era daquele tipo que, por onde passa, arranca suspiros de quase todas as garotas presentes. Digo quase porque eu não estava incluída nessa lista. Sei bem o tipo de caráter que os Malfoy têm. Sempre agindo em prol de seus interesses, não importando a conseqüência de seus atos para as pessoas ao redor. Antes de embarcar pela primeira vez no expresso de Hogwarts, meu pai me avisou para não ficar muito amiga dele, o que eu achei desnecessário, pois nem amiga eu seria. Alvo, meu primo, de vez em quando conversa com ele. Aposto que faz isso só para me irritar posteriormente com aquele discurso de que eu deveria ser menos preconceituosa e pelo menos dar uma chance a ele. Haha, faça-me rir.
No meu primeiro ano em Hogwarts, vi de perto como ele era. Na aula de quadribol dos primeiranistas, Scorpius ficou se gabando sobre como sempre assistia os jogos dos melhores lugares nos estádios junto com seu pai. Disse também que durante a vida toda treinou quadribol com seus primos, que segundo ele, são jogadores profissionais, e por isso deveria ser chamado para a equipe da Sonserina logo depois que todos evidenciassem esse fato. É óbvio que isso não aconteceu. Na verdade, dei boas risadas quando ele caiu de sua vassoura.
Nos anos que se seguiram, evidenciei sua crescente popularidade. Cheguei a comentar com Hugo que ele provavelmente estava fazendo garotas se apaixonarem por ele com algumas das famosas poções do amor da loja dos nossos tios, embora soubesse que, na verdade, era porque ele estava ficando a cada dia mais bonito. Um dia, enquanto almoçava, percebi que ele olhava para mim e retribuí com meu olhar mais arrogante. Acho que ele percebeu, pois não tornou a olhar.
Mas, de todos os motivos que possuo para desprezar Scorpius Malfoy, além de toda a má fama de sua família e da maneira como ele parece se sentir superior a tudo e a todos, o pior é uma conversa que tivemos há um mês atrás. Eu me dirigia ao salão principal para o almoço junto com Alvo, Tiago e Hugo, quando ele apareceu e começou a conversar com meus primos e meu irmão. Ele tinha um ar de insolência que me irritava mesmo de longe, e a maneira como me lançava olhares furtivos dava-me vontade de perguntar a ele se havia perdido alguma coisa, e foi o que fiz.
- Rosie! – Hugo reclamou logo depois que perguntei, embora ainda não saiba o porquê. Não era eu que estava sendo mal-educada. Malfoy riu e respondeu:
- Acho que mesmo estando em Hogwarts por quatro anos, nunca fomos apresentados direito. Sou Scorpius Malfoy. – dizendo isso, ele estendeu a mão, a qual ignorei e respondi com ar de deboche:
- Jura?
Os três me olharam incrédulos. Scorpius riu novamente e falou:
- Rose, o que eu te fiz? Mal me conhece e me trata tão mal, percebo a maneira como você me olha e como se afasta de mim quando tento me aproximar. Sei que nossos pais não eram os melhores amigos, mas isso não quer dizer que devemos ser iguais a eles.
Alvo, Tiago e Hugo concordaram. Foi a minha vez de ficar incrédula.
- Escuta Scorpius, já ouvi o suficiente sobre pessoas do seu tipo para poder dizer que te conheço. Não tenho que aturar sua petulância, tentando se aproximar de mim e ficando amiguinho das pessoas com quem ando. Você me irrita, Malfoy, me irrita desde aquela aula de quadribol que você ficou se exibindo para todo mundo. Era isso que você queria ouvir?
- Isso foi no primeiro ano! – ele rebateu - E eu nunca te fiz nada, garota louca. Você não tem motivos para não gostar de mim. Pode pensar que conhece minha família, mas a mim você não conhece.
- Ele tem razão, Rosie. – disse Alvo. Logo Malfoy se afastou de nós e foi para a mesa da sonserina. Nenhum dos três falou comigo durante o almoço, o que me irritou.
Agora Scorpius Malfoy acha que pode deixar minha família contra mim. Desprezível.
Depois do almoço, fui com Lily até a cabana de Hagrid, mas ele não estava. Então sentamos na grama e ficamos admirando a floresta negra. Já estava perto do sol se pôr, a vista perto da copa das árvores era estonteante. Estava completamente absorta na paisagem quando Lily me perguntou algo que, nem preciso falar, não gostei nada.
- Rosie, qual o problema com Scorpius?
- Lily... – respondi, tentando manter a calma - Problema nenhum.
- Então por que o trata tão mal?
- Olha, francamente... O que Alvo te contou?
- Da sua repentina raiva quando ele tentou falar com você mês passado. Ele achou desnecessário.
- E quem é Alvo para dizer o que é ou não é necessário?
- Calma Rosie. Só queria entender seus motivos. Não queremos que fiquem falando coisas ruins de você. Sabemos que gosta de ficar na sua e que não se incomoda em socializar ou fazer vários amigos, sabemos que está satisfeita com os que tem. Mas agindo dessa maneira, você vai afastar as pessoas de você e levá-las a ter uma opinião errada. Scorpius é legal, por que não dar a ele uma chance? Não precisa ficar amiga nem nada, mas o que custa tratá-lo bem?
Às vezes, Lily era inacreditavelmente sábia para a sua idade. Mas na hora não cheguei a pensar nisso, pois estava chorando. Sempre fazia isso quando percebia o quão errada eu estava em relação a algo, partia o meu coração mais do que qualquer coisa e eu nunca soube como aceitar. Mas talvez nesse momento eu não estivesse chorando só por causa disso.
- Rosie, o que houve... - mas ela não teve tempo de terminar a frase.
- Droga, Lily! Será que você não percebe? Eu não odeio Scorpius, só gosto dele mais do que deveria!
Levantei e saí correndo enquanto as lágrimas caíam. Lily provavelmente estava parada no mesmo lugar, sem acreditar no que ouvira, mas quem se importava? Ao invés de voltar para o castelo, segui para o corujal. Pela hora, era difícil que houvesse alguém ali, então eu ficaria sozinha. Mas eu estava errada. Quando adentrei o lugar, em soluços, uma figura loira e solitária contemplou-me com os olhos arregalados. Era Scorpius.
Na mesma hora me dirigi em direção à saída. Era tudo que eu precisava, agora ele me vira chorando e devia me achar uma pessoa muito fraca. E se tem algo que eu odeio parecer é fraca. Mas ouvi passos atrás de mim, e uma voz chamando pelo meu nome. A voz me segurou pelo braço e não me deixou continuar. Ele me virou para ele e perguntou o que estava acontecendo. Havia preocupação em seu olhar, e era algo sincero, eu conseguia perceber.
Algo sincero vindo de um Malfoy. Chegava a ser cômico.
- Rose, o que foi?
- Me larga, Malfoy.
- Não até você dizer por que está chorando.
- Já mandei me largar, Malfoy.
- Você tem cachos ruivos muito bonitos, sabia?
- Pare de debochar da minha cara, Malfoy. E se disser uma palavra sobre isso a alguém, juro que quebro sua cara.
Não costumo usar esse tipo de palavreado, e nunca nem quebrei a cara de alguém, mas achei que uma ameaça cairia bem naquele momento. Malfoy apenas riu. Como eu odiava aquele risinho irônico. Mas ao mesmo tempo, era tão charmoso... Nesse momento eu fitei os seus olhos e ele fitou os meus, que estavam marejados de lágrimas. Era incrível como eu já não me importava em passar os dias pensando nele, e já não me culpava pelo o que minha imaginação criava durante os meus sonhos. Ignorava o que sabia que diriam se descobrissem, e afastava os pensamentos que me faziam sentir tola. Porque, no mais fundo da minha alma e do meu coração, existia algo que absorvia os pensamentos e os sentimentos. Eu não podia impedir, porém não os deixava transparecer. E não é assim que faz o negrume da noite? Não esconde toda a luz, o verde das folhas e o azul do mar? Assim eu fazia, para ele não ver em meu rosto o que não podia saber.
Já havia admitido para mim mesma, mas não admitia e nem iria admitir para o mundo.
Porém, nesse momento eu soube que ele sabia o motivo do meu choro. Soube que havia descoberto, apenas olhando nos meus olhos. E eu descobri então, que ele fazia o mesmo que eu. E seu interior era tão negro quanto o meu. Scorpius gostava de alguém, sabe-se lá por quanto tempo, que apenas o desprezava sem motivo algum. E esse alguém era eu, que achava que nunca seria amada por ele e nem valorizada. Ele só me abraçou, e eu parei de chorar, mas sem jeito de retribuir o abraço com o mesmo carinho. Aproveitei os minutos que ficamos ali para reparar em como seus cabelos tinham um cheiro doce, em como sua pele era macia e na maneira como sua respiração estava acelerada. Enquanto seus braços ainda me envolviam, ele disse:
- Rosie... – ele hesitou, parecia não querer escolher alguma palavra errada – eu posso te ouvir por quanto tempo quiser. Ou simplesmente posso ficar calado. Bem... Eu não sei bem o que dizer. Mas eu estou aqui, eu não vou deixar você ir embora. Pode me dizer as coisas ruins que quiser ou pode quebrar a minha cara. Eu só não quero que...
- Malfoy, - eu o interrompi- acho que te devo desculpas. Durante esse tempo todo, eu só não sabia como agir, e você sempre tão legal, com tantas garotas mais bonitas em volta de você... Pensei que nunca fosse reparar em mim e criei minha própria forma estúpida de defesa.
Estava chorando de novo, mas silenciosamente dessa vez. Então, ele respondeu:
- Ah Rose, não chore. Você pode não perceber, mas é mais bonita do que todas elas juntas. Eu percebi isso naquele dia na plataforma 9 ¾, e teria lhe dito se você me desse uma oportunidade. Mas eu entendo. E agi sem pensar quando nos falamos perto dos seus primos naquela outra vez, não queria te ofender.
Talvez fosse um sonho, eu não sei. Mas Scorpius me beijou e foi a melhor sensação da minha vida. Ele gostava de mim tanto quanto eu gostava dele. Ele me admirava de longe da maneira como eu o admirava, apenas tinha mais coragem do que eu para admitir seus sentimentos - coisa que nunca esperei de um Malfoy. Eu sei que ainda vou me surpreender mais com ele, da mesma maneira que as pessoas vão se surpreender quando verem Rose Weasley e Scorpius Malfoy entrando em Hogwarts de mãos dadas.
Meu pai não vai gostar nada, mas quem se importa? Eu não.
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