Capítulo Único



Nadinne

 
Estava começando a escurecer, já era possível observar o brilho pálido da lua e das estrelas mesmo em seu reflexo se projetando no lago negro. Deixei meus pensamentos se perderem por um momento e depois me deitei na grama sem me importar que desarrumasse meus cabelos. Já havia se passado meia-hora, e nem sinal dele. Ele não viria, e eu apenas estava ali me iludindo. O momento em que eu diria um adeus definitivo a Tom estava chegando e eu sentia isso no fundo do meu coração, junto com a mais angustiada das dores. A cada vez que eu olhava em seus olhos,  enxergava ali que eu não poderia mais estar com ele e ele não poderia mais estar comigo, nenhum dos dois estava disposto a mudar pelo outro. Mas eu o amo, o amo porque também vejo nele algo que nem ele sabe que possui e talvez eu não saiba o que é. Existe algo bom naquela alma sombria, mas é algo que eu não sou capaz de despertar.


Olhei para o céu e observei que era como eu e Tom. Tinha uma parte azulada e límpida, e uma parte negra. Em alguns pontos chegavam a se misturar, mas na maior parte uma respeitava o limite da outra. E era engraçado como uma hora tudo ficaria negro, e depois tornaria a ser somente azul, por muito pouco tempo as duas enfeitariam aquele céu ao mesmo tempo. Era exatamente como eu e Tom.


 


Tom

Meia-hora atrasado. Desci correndo as escadas e quando cheguei aos portões do castelo, pude observá-la deitada na grama e admirei de longe a maneira como seus cabelos castanho-claro estavam desarrumados emolduravam seu rosto tão alvo. Conforme me aproximei, percebi que estava pensativa. Havia tanto tempo que eu e Nad não ficávamos a sós que pensei ter me esquecido do perfume natural de sua pele ou do brilho de seus olhos. Mas agora ficar com ela me dava uma estranha sensação de estar fazendo algo errado. Como posso explicar? A vida inteira fiz coisas erradas, mas sentia culpa pela primeira vez na vida. Era como se eu pudesse fazer mal à Nadinne, corroer sua alma tão benéfica e tão linda com tudo de ruim que havia em mim. Nunca me importei com ninguém nesse mundo, mas desde que éramos duas crianças que por acaso estavam sozinhas no compartimento de um trem, eu me importava com ela. E talvez, talvez eu a amasse. Embora eu não saiba se amor é algo que alguém como eu pode algum dia sentir. Agora, cinco anos depois, ela ainda insistia em fazer parte da minha vida e se mostrava magoada quando dizia não ter mais tanto da minha atenção. Embora venha notando, ela tem parado com isso ultimamente. Talvez tenha percebido finalmente do que já me toquei faz algum tempo, mas ainda assim ela me pediu para que viesse falar com ela hoje, e o que eu faço? Me atraso.Sentei-me ao seu lado, ela não disse nada. Então comecei:
          — Desculpe.

          — Por que se atrasou?- ela perguntou-.


          — Detenção.


          — A verdade, Tom.- disse ela com um tom decepcionado na voz-.


          — Estava com Macnair e Lestrange, perdi a hora. Me desculpe, Nad.


 Ela se levantou e se sentou do meu lado, inesperadamente ela me abraçou e respirou fundo.


          — Por quanto tempo ainda vou poder te abraçar? Quanto tempo falta antes que eu perca você para sempre? A cada dia que passa seus olhos escurecem mais e seu rosto fica mais pálido. Você passa mais tempo com esses seus amigos que sabe que não gosto. E eu não sei o que você tanto faz e o que tanto planeja, Tom Riddle, eu só sei que não é bom.


 E ela tinha razão, não era mesmo. Mas era o que eu queria e o que tinha que fazer, Nadinne nunca entenderia isso, e eu não exigiria dela de maneira alguma que o fizesse. Apenas a abracei e permaneci em silêncio, ela também. Sei que observava o mesmo que eu, observava o dia dar lugar a noite. Nadinne deu lugar a mim em seu coração, de forma que eu não merecia. Meu coração sempre foi todo dela, e ela sempre mereceu mais do que o amor de alguém como eu. Por todos esses anos, ao lado dela eu soube o que era felicidade, porque eu via naqueles olhos azuis brilhantes e sinceros. Nadinne era minha melhor amiga e talvez, só de pensar eu enrubescia, talvez fosse até minha namorada. Embora nunca nem eu e nem ela tenhamos mencionado esse termo em nenhuma das vezes em que por acaso nossos lábios se encontravam e permaneciam juntos por segundos, minutos, e às vezes, até horas. Eu nunca conseguiria sentir alguma coisa por ela diferente de admiração, carinho, instinto de proteção e, talvez, amor.


            — Nadinne, me perdoe. – Implorei, com um tom de voz que só conseguia utilizar com ela-.


            — Não me importo com seu atraso, Tom Riddle. Me importo com o que você faz. Será que você não enxerga o mal que isso faz a você? E que não te leva a lugar nenhum? Eu te conheço o suficiente para saber que talvez essas palavras não vão fazer a menor diferença, mas eu te amo o suficiente para tentar. Porque eu não quero que você se perca nesse vazio que existe dentro de você, eu quero que você use o seu potencial para coisas boas. Tom, eu convivo com você cinco anos da minha vida, não é pouco. Eu acho que mereço saber o que você planeja fazer com a sua alma.


            — Nunca teria capacidade de te magoar conscientemente, Nad, não me peça isso.

            Ela confessou. Confessou que me amava, e eu não conseguia nem admitir isso para mim mesmo. Nadinne era mais forte do que eu, sempre foi. Eu a abracei mais forte e tornamos a permanecer em silêncio, agora já tinha escurecido completamente. Diante daquilo tudo, eu disse o que sabia que ela merecia ouvir, e eu sabia que era a verdade.


           — Eu te amo. Como não mais irei amar a alguém, como não posso amar. Eu tenho que te deixar livre para seguir o seu caminho, que é cheio de coisas boas, que você merece. Sou apenas um atraso de vida, um empecilho para você. Eu não vou mais ficar na sua vida te atrapalhando, eu sei que é melhor assim.


Nadinne


Doía saber que ele estava certo. Doía ver a escolha que ele fazia. Escolhia seguir seu caminho qualquer que fosse e me deixar para seguir o meu. Da mesma maneira que o céu escurecendo, o azul e o preto convivemm por tão pouco tempo juntos, mas não há nada mais que seja tão lindo. Nem o céu completamente azul e enfeitado com nuvens, nem o céu completamente escuro enfeitado com as estrelas e com a lua. Talvez ele tenha tentado mudar por mim, eu não sei. Mas acho que estava na hora de aceitar que já não era possível ficarmos juntos, e isso era para o meu bem.
Depois de um tempo, eu percebi que estava chorando. E ele chorava também. Eu sabia, no fundo do coração que aquela era a única vez que Tom Riddle choraria em toda a sua vida. Ele me olhou bem fundo nos olhos, e pela última vez, nós dois nos beijamos. Foi algo calmo, mesmo sendo um beijo de despedida, não sei dizer por quanto tempo mais ficamos ali. Por fim, ele me deu um último abraço e olhou nos meus olhos. Nunca mais dizemos uma palavra um ao outro. Eu me levantei e fui embora, tirando os últimos fiapos de grama do cabelo e secando as últimas lágrimas dos olhos, ele continuou ali por um tempo antes de ir embora também. Nos outros dias, mal nos olhávamos nos raros momentos em que nos víamos. No meu último ano em Hogwarts, não mais as lembranças dos nossos dias felizes me afetavam tanto, embora eu nunca as tenha esquecido. E acho que Tom já não era capaz de ter algum sentimento diferente de raiva, ódio, e daquele desejo insaciável por poder.


 Tom


  Eu observei meu céu azul se afastar sem olhar para trás, e quando a perdi de vista, continuei ali olhando para o lago negro até decidir que me esforçaria para não cruzar com Nad enquanto estudássemos em Hogwarts. Não seria muito difícil, com ela na Corvinal e eu na Sonserina. Depois que saíssemos da escola, eu ia tentar me esquecer dela o máximo possível, isso eu não sabia se conseguiria. Uma coisa era certa, eu sentiria falta da única pessoa que na minha vida, fez alguma diferença para mim.

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