Lanche de Confusão



N/A:Sim, eu sei que já faz um século que eu não posto.Nem vou me deter em falar sobre a bagunça que deu no texto da fic.Primeira coisa, isto é só mais um maldito preview, não está com as devidas correções além de ser o cap. incompleto. Até a parte em que estou transcrevendo pro pc, acho que dará uns dois capítulos, este inteiro e o terceiro, então quando finalmente postar serão os dois de uma vez. Desde já agradeço a quem tiver paciência de ler.kkk XD


 


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A bronca não foi pequena. Harry teve mais ou menos uma idéia do que estava por vir ao receber um olhar mortífero de Valter Dursley e um sibilante “para dentro, agora” que produziu um sorriso de satisfação no rosto de Duda. Como era de se esperar, ele foi acusado de ter provocado o blecaute, mesmo dizendo que não podia fazer magia fora da escola (embora os Dursley soubessem disso), seu tio ameaçou jogá-lo no barraco de ferramentas além de alimentá-lo apenas com pão dormido e sobras das refeições se voltasse a chegar tarde. Ficou bastante claro que isso queria dizer na verdade, ”depois de Duda”. Depois do carão, subira as escadas com certa dificuldade, ainda sob ameaças por parte do tio, indo diretamente ao banheiro para lavar os braços esfolados, que por algum motivo não foram notados pelos Dursley. Enquanto via o sangue misturado à água escorrendo pelo ralo,ficava cada vez mais difícil manter os olhos abertos, mas os arranhões ardiam demais para que pudesse ignorá-los.Porém,só se deu conta do estado em que estava quando,ao entrar no próprio quarto, passou na frente do espelho embutido no armário. Seu rosto estava pálido como de um cadáver e, a menos que estivesse bêbado, podia jurar que a coloração de seus olhos estava desigual,quase como se estivessem desbotando.Ao invés do verde vibrante, o espelho refletia íris quase cinzentas por trás dos óculos redondos,além de estar com olheiras fundas como se não dormisse a séculos. De alguma forma esquisita, estava praticamente murchando diante dos próprios olhos. Naquele momento não tinha a menor idéia do que estava causando tal efeito, embora soubesse que artes das trevas eram capazes de debilitar uma pessoa àquele ponto. Sem dúvida, teria se dado muito mal não fosse por Edwiges. A coruja voltou da caçada com o jantar no bico bem na hora em que Harry já começava a entrar em pânico. Sem a menor cerimônia, largou o rato morto por cima do Profeta Diário(o qual passara a receber desde o dia anterior) e voou com tudo pra cima do garoto, piando histericamente e dando-lhe dolorosas bicadas até fazê-lo tropeçar e cair no chão com um baque surdo. Levantou-se pronto para ralhar com a coruja quando viu o que parecia ser um peso de papel rolando em direção à cômoda. Era uma pequena pirâmide prateada sob base redonda de madeira escura e reluzente onde estavam gravados símbolos em baixo relevo de tamanho e formas variadas.Ao tentar pegá-la, sentiu uma espécie de puxão nos dedos que o fez soltar na mesma hora.Foi como se tivesse enfiado a mão dentro da mangueira de um aspirador de pó. —O que está acontecendo aí, moleque?—Tio Valter berrou ao esmurrar a porta do quarto. —Nada, eu tropecei num livro. —inventou a primeira coisa que veio à cabeça.Tinha que dar um jeito de esconder aquilo antes que seu tio inventasse de querer entrar pra averiguar a veracidade de suas palavras. Talvez pudesse usar algo para enrolar e guardar o objeto até que pudesse mostrar a Sírius ou o prof. Lupin. Chutou o malão e achou o que precisava em cima do livro de feitiços:uma meia espalhafatosa que havia ganhado de Dobby no natal passado, muito grande para o seu tamanho(embora ele nunca tencionara fazer uso dela). —Se eu descobrir que está armando alguma coisa estranha aí dentro, vai se ver comigo! Harry queria ter dito “não enche”, mas achou mais prudente ficar calado. Sentiu alívio ao ouvir os passos de tio Valter morrendo à distância. Não lhe passou despercebido o aviso que recebera. Seu tio pretendia vasculhar o quarto quando bem entendesse, embora Harry duvidasse que ele conseguisse fuçar as suas coisas sem ter um ataque cardíaco. Mesmo assim não pretendia deixar seus pertences jogados para que ele pudesse mexer à vontade e aquela coisa no chão era o item menos recomendável para permanecer à vista. Pisou num pedaço de tecido macio e abaixou-se para pegá-lo. Parecia o saco onde estivera a mini pirâmide, tinha uma cor preta um pouco suja devido à poeira a que ficara exposta, mesmo na caixa e alguns números rabiscados em branco no canto direito. Ao levantar a cabeça notou através do espelho, com certa incredulidade, que seu rosto voltara ao normal. Na manhã seguinte, lá pelas nove horas, Harry descia as escadas com a segunda rodada de roupas sujas. Depois de limpar o banheiro de Duda, que recendia a urina e pasta de dentes (o de seus tios estava limpíssimo), teve que catar tudo que ele deixou jogado no chão. Havia livros, pedaços de papel, um isqueiro de aparência cara e peças de roupa para todo lado.Entre elas, uma cueca com estampa de Mickey do comprimento de uma capa de travesseiro lhe provocou risos e uma outra, amarrotada embaixo da cama, tinha uma mancha amarelada que ele não quis nem imaginar do que seria, tomando o cuidado de usar uma das camisas para pegar e juntá-la ao monte. Mesmo enrolando as peças suadas(ou com alguma sujeira suspeita),a montanha de roupas fedia muito,nem Petúnia pôde ignorar. Harry teve que fazer um esforço monstro para não rir na cara de sua tia quando a viu franzir o nariz e, a exemplo dele, pegar as roupas com a ponta dos dedos, jogando-as diretamente na máquina de lavar. Infelizmente ele não teve mais motivos para rir naquela manhã. Chegando à frente do banheiro de hóspedes, o último cômodo que ele devia limpar, pousou o balde no chão e abriu a porta agradecido por este não estar muito sujo.Ou era o que ele pensava. Assim que porta escancarou, um odor nauseabundo exalou do banheiro obrigando-o a recuar puxando a gola da camisa sobre o nariz.Tinha certeza que Duda também dera uma passada por ali depois do café. Exceto quando tia Guida vinha visitar—e nessas ocasiões era ele quem realizava a limpeza, uma vê que tia Petúnia fingia convenientemente que tal banheiro não existia—somente ele usava-o. Ia ser um longo dia, pensou suspirando, arrependendo-se imediatamente. Saiu correndo do banheiro, espumando de raiva ao descobrir tarde demais que a camisa era uma barreira inútil contra o fedor estagnado. Duda ia lhe pagar por essa.Ah, se ia. O sol já ia alto no céu quando Harry se livrou das roupas fedidas e do banheiro imundo.Gastou quase todo o desinfetante que tia Petúnia usava, mas conseguiu acabar com o cheiro repugnante e agora o banheiro de hóspedes exalava um aroma fresco de lavanda. Depois da inspeção—sua tia parecera decidida a achar qualquer coisa para prolongar o castigo, mas por mais que procurasse não achou nada e acabou desistindo—tomou um banho apressado, vestiu a primeira roupa que viu pela frente e saiu antes que ela desse conta de sua ausência. Esta manhã, enquanto guardava alguns livros no malão, encontrara o saco de veludo onde o objeto que pegara nos escombros—uma pirâmide em miniatura—estivera enrolado. Devia ter colocado lá depois de jogar seu conteúdo junto com a bagulhada da escola. Noite passada foi dormir tarde, tinha sido um sufoco só para pegar a piramidezinha do chão, pois toda vez que tentara manuseá-la, a sensação de sucção reaparecia, mas de alguma forma conseguiu removê-la para dentro de um pé de meia velho. Enquanto andava, retirou-o do bolso para examinar melhor os detalhes que não havia percebido antes. As letras “E.H.” bordadas em azul turquesa cintilavam em contraste com o fundo escuro, mas era difícil notá-las à noite ou só com o toque dos dedos devido à espessura. Os números no canto esquerdo, escritos com tinta branca, pareciam uma seqüência, como num código de barras.Obviamente ele não fazia idéia do que poderia significar. De qualquer forma, tinha que voltar aos escombros e ver se encontrava—embora duvidasse muito—alguma coisa que indicasse o que exatamente era aquela bomba de magia negra. Dobrou a esquina da rua das Laranjeiras, na qual os olhos de uma senhora faiscaram raivosos em sua direção e continuou o caminho até a praça Broule. Àquela hora, apenas o pipilar de pássaros tardios e os gritos de um grupo de crianças eram ouvidos por ali.O trailer estava fechado—a lanchonete só abria a partir das três da tarde, com exceção dos fins de semana e feriados, quando funcionava o dia inteiro—seu teto servia de poleiro para alguns pombos particularmente grandes que observavam os garotos jogando bola. Uma placa dupla na esquina da rua à esquerda indicava Praça Broule/Rua das Hortênsias em caprichosa letra preta. Harry reconheceu a rua gêmea da Alfeneiros,com suas caixas de correio azuis e residências de cores suaves.Em uma delas, o número 15, a mesma mulher gordinha que ele vira fofocando noite passada espiava os transeuntes através da cortina, a qual fechou bruscamente ao perceber que ele notou. Imaginou qual seria o novo alvo dos mexericos dela, que, aliás, provaram-se verdadeiros.Depois que seu tio descartara o jornal, conseguiu surrupiá-lo furtivamente, atraído pela reportagem sobre o blecaute da noite passada.Disseram que a causa foi um curto circuito com princípio de incêndio na rua das Tílias, mas não mencionaram nada sobre baderneiros ou criaturas estranhas por ali. Tinha a forte suspeita de que o Ministério estava mexendo os pauzinhos para abafar o caso. Ainda não havia esquecido o modo como Cornélio Fudge se comportara depois da história do falso Moody e do retorno de Voldemort, embora achasse que ele só estava sendo teimoso e que ainda ia cair em si depois de um tempo.Mas se realmente o Ministério da Magia estava por trás dos panos disposto a encobrir essa sujeirada, com certeza estavam cientes da movimentação em Little Whiging e pelo visto não se importariam em fazer vista grossa para os crimes contra trouxas em nome da “paz”.Só de pensar nisso já ficava espumando de raiva. Havia tentado escrever uma carta a Rony e Hermione, mas ficou tão aborrecido que não conseguiu pensar em como contar o que estava acontecendo sem mencionar como descobrira esses fatos da forma como ocorreu. Tudo que ouvia era o alerta inútil dos amigos. “Harry, isso foi muito perigoso! E se eles tivessem te pegado?” “Harry, cara, não sei, mas acho que você não devia andar por aí se as coisas estão desse jeito...” Conselhos que ele não ouviria. Não ia ficar sentado enquanto Voldemort e os Comensais estavam à solta esperando a melhor oportunidade de dar o bote. Harry já estava chegando à rua em que tivera o encontro com a criatura e o bruxo desconhecido. A placa que indicava o nome da mesma havia sido arrancada restando apenas o mastro no lugar.Ali haviam pequenas lojas que atualmente estavam fechadas, muitas com aviso de “em reformas” ou “mudamos para” seguido do nome de alguma rua. O prédio que agora ostentava um buracão provocado pelo impacto do corpo da criatura,era uma fábrica de sorvete,a esta hora em funcionamento.Vários homens se revezavam juntando os entulhos em carros de mão.Pareciam bastante mal humorados com o rombo na parede, a poeirada produzida pelos tijolos quebrados,fora o fato de terem que fazer os reparos debaixo daquele sol escaldante. Num dos prédios (onde se lia “Depósito têxtil Burberry”),um caminhão era carregado com caixas e rolos plastificados de tecidos das mais variadas cores enquanto um homem fazia anotações numa prancheta.Ao lado deste tinha outro depósito, mas havia somente uma placa com aviso de reforma no portão. Desviando a atenção dos trabalhadores, virou na primeira viela à esquerda.A rua Elmer não era realmente um beco como ele pensara.Tirando todo aquele amontoado de lixo que ocupava uma das laterais,dava pra passar um carro tranqüilamente.Em ambos os lados, haviam prédios antigos de apartamentos baratos e saídas de emergência enferrujadas que formavam um emaranhado metálico até o chão. Ao chegar na primeira esquina à esquerda, havia um grande pedaço de grade retorcida no chão,bem ao lado de outra lixeira.O metal trançado do restante da cerca ainda estava no lugar, escuro e retorcido assim como o que se encontrava no chão. Ao que parece o animal esquisito abrira caminho a fogo ao persegui-lo.Talvez em breve, os casos de incêndio se tornassem mais freqüentes que o normal.Talvez até os Dursley fossem atingidos—não que ele se importasse que a casa dos tios pegasse fogo.Só não queria estar lá dentro quando acontecesse. Em dez minutos avistou as ruínas da casa.Apesar de ser uma área cercada por prédios altos,a brisa era forte, o que levantava uma nuvem de poeira espessa de vez em quando.Não havia nenhuma residência—além daquela—por perto, a rua se resumia a galpões vazios ou lojas abandonadas. A tinta branca da fachada da casa, reluzia ao sol, contrastando com o interior depredado.O chão socado de pedregulhos parecia ainda mais íngreme, uma subida arriscada ponteada pelo brilho dos cacos de vidros em alguns trechos.A parede esquerda onde o espaço da janela ainda conservava as dobradiças enferrujadas,tinha um aspecto carbonizado obviamente camuflado à noite.Naquela área havia um detalhe no mínimo curioso:um desenho impresso nas cinzas.Harry não conhecia aquele símbolo, apesar de ter lhe parecido familiar. Enquanto tentava lembrar onde vira a figura, ouviu alguém tropeçar e xingar próximo às ruínas. —Ainda tá dormindo Órion?—perguntou uma voz de garoto.—Eu te disse que aquele chafé da dona Matsunaga não fazia efeito.Se alguém tomar aquilo pensando em ficar acordado...—bufou debochado. Harry escalou o terreno da maneira mais silenciosa que conseguiu—o que era realmente difícil devido à quantidade de pedras soltas.Por sorte seus escorregões eram abafados pela conversa do grupo.—e agachou-se perto do buraco na parede por onde saíra noite passada. —Eu não tomei aquele café.Foi cappuccino.—respondeu Órion com indiferença. —Hum, vejam como são as coisas.—Desta vez era uma menina quem falava,com grande ar de triunfo na voz—Os filhinhos de papai tomam C-A-P-P-U-C-C-I-N-O e nós, os mortais pobres, temos que nos contentar com café ralo feito com água de chuva. —Você não quis dizer “pobres mortais”?—disse uma outra garota. —Não, é mortal POBRE, de dinheiro mesmo.Somos a banda pobre dos mortais e o Órion faz parte da banda rica entendeu? —Ah.Mas no geral a gente não seria a banda podre da sociedade?—era outro rapaz. —Isso também.—Disse a primeira garota, como se fosse a coisa mais óbvia do mundo. —Então somos pobres e podres.—concluiu o garoto—E Órion é rico e podre. —Não, é podre de rico.—corrigiu uma das meninas. —E podre de pobre.—completou a outra. —Hoje,vocês é que estão podres.—disse Órion provocando risadas nos amigos. Que conversa idiota, pensou Harry mal humorado.Na verdade era ele quem queria estar batendo um papo sem noção com Ron e Mione ao invés de estar quase despencando de uma montanha de pedras enquanto tentava não ser visto. Eles chegaram à entrada da casa e andaram um pouco sobre as pedras,o som de cacos de vidro chegando aos ouvidos de Harry de vez em quando. —Mas falando sério gente.Não acho que a sra. Matsunaga além de pó de café velho use água de chuva...—falou uma menina. —Ainda quer discutir isso? —Espera aí ninguém falou em pó de café velho, Cody. Que história é essa? —... Se fosse verdade—continuou como se os colegas não tivessem falado—alguém já teria passado mal. Harry se esticou um pouco para ver onde estavam. Alguns metros abaixo quatro adolescentes davam uma olhada ao redor. Havia um garoto de touca escura, outro de jaqueta-canguru, uma menina de saia longa xadrez e a última, uma lourinha, parecia pronta para ir à aula de educação física metida num agasalho verde-folha. —Mas não dizem que água de chuva é mais limpa que água de torneira?—Quis saber o garoto de touca. Parecia um desses marginalzinhos que andam pichando muros. —Antigamente sim— disse a garota de saia xadrez— Mas hoje em dia com esse monte de lixo?Acorda Alan, estamos na era do caos e da podridão. —Cê também avacalha né Lídia.—Riu Alan. —Se não me engano, acho que ouvi Derick Allen reclamando de dor de barriga hoje de manhã. —Falou o garoto de capuz, pela voz, devia ser o que chamavam de Órion. —Isso não é nada. Os bichinhas da Carmel ficaram de cama depois de comer a sopa estragada que serviram ontem. — disse Alan. Órion bufou tentando conter o riso. Harry se sentiu um tantinho sortudo. Apesar de não se comparar à comida de Hogwarts, os pratos que sua tia fazia não eram estragados; andavam insossos sim, mas nunca colocou nada podre na mesa— nem para ele. —É mesmo aqui?—Indagou Alan pegando um pedaço de papelão do chão para forrar um bloco de cimento plano, onde se sentou. —nesse casebre todo acabado? —Pode estar acabado agora, mas isso aqui nunca foi um casebre. —disse a menina loira, a qual também reconheceu sua voz como sendo a de Cody, pulando em cima de alguns pedregulhos maciços. —Pelo tamanho do terreno, talvez... Classe média? —Sei lá, acho que depende do proprietário Lídia. Meu pai é que entende dessas coisas. —Explicou Órion. —Se a casa foi vendida depois que o cara que fez isso aí— indicou o desenho na parede com um gesto— se mandou, o preço pode ter baixado. Harry ficou sobressaltado ao ouvir as palavras de Órion. Somente bruxos se referiam às pessoas comuns como trouxas. Chegou a pensar se não havia imaginado aquilo até ouvir Lídia falar novamente. —Ou aumentado. —Ela ajeitou a boina vermelho vivo sobre os cabelos escuros e longos. —Todo mundo sabe que os trouxas são loucos por casas assombradas ou com alguma maldição, não é à toa que cobram até ingresso pra quem quiser pagar pra ver, se bem que na maioria das vezes não enxergam nada ou se dão mal. —É verdade. —concordou Alan. —Essa é a única construção detonada na área. —Afirmou Órion. Lídia se aproximou do desenho na parede e perguntou—O que cê acha da gente levar um pouco disso aí, hein Cody? A garota pulou por cima de algumas pedras, seus cabelos lisos presos nas laterais dançando no ar com o movimento. Ela resmungou alguma coisa que Harry não entendeu e se agachou, dispondo no chão o que lhe pareceu um estojo de ferramentas, do tipo que usava o técnico de computador que os Dursley chamavam ocasionalmente. Pensou um pouco e selecionou uma faca fina indo em seguida até a parede, a qual começou a raspar, depositando as cinzas num pequeno pote de vidro. —E dá pra descobrir só com isso?—perguntou Órion enquanto Cody recolhia o estojo e arrolhava a amostra, guardando tudo no bolso lateral da calça. —Unhum, papai me ensinou. É só jogar um pouquinho de Poção de Quebra nisto— Cody explicou sacudindo o vidrinho diante dos olhos—e saberemos na hora se foi efeito de Artes das Trevas ou simples incêndio. Órion chegou mais perto da figura e passou os dedos nas cinzas—Acho que é a primeira opção. —Sua mão estava ligeiramente afastada da superfície enquanto ele a movia de um lado para outro—Ainda dá pra sentir um pouco de vibração mágica saindo disso aqui, mas é melhor termos certeza antes de fazer qualquer coisa. —Já tem alguma idéia de quem pode ter sido?—Alan perguntou levantando-se e seguindo os demais rumo à saída. —Talvez... Não sei. —Disse depois de pensar um pouco—Vamos ao Brom’s mais tarde. —Decidiu de repente. —Aliás, vocês não deviam estar preocupados com outras coisas?Onde vão almoçar, por exemplo? —No Killgry é que não vai ser. —Disse Alan parecendo insatisfeito. —Daqui a pouco a dona Matsunaga serve uns ratos de porão no espeto e a gente ainda vai ter que fingir comer um pedacinho até ela dar as costas e podermos jogar em algum daqueles vasos de plantas. —Vixe, imaginem o suco. Com certeza feito de alguma fruta exótica de gosto esquisito. —Falou Cody em meio às risadas. —Kiwi?—sugeriu Lídia. —Kiwi não é ruim. —Cody estranhou o exemplo. —Mas passado do ponto deve ser uma beleza. —Tudo bem, eu já entendi o recado. De agora em diante vamos comer na casa da minha tia.—Declarou Órion risonho.—Só tenho que pensar numa boa desculpa. Harry esperou até que suas vozes se perdessem na distância para deslizar pelas pedras parando próximo o lugar em que Alan estivera sentado. Olhando de perto, o desenho não tinha o contorno tão preciso quanto lhe parecera minutos atrás. Na lateral esquerda o local raspado por Cody exibia pequenos caminhos em baixo relevo. Passou os dedos sobre os contornos imprecisos do desenho e se espantou ao sentir uma leve repulsão de ar entre sua pele e a parede ressecada. Os pêlos de seu braço estavam eriçados e pouco a pouco a palma da mão ficou suada, embora ele não sentisse calor vindo dali—era mais como se um vapor denso se desprendesse da superfície para sua pele. Ficou aliviado de ainda não ter enviado nenhuma carta, tinha que incluir uma observação a respeito dessa história. Todos esses anos morando em Little Whiging e nunca tinha visto nem ouvido falar de outros bruxos morando no bairro.E um deles estava distribuindo azarações a torto e a direito, enquanto ele não podia nem usar um simples feitiço de limpeza, relembrou desanimado. Os bruxos que vira a pouco pareciam saber alguma coisa sobre o que Voldemort andava maquinando, não seria nada mal descobrir o que era. Também estava muito curioso a respeito do tal teste que pretendiam fazer no pó de cinzas que recolheram da parede. O problema era saber onde poderia encontrá-los. Censurou-se por não ter tido a idéia de segui-los antes. A única pista que restava era o tal Brom’s a que haviam se referido e Harry só conseguia pensar em um lugar com nome parecido. Não custava checar. Enquanto ele caminhava de volta à Rua dos Alfeneiros perdido em pensamentos, uma figura sombria observava a cena silenciosamente. Quem passasse por ali veria apenas um sujeito de aparência suspeita, porém discreta, e, embora não pudessem acusá-lo de nada, teriam certeza de que “boa coisa não está fazendo”. Talvez até tivessem razão, entretanto ninguém chegou a ver o corpo pingando sangue que ele levou consigo para a escuridão do beco ou estranhou o cheiro misturado à fumaça que preencheu o ar minutos depois. Às sete da noite, Harry estava em frente à lanchonete lotada já considerando comer sentado num canteiro quando um casal se levantou e foi embora. Sentou-se na mesa rapidamente, antes que um extenso grupo que acabava de chegar, avistasse o lugar vago. Passou um tempo dando uma boa olhada nos outros fregueses ao mesmo tempo em que fingia ler o cardápio. Harry não viu nenhum dos bruxos que estavam nos escombros entre as pessoas que estavam nas mesas, nos bancos do balcão, muito menos nos bancos da praça que ficavam mais próximos do trailer. Eles podiam não ter chegado ainda, mas esse pensamento não conseguiu impedir a sensação de frustração que começava a queimar-lhe o estômago. Talvez fosse apenas fome,pensou enquanto a barriga direcionava seus outros sentidos para o menu, entrando em uma discussão mental consigo mesmo sobre o que queria e o que podia comer.Suas reservas de dinheiro trouxa rareavam a uma velocidade preocupante.Logo,logo teria que fazer bicos novamente para garantir comida ao invés das migalhas dormidas dos Dursley. Decidiu-se por uma porção de macarronada simples. Ia chamar a garçonete quando alguém falou com ele. —Com licença... Por um momento de insanidade achou que era Draco Malfoy quem estava a sua frente.Vestido numa jaqueta vermelhona e usando boné preto e branco do qual saíam os cabelos loiros claríssimos,o menino alto o encarava de volta sem qualquer sinal de reconhecimento,impassível diante do choque de Harry.Este, por outro lado, ficou piscando atordoadamente enquanto sua mente começava a processar os erros de identificação.Draco não tinha olhos azuis e duvidava que ele fosse deixar o cabelo crescer daquele jeito, além de não ter tantos fios assim na cabeça—Já aquele garoto os tinha em abundância. —...se podemos sentar aqui. A voz também era diferente—levemente mais grave—embora lhe parecesse familiar, apesar de não ter entendido boa parte do que ele falou.Ou melhor, nem se deu conta de que ele estava falando até aquele momento. —Como disse? —Eu perguntei se não há mais pessoas sentadas com você nesta mesa. Harry nem se deu ao trabalho de mentir, ele descobriria assim que notasse que ninguém estava voltando para a mesa e era perda de tempo guardar lugar pra gente que ele nem sabia se apareceria. A lanchonete estava completamente lotada e o máximo que poderia acontecer era eles darem uma passada apenas para comprar um lanche para viagem. —Não. —Então meus amigos e eu podemos sentar aqui?Todos os lugares estão ocupados... —Fiquem à vontade. —disse com uma calma que estava longe de sentir, resistindo ao ímpeto de dar o fora sem maiores explicações. Raramente conversava com outros garotos trouxas. Os que se atreviam a falar com ele geralmente nunca tinham ouvido sobre sua suposta má índole. Segundos depois Harry estava sentado na companhia do grupo mais esquisito que já tinha visto. À sua frente, um menino que devia ter uns 10 ou 11 anos arrancava nacos seguidos de uma barrinha de torrone, mas não foi isso que chamou a atenção de Harry. Desde que se entendia por gente seus tios viviam acusando-o de ser um delinqüente (mesmo que ele nunca tenha dado motivos para isso), mas se ele andasse como aquele moleque desde o ginásio, aí sim os Dursley iam pintar e bordar em cima dele. Metade de seu antebraço esquerdo estava coberto com pulseiras de espinhos metálicos; no pescoço, um crânio de metal pendia do cordão que lhe lembrou uma das coleiras que o cachorro de Tia Guida usava, e os cabelos escuros e lisos estavam achatados na altura dos olhos por um gorro onde se lia “Batedor nível 2”. Edward Readman ou simplesmente Ed, era, com efeito, uma figura notável, não só pela vestimenta(coisa que não era exclusividade dele naquele grupo pelo que Harry percebeu), como pela personalidade exuberante. Em poucos minutos Harry ficou sabendo que ele era perito em colas.Passara na recuperação do semestre passado numa boa e conseguira se livrar das provas no fim do ano passado com uma fina tira de papel de dois metros com mais respostas do que realmente precisava. —Eu tinha que me garantir, sabe como é.—ia dizendo cheio de razão—A professora era mó carrasca e a prova estava realmente difícil. Harry imaginou a cara de Hermione se ela escutasse uma história dessas. Ao lado de Ed sentava-se um garoto que aparentava ser o mais velho e tinha um visual no mínimo extravagante. O terno justo, as luvas e a gravata com listras vermelhas eram essencialmente negras, assim como seu cabelo liso e lustroso.Mas o pior de tudo é que ele usava batom e não parecia nem um pouco incomodado com os olhares que as pessoas ao redor lhe dirigiam. Harry ficou surpreso ao constatar que a maioria eram meninas que pareciam mais interessadas em outras coisas que não fossem o fato dele pintar os lábios.Na verdade pareciam nem ter notado tal detalhe. O nome dele era Yuri Schneider, era finlandês(o que explicava seu sotaque) e veio para a Inglaterra como estudante de intercâmbio, assim como os demais—Exceto Ed, que era britânico de nascença. Selene Louis, única menina do grupo, era uma versão punk de Alice, com seus piercings(dois no nariz e um na sobrancelha direita), meias de listra e vestido preto com tule vermelhão. Harry teve a incômoda impressão de estar sendo despido ao ser avaliado por seu olhar intenso. O sósia de Draco, ao contrário de seus amigos, tinha uma aparência mais normal.Quando ele se apresentou, Harry lembrou onde já tinha ouvido sua voz. Órion Harper era, sem dúvida nenhuma, o mesmo Órion que ele vira nos escombros.Apesar de não ter visto seu rosto, os cabelos claríssimos ficaram bem visíveis na borda do capuz. Olhando com mais atenção,Harry já não o achava tão parecido assim com Draco.Tinha um rosto mais proporcional,o nariz era comprido(mas não tanto quanto o de Rony) e o queixo não era pontudo. —Ah, você ainda não nos disse o seu nome.—observou Ed. —Harry...—Ele hesitou dando-se conta de que usar seu nome agora era a pior coisa que poderia fazer.Tinha que pensar rápido antes que o estrago fosse maior.Ele viu uma embalagem no chão e resolveu arriscar—Pringles. Não lhes passou despercebida a brevíssima hesitação de Harry, mesmo assim não teceram comentários.Ele devia ter seus motivos. Uma garçonete se aproximou e eles fizeram seus pedidos.Harry ficou surpreso ao descobrir que Selene e Yuri iam jantar como ele.Segundo ambos, a comida do local onde estavam hospedados era intragável. A garçonete se retirava quando uma pequena comoção na esquina da Rua das Acácias chamou-lhes a atenção. Um grupo de rapazes usando jaquetas cheias de espinhos metálicos estava se estranhando com três garotos que pareciam ter a mesma idade que eles. Exceto pelo líder—ou o que parecia ser o líder de alguma forma—os demais tinham cabelos curtos e lembravam muito Crabbe e Goyle. O líder empurrou um dos garotos do outro grupo e tomou algo das mãos dele e deu uma olhadinha para trás, provocando risos em seus companheiros, enquanto o trio ia embora com um olhar assassino. Eles se dirigiram até uma mesa ocupada apenas por crianças, que saíram correndo imediatamente deixando os lugares vagos. Aparentemente eles nem haviam notado que havia gente na mesa antes de se sentarem. —Tava faltando os vira latas chegarem. —disse Yuri com expressão reprovadora. —Quem são eles?—Harry tinha a leve suspeita de já ter visto o chefão dando uns sopapos em um dos amigos de Duda. —Você não vem muito por aqui não é Harry?—Órion deduziu facilmente—Bem, o pessoal daqui costuma se referir a eles como “Riquinhos Desocupados”, mas entre nós eles são conhecidos como os Cuspidos de Iowa, cortesia de um amigo que ficou encantado ao reencontrá-los depois de dois anos.—ele abafou uma risada. —Eu até acho que não ficou um apelido tão ruim—comentou Selene. —Pomposo demais. —Mas essa foi a idéia. —explicou Yuri revirando os olhos— Não é segredo pra ninguém que eles vivem querendo pisar em cima dos outros só porque têm dinheiro. —Escuta só. —Ed se inclinou sobre a mesa como se fosse contar um grande segredo. —Outro dia eles estavam se gabando pro Chad, um líder de uma gangue de Clover Leave. —disse para Harry.Ele limpou a garganta e engrossou a voz,tomando o cuidado de falar baixo para que as mesas mais distantes não ouvissem—“Nós somos os Canibais de Iowa”—mal havia começado e eles já estavam achando difícil ouvir a história sem cair na risada ao ver Ed empinando o nariz e arregalando os olhos numa tentativa de fazer cara de mal.—‘’e vocês vão pro canil lá de casa pra servir de ração pros cachorros.” —Ele falou desse jeito na cara de Chad?—Ed confirmou. Yuri já estava com os olhos cheios de lágrimas da gargalhada mal disfarçada. —Eu nem quero saber o que ele fez. —Órion sorriu levantando a mão para evitar que Ed prosseguisse enquanto Yuri tentava rir baixinho, o esforço provocando-lhe um rubor intenso. —Mas independente do que aconteça, nunca, mas nunca mesmo, chame-os de Cuspidos de Iowa na cara deles. —Órion avisou, embora seu rosto risonho não desse o efeito desejado ao que ele dizia—A não ser que esteja preparado pra comprar briga. Para todos os efeitos eles ainda são os Canibais de Iowa. —Tenho pena das pessoas que moram em Iowa. —disse Selene. —Mas quanto a isso,acho que bem pouca gente que conhecem eles devem estar dispostos a desafiá-los depois do que aconteceu em Londres no ano passado.E ouvi boatos de que foram eles que causaram aquele blecaute ontem à noite durante uma briga com outra gangue. —Eu nem sabia que vocês tinha ido pra Londres!—reclamou Ed— Lá se foram os meus livros de Carson. De repente eles ficaram desconfortáveis. Yuri voltou a si, recuperando sua habitual palidez e se pôs a explicar a situação para Edward e Harry. —Você não sabe o que está dizendo. Foi uma sorte não ter ido para lá no ano passado. Eles penduraram um calouro num poste de cabeça para baixo, botaram fogo nas roupas dele depois de despi-lo e jogaram tudo num prédio abandonado perto do Soho. —E óbvio que a polícia não descobriu nada. —disse Órion. —O tal calouro foi salvo pelo pessoal da Alcatraz.Se ficasse por lá teria sido muito pior, com certeza os pais deles mexeriam os pauzinhos para que os filhos não fossem envolvidos em nenhum escândalo.Mas, de qualquer forma o garoto ficou tão traumatizado que se recusou a vir em outras temporadas, mesmo com um grupo diferente. —Acho que alguém vai ter que buscar os nossos pedidos. —Selene disse depois de um tempo. —É o que parece. —Órion concordou, olhando por sobre os ombros. Os garçons estavam todos ocupados equilibrando bandejas cheias entre as mesas e Ones Thompson também parecia estar com problemas com a súbita lotação de fregueses no balcão. —Vamos até lá, antes que acabem com toda a comida.—Yuri suspirou, dando um tapinha no ombro de Órion.

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