Capítulo Único



Após a Estrela
Capítulo Único

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Estrelas. Muitas estrelas. Todas pontilhando o céu negro, como pequenos diamantes em um véu, como piscas-piscas furta-cor no pano de fundo da noite. Ou ainda, como o brilho dos olhos dele. Um brilho gélido e frio, mas que parecia conter todo o ardor do fogo.

Nunca havia entendido muito bem o porquê de ter adquirido o hábito de encarar as estrelas naquele ano; ao menos antes daquilo. Podia ter sido apenas um encontro de olhares, mas o que ela sentira fora muito mais do que algo simples, singelo. Um arrepio havia gelado-lhe a espinha, e um estranho fogo começou a subir por seu rosto. Não sabia o que eram, naquele dia, mas aqueles pontinhos em seu olhar deviam ser algo a mais.

Respirou fundo, lembrando-se de como havia estancado em um passeio noturno pelos jardins, ao olhar para o céu. Na verdade, estava em um encontro, com um garoto qualquer do qual ela não se lembrava. O fato fora que, ao observar as estrelas, percebeu o que havia naqueles olhos que a deixara tão curiosa.

Eram estrelas, das mais brilhantes, que tinham concordado em aparecer ali, no olhar dele. A garota duvidava que ele mesmo soubesse que as possuísse, mas ainda assim o culpava por ter olhado para ela, por ter encarado-a por tempo demais. Sentia um ódio misturado com o que julgava que fosse o amor, um fato que lhe causava máxima indignação: como amar o que se odeia; e como odiar o que se ama?!

Coisa de demente.

Mas, quem sabe, não era isto que ela era? Uma demente, que se apaixonou pelo olhar de um cara! Parecia coisa de filmes trouxas, daqueles bem água com açúcar, cheios dos tais clichês que, mesmo sendo tão comuns em contos de fada, eram uma delicia de se assistir. Sonhar, imaginar que era a personagem principal, e que apesar dos conflitos e desencontros, sempre haveria um final feliz, com um príncipe encantado ao seu lado!

Não. Ela sabia que não seria mais uma protagonista de clichês. Sua vidinha era comum demais. Seus defeitos, iguais aos de outros. Suas qualidades, tão poucas. Sua personalidade era fraca, e não se lembrava se algum dia ela já fora forte. Talvez, quando era criança, sua vida não fosse comum. E seus defeitos fossem diferentes. Suas qualidades existiam em uma quantidade abundante. E aí sim, depois de todo este conjunto, ela devia ter a personalidade mais forte e decidida que poderia ser encontrada.

Mas era tudo porque sua imaginação de criança permitia tais coisas. Agora, adulta, estava na hora de compreender que contos de fada ficavam apenas em livros, assim como os príncipes e as desventuras que se transformavam em felicidade no fim.

Ele não viria. Deixaria de aparecer naquela noite, para desejar-lhe uma boa viagem. Deixá-la-ia partir novamente, provavelmente para sempre. Sim, talvez não devesse mais voltar. Ele devia tê-la esquecido, e era de se esperar que estivesse com outra naquele exato instante.

Levantou-se, ao ouvir que seu trem seria o próximo a sair. Esperou o máximo que pode, como se quisesse extinguir a última gota de esperança que resistia forte em seu peito. Quando já não havia jeito, embarcou. Escolheu uma cabine e guardou sua mala. Sentou-se ao lado da janela, para poder continuar a ver as estrelas. A lua? Esta não lhe interessava.

Apenas as estrelas. Estrelas que podiam até já ter morrido, mas cujo brilho ainda alcançava a noite escura. E era assim que seria com ela: nunca esqueceria aquele olhar, e mesmo que ele morresse em suas lembranças, teu brilho sempre a alcançaria novamente.

E assim seria de novo, de novo, de novo, e de novo. Repetidas vezes. Um amor-ódio. Uma morte vivaz. Uma lembrança quase apagada.

O brilho que continua após a estrela.

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