Inverno Perpétuo em minha ment

Inverno Perpétuo em minha ment



A ESCURIDÃO INTERIOR
Inverno Perpétuo em minha mente.

Já passavam das dez horas da noite quando Gina Weasley desceu as escadas em direção ao salão principal. Era possível ouvir dali, os alunos que conversavam lá em baixo, certamente, todos estavam indo à festa também. Muito bem arrumada para a ocasião, Gina que colocara seu melhor vestido de seda parecia apressada. Desceu as últimas colunas de escadas de pedra, desgastadas e de aparência úmida, típicas das áreas mais sombrias do castelo, no melhor estilo barroco. Pulou os dois últimos degraus e em meio aos casaizinhos que passavam aqui e ali, parecia procurar alguém. Ela adentrou o corredor principal, iluminado pelas bruxuleantes luzes dos archotes postos sobre as paredes frias, e seguiu rumo aos terrenos de Hogwarts, onde a festa parecia já ter começado. Uma sensação de ansiedade tomou conta dela assim que chegou lá fora. Não vira festa mais linda.
Apesar do clima frio intenso os alunos pareciam não se preocupar em congelar naquela noite, razão pela qual se agrupavam aos montes sobre o gramado para assistirem a apresentação de “As Esquisitonas”. Fora montado um enorme palco em frente ao lago, onde as luzes brilhavam refletindo nas límpidas águas. As árvores enfeitadas com luzes pisca-pisca, o gramado coberto pelos tapetes púrpuros e sobre o palco o feitiço que simulava pequenas estrelas caindo.(provavelmente elaborado pelo professor Dumbledore que se encontrava junto aos outros professores, próximos a mesa das guloseimas). Mesas decoradas e repletas de comidas, certamente, feitas pelos elfos, foram postas alternadas para que todos pudessem desfrutar. A agitação das guitarras levava os alunos à loucura e a melodia ecoava por todo o jardim. Corujas de todos os tipos revoavam a todo o momento em direção ao corujal. Tudo brilhava numa sensacional sintonia.
Gina deu uma boa olhada nos arredores tentando encontrar alguém, mas nada. Foi quando uma mão lhe puxou por trás.

- Oi Gina!

A garota saltou para trás.

- Ah! Você me assustou, Hermione. – A garota riu.

- Francamente, você anda se assustando a toa. E por falar em andar, onde é que está o seu par? – Hermione viu a colega corar de leve.

- Você está falando do Harry?

- Claro! Ou já tem outro? – Hermione franziu a testa.

- Eu não sei não. – a voz de Gina saía arrastada.

- Bom... O Rony está me esperando, qualquer coisa, nós estamos ali – Ela apontou para um ponto próximo a pista de dança.

- Tudo bem... Eu vou esperar mais um pouco.

- Não liga não, daqui a pouco ele aparece... – Hermione pôs a mão no ombro da amiga – Até mais Gina! – dito isso, ela saiu balançando o cabelo muito bem arrumado, nada tão normal para Hermione Granger.

Após a conversa com a amiga ela sentou-se numa das cadeiras a disposição e pôs-se a esperar. Ficou observando os alunos dançarem, outros conversarem e outros nem tão inocentes assim. Alguns garotos do quarto ano passavam por ela “Oi Gina!”, “E aí, tudo bem?”, “Cadê o Harry?”. Ela simplesmente sorria falsamente para eles, afirmando que logo o garoto estaria ali. Mas não estaria. As horas se passaram e aquela cadeira estava virando seu túmulo de espera. Hermione não voltou, parecia estar se divertindo com Rony, o suficiente para esquecer a amiga. “Que bom para eles. Estão se ajeitando”. Gina se sentiu um pouco melhor. Mas não estava bem, precisava sair dali. Precisava caminhar um pouco, sentir a brisa do lago em suas margens. Pensou em ir ao corujal. Foi o que fez.
Gina sabia que não podia sair da festa, muito menos ir para outra área do castelo sozinha, mas estava chateada demais para seguir as regras.
Alguns alunos desviaram olhares a garota, até então, indefesa que se arriscava a andar sozinha pela trilha à noite. Aos poucos a música foi silenciando e só restava ao fundo a imagem de uma enorme festa de luzes piscando. Uma coruja passou sobre ela piando, as enormes asas abertas planando para entrar no corujal. O silêncio agora era perpétuo e a escuridão também seria, não fossem os lampiões colocados em toda parte. Ela hesitou entrar por um instante, mas logo mudou de idéia e pôs-se a subir a grande escadaria de pedra. Contou os degraus que subia, sussurrava para si mesma.
Estaria com medo? – pensou – não, não sentiria medo em apenas subir uma simples escada. - Já se arriscara demais, era hora de voltar. Ela deu uma boa olhada lá de cima, a vista era magnífica. As luzes da festa brilhavam e corujas de todos os tipos passavam exibindo suas penas. Uma intensa paz invadia seu corpo na mais sutil tranqüilidade que já sentira. Estava ficando mais frio, precisava voltar. Deu um último suspiro e... Caiu no chão. Soltou um gritinho assustado. Tropeçara em algo que ficou no seu caminho. Ainda com o braço doendo, levantou-se para dar uma olhada na escada e encontrou sentado nela, ninguém menos que Tom Riddle.
Gina recuou um pouco assustada, olhando fixamente para o garoto. Ele se levantou e como se não tivesse visto ela, debruçou no corrimão de pedra e ficou a observar a imensidão dos terrenos de Hogwarts. Ela desceu mais um degrau e abriu a boca lentamente, as palavras não saiam.

- To-Tom?

Ele agiu como se ela não estivesse ali e permaneceu olhando para o céu.

- O que você quer? Por que está aqui? – ela subiu o degrau de volta se aproximando do garoto.
Nenhuma resposta.

- Tom? – ela chegou mais perto – Tá me ouvindo? Por que não me responde?
Silêncio.

- Eu não te entendo garoto. – disse ela furiosa descendo a escada apressada.
Ele não manifestou nenhum sinal de movimento, apenas suspirava lentamente.

Antes que chegasse ao chão novamente, ela deu uma boa olhada no garoto. Estava pálido, não que isso não fosse normal, mas estava diferente de todas as vezes que já o vira. Parecia mais novo e seus olhos exalavam uma melancolia que assombrava o ar. A garota não conseguia ir embora e deixá-lo ali sem obter respostas, então subiu novamente e se posicionando atrás dele gritou.

- Tom!

O silêncio se estendeu por mais alguns minutos.

- Eu desisto – disse ela dando meia volta. Mas quando ia descendo viu uma lágrima cintilante brilhar sobre o rosto fúnebre do garoto.
Aproximou-se mais um pouco e viu que o príncipe das trevas estava tomado por uma angustiante depressão. Sentiu pena dele.

- O que está acontecendo, Tom? – ela baixou o tom de voz e pôs a mão no ombro dele.

Nesse instante um frio incomum varreu todo o calor que existia em seu corpo, seu sangue parecia congelar, sua respiração estava úmida e uma tristeza infinita invadia-lhe a mente como jamais sentira. Uma gélida lágrima rolou asperamente sobre o rosto dela como um corte feito pela mais finas das lâminas.

A noite parecia terminar aos poucos e uma grossa camada de neve surgiu sobre as árvores, que agora estavam ressecadas e mortas. Estava um cinzento e silencioso fim de tarde. Nenhum aluno se atrevia a sair da escola naquelas condições climáticas extremas. Mas um deles quebrou essa regra. Era Tom Riddle que estava debruçado sobre o corrimão de pedra do corujal, encoberto pela neve que insistia em cair. Gina deu uma boa olhada nele, a mão ainda em seu ombro. O garoto parecia chorar, e apesar de não demonstrar sua tristeza ela via isso em seus olhos. Aos poucos tudo fazia sentido na cabeça de Gina. Ela se virou e viu que o corujal parecia diferente. Então compreendeu, estava no passado. Já havia tido experiências parecidas antes com Tom. O elo entre as duas épocas era apenas o contato entre eles, e ainda que permanecesse com a mão sobre o ombro do garoto não duraria muito tempo. Ainda assim ele não podia se comunicar com ela. Foi então que alguém subiu as escadas, um garoto com as vestes da grifinória.

- Oi Tom! - Riddle se virou e o olhou com desprezo.

- Tom, eu queria te pedir desculpas em nome de todo o grupo, eles... Eles não queriam ter feito aquilo. Talvez até não se importem, mas eu... Eu me importo cara, você sabe. Qual é Tom, você não pode simplesmente se isolar assim e fugir do mundo. Tudo isso só vai piorar a sua tristeza. Você é um cara legal. Só que é sentimental demais. Esqueça tudo que passou e se preocupe com o presente. Precisa viver.

Tom permaneceu calado.

- Eu o vejo vagando a noite pelo castelo, pela manhã fica sozinho e misterioso trancado naquelas salas. Precisa parar de estudar um pouco e voltar a se divertir.

Tom o olhava fixamente com os olhos negros lacrimosos.

- Bom... Eu já vou indo... Mas Tom... Sabe que pode contar comigo. – e saiu.

Riddle ficou a observá-lo descer as escadas. Nenhum movimento. Foi quando uma voz mórbida e frígida cortou o ar silencioso da tarde.

-Eles estão mortos – disse Tom na mais perfeita calmaria – todos eles...

Gina se assustou ao ouvir isso e de um salto tirou a mão do ombro de Tom. Um calor prazeroso aos poucos infectava seu sangue. Seu corpo era aquecido como que por uma lareira. Ela viu a tarde cair rapidamente e a noite retornar. Tudo mudou. Exceto Tom que continuou parado a observar o infinito. Estava de volta ao presente.

- Você os matou – sussurrou ela se afastando amedrontada enquanto tampava a boca. – Eu não acredito nisso... O que eu estou fazendo aqui...
Nenhuma resposta que não fosse o silêncio da noite.
Então ela desceu as escadas novamente, decidida a voltar para a festa.

- Por que eu ainda dou atenção a você? – disse ela enquanto descia.

- Porque você tem pena de mim, Weasley... – a voz inconfundível do rapaz soou nos ouvidos dela. Ela parou, a espinha congelou. Lentamente se virou para encarar aquela face pálida. – E eu enojo a sua maldita pena, sua escória de sangue podre.

A garota puxou a varinha rapidamente. Ele gargalhou friamente.

- Não se preocupe, não vou fazer nada contra você.

Aos poucos a coragem invadia a garota.

- Foi assim que você fez com eles? Com o seu grupo de colegas? Matou um por um quando estavam desprevenidos e sozinhos? – ela sentia medo.

O sorriso no rosto dele morreu.

- Você conheceu somente uma parte da história, Weasley.

- Não me importa. Nada que eles possam ter feito te dava o direito de... Ter feito...

- Tire suas próprias conclusões. – Ele se aproximou dela que tentou fugir em vão, pois ele a agarrou firme pelo braço e inesperadamente a beijou.

A princípio ela apenas sentiu os lábios cadavéricos congelarem a sua boca, mas aos poucos tudo ia escurecendo e ela parecia estar entrando no corpo de Tom... Ouvia vozes, pessoas rindo, várias delas. Estava caída no chão, sozinha. Todos a rodeavam.

“Assassino, assassino, você matou seus pais”.
“Pessoal. Vamos sair daqui, chegou aquele retardado da Sonserina”.
“Não me importo nem um pouco com os sentimentos dele”.
“Essa noite nós pegamos aquele nerd. Batam com toda força bem na cara dele.”
“Esse rato é o mascote dele, matem e coloquem em sua cama. Vai ter uma baita surpresa a noite.”

Gina caiu numa espécie de poço escuro. Uma mistura de gritos, risos e dores caiam sobre ela. Ela se encolheu num canto. “Por favor, me deixem em paz”. Chorou aflita.
Aos poucos tudo ia sumindo e lentamente Tom parava de beijá-la. Estava de volta ao corujal. Ela o empurrou e caiu no chão. Encolheu-se chorando muito. Abaixou a cabeça e ficou muda.

- Me desculpe... Era necessário – Tom abaixou-se junto a ela, limpando as lágrimas da garota com as mãos que mais pareciam blocos de gelo. – Você tá legal?

Ela não respondeu. Levantou o rosto molhado de lágrimas. O nariz sangrando. Um sangue tão vermelho quanto seus cabelos que contrastavam com sua pele alva.
Ela não disse nada, se levantou e desceu as escadas correndo sem olhar para trás. Lá em baixo deu um encontrão em alguém. Conhecia mais do que ninguém aquele garoto, até mesmo naquela escuridão.

- Ha-Harry?!

- Gina o que houve? – ela limpou o nariz rapidamente com o auxílio da manga do casaco.

- Nada, foi só uma hemorragia. É o frio sabe. – ela passou na frente seguindo a trilha de volta a festa.

- Gina, eu sei que não está bem... Está acontecendo alguma coisa de errado. Disseram-me que estaria aqui. E eu vim procurá-la. Por que você saiu de lá?
Ela o olhou, as lágrimas caindo.

- Não chora... Acabou... – ele a abraçou, o que não a tranqüilizou.
Ainda abraçada com Harry, Gina olhou para cima e viu o velho Tom a olhando lá de cima do corujal. Diferente das outras vezes, agora ele olhava os dois juntos lá em baixo.

Antes que Gina pudesse fazer um movimento Harry a beijou. Ela apenas retribuiu, tentando olhar para Tom lá em cima. Mas ele havia sumido.

- Harry, eu só quero ir embora... – sussurrou ela chorando no ouvido do garoto que fez que sim com a cabeça.

- Vamos...

Os dois seguiram pela trilha e logo estavam na euforia da festa que estava no auge. Atraindo a atenção de um enorme grupo de pessoas, Harry e Gina passaram rapidamente para dentro do castelo. Após alguns corredores mal iluminados e desertos, estavam no salão comunal da grifinória. Harry sentou-se na poltrona em frente à lareira e Gina do seu lado.

- Gina, o que tá acontecendo? Pode falar pra mim. Por favor, confia em mim.

- Não quero falar sobre isso agora, tudo bem? – ela fez uma cara de súplica.

- Certo. Amanhã conversamos. – dito isso, ele a beijou e subiu ao dormitório dos garotos para se reunir ao grupo dos que odiavam festas, ou que estavam cansados demais.

Gina ficou sozinha no salão comunal. Foi até a janela. Olhou pela vidraça. Lá estava o corujal. Bem longe dali. Deitou-se no sofá olhando para o céu pela janela.
Era Tom. Não saía de sua cabeça aquele amargo pensamento. Uma mistura de ódio, pena e... Amor? Não, não podia ser. Ela se revirou tentando apagar os pensamentos que insistiam em permanecer na sua mente.

Longe dali, um frio Tom Riddle sentava-se sobre a bancada de pedra do corujal observando a festa ao longe. Seus pensamentos abstratos se repassavam dentro da mente. A cena que vira a pouco, Gina Weasley e Harry Potter, de alguma forma destruía seu coração de pedra. Foi então que uma quase cristalizada lágrima irrompeu de seus olhos, ardendo e queimando o seu rosto como uma ferida. Ouviu algumas corujas piarem nos ninhos acima e observou a sombra das aves voando por todos os lados. Ele se levantou e foi até enorme janela de pedra. Uma coruja cinza pousou no parapeito e começou a beliscar a mão do garoto. Riddle a olhou e teve uma idéia.

As horas se passaram e, aos poucos, os alunos chegavam da festa, exaustos e aparentemente felizes, conversando sobre a noite lá em baixo.

- E aí Gina, beleza? – cumprimentou Dino.

- O que você ta fazendo aqui em cima? A festa é lá em baixo. – a expressão indefinível de Gina respondeu por ela e o garoto apressou-se a deixar a conversa, nada agradável, de lado.

Foi então que, decidida, a garota levantou-se jogando os cabelos ruivos para trás, lançou apenas um sorrisinho nada simpático a Dino e passou pelos alunos eufóricos na direção do quadro da mulher gorda. Agora, no corredor, o barulho da excitação dos alunos diminuía conforme ela caminhava arrastando atrás o vestido que, outrora, sonhara tanto em ter.
Sem que soubesse para onde partira, Gina passou por mais dois corredores mal-iluminados e subiu a grande escada de pedra à frente. Não havia ninguém perambulando por ali àquela hora, não quando uma agitada festa seguia lá em baixo. Ela caminhou lentamente olhando os bruxos que dormiam em seus quadros e outros que tagarelavam entre si.

- Boa noite, senhorita – a voz masculina de um velho homem num dos quadros, a assustou.

- Boa noite, senhor. – disse ela examinando os quadros.

- Pode-se saber o que uma dama da grifinória da sua idade faz, a uma hora dessas andando pela escola? Precisa de ajuda? – ele acompanhava os passos dela pulando de quadro em quadro, o que não agradou muito alguns bruxos que dormiam. Ouviram-se os resmungos.

- Não. Eu estou bem... – disse ela sem olhá-lo enquanto seguia pelo corredor cheio de portas.

- Certo, jovem. Se precisar de alguma ajuda, pode recorrer ao nobre Carlos Henrique V – e dito isso, fez uma breve reverência medieval, o que resultou numa risadinha abafada de Gina.

Ela parou no meio do corredor olhando a placa na parede:

“REGISTRO DE SUSPENSÃO”

Então se virou rapidamente.

- Carlos! – gritou, mas não houve resposta.

Ela olhou ao redor se certificando de que nenhum professor, nem Filch estariam por perto e num furtivo giro da maçaneta, abriu a porta entrando com cautela.
Estava entrando numa saleta iluminada por uma grande lareira acesa no centro. Deu uma boa olhada. Não havia ninguém, exceto algumas estantes empoeiradas tomadas de milhares de livros e pastas. Sobre cada estante, uma letra do alfabeto. Ela hesitou em mexer nos papéis, mas sua curiosidade não permitia, já que estava ali deveria seguir em frente.
Devagar ela caminhou lendo as inscrições. Puxou rapidamente uma pasta na estante de letra F e a abriu. O pergaminho antigo, gasto e úmido estava prestes a se dissolver em suas mãos.

SALA DE REGISTROS - REGISTROS “F”
FABÍOLA HEFER MINS – SONSERINA – 4º ANO
Suspensão de toda carga horária que envolve as atividades em Hogwarts, por três meses, até segunda ordem.
Por: Dissipação de discórdia em sala de aula e desacato a professores.
Detenção com: Sir Carlos Henrique V, durante a semana das seis da tarde até as nove da noite, e sábados das sete da manhã ao meio dia.

Gina viu a foto de uma garota morena de longos cabelos negros que se mexia no papel.

- É... A Fabíola; faz tempo que não a vejo – disse uma voz rouca atrás de Gina.

A garota se virou rapidamente para ver quem era.

- O que faz aqui Carlos? – o fantasma do antigo quadro flutuou na sua frente.

- Eu é que pergunto, o que a senhorita faz aqui? – advertiu o fantasma.

- Eu já estou de saída – ela pôs a pasta de volta a estante. – Desculpe, não queria estar aqui. Eu ia voltar para a festa, mas as escadas mudaram e eu decidi pegar um atalho. – Ela corou de leve. – Você... Você é um fantasma?

Carlos riu.

- Mas é que claro que sou um fantasma, o que mais poderia ser? – Gina sorriu um pouco. – Vejo que já conheceu a Fabíola... Uma boa pessoa sabe... Mas as coisas mudam aqui nessa escola.

- Vo-você... Conheceu ela?

- É claro que conheci, fez a detenção comigo, horas. Limpar registros, nada tão grave. Alguns eram pendurados pelos punhos na masmorra... – Gina arregalou os olhos.

- Carlos... Já que você está aqui há muito tempo, será que pode me contar algo que aconteceu aqui anos atrás?

- Pois diga, sobre o que quer saber?

- Conheceu um aluno chamado Tom?

A expressão no rosto do fantasma mudou instantaneamente.

- Ah, sim. O Tom. Lembro-me. E como... – sussurrou ele.

- Pode me contar algo sobre?

- Bom... Minha pequena, o que você precisa saber é que aquele foi o garoto mais difícil que eu já conheci em todos esses séculos da minha morte.

- Difícil?

- Sim... Tom não era como os outros garotos, esse vivia isolado do mundo. Nunca andava com ninguém e só se importava com ele mesmo. – Gina prestava atenção. – Mas Riddle, assim como Fabíola não era má pessoa. Só... Difícil. E como eu já disse, essa escola transforma os alunos. Nem tudo é o que parece ser. Aquele garoto sofreu demais durante sua adolescência aqui em Hogwarts. Todos os professores o detestavam, todos exceto o professor Dumbledore. – Gina sorriu. – Sim. Dumbledore, assim como eu percebi que aquele garoto tinha muito mais pra mostrar além do que aquele pobre menino frio e solitário. Mas acontece que nem sempre as coisas vão certas e nem todos os caminhos são corretos. – Gina percebeu a infelicidade dele – Ouvi falar dele ultimamente. Terrível Lorde Voldemort. – se não
estivesse morto, Carlos se arrepiaria ao ouvir aquela pronúncia.

- E os amigos dele? Soube que ele andava com o pessoal da grifinória.

- Sim, sim... Mas sabe como é essa maldita rivalidade entre as casas. Salazar não merecia lugar nesta escola. Esse sim era ruim. Ainda me lembro como se fosse hoje do dia em que fugiu. – Gina admirava a memória do fantasma – Foi difícil a amizade do Riddle com o pessoal da grifinória, apenas um, Joe se não me falha a memória, realmente gostava de Tom. Os outros debochavam dele. O maltratavam. Nada tão cruel, mas não se deve machucar um coração quando não o conhecemos, não é verdade? Nunca pensei que a ira dele cresceria tanto. – Sir Carlos Henrique V ficou calado por uns segundos apreciando a tristeza daquele instante. – Mas me diga, por que saber dessa história tão antiga? Isso foram anos antes de você.

Gina o olhou.

- Ele os matou não, é? O Tom.

O fantasma flutuou na direção da porta.

- Tom saiu da escola muito antes deles morrerem – riu Carlos – Os outros tiveram suas vidas normais, uns trabalharam no ministério, outros em Gringotts e um mais bem aventurado no St. Mungus.

- Então... Tom não os matou? – Gina estava confusa

- Não mesmo. Todos os bruxos ficaram sabendo de como eles morreram.

Gina se calou.

- Tenho que ir Carlos. Foi um prazer falar com você.

- Tudo bem, minha nobre grifinória, tome cuidado. Volte sempre que quiser.
É muito bom ter uma companhia durante esses séculos.

Gina correu, uma fúria invadia o seu corpo. Agiu precipitadamente. Por que foi tão idiota e tirou suas conclusões precipitadas? Era tarde demais agora. Estava voltando para o salão comunal, a cabeça queimando de dor. “Tom me desculpe”.Pensava repetidamente.

- Servatis a Poena – gritou para a mulher gorda que dormia.

Tudo estava uma desordem na sala comunal. Certamente a festa havia acabado há horas, os alunos já haviam chegado e subido para os dormitórios. Ela mergulhou numa poltrona fofa e bichento deitou no seu colo.

- Eu realmente não sei o que sinto... – disse baixinho. – Tom pode estar certo, sinto muita pena dele... Mas... Eu me sinto na obrigação de ajudá-lo sempre que o encontro.

A voz dela ia diminuindo e em um instante ela adormeceu na poltrona, a cabeça encostada na grande janela de vidro que dava vista para os terrenos
da escola.

Toc-toc-toc

Aos poucos Gina despertou ouvindo o som que se repetia cada vez mais alto.

Toc-toc-toc

Ela abriu os olhos sonolentos e ainda enxergando embaçado viu uma coruja, no parapeito da janela fechada, dando bicadas no vidro para chamar sua atenção. Rapidamente abriu a tranca da janela para que a ave pudesse passar. Uma corrente de vento gélido entrou e ela apressou-se a fechar o vidro. Trazia nas patas um pedaço de pergaminho amarrado que Gina pegou. Ela desenrolou o papel gelado e com as mãos inquietas tentou ler aquela letra garranchosa.

“Me desculpe por tudo que fiz a você. Me desculpe por eu ser quem eu sou. Não sabe como me dói cada dia que passa, ter de acordar nessa sub-vida, sofrendo. Está uma maldita noite fria. Estou tentando entender essa vida. Preciso falar com você. O mais rápido possível. Quando a coruja chegar você deverá estar dormindo, então venha amanhã, vou estar te esperando pela manhã. Por favor, venha. Eu não sei mais o que fazer, estou enlouquecendo. Mas apesar de tudo... Eu estou com você. Para sempre e toda vez”.

Gina soltou o pergaminho no chão, as mãos tremendo. Lágrimas rompendo-se involuntariamente de seus olhos. Ela correu até a mesa e buscou um tinteiro. Apanhou o papel no chão e usou o verso do bilhete.Tentou escrever enquanto tremia. As palavras mais borradas que a de tom.

“Me desculpa Tom... Mas eu amo o Harry... Por favor, não fique triste. Eu vou estar com você. Para sempre e toda vez”.

Ela prendeu em uma das patas da coruja e acariciou a pela penugem cinzenta. Abriu a janela e lá se foi a ave voando até o corujal.
Sentindo-se tonta, ela subiu as escadas em direção ao dormitório feminino e a última coisa que lembrou foi de se ver caindo na cama, no momento exato que o ponteiro do grande relógio marcava três da madrugada.

Amanheceu em Hogwarts, ninguém no salão comunal da grifinória havia acordado. Lá em baixo um frio intenso chegava com uma massa de ar. As árvores, quase sem folhas, começavam a secar. E os primeiros flocos de neve caíam do céu anunciando que o rigoroso inverno de Hogwarts estava próximo. Uma sombra pairava sobre o céu nublado e poucos eram os raios de sol que conseguiam se infiltrar.
Na grande torre do corujal as corujas dormiam aquecidas em seus ninhos e a um canto no chão estava um garoto deitado encolhido. Tom Riddle se levantou limpando as vestes, tremia de frio. Parecia ansioso, correu até a escada e debruçou no corrimão. Ficou olhando lá em baixo, como fizera várias vezes antes. Esperou, esperou e esperou... Mas apenas esperou em vão por algo que sabia que jamais viria. “Ela deve ter se atrasado”.E esperou mais uma hora parado, sem se mover. Seus olhos demonstravam a tristeza interior que o afogava gradativamente. “Ela não vai vir”.Os olhos avermelhados, carregados de lágrimas. Foi então que avistou a carta trazida pela coruja no chão. Pegou-a na mão e leu. Seu corpo paralisou, entrou em choque. Soluçou e guardou o pergaminho no bolso. Uma lágrima rolou pelo rosto. Ia embora dali. Pegou o casaco sobre uma mesa e desceu as escadas do corujal cabisbaixo.

Puf!

Esbarrou em alguém e caiu. Sacou a varinha rapidamente.

- Tom... – aquela voz irreconhecível soava como remédio para sua dor.

- Gina?

- Você... Já vai indo? – perguntou ela.

- Sim... Os comensais da morte me pegarão na floresta negra. Na verdade pegarão o Tom, apenas uma lembrança. – disse ele descendo rápido para que a garota não visse as lágrimas no seu rosto. Enxugou com a manga do casaco.

- Não foi você – disse ela e ele parou no meio do caminho se virando para encará-la.

- Eu não devia ter desconfiado de você. Desculpe-me.

- Está perdoada – disse ele e continuou a descer as escadas.

- Só isso que tem a me dizer? – disse ela descendo para mais perto dele.

- Obviamente não. Mas não há necessidade, já vi que é uma garota inteligente.

- Eu posso ver a tristeza em seus olhos. Não precisa se esconder. – disse ela e ele parou novamente.

Ele desceu até que os dois ficassem no mesmo degrau.

- Você é tão frio, tão seco por dentro. – disse ela passando a mão no rosto frígido dele.

Tom apenas a olhou sem nenhuma reação.

- Não chore mais. – ela o abraçou de surpresa.

Riddle não demonstrou nenhuma reação, apenas ficou parado deixando ela o abraçar. O calor envolvente do corpo dela aquecendo-o mais que o sol.

- Estou acabado Gina. – disse ele e pela primeira vez chorando.

- Não. Você não está acabado. Pelo contrário. Você descobriu que pode amar. Saiu dessa plena escuridão. – disse ela.

- A escuridão é perpétua, não importa o que pense, não importa o que eu faça. Eu estou morto.

E os dois se abraçaram por vários minutos.

- Queria tanto poder te ajudar Tom – disse ela chorando. – Não quero que continue assim.

- É tarde demais, as trevas me consumiram.

- Há muito mais que trevas nesse coraçãozinho aí – ela pôs a mão no coração dele e acariciou seu rosto gelado. – Não ligue para essa ordem. Nem tudo é o que parece. Você pode mudar. Deve haver uma luz.

- Tanta esperança, minha menina. – disse ele sorrindo – por isso que eu a amo.

Um silêncio mórbido se seguiu.

- Tenho que ir – disse ele soltando ela.

- Por favor, Tom... – suplicou ela.

- Adeus Gina. – disse ele entrando na floresta e sumindo de vista.

Ela correu atrás dele, entrou na densa floresta, as copas das árvores encobrindo a pouca claridade que havia da manhã.

- Tom! – gritou ela.

Nenhuma resposta.

- Tom!

A voz dela foi abafada por uma misteriosa carruagem que se aproximava. Os cavalos invisíveis deveriam ser Testrálios, puxavam a negra e sepulcral carruagem. De dentro saíram três encapuzados. As capas negras farfalhando no chão seguiram na direção de Gina que correu de volta. Acabou tropeçando na raiz de uma árvore e caindo no chão.
Os bruxos sacaram a varinha e apontaram na direção dela. Gina se encolheu e fechou os olhos.

- Avada...

- Avada Kedavra! – um estampido seguido por um relâmpago verde estourou o ar como um tiro e os três caíram juntos no chão mortos. Os olhos abertos fixando Gina.

Gina abriu os olhos, viu Tom na sua frente, a varinha apontada para os comensais. Ele abaixou-se perto dela.

- Você tá legal? – ela assentiu com a cabeça.

- Obrigada! – sussurrou a garota.

Ele estudou aquele frágil e delicado rosto por um instante, os cabelos ruivos voando em seu rosto. E sem mais pensar a beijou apaixonadamente.

- Tudo o que eu quero é a sua felicidade - disse ela.

- Você acabou de ver a prova. Somos de vidas diferentes, de mundos diferentes.

- Mas de corações iguais. – disse ela e então sorriu.

- Sim, meu anjo.

Eles se beijaram novamente, mas aos poucos Gina não podia mais tocá-lo e ele não passava de um fantasma.

- Acabou o meu tempo aqui. Agora eu não passo de uma lembrança.

- Lembrança agente guarda no coração. – disse ela.

- Nunca vou me esquecer de você. – disse ele. – Você nunca estará sozinha, nunca.

- Eu estou com você. Sempre vou estar.

- Para sempre e toda vez? – perguntou Tom.

- Para sempre e toda vez – repetiu ela sorrindo.

- Adeus Gina. – disse ele entrando na carruagem negra e desaparecendo pela floresta.

Gina olhou para o chão, viu um pequeno pedaço de papel. A carta de Tom. Sorriu e guardou no bolso, saindo em seguida de volta para a escola.
Deu uma boa olhada no corujal antes de entrar, suspirou fundo e então entrou no castelo.

E aquela foi a última vez que Sir Carlos Henrique V contou a história do garoto melancólico e solitário, dominado pela escuridão.

O Fim



Nota: Fiz o possível pra ficar pequena, ams pelo visto foi em vão. Não quis dividir em capítulos, pois achei que perderia a graça da história. Bem... quem tiver um pouquinho de paciência termina rápido.















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