Capítulo Único



Soon I’ll be here no more
You’ll hear my tale through my blood…


Tudo o que eu consigo sentir é o frio e o vento.

Há algum tempo eu conseguira me esconder dos meus sentimentos, fechando meus olhos para não ver o que estava ao meu redor.

Mas as minhas mãos estão em contato com a pedra, e o calafrio a percorrer minha espinha é inevitável.

Fujo de mais uma recordação, me concentro na brisa em atrito com meu rosto, dando a impressão de que minhas lágrimas congelariam.

Foi o vento que me trouxe aqui.

E é o frio que aqui ainda me prende.

This night will bring him back to me…

Nem bem amanhecera. Era fim de férias e já andávamos há algum tempo, em caminho da Copa Mundial de Quadribol. Eu acordara muito cedo, o que contribuíra drasticamente para o meu mau humor. As conversas antes animadas haviam sido substituídas por um silêncio que só era interrompido pelo som dos meus passos e da minha respiração ofegante. Levantei meus olhos para olhar a minha volta. Os primeiros raios de sol começavam a iluminar lentamente a paisagem do morro Stoatshead, dando a tudo um suave tom amarelado. Mas eu já não via ninguém. Como era de se esperar, eu havia ficado para trás. Ele havia me deixado para trás.

Se alguém me parasse no meio daquela subida e perguntasse quem era o amor da minha vida, dentro de mim eu saberia que a resposta era Ronald Weasley. Não que eu estivesse apaixonada por ele... Era só que era tão óbvio, tão claro! De tanto ver os olhares dos outros e ouvir os comentários da Ginny aquilo se fixara em meu subconsciente, onde eu estava feliz em deixá-lo até a hora chegar. Se não houvesse acontecido o que aconteceu.

Enfim, alheia a tudo isso retomei a caminhada, agora em passos mais rápidos. Isto fez com que eu chegasse ao topo em pouco tempo, mas também com várias dores ao longo do corpo. O resto do grupo não estava muito longe de mim, parados, ao que parecia, ao redor de alguém. Se eu soubesse o que me aguardava, viraria as costas e retornaria à toca. Porém eu me aproximei, sendo apresentada ao senhor Amos Diggory, e não muito depois ao seu filho.

Cedric. Um belo rapaz de olhos azuis e cabelos caramelo. Ele sorriu para mim...E pouco a pouco, meus sonhos, meus planos e meus desejos começaram a desmoronar, quebrados como um vidro que cai ao chão, a partir do momento em que eu primeiramente desejei que nunca tirassem aquele sorriso de perto de mim... Etérea, dirigi-me para a chave do portal, permitindo-me desviar os olhos dele e lançar um olhar para a encosta. Se eu tivesse caído...

My fall will be for you
My love will be in you…


O que me resta agora são lembranças.Os momentos vividos, todas as oportunidades perdidas e desperdiçadas...

Eu me fixei na ilusão de que ainda teria você por muito tempo.

E a única coisa que me traz a realidade é o toque do mármore.

Cruel ironia que me faz pagar por ter sido tola e apenas ter deixado o momento passar.

Agora estou aqui, ajoelhada no seu túmulo, pensando em tudo o que deveria ter dito muito tempo atrás.

Enquanto você estava vivo...

At the end of the world
Or the last thing I see
You are never coming home…


Eu ainda estava feliz. A copa revelara-se um evento muito mais interessante do que eu imaginava. Foram poucas as vezes que eu o vi, caminhando pelo acampamento, eu até mesmo no dia do jogo. Mas eu estava hipnotizada, admirada com a quantidade de bruxos, a diversificação de raças e nacionalidades. Eu andava e ouvia idiomas diferentes, hinos tocando, principalmente dos da Irlanda e da Bulgária.

Ron não parava de valar sobre o apanhador Búlgaro. Vítor Krum isto, O Krum aquilo... Para mim ele não era mais do que um jogador de quadribol com um uma cara de poucos amigos. Eu não cogitava que em breve ele também entraria na minha vida. Foram dias alegres, livres de preocupações. Até mesmo a figura de Voldemort não assombrava nossos pensamentos. Até a noite cair.

Nossas barracas estavam praticamente em festa. Comemorávamos uma vitória que nem ao menos era de nosso país. Eram sorrisos e gargalhadas espalhados pelo ar, um som extremamente contrastante com os gritos que em pouco tomariam conta do lugar. Já passava da meia noite quando eu e Ginny fomos dormir. Mas pouco tempo depois fomos acordadas por um Senhor Weasley parecendo assustado. Pelo barulho acontecia algum tumulto lá fora. Seguindo as instruções deles nos juntamos aos meninos e corremos para a floresta.

Creio que foi nesta noite quando o pesadelo começou. Vultos encapuzados torturando pessoas, a primeira vez que vi a marca negra. Ela fora conjurada pela varinha de Harry, e ao que parecia estavam culpando-o por aquilo. No meio da confusão, o Senhor Diggory apareceu, lembrando-me de Cedric. Comecei a cogitar onde ele estava, se ele estava bem... Foi a primeira vez que temi que algo tivesse acontecido com ele. Mas a razão me disse que o pai dele não se afastaria sem antes deixá-lo em segurança. Essa conclusão serviu para me acalmar por hora, mas nesta altura eu já perdera a linha dos acontecimentos... A elfa do camarote sendo acusada, ao passo que eu me manifestei para defendê-la. Achava um absurdo a maneira como tratavam aquelas criaturas... Mas no fim, o dono dela, o chefe de Percy acabou por puni-la, e nós antecipamos a volta para a toca.

Durante o resto do verão não se falou sobre nada além disso, até a nossa chegada a Hogwarts trazer uma novidade. Eu não parava de pensar nele, se ele havia chego em casa bem, no que ele estaria fazendo. Peguei-me repreendendo-me muitas vezes por ter desviado minha atenção da leitura de um livro, de uma conversa. Eu nunca estivera assim, e não sabia o que estava acontecendo comigo. Minha hipótese parecia absurda, afinal, eu não trocara nem duas palavras com ele, não sabia quase nada sobre sua personalidade... Eu não acreditava em amor à primeira vista, mas não demorou muito para eu descobrir acreditar.

Assim que entrei no salão principal meus olhos começaram a buscá-lo, fixando-se então na mesa da Lufa-lufa... Foi quando eu associei que fora ele quem ganhara de Harry no primeiro jogo do ano passado, era ele o garoto mais popular da escola, aquele que arrancava suspiros femininos por onde passava. Foi como se meu ego murchasse, ao realizar que ele era totalmente inalcançável. Tentei desviar o meu olhar o mais rapidamente possível, mas os olhos dele se encontraram com os meus a encará-lo. Senti meu rosto inflamar-se, e virei bruscamente a cabeça para falar qualquer coisa com os meninos, e não olhei mais naquela direção pelo resto da cerimônia.

Tudo corria normalmente, até que Dumbledore começou seu discurso. Quando achávamos que ele havia terminado de falar, ele tomou novo fôlego. Apresentou nosso novo professor de artes das trevas, e posteriormente, falar sobre o Torneio Tri-Bruxo.

Eu não sabia o porquê, mas enquanto ele falava, meu coração começara a bater mais forte. Era um sentimento estranho, uma angústia presa a minha garganta. Os alunos estavam animados, excitados com a novidade. Delegações estrangeiras viriam, haveriam provas, uma seleção para alunos maiores de 17 anos. O burburinho e as conversas se alastraram instantaneamente, se estendendo até a hora de dormir. Eu permanecera calada. Sem saber porque, eu não gostava daquilo.

Mas as coisas seguiram como sempre, com exceção de que em todos os lugares que eu ia eu instantaneamente o procurava. Até o dia em que os alunos de Beauxbatons e de Durmstrang chegaram. Se quando ficaram sabendo do torneio os alunos ficaram alvoroçados, agora estavam incontroláveis. Eu observava as delegações chegando, com seus navios e carruagens voadoras com o resquício da curiosidade que isto um dia despertaria em mim.Tentei me juntar à animação dos meus amigos, mas simplesmente não conseguia. Observei Ron constatar animado que o tal do Vítor Krum ainda estudava e, que, principalmente, estava em Hogwarts.

Nos dias seguintes eu quase conseguia sentir os olhares dele, todas as idas à biblioteca. Meu lugar favorito, único em que eu poderia ficar sozinha em silêncio com os meus pensamentos tornara-se reduto das fãs dele. Quando ele foi colocar seu nome no cálice de fogo ele me encarou, pura e diretamente. Depois se virou, saindo do salão com seus amigos. Como eu desejava que aqueles olhares viessem de Cedric! Quando ele colocou o nome dele no cálice, sorrindo ao som das vaias dos alunos da lufa-lufa, ele sequer virou o rosto para onde eu estava... Abaixei minha cabeça e continuei a ler meu livro, sem antes sentir aquela pontada de tristeza que vinha se tornando tão característica.

Por fim, o dia em que o cálice revelaria os três campeões chegara.

Love is the red rose in your coffin door
What’s life like bleeding on the floor?


Eu não vim ao seu funeral.

A idéia de que você estava morto simplesmente não fazia sentido para mim.

Era apenas um pesadelo no qual tudo o que eu queria, e ainda quero, é acordar.

Só queria saber em que momento as coisas tomaram este rumo.

Em que instante seu destino foi traçado, levando consigo e transtornando também o meu.

E quando foi que tudo deixou de ter sentido, quando o céu perdeu a cor.

You fool, you wondered.

You challenged the gods and lost...

Eu sempre soube que seria ele. Mas quando Dumbledore anunciou seu nome, eu ainda não entendia o porquê de não querer que ele fosse o escolhido. Mais uma vez, eu estava muito além dos aplausos e vaias, das reclamações dos gêmeos a cerca do perfeito lufa-lufa.

Estava perdida no seu caminhar, no sorriso tão largo e sincero. No cabelo que balançava enquanto ele andava, nos olhos azuis faiscando felicidade. Não tinha mais como negar o que eu sentia por ele, por mais que eu tentasse não ouvir a voz que me dizia isso.Porém quando ele passou por aquela porta, cai de novo em minhas aflições. Tentei me concentrar no resto da seleção, e não me admirei quando Vitor Krum fora escolhido. Todavia, naquela noite, o que realmente viria para me tirar o sono era o fato de Hogwarts ter dois campeões.

Aquilo não estava certo. Era impossível, absurdo. E real. Harry teria que competir mesmo em nítida desvantagem, e ainda com os olhares reprovadores de toda a escola. Sim, uma parte de mim também se sentiu ofendida por ele “roubar” a glória de Cedric, mas não, antes de tudo ele era meu amigo, e eu tinha certeza de sua inocência. Assumi assim mais uma preocupação, mais um problema para um coração que já não andava tão bem assim.

Aqueles dias me deixaram exausta. Eu estava travando várias batalhas ao mesmo tempo, e a pior de todas, contra mim mesma. Prestar total atenção às aulas era algo que já não existia mais no meu vocabulário. As lições eram feitas com a minha mente vagando para muito longe do pergaminho. Agora o que restava de mim era apenas uma pequena parte da Hermione de antes, cálida e distante.

A primeira prova passou, depois de noites em claro tentando ajudar de alguma forma Harry, que por fim, saíra-se bem. Para mim, tudo aquilo era um grande espetáculo de sangue, que escorria pelas arquibancadas e sujava as minhas mãos. Meu sangue, o sangue dele, o sangue de Harry.Foi assim que encarei todo aquele campeonato, e foi assim que eu entendi a maneira como ele terminara.

Entre empecilhos e outros, minhas idas a biblioteca continuaram com sua regularidade normal, mesmo com o nada agradável som de risinhos e conversas vindas de algumas meninas descontroladas que iam até lá para admirar Krum, de quem elas nitidamente gostavam apenas pelo fato de sua fama e dinheiro.

Bom, eu não estava nada preparada para o dia no qual ele veio falar comigo. Esta era a última de minhas cogitações, e justamente a que se tornou verdadeira. Os professores já falavam sobre o baile há algum tempo, mas eu nem me dera ao trabalho de procurar um par, afinal, quem eu realmente queria que fosse meu acompanhante era a pessoa mais improvável, estando até mesmo depois de Krum.

Ele, porém, depois de algumas conversas de poucas e amigáveis palavras, acabou me convidando. Desde que ele começara a se aproximar eu já imaginava que isto iria acontecer, mas mesmo assim foi um choque. Não pude resistir a olhar no fundo dos olhos dele. Eram escuros e apresentavam nítida apreensão. Eu realmente queria que fossem os olhos de outra pessoa a me encarar... Mesmo assim aceitei o convite, sem saber se era por falta de opção, por alguma vontade de chamar a atenção de Cedric ou simplesmente porque aqueles olhos apreensivos me conquistaram.


A única pessoa a quem eu contei sobre o convite fora a Ginny, que para meu alívio, não contou nada a ninguém. Constatei tristemente que as pessoas não acreditavam que eu conseguira um par... Eu era tão horrível assim? Isto fez com que qualquer esperança de que ele me notasse estava sendo liquidada, ainda mais quando Harry contou o porquê de Cho Chang não ter aceitado o convite feito por ele. Eu não tinha nenhuma chance contra ela, e tudo o que me restava fazer era me arrumar o melhor possível para o baile, na tentativa de fazer com que Vítor não se arrependesse.

And all the things that you never gonna told me...
And all the smiles that will ever gonna haunt me…


Eu sempre me orgulhei de enfrentar tudo com o rosto erguido, de ser forte e determinada. E até isso você tirou de mim.

O mundo dos sonhos é sempre mais sedutor, e nos meus, você ainda está vivo, e em pouco eu verei seu rosto novamente.

Eu poderia nunca ter te conhecido, nunca ter me apaixonado por você... Nunca ter sentido falta do som da sua voz, ou do brilho dos seus olhos.

Fui tola, fugindo dos meus sentimentos, me escondendo atrás de livros e desculpas para não me admitir a possibilidade de algo. Fui tola ao não ter tentado, ao não ter me declarado.

Escondendo-me de você, acabei me escondendo de mim mesma. Mas eu seguirei em frente.

Mentindo, chorando, fingindo, atuando, assustada, acuada, apaixonada... E você nada poderá fazer contra isso, mesmo que você soubesse...

So I won’t stop dyeing, won’t stop lying
If you wanna I’ll keep on crying…


E tudo naquela noite estava diferente. O clima, os sons, as batidas do meu coração. Fui para o salão sozinha, temendo continuar assim ao chegar lá. Mas não, Vítor, como um perfeito cavalheiro, estava me esperando, me estendendo o braço e sorrindo. Pela primeira vez em muito tempo, eu me sentia protegida.

Ele também estava lá, junto a Cho Chang. O mesmo sorriso, o mesmo caminhar. Passou por nós, nos cumprimentando educadamente. Fiz o mesmo, não me demorando muito a admirá-lo. E tentei não olhá-lo, por mais difícil que isso me parecesse.

Meu jantar foi melhor do que eu esperava. Ignorei os olhares enciumados de Ron, que há algum tempo me deixariam tão feliz. Concentrei-me na conversa com meu par, que era muito interessante, muito gentil, muito educado. Ele tinha quase tudo para eu amá-lo, mas um grande defeito. Ele não era Cedric.

Nos levantamos para o que seria minha primeira dança, do meu primeiro baile. Mais uma vez Vítor se mostrava habilidoso, e pude reparar como ele ficava bonito quando sorria. Só não tão bonito quanto... Que por sua vez, parecia deslizar pelo salão com sua linda companheira. Por mais que doesse em mim admitir, eles formavam um belo casal. Sim, ela era o tipo de garota para ele. Creio que também pela primeira vez, eu senti ciúmes de alguém, não apenas ciúmes, mas também inveja. Tudo o que eu mais desejava era estar no lugar dela, com meu corpo próximo ao dele, nossas mãos nos tocando, a atenção dirigida a mim.

Ocorreu-me o quão injusta eu estava sendo com Vítor. Peguei a mão dele, e sem desviar meu rosto, nos misturamos com a grande massa de alunos dançando como loucos. Mesmo assim eu ainda podia senti-lo perto de mim, ouvir seus risos, ver sua expressão de felicidade. Paramos então para beber algo, e eu fui me sentar com os meninos, que tinham rostos emburrados e entediados. Enquanto tomava ar, não pude impedir um olhar pelo salão, e, feliz ou infelizmente, não os encontrei. Mas minha mente não me deixou em paz, cogitando lugares e ações. Eu me sentia fútil e estranha, não queria pensar naquilo, não queria me preocupar com aquilo. Como se o que eu quisesse estivesse sempre de acordo com o que eu queria querer.

Senti meu rosto enrubescer, as lágrimas prontas para cair. Lágrimas que enxugei. Tentei me afastar estes pensamentos.Não era hora para isso. Sai como em busca de Vítor, indo em direção aos jardins.Era uma noite fresca e bonita, o céu estava estrelado e tinha um aroma de flores pelo ar. Mas para mim, todos os arbustos escondiam Cedrics e Chos, todos os bancos declamavam juras de amor que somente ela iria ouvir. Joguei-me no mais afastado o possível, ainda tentando reprimir todos os arrepios e todas as imagens que meu cérebro formava.

Vítor me achou, sentando-se ao meu lado, quieto, como se esperasse eu estar pronta para dizer algo. Eu estava mais vulnerável que nunca, e aquele simples gesto fez com que eu sentisse meu coração esmaecer. Encarei-o, memorizando o maior número de detalhes de seu rosto que eu podia, aquele rosto grave e ao mesmo tempo tão doce. Eu senti-o aproximar-se de mim, e eu não recuei. Eu o desejava, queria aquilo. Precisava por puro egocentrismo, e creio que em nenhum momento pensei nos sentimentos dele.

Seus lábios tocaram os meus, e antes de esquecer do mundo a minha volta, de me esquecer de mim mesma, um único pensamento passou em minha mente. E eu me lembro até agora de ter desejado que aquele beijo fosse de Cedric.

Last dance, first Kiss Your touch, my bliss
Beauty always comes with dark thoughts


Você tirou todos os bons momentos que aquele ano poderia ter me proporcionado. Ou talvez eu mesma tenha os tirado de mim.Sim, eu fiz de tudo para tirar você de mim. Magoei os outros e a mim mesma, me fiz de tola, fechando os olhos para não enxergar, tropeçando para não poder fugir.

Naqueles meses eu me sentia tão sozinha quanto eu nunca me sentira antes, e era o pior tipo de solidão. Aquela que era estar cercada de pessoas, mas muito distante delas. Ninguém com quem desabafar, ninguém em quem confiar.

Tudo que eu precisava era de alguém para me dizer que daria certo, alguém para reacender minha esperança, mesmo eu sabendo que eu não concordaria, mas mesmo assim, no fundo, me convencendo.

E, quanto mais eu mais me isolava, mais você parecia ter amigos. E eu cogitava se acontecia com você o mesmo que acontecia comigo, se você era tão sozinho quanto eu era. E isso fez que eu me sentisse mais perto de você, naquela noite.

Você está sozinho agora?

Ever... Get the feeling that you’re never
All alone, and I remember now…


Foi logo depois da segunda tarefa. O fato de eu ter sido escolhida para ser resgatada por Krum aumentava cada vez mais meu peso na consciência. O que eu estava fazendo com ele, o que eu estava fazendo comigo mesma, com todos ao meu redor?

Eu acabara de terminar minhas lições, e a sala comunal estava incrivelmente abafada. Olhei para o céu. Nuvens escuras movimentavam-se, fundindo-se e separando-se. Sentada perto da janela, podia sentir a brisa fria e suave, fazendo com que logo eu ansiasse por mais. Eu me sentia sufocada em todos os sentidos, e uma volta pelo lago era uma idéia tão atrativa que pouco tempo depois eu já saia do castelo, sentindo cheiro de terra molhada.

Finalmente começara a garoar, e eu sabia que em breve a chuva pioraria, mas mesmo assim, talvez a água fria viesse e levasse consigo todos os meus problemas. A superfície do lago agora estava cheia de ondas circulares, decorrentes das gotas que caiam, brilhando com a luz da lua. Eu fiquei um bom tempo observando aquela cena, admirando a sua beleza, sem nunca deixar de pensar o porquê da vida não ser tão simples e bela assim.

O que era antes uma brisa fresca tornara-se um vento gélido, que parecia preencher a minha alma. A chuva caia impiedosa, agora machucando a minha pele. Mesmo assim aquilo não deixava de ser belo, especial. Aquele temporal não era apenas externo, era igual ao que acontecia dentro de mim. Fechei os olhos e comecei apenas a sentir. Era uma revolução, e era apenas em mim, era meu e de ninguém mais.

Esta conclusão perdeu-se assim que eu vi um vulto na margem oposta. Minha visão estava embaçada e era difícil distinguir o que era, mas eu sabia muito bem quem era a minha companhia. Talvez pela silhueta, talvez por algum relance dourado, talvez porque eu desejava que o fosse e para mim era. Não importava como, era ele quem estava ali, não me deixando em paz, nem quando eu a havia encontrado.

Tudo começou a ficar incerto. Não sei se foi meu delírio, mas ele parecia ter notado minha presença ali, por mais tardiamente que fosse, e eu o via aproximar-se. Passos lentos e incertos, ele vinha até mim. Podia sentir sua respiração, ver seus cabelos molhados e grudados no rosto, exatamente como ele ficara quando ele resgatara Cho. Mas era eu quem ele resgatava agora, era a mim que ele abraçava, era o meu pescoço que seus lábios tocavam levemente, trazendo um arrepio de felicidade e contentamento. Era a minha vida que ele devolvia, eram meus desejos sendo realizados. Aquilo só podia ser um sonho, e não, o vulto não estava tão próximo assim, mas ainda caminhava contra o vento. Minha perplexidade, desilusão e confusão eram tantas que a única coisa que consegui fazer foi correr dali, entrar no castelo sem me importar em ser pega, alcançando rapidamente a torre da grifinória e minha cama.

As lágrimas escorriam como as gotas na janela. Eu tinha frio, medo e remorso, nada em mim explicava o porquê da minha reação ter sido aquela. Por tudo que era sagrado, por alguma força que regia a vida e eu já não sabia mais como chamar ou até mesmo se era verdadeira... O que estava acontecendo comigo? Delírio, divagação? Estava sonhando acordada? Havia mesmo alguém ali? Minha cabeça latejava e eu me sentia fisicamente morta, mas com a mente freneticamente desperta.Vencida pelo cansaço, eu adormeci, ainda com as vestes molhadas. No sono, ele finalmente conseguira me alcançar. Segurava meus pulsos com seus dedos longos e firmes, não menos delicado. Dava-me o beijo que eu vinha esperando há tanto tempo, sussurrava algo que eu não entendia e me olhava, o olho mais triste e reluzente do mundo.

Quando eu acordei, as lágrimas já haviam secado.

This night will hurt you like never before...

Eu começara a achar que perdia a razão. Hoje eu percebo que a perdi assim que te encontrei.

Tantas coisas perdidas, descobertas, achadas, para serem perdidas novamente. Coisas que poderiam ter sido, que foram, que nunca vão ser.

Mas foi assim que eu realmente cheguei a me conhecer. A Hermione fraca, iludida, que amando nunca amou, que chorando nunca chorou, e sofrendo nunca sofreu. A desatenta, a perdida.

Teria sido mesmo Voldemort quem tirou você de mim? Você já esteve realmente em mim? Foi o campeonato, a guerra, a paixão, o carma? E em que momento eu comecei a acreditar nisto? Ainda me é estranha a filosofia dos apaixonados. Agarro-me nela para achar minhas respostas. Como eu preciso delas...

Finalmente, eu estava (e estou) disposta a morrer por amor.

Mas foi meu amor que morreu.

Black is the Kiss, the touch of the serpentine sun
It ain’t the mark of the scar that makes you one


Aquele era o fim e o reinício de tudo.

A última prova chegara, com a promessa de dar fim ao meu sofrimento. Eu me preparara, lacrara meus sentimentos para poder suportar aquilo. Porque sim, eu sabia que alguma parte de mim não sairia viva dali.

Pela primeira vez acontecia à noite. Um manto negro cobria o céu, e eu poderia ter interpretado aquilo como um presságio. Mas eu gostava de ser cética, evitava assim as chances de me machucar.

Durante todos os momentos de espera eu me achava distante, tão distante que assim eu poderia acompanhá-lo. Em minha mente eu estava lá, dobrando as esquinas do labirinto, tentando protegê-lo com o que eu sabia de magia. Mas depois eu olhava para cima, e deixava que a escuridão tomasse conta da minha visão.

Muito tempo se passou. Faíscas vermelhas, então. Não me surpreenderam, assim como o fato de apenas Harry e ele continuarem lá. A agitação, os comentários, os rostos apreensivos. Ainda estava escuro. Os professores correndo, um sinal surdo correndo pelo ar. Uma rajada fria. Ron se mexendo, suspirando. Por que eu simplesmente não continuara apaixonada por ele? Minha mão se fechou. E, como trazido por uma chave de portal, Harry surgiu na arena. Arena de sangue. E com Cedric inerte nos braços.

Morto.

Gritos, agitação, um pai desesperado.

Morto.

Pessoas chorando, rostos em fúria, um lampejo verde.

Morto.

Ainda era noite, e eu me encontrava parada, sem reação.

Morto.

Músculos contraídos, Harry sendo levado. Uma lagrima solitária pelo meu rosto.

Morto.

O grito dentro de mim. Os sonhos quebrados, os lábios selados.

Morto.

E, finalmente, eu percebi que o sol nasceria. Havia de nascer.

Morto.

Os raios ainda brilhariam. Não mais para mim.

Morto...

My only wish to leave behind
All the days in earth…


Eu ainda espero pelo dia nascer.

Perder-me na dor é mais fácil e cômodo. Mas eu tenho que resolver o que fazer da vida.

Pergunto-me, afinal, de que serviu tudo isso... Para que eu tive que amar você assim para enxergar coisas tão pequenas, tão próximas dos meus olhos.

Releio seu epitáfio.

“Filho amado, nos reencontraremos”

Queria poder também acreditar nisto.

Na sua lápide tem sua foto... E você parece feliz, muito feliz. Aliás, você deve ter morrido feliz, tendo ganhado o torneio.

Tolo... Mas pensar nisso me consola.

Não sei se você alcançou o que queria na vida. Eu nunca efetivamente falei com você...

Mas o que eu sinto por você daria um bom livro. Nossa história, antes de um drama, é um romance.

Por mais que você nunca chegue a saber disso.

Mais uma coisa para a lista das verdades que você nunca poderá saber. Mais uma frase para a lista daquela que você nunca vai ouvir saindo dos meus lábios.

Eu amo você.

E queria poder gritar aos quatro ventos, esperando que um deles leve esta mensagem até onde você estiver.

Mas... De que isto adiantaria?

Valem-me mais estas preces silenciosas, este diálogo e esta narrativa confidenciada, exclusivamente a você.

Eu levarei isto para meu túmulo, e também deixarei no seu.

Onde deve ficar, guardado e eternizado, enquanto eu tento esquecer e seguir em frente.

Seguir em frente... É isto. Deixar tudo no passado, parando de reviver cada instante.

Não se preocupe, não violarei mais nosso segredo.

Agora eu estou me levantando, me dirigindo aos portões do cemitério, passando pelas árvores, por outras lápides, por outros amores enterrados.

Já não dói tanto...

Olho, pela última vez, para trás.

Não foi tanto desperdício assim.

Nem tanta diversão. Mas o pior já passou, deixando a cicatriz.

E a vida continua, a vida sempre continua.

Até o dia em que nós nos reencontraremos.

Essa é minha dívida e minha eternidade.

E isso... Bom, talvez não tenha passado de um breve intervalo.

Talvez como um interlúdio, demarcando as partes de uma grande composição. As separando, tornando-as diferentes...

Um interlúdio...

E espero que fiquemos juntos no final da canção.

Sorrio e volto a andar.

O vento me trouxe aqui.

E o frio marca meu Adeus...

Saints protect her now...
Come angels of lord...
Come angels of unknown…

N/A:
Fic escrita para o Primeiro Challenge Cedric/Mione do Fórum da Aliança 3 Vassouras... Primeiro lugar...

Partes em itálico são letras de Músicas do My Chemical Romance e do Nightwish, que a tradução e a autoria estão ai em baixo, respectivamente ...:

Soon I’ll be here no more
You’ll hear my tale through my blood

Em breve eu não estarei mais aqui
Você ouvirá meu conto pelo meu sangue…

Creek Mary’s Blood - Nightwish


This night will bring him back to me…

Esta noite o trará de volta para mim

Dark Chest of Wonders – Nightwish


My fall will be for you
My love will be in you…

Minha queda será por você
Meu amor estará em você

Ghost Love Score – Nightwish


At the end of the world
Or the last thing I see
You are never coming home…

No fim do mundo
Ou a última coisa que eu vejo
Você nunca está voltando para casa...

The Ghost of You – My chemical Romance


Love is the red rose in your coffin door
What’s life like bleeding on the floor?

Amor é a rosa vermelha na porta do seu caixão
Como é a vida sangrando no chão?

Thank you for the Venom- My Chemical Romance


You fool, you wonderer

You challenged the gods and lost...

Seu tolo, Seu viajante
Você desafiou os deuses e perdeu

Planet Hell – Nightwish


And all the things that you never gonna told me...
And all the smiles that will ever gonna haunt me…

E todas as coisas que você nunca vai me dizer
E todos os sorrisos que vão sempre me caçar...

The Ghost of You- My Chemical Romance


So I won’t stop dyeing, won’t stop lying
If you wanna I’ll keep on crying…

Então eu não pararei de morrer, não pararei de mentir
Se você quiser eu continuarei chorando...

Cemetery Drive- My Chemical Romance


Last dance, first Kiss Your touch, my bliss
Beauty always comes with dark thoughts

Última dança, primeiro bejio, Seu toque, minha felicidade
Beleza sempre vem com pensamentos obscuros

Wish I had an Angel- Nightwish


Ever... Get the feeling that you’re never
All alone, and I remember now…

Sempre… Tenha o sentimento que você nunca
Está totalmente sozinho, e eu me lembro agora...

The Ghost Of You- My Chemical Romance


This night will hurt you like never before...

Esta noite irá te machucar como nunca...

Wish I had an angel – Nightwish


Black is the Kiss, the touch of the serpentine sun
It ain’t the mark of the scar that makes you one

Negro é o beijo, o toque da serpente sol
E não é a marca da cicatriz que te faz único

Thank you for the Venom-My Chemical Romance


My only wish to leave behind
All the days in earth…

Meu único desejo é deixar para trás
Todos os dias na Terra...

Planet Hell – Nightwish


Saints protect her now...
Come angels of lord...
Come angels of unknown…

Santos a protegem agora…
Venham anjos do Senhor…
Venham anjos do desconhecido...

Interlude- My Chemical Romance

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