O livro conta uma história



Naqueles tempos, Jadis, a Feiticeira Branca, ainda governava em Nárnia. Os animais falantes mantinham a lenda de que dois Filhos de Adão e duas Filhas de Eva tomariam para si os quatro tronos de Cair Paravel. Todos sabem que mais tarde viriam os irmãos Pevensie que derrotariam o maléfico poder da Feiticeira. O que ninguém sabe é que antes de Lúcia e Susana outras Filhas de Eva haviam pisado em Nárnia, ainda no Inverno dos Cem Anos. Uma delas era era Amy Lynn Lee.
Tudo começou em sua infância. Amy mudava muito de cidade, e conseqüentemente de escolas, o que a deixava muito sozinha, sem amigos. Por isso vivia trancada em casa, escutando músicas da Björk, Tori Amos e Nine Inch Nails. Outra coisa que fazia bastante era ler. Adorava principalmente contos de fadas, onde a princesa sempre encontrava um príncipe que lhe amasse para todo o sempre. Por isso, sempre saía de casa meia hora antes das aulas, a caminho da escola, para ver os grossos volumes de livros encantados. Sim, Amy gostava principalmente de livros grandes, com mil e tantas páginas, na esperança de que a história nunca acabasse, na esperança de que os personagens nunca fossem embora, para que não voltasse à sua solidão.
Mas aquele era um dia especial. Amy mal sabia disso. Ao entrar na livraria, antes da aula, a garota se deparou com um livro em que aparecia um leão na capa. "Que leão bonito", pensou Amy. Imediatamente perguntou à atendente se aquele era um livro de conto de fadas.
- É sim, mas não está à venda, querida - respondeu a lojista, uma senhora idosa que tricotava sob a penumbra que envolvia a estante de livros e o que existisse além dela.
- Mas por quê? O leão é tão bonito...
- Sim, mas este livro é especial.
- Especial? Como assim?
- Eu não posso lhe explicar, querida. Não eu.
Amy olhou mais uma vez para a capa do enorme livro. Agora parecia que o leão brilhava em meio à escuridão, provocada em partes pela neblina lá fora.
- Tentador, não é, querida? - disse a velhinha, com um ar bondoso.
- Mas por que a senhora não pode vendê-lo? Todos os livros de conto de fadas são especiais.
- Oh, sim. Mas nenhum é tão especial quanto este.
- A senhora já leu? Como é a história dele?
- Imagine todos os seus sonhos unidos a todos os seus pesadelos. É parecido. Este não é um livro para ser lido, mas sim para ser vivido. Vivido apenas pelas almas mais corajosas, e...
A velhinha foi interrompida pelo toque de um telefone antigo, que soava tão distante, para Amy, que esta levou um susto quando a senhora parou sua narração tão bruscamente.
- Er... Um minutinho, querida. Alô - disse a velha, virando-se para atender o telefone.
Amy olhou de novo para o livro. Era muito estranho. O leão realmente brilhava. Era a única luz na escuridão que tomava conta da livraria. O leão era tão majestoso, tão bonito, e parecia estar retribuindo o olhar que a menina o lançava.
De repente lhe passou um pensamento horrível pela cabeça, e por um momento Amy não pôde lutar contra ele. E se ela colocasse o livro dentro da mochila e saísse correndo da livraria? A garota olhou para a bondosa velhinha. Ela não veria nada, pois estava de costas, ao telefone. Amy não tinha muito tempo. Logo a senhora acabaria sua conversa. Tinha que tomar rápido uma decisão.
Foi tudo tão rápido, que Amy parecia não ter noção do que estava fazendo. Quando se deu conta si, corria pela rua da livraria, com o livro por entre o material escolar, em sua mochila entreaberta.
"O que foi que eu fiz?", pensou Amy, com uma ponta de remorso, mas feliz por estar com o livro do leão.
Agora estava em frente ao portão da escola. Estava começando a chuviscar. O sino tocou e Amy foi obrigada a entrar. Queria gritar por dentro.Odiava aquela escola com todas as suas forças. Não tinha amigos, ficara sempre isolada, e seu apelido novo era "Carrye - A estranha".
O tempo custou a passar até que o recreio chegou. Somente quando estava no pátio é que lembrou do leão. Em seus devaneios, esquecera completamente do livro que tinha pego. Mas o seu material havia ficado na sala de aula, e somente depois do intervalo é que poderia folheá-lo.
Amy percebeu que umas meninas perto da cantina apontavam para ela e davam risada. Apurou os ouvidos e ouviu o comentário de uma delas: "Aquele cabelo ridículo dela! Tá na cara que é chapinha... Pela cara de monga dela, aposto que o cabelo é daqueles que são todo embaraçados!"
As outra meninas riram com vontade.
Amy correu para o banheiro, se trancou em um box e começou a chorar, deprimida. Quando o sino tocou novamente para voltarem às suas salas, Amy ficou mais uns três minutos chorando.
"A professora vai me matar", pensou a menina ao caminhar pelo corredor de sua sala, enxugando as lágrimas.
Sua surpresa foi grande ao entrar na sala e ver a zoação, com aviõezinhos e bolinhas de papel flutuando no ar: a professora ainda não havia chegado.
Mas sua surpresa foi ainda maior quando se dirigiu à sua carteira: sua bolsa estava arreganhada, seu caderno rasgado e jogado no chão e as outras coisas estavam todas espalhadas pela cadeira.
Amy olhou para a menina que se sentava atrás dela, Hillary Duff. Hillary entendeu o olhar indagador de Amy, e disse:
- Foi a Avril. Ela disse que não gosta do jeito que você se veste.
Avril Lavigne era a menina mais popular da escola. Coincidência ou não, era a mesma que havia rido dela na cantina.
Amy se virou, e viu Avril com seu livro do leão na mão.
- Ora, ora, se não é nossa querida novata!
A sala ficou em silêncio, todos em volta de Amy e Avril, que agora estavam frente-a-frente.
- Escute aqui, garota, eu acho melhor você tomar cuidado com tudo o que fizer por aqui. Não quero ninguém me copiando, nem mesmo você, com este revolucionário jeito de se vestir.
Amy estava usando um espartilho preto com uma saia rodada, muito diferente de Avril, que usava uma mini-blusa com gravata e uma calça-jeans. A única coisa que tinham em comum era a bota preta, que nem era tão igual assim, pois enquanto a bota de Avril acabava no calcanhar, a de Amy seguia até o joelho. Mas eram da mesma marca.
- Eu não estou pretendendo copiar ninguém - disse Amy, os olhos voltando a se encher de lágrimas - Será que você poderia devolver meu livro?
- O quê? Isto? - Avril jogou o livro para o alto e o pegou com a outra mão, como se estivesse fazendo malabarismo. - Pra que você quer isto? As Crônicas de Nárnia - disse Avril, lendo o título da capa, em tom de zombação.
- Isto é meu! - gritou Amy.
- Ah, você quer, é? Então pega!
Avril jogou o livro para o alto. Não tinha como Amy alcançá-lo. Mas foi aí que aconteceu uma coisa estranha: antes de o livro bater no chão, todos já tinham se virado para acompanhar os passos de Avril, que se dirigia à porta. Menos Amy. Juntamente com o baque, uma luz dourada saiu de dentro do livro. Amy nunca soube dizer se estava sonhando acordada. Mas essa luzinha se dirigiu aos pés de Avril, que tropeçou antes que pudesse atravessar a porta. A turma olhou para ela com uma expressão preocupada, afinal era a menina mais popular da escola.
Quando se levantou e viu que os cadarços de cada par de sua bota estavam amarrados um no outro, teve um excesso de fúria:
- Quem foi que fez isso? - seu olhar se focou em Amy, e agora ela seguia em direção à menina - Você... Eu sempre soube que...
- Pára com isso, Avril! - interrompeu uma voz calma. Amy virou-se e viu uma garota vestida de branco. Parecia ser seu anjo.
- O que é Alanis? - vociferou Avril - Quem você pensa que é para...
- Amy não fez isso. Ela estava longe de você quando caiu.
- Pois eu vou ensinar a vocês duas como...
Mas nesse instante a professora entrou na sala.
- Classe, desculpem pelo atraso, estava resolvendo uns probleminhas com a diretora, mas já estou aqui. Todos pros seus lugares. Agora vamos aprender Análise de Circuitos em Corrente Contínua! Todos sabem que corrente é o movimento orientado de elétrons, e...
Amy nem prestou atenção na aula. Depois de arrumar suas coisas na mochila, só pensava na hora em que estaria em casa lendo o misterioso livro.

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