O Espelho de Erised



Durante todo o restante da semana, Sarah não teve novas tentativas nem oportunidades de sair para poder abrir o Pajefall. Durante o dia tinha aulas, se divertia com Lily e Tom e de vez em quando conversava um pouco com David. À noite, mergulhava nos livros e gastava o tempo estudando para terminar todos os deveres dados pelos professores. Já tinha tido aula com todos àquela altura. O professor Carl Gordon, da difícil matéria de Poções, era alto e gordo com um grosso bigode e olhos espertos; já tinha ensinado tudo sobre o bezoar e a poção do Morto-Vivo, fazendo da matéria uma das preferidas de Sarah. O Prof. Neville Longbottom era de Herbologia, tinha o rosto arredondado e jeito desengonçado; Lily já o conhecia antes da escola, pois era amigo da família. A professora de Astronomia, Sinistra Sparkle, era uma mulher séria e eficiente que vivia pegando no pé de Sarah durante a aula.



            - Por que alunos do primeiro ano não podem entrar para os times de Quidditch? – perguntou Sarah certo dia para Lily quando voltavam das aulas em direção à sala comunal.



            - Não sei... Vai ver pensam que somos péssimos pilotos. Ou então que morremos mais facilmente.



            - Humm. Faz sentido. Mudando de assunto... O que vocês acham que tem naquela sala do quinto andar? – sussurrou Sarah para Lily e Tom.



            - Boa pergunta, eles até colocaram patrulhas de professores naquela área. Deve ser grande. Talvez algum tipo de monstro – arriscou Tom.



            - Não seja bobo. Que acham de tentarmos descobrir, hein? – perguntou Sarah.



            - Você não toma juízo mesmo, não é, Sarah? – repreendeu Lily.



            - Eu acho legal essa história de detetive – disse o amigo sorrindo.



            - Pois eu não acho! – exclamou Lily indignada – Vamos cuidar da nossa vida que é o melhor que temos a fazer.



            Nesse instante, Nick Dickson passou todo pomposo e deu um baita esbarrão em Lily, fazendo-a cair, todos os livros se espalhando pelo chão. Os amigos se agacharam para ajudar.



            - Quem ele pensa que é? – exclamou Sarah.



            - Alguém que não merece a amizade de ninguém. – resmungou Lily se levantando do chão. Com os livros de volta nos braços da ruiva, voltaram a caminhar.



            Sarah parou de repente no meio do corredor, fazendo Luke Ashley trombar com ela por trás. Lily e Tom a olharam enquanto a garota pedia desculpas ao colega.



            - Tá querendo imitar o Zé Bonitão lá, é? – perguntou Tom.



            - Não. Eu só não vou para a sala comunal agora. Vejo vocês depois. – e saiu correndo na direção contrária de todos. Queria encontrar um lugar que estivesse longe de todos para poder abrir o Pajefall.



Já tinha andado um tempo, subindo e descendo escadas, mas para todo lado encontrava alunos ou professores. Quando chegou ao sétimo andar e virou um corredor, ouviu vozes.



            -... Mas ninguém pode saber sobre esse objeto, Kingsley. Ninguém.



            - Pode deixar, Crown. Não conto a ninguém. Só não sei o porquê de não ter me avisado antes. Parece-me perigoso deixá-lo aqui.



            - Não se preocupe. Não se preocupe. Os alunos foram proibidos de entrar lá. E o lugar está protegido com feitiços eficientes. Nem professores podem entrar na sala, dei ordem para ser impenetrável.



            - Bom, se você assim acredita... É muito importante a preservação dela. Você sabe, não é? Gostaria de saber quem é essa pessoa para quem foi deixada a Pensieve de Dumbledore. São nesses tipos de encantamentos que você vê o tamanho que era o poder dele. Já morreu há anos e o encantamento usado está intacto.



            - O Ministro acha que é algum... herdeiro?



            - Não, não... Ele não tem parentes vivos.



            - Humm... Mas o mais interessante é que as lembranças sempre estão em movimento e, às vezes, acho que recebe novos pensamentos.



            - Magia poderosa, meu caro. Magia muito poderosa. – a voz do Ministro agora parecia cansada.



            - Quanta coisa estaria escondida na cabeça de Dumbledore, hein? Com certeza era uma mente brilhante. Sem contar que sabia tudo sobre Voldemort.



            - É... Mas agora tenho que voltar para o Ministério da Magia. Até mais, Crown.



            Então Sarah ouviu passadas no corredor e seu coração parou. O ministro estava vindo em sua direção, ia saber que ouviu a conversa.



            Olhou a toda volta e avistou um armário de vassouras. Estava começando a adorá-los. Correu até ele silenciosamente, entrou no meio da poeira e esperou até os passos se extinguirem.



            Saiu de lá espiando para todos os lados, certificando-se de que estava realmente sozinha. Naquele andar deveria ficar a sala do diretor, então tinha que ter mais cuidado com todo esse negócio de ouvir conversas particulares. Engasgou um pouco com o pó, espanou as vestes e recomeçou a andar.



            Sarah agora desejava, quase suplicando, achar logo uma sala vazia e longe de todos. Foi andando, andando...



            Quando virava um corredor, viu uma porta diferente – prata e bem ornamentada. Correu até ela e entrou. A sala certamente era para alguém que gosta de conforto. Não sabia ao certo o que estava fazendo ali, entre corredores de salas de aula, com todos aqueles móveis sofisticados e luxuosos.



Ignorando os pensamentos, Sarah trancou a porta e se sentou em um dos sofás vermelhos que decoravam o cômodo. Podia não saber pra que servia, mas era perfeita para abrir o Pajefall. Estava longe de tudo agora. As salas comunais ficavam distantes, vira no mapa que David lhe mostrara, e era pouco provável algum aluno estar vagando por essas partes do castelo. Bom, com exceção de Sarah.



            Retirou das vestes o embrulhinho vermelho, colocou-o sobre a mão plana e procurou o fecho para abrir, mas não havia nenhum. Girou várias vezes para achar, mas era totalmente fechado.



            - Ora, isso foi lacrado com magia! – resmungou Sarah, então uma luzinha em sua cabeça se acendeu – É claro... Magia.



            Equilibrou-o sobre uma das mãos e com a outra pegou a varinha nas vestes. Tocou a ponta dela no embrulho. Nada aconteceu.



            - Abra! – mandou ela, tocando-o com a varinha novamente. O embrulhinho projetou uma linha vertical de onde saiu uma luz dourada forte. Foi se alargando, alargando, até desaparecer, deixando um objeto do tamanho da palma de sua mão, circular, dourado e achatado. Dos lados continha desenhos majestosos e em cima, uma fina risca onde provavelmente ele se abria e mostrava o Patrono específico.



            Girou o objeto para lá e para cá, admirando sua delicadeza. Foi então que ele se abriu lentamente, fazendo desaparecer as finas portinhas. Um círculo pequeno de luz azul prateada brilhava no centro e então uma miniatura de fênix surgiu, emanando a mesma luz azul prateada. Ficou voando sem sair dos contornos do objeto. Virou os olhos para Sarah e emitiu uma voz de homem suave e grave, que parecia um eco:



            - Ótimo, Sarah! Muito bom mesmo. Não achei que se sairia tão bem em tão pouco tempo.



            - De quem é essa voz? – perguntou ela.



            - Não posso me apresentar por enquanto, mas é só por precaução. Acho que a minha aparição faria algumas pessoas se alarmarem.



            - Então é por que é um bruxo das trevas.



            - Não, não sou. Vim dizer a você que tem uma primeira missão a cumprir e que vai salvar muita gente das forças das trevas. Elas vão te procurar. Cuidado! Adeus...



            Sarah ficou olhando para o objeto enquanto a pequena fênix ia se dissolvendo. O que tinha lhe dito não fazia sentido algum. Uma missão? Como assim? O que, diabos, estava acontecendo?



Sarah resolveu bem naquele momento que odiava charadas.



            Olhando em volta mais atentamente agora, reparou pela primeira vez em um velho espelho num canto. Talvez tenha chamado sua atenção pelo contraste lastimável que fazia perto de todos aqueles móveis lustrosos. Colocou o Pajefall no bolso e foi até lá. Em cima dele estava gravado em letra dourada “Espelho de Erised” e, mais abaixo, uma longa frase escrita nas mesmas formas que tinham no Pajefall. Talvez fossem runas.



            Esperou ver seu reflexo, mas nada viu – estava vazio.



De repente duas pessoas começaram a caminhar em sua direção, dentro do espelho. Ela arregalou os olhos para aquilo. Aproximaram-se mais e pararam, olhando-a. A primeira era a mulher mais formosa que já vira, com seus olhos levemente repuxados e sobrancelhas arqueadas, deixando-a parecida com uma fada. Era magra, tinha cabelos lisos e longos, da cor do mel, e olhos muito azuis, como os de Sarah. O outro era um homem, também muito bonito, de pele pálida, cabelos negros, alto e forte. Ele envolveu a mulher com um braço, beijou-a no topo da cabeça e encarou a garota. Sem margem para dúvidas, Sarah sabia que estava cara a cara com seus pais biológicos. Sentiu um aperto estranho no peito que não podia explicar. Esticou a mão até o espelho, talvez pensando em atravessá-lo, mas sentiu apenas o vidro frio.



Como se pudessem entender aquele gesto, eles sorriram, porém havia algo errado... Não era com carinho, mas como se a desafiassem. A imagem deles desvaneceu aos poucos e a de alguns outros bruxos tomaram seu lugar. A bruxa elegante e loura do quadro no Gringotts estava lá, um velho de veste puída sorria desdenhoso, uma bela jovem a mirava com carinho, um homem alto e austero segurando uma varinha vermelho sangue... Tantos bruxos juntos que de alguma forma significavam algo para ela, podia sentir. E também tinha consciência do quão poderosos eram, quase podia enxergar a Magia a atingindo.



No centro do grande grupo estava um bruxo de cabelos e barba negros e compridos que a encarava com olhos sábios. Usava vestes verdes e anéis em forma de serpente, assim como suas abotoaduras e um medalhão. De alguma forma, tinha a sensação de que o conhecia.



Enquanto tentava associá-lo a um nome, o grupo de bruxos sumiu e seus pais estavam de volta. Dessa vez o reflexo de Sarah surgiu com eles, mas não era exatamente ela. Estava distorcida, suas feições estranhas, e se retorceu quase que em uma convulsão. No segundo seguinte havia duas de suas cópias grutescas ao lado dos pais juntamente com uma sombra, que se elevou sobre eles de forma ameaçadora, partindo dos reflexos da garota.



Foi então que sua visão começou a embaçar e se sentiu meio tonta. Tudo escureceu e ela teve de parar de observar o espelho para se sentar um pouco. Depois que a sensação passou, Sarah se levantou de um salto, olhou uma última vez para a sala e decidiu que queria sair dali o mais rápido possível. Verificou se o Pajefall estava em seu bolso e se foi.



            Saiu correndo pelos intermináveis corredores, com os pensamentos a mil, até chegar ao retrato da Mulher Gorda. Disse “Acromântula” sem fôlego e passou pelo buraco. Avistou Lily e Tom, novamente perto da lareira, e foi até lá. Eles ergueram os olhos para ela, assustados, quando se aproximou.



            - Que aconteceu, Sarah? – perguntou Lily, se levantando, e sua poltrona foi rapidamente ocupada por um sextanista.



- Parece até que correu uma maratona! – disse Tom e Lily lhe lançou um olhar indagador.



- Depois explico – interviu Sarah – Preciso lhes contar uma coisa... – sentiu os olhos lacrimejarem, esquecera completamente da mensagem do Pajefall.



            - Vamos para o meu dormitório. Não vai ter ninguém lá essa hora. Nick deve estar na biblioteca e Hugo saiu com Luke e Brad. – ofereceu Tom.



            Subiram a escada do dormitório dos meninos e entraram no quarto de Tom. Era bem diferente do das garotas. Havia menos móveis, com aspecto mais grosseiro, e ainda uma enorme bagunça de roupas e objetos para todo lado.



            - Muito bem, o que tem a dizer? – perguntou Tom.



            Sarah olhou apreensiva para os lados. Hesitou por um momento e disse:



            - Acabei de encontrar meus pais.



- O quê? – exclamaram os dois juntos.



- É sério. Estava numa sala esquisita e tinha esse espelho e então...



- Eles estão mortos. – falou Lily numa voz cortante, como se quisesse que a amiga aterrissasse.



- Isso é o que você diz, mas, para mim, estão bem vivos. Mas não estou dizendo realmente encontrar. Sabe, não cara a cara. Quer dizer, mais ou menos cara a cara...



- Sarah, começa de novo que eu não estou te entendendo. – interrompeu Tom.



- Ok – respirou fundo e recomeçou dessa vez mais devagar – Eu estava em uma sala estranha onde tinha um espelho diferente. Ele não refletiu a minha imagem como eu esperava, mostrou os meus pais! Eu os vi. E então várias outras pessoas. Não sei explicar muito bem, mas foi isso o que aconteceu.



- Humm... – disse Lily com expressão concentrada.



- O que? Você sabe o que quer dizer?



- Talvez... O que estava escrito nele?



- Espelho de Erised.



- Claro! Esse espelho não reflete a realidade. Ele mostra o que a pessoa mais quer na vida, algo como o desejo mais desesperado de seu coração. Papai sempre falou dele pra mim, em ensinamentos da vida... O homem mais feliz do mundo se veria como realmente é naquele espelho.



- Mas... O que você mais queria era ver os seus pais? – indagou Tom.



- Talvez não exatamente. – tornou Sarah, desconcertada – Eu queria conhecê-los, ter uma idéia de como seria minha vida longe da Sra. Newell... e queria saber o que aconteceu para eu precisar ser abandonada com ela. Mas não acho que o espelho me tenha dado alguma resposta – disse a Lily – Pelo menos não uma que eu tenha entendido.



- Ele pode ter enigmas. – sugeriu Lily.



- Acho que não. Bom, era só isso. Foi tão confuso. Uma hora eu não estava lá, mas então estava, só que diferente, e eu me dividi em duas e uma sombra engoliu todos. Não entendo...



- Acho que você não vai entender até entender. Esses objetos raramente são diretos com as pessoas.



- Humpf! – resmungou Tom – Achei que era algo mais emocionante pra termos que subir para uma conversa reservada.



Então Sarah se lembrou.



- Não acabou, não. – e contou sobre o Pajefall, sobre a tal missão que tinha no castelo...



            - De uma coisa eu sei – disse Tom – Esse objeto aí pode estar pifado. A Sarah com uma missão “secreta”. Até parece. – e desceu para a sala comunal falando consigo mesmo.


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Comentários (1)

  • TATY STAR

    Consegui achar os capítulos. Please, continua, que a história está ficando boa pra chuchu!!

    2022-01-04
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