O Pajefall



Sarah estava fervendo em curiosidade quando chegou à cabana. Bateu na enorme porta, proporcional ao tamanho do dono, e ouviu latidos lá dentro. Passadas pesadas rangeram a madeira e a porta se abriu, mostrando um Hagrid sorridente.



            - Ah! Você veio! – exclamou – Entre, entre.



            Deu espaço para a garota poder entrar e fechou a porta. Achou estranhamente pequeno para Hagrid, com os móveis todos “ingurgitados”. Uma cama ao canto, uma mesa com duas garrafas de chá do tamanho de baldes sobre ela, uma lareira, entre outras coisas. Os latidos vinham de outro canto, perto da porta dos fundos, onde havia um cachorro enorme de caçar javalis junto de um monte de panos. A garota foi até lá, mas um rosnado a fez recuar.



            - Como se chama, Hagrid? – perguntou.



            - Princess – respondeu Hagrid. Sarah achou que a cadela estava longe de ser uma princesa, mas guardou o pensamento para si. – É uma cadela que arranjei para outro cão que eu tinha, mas ele infelizmente morreu... Já tem um tempo, mas acho que ela ainda sente a falta dele, por isso tem tanta estima com os filhotes e não deixa ninguém chegar muito perto. Naquele monte estão dormindo dois filhotinhos – deu um enorme sorriso – Geralmente eles são muito dóceis, vão gostar de você.



            - Humm... – respondeu ela, espiando. A cadela Princess rosnou de novo, fazendo-a desistir. Não estava assim tão curiosa para arriscar uma canela.



            - Sente-se – convidou ele e Sarah foi até o banquinho próximo da mesa – Como foi o primeiro dia de aula?



            - Foi bem legal! Nunca tinha voado em uma vassoura e já sou a melhor da sala – disse sorrindo.



            - Que maravilha! Sinal que tem talento – e deu uma piscadela pra ela.



            - Pode ser que sim.



            - Está gostando do castelo?



            - Muito. Não conheço quase nada dele, mas ainda vou ter tempo para explorá-lo.



            - Cuidado. Não tente bancar a aventureira em Hogwarts, Sarah. Você pode encontrar mais do que procurou. – ele retirou um bule tamanho GG da lareira e serviu chá na xícara de ambos – Creio que está curiosa para saber o que veio fazer aqui?



            - Ah, sim. – respondeu bebericando o chá com dificuldade. Admitiu que estava muito bom, só não soube distinguir do que era feito. Pensando nisso, olhou desconfiada para a xícara, afinal você nunca sabe o que vai encontrar numa casa de bruxo.



            - Muito bem... É por um objeto muito valioso e raro. Um amigo quer lhe dar de presente.



            - Amigo...?



            - Mas é um segredo entre você e eu. Se for contar para alguém, como Lily e Tom, você tem de certificar que não vão espalhar.



A conversa estava ficando mais séria do que havia esperado.



            - Não estou entendendo...



            - Esse objeto vai te propiciar muitas coisas, mas é preciso sabedoria para usá-lo. A pessoa que te mandou quer que você descubra sozinha o que tem que fazer.



            Sarah olhou-o abobada, mas tratou de ficar calada para Hagrid explicar.



            Porém o que ele fez foi tirar da capa um bolinho de pano vermelho e colocar sobre a mesa, na frente dela. Sarah esticou o braço para abrir o embrulho de veludo e ver o que era, mas Hagrid o segurou e balançou a cabeça.



            - Você deve abrir só quando estiver sozinha, assim ele reconhecerá a verdadeira dona. É um Pajefall. Ele lhe permite conversar com outras pessoas que possua um, através do Patrono.



            - Patrono? O que é isso?



            - Você futuramente vai aprender a fazer um, porque é magia muito avançada. O Patrono é uma força conjurada, cada bruxo possui um diferente, cada um tem sua forma própria. Ele pode tanto te proteger, quanto enviar mensagens para os outros. O Pajefall irá projetar uma versão menor do verdadeiro Patrono e passar a mensagem devida.



            - Hagrid... Quem é esse seu amigo? Eu conheço? Por que está me dando isso?



            - Calma, calma... Sinto muito, mas não posso lhe responder nenhuma dessas perguntas.



            - Por quê? Ele me deu isso sem mais nem menos?



            - Tem um propósito e você saberá na hora certa. – disse sorrindo - Agora vá. Tem que voltar para o castelo. E não se esqueça, só abra quando tiver certeza que está sozinha.



            Terminou e acompanhou Sarah até a porta.



Enquanto caminhava para o castelo, se encontrou perdida em pensamentos. Por que Hagrid não podia revelar quem era a pessoa? Por que lhe dera aquele Pajefall? Quem seria esse homem misterioso? O que queria lhe falar de tão secreto que era necessário um objeto desses?



            Voltou mecanicamente para a sala comunal de Gryffindor e ao passar pelo buraco, foi como ter saído de um transe. Ficou toda agitada ao avistar Lily e Tom, próximos da lareira. Correu até eles.



            - Vocês não têm noção do que...!



            - Você é que não tem noção! – exclamou Tom, sobrepondo-a em tom furioso.



            - Hã? – indagou, confusa, olhando de um para o outro.



            - Ele é um chato! Só por que eu não quis falar por que gritei pra você não demorar, ele fica nessa chatice querendo saber de tudo. – explicou Lily meio zangada. Pareciam estar naquilo há um tempo.



            - Ora, Tom, às vezes é só uma marca de batom novo. – riu-se Sarah tentando ajudar.



            - Eu sei que não é! – gritou ele – Achei que confiasse em mim, Sarah. Sou mais amigo seu do que ela!  – protestou apontando para Lily.



Mas ele tinha acertado em cheio. Lily pegou o pergaminho em que escrevia e jogou na cabeça dele, olhando magoada para o amigo. Abriu a boca, fechou sem encontrar as palavras, abriu de novo e, para surpresa de Sarah, falou muito calma:



            - Eu sei, Tom, mas eu preciso contar para ela! É... é sobre garotos!



            Ele fez uma careta. Deu as costas, resmungando, e foi se juntar a Luke Ashley e Brad Campbell numa partida de Gobstones. Era um jogo estilo bolinhas de gude, só que com bexigas que espirravam um líquido fedorento no jogador que perdia.



- Você é tão minha amiga quanto ele, Lily – Sarah tentou consertar.



- Não esquenta, Sarah. Mesmo você me considerando muito, eu sei que vai levar tempo para eu ser o que Tom é para você. Eu entendo. Não se pode comparar alguns dias com anos. – e sorriu ao mesmo tempo em que Sarah sentia alívio. Então a olhou, desconfiada, e sussurrou:



            - Não tem nada a ver com garotos, não é?



            Ela deu uma risadinha, sacudiu a cabeça negativamente e a puxou para o dormitório, essa hora vazio.



            - Preciso lhe contar uma coisa! – exclamou.



            - Pois então conte. – tornou, curiosa.



            - Na verdade não é contar, é mostrar.



            Chegaram ao quarto e Sarah ficou olhando, intrigada, Lily se ajoelhar ao lado de sua cama e puxar o malão. Mexeu nele procurando alguma coisa e depois tirou dali um embrulho prateado. Olhou para Sarah e deu um largo sorriso.



            - Preparada?



            Sarah não respondeu e Lily rasgou o papel. No segundo seguinte a amiga segurava uma manta bem grande, azul prateada. O queixo de Sarah caiu diante de sua beleza. Aproximou-se mais. Ao passar a mão, teve a sensação de ser feito de fios de água. Olhou boquiaberta para Lily, que ainda sorria.



            - O que é isso? É magnífica!



            Ela deu uma risadinha e respondeu:



            - Sabia que ia gostar. É uma Capa da Invisibilidade. Era do papai, ele deu pra mim. James roubou um mapa dele no ano passado, mas papai sabe, então me deu isso. Não sei o que tem no mapa, mas deve ser bom, porque James preferiu.



            - Uau! Que demais!



            - Papai ainda guarda uma tonelada de segredos. Acho até que esconde alguns da mamãe para não preocupá-la.



- E por que ele te deu isso? Não vai precisar? Acho que aurores devem fazer bom uso dela...



- Papai não precisa de uma capa para ficar invisível. – e riu quando Sarah se boquiabriu mais ainda.



            - Humm... Mas não é só você que tem novas histórias não... – e contou tudo o que Hagrid lhe disse na cabana depois que as aulas terminaram.



            - Mas... mas, Sarah... como assim não pode te dizer quem é? Por que essa pessoa te deu um Pajefall?



            - Eu perguntei a ele, mas disse que não pode dizer e que mais para frente vou descobrir sozinha. Por que tudo na minha vida tem que ser tão difícil? Nada tem respostas. – olhou para a amiga e se lembrou da última recomendação de Hagrid, coisa que ela tinha medo que acontecesse – Mas você não pode contar nada para ninguém. Hagrid disse que eu podia contar para os amigos, mas não pode sair daqui. Ok?



            Lily continuou encarando-a. Então disse:



            - Sarah, você já pensou na possibilidade de ser uma pessoa perigosa usando Hagrid para chegar até você? E toda essa história de abrir o objeto sozinha... Não seria uma tática para te matar e não ter testemunhas?



            - Mas ele disse que podia contar só para os amigos, então agora você também sabe. Se fosse para acontecer algo, você já saberia. – sorriu. – Quem você acha que quer me matar? Slade? – e riu pelo nariz.



            - Não sei não... – ela mordeu o lábio, meio contrariada.



            - Ah, vamos, Lily. Não há nada de errado com isso.



            Ela sorriu e tornou:



            - É melhor irmos dormir. Nakata e Terence já estão pra chegar e é melhor atrasarmos a apresentação entre vocês. – As duas riram. Depois se trocaram e foram para cama.



 



            No dia seguinte Sarah acordou ainda de madrugada, quando o sol nem tinha aparecido, e desceu para a sala comunal. Estava vazia exceto por um garoto da turma de James, David Wood. Foi até ele.



            - O que é que você está fazendo? – perguntou, assustando-o. Ele escondeu rápido o pedaço de pergaminho velho que segurava e gaguejou:



            - N-nada.



            Sarah olhou-o, desconfiada, mas não fez mais perguntas. Foi em direção ao buraco da Mulher Gorda com o embrulhinho do Pajefall no bolso e saiu andando pelos corredores escuros. Na verdade, não podia sair andando pelo castelo, ainda era noite e Danth estaria supervisionando os corredores à procura de alunos infratores e, nesse momento, Sarah podia fazer parte da lista do zelador. Mas sua curiosidade era maior que o medo de pegar uma detenção. Quando chegou ao final do corredor, ouviu uma voz às suas costas:



            - Ei! Schaffor!



            Era David Wood e vinha correndo desabalado em sua direção. Parou ofegante quando a alcançou.



            - Você é louca? Danth pode te pegar andando pelo castelo a essa hora – sussurrou.



            - Mas é que eu preciso muito fazer uma coisa, e se não desrespeitar algum regulamento não sei como vou conseguir.



            - Quê? – perguntou ele confuso.



            - Olha. Por favor, não me entregue para ninguém...



            - Não vou te entregar! – retrucou, como se fosse óbvio – Mas você tem que saber que podem te ver. Vem, vamos voltar.



            Ele segurou seu pulso e começou a caminhar de volta, mas Sarah parou abruptamente, fazendo Wood olhar para trás, surpreso.



            - Você não está entendendo? – sibilou ele com urgência – Pode entrar em uma fria! Danth está por perto!



            - Como pode saber? – perguntou ela no mesmo tom de voz.



            - Não interessa como eu sei, mas tem que voltar agora! Vem.



            E continuou a puxá-la pelo pulso até chegarem ao retrato da Mulher Gorda... que estava vazio. Como iam entrar?



            - Essa não! Deve ter ido fofocar em algum outro retrato... Vamos ser pegos! – ele agarrou o pulso de Sarah novamente e saiu correndo pelo corredor, abafando os passos com um toque da varinha. Pararam em frente a um armário de vassouras, e Wood obrigou-a a entrar.



            - O que você acha que está fazendo, hein? – disse ela ainda sussurrando. – Estamos dentro de um armário de vassouras!



            Retirou a varinha das vestes e murmurou “lumus”. Um fio de luz vindo da varinha iluminou o armário, mostrando o rosto dos dois. David ignorou a pergunta e retirou do bolso o pedaço de pergaminho velho que tinha escondido na sala comunal. Deu uma breve olhada em Sarah, encostou a ponta da varinha no pergaminho e recitou: “Juro solenemente que não vou fazer nada de bom”.



            Começaram a aparecer linhas finas no papel, em todos os lugares. Pareciam crescer, traçando formas diferentes. Quando parou, Sarah aproximou o rosto para ver o que era e seu queixo caiu. Era um mapa perfeito de Hogwarts! Mostrava tudo. Procurou o local onde estavam e deparou com dois pontinhos nas linhas do mesmo armário com os dizeres “Sarah Schaffor” e “David Wood”. No corredor, um terceiro pontinho se mexia, aproximando-se do lugar onde estavam, com a legenda de “Ludo Danth”.



            Ela olhou para David, que projetou um sorriso enviesado no rosto, parecendo constrangido.



            - Então foi assim que você soube que Danth ia me achar?



            - Exato.



            - Uau! Mas onde conseguiu isso?



            - É do James. Mostra tudo de Hogwarts: as pessoas, as passagens secretas, as salas comunais... É, no mínimo, incrível.



            - E o que você ia fazer com ele? – sorriu.



            - Só queria ver se era seguro tentar descobrir o que tem no corredor do quinto andar, eles o interditaram hoje. E você, o que estava tentando fazer?



            - Não... Não posso dizer – se sentiu um pouco culpada por isso, afinal, ele tinha dito o que estava tramando. Confiou nela. Mas o que Sarah tinha nos bolsos precisava ficar só entre ela e os amigos.



            Passou a mão de leve sobre a capa e sentiu o pequeno volume que o Pajefall fazia.



            - Ah, Qual é... Eu contei o que queria fazer desrespeitando as regras da escola. Agora me diga a sua aventura da noite.



            - Mas é que eu não posso. Sério mesmo – respondeu sem olhar para ele.



            - Bom, acho que a Mulher Gorda já deve ter voltado do seu passeio noturno. E Danth já saiu de perto – acrescentou olhando para o mapa – Vamos?



            Sarah assentiu com a cabeça murmurando “nox” para apagar a luz de sua varinha e saíram do armário. Para alívio dos dois, a Mulher Gorda tinha voltado.


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